Em 2020, uma projeção feita pelo New Global Cancer Data (Globocan 2020) constatou que o número de mulheres diagnosticadas com câncer de ovário aumentará em 42% até 2040 no mundo. Essa estimativa retrata a gravidade da condição, mas é possível entender o motivo e buscar formas de reduzir os riscos. O problema principal, atualmente, deve-se à falta de conhecimento sobre a doença e ao diagnóstico tardio. Estima-se que apenas cerca de 20% das mulheres recebem um diagnóstico precoce desse câncer.
O câncer de ovário se desenvolve predominantemente em mulheres acima de 50 ou 60 anos. “O principal fator de risco é o envelhecimento populacional, o segundo são as mutações genéticas. O terceiro fator de risco é a exposição hormonal e isso se dá principalmente por mulheres que têm menarca precoce e menopausa tardia, que não amamentam ao longo da vida e também as mulheres que fazem reposições hormonais ao longo da vida”, explica Henrique Helber, oncologista do Hospital Israelita Albert Einstein.
Caminhos para um tratamento efetivo
Existem cerca de 30 tipos de câncer de ovário. Eles podem ser denominados a partir de suas células de origem, mas a principal característica é sua natureza silenciosa, já que a neoplasia tem sintomas normalmente sutis e também existe a falta de rastreamento efetivo para detecção precoce. “Por isso, a informação e o conhecimento são fundamentais e determinantes para que o prognóstico seja o melhor possível”, explica Henrique.
Os fatores de risco desse tipo de doença incluem histórico familiar de câncer de ovário, mama ou colorretal, especialmente em parentes de primeiro grau. Aproximadamente 25% dos cânceres de ovário estão associados a mutações nos genes BRCA1/BRCA2. E é justamente essa descoberta que trouxe mudanças significativas nos protocolos de diagnóstico.
O câncer de ovário é diagnosticado por meio de uma combinação de exames clínicos e de imagem. Os tipos de mutações e testes genéticos, por exemplo, são essenciais no diagnóstico desse tipo de câncer. “Hoje, a caracterização molecular dos tumores é uma arma essencial num diagnóstico acurado e uma possibilidade de tratamento personalizado”, explica Breno Jeha Araújo, oncologista da Oncoclínicas, especializado em genômica clínica.
Sintomas sutis, atenção redobrada
Por tanto, para prevenir e detectar o câncer de ovário o mais cedo possível, é importante não negligenciar nenhum sinal. Os mais comuns:
· Inchaço e dor no abdômen
· Dores na região pélvica, nas costas ou nas pernas
· Alterações gastrointestinais (náuseas, indigestão, gases)
· Mudanças nos hábitos intestinais
· Fadiga constante
· Perda de apetite e peso sem causa aparente
· Sangramento vaginal anormal, especialmente após a menopausa
· Alterações urinárias
Em resumo, a prevenção envolve olhares atentos e a identificação e gestão dos fatores de risco. Mulheres com mutações genéticas conhecidas podem considerar a profilaxia cirúrgica, por exemplo. Além disso, manter um peso saudável, evitar o tabagismo e considerar o uso de contraceptivos orais, que têm sido associados a uma redução no risco de câncer de ovário, são medidas preventivas recomendadas. Não menos importante, a realização de exames regulares é fundamental para a detecção precoce.

Para além da estatística
Quézia Queiroz, jornalista e empreendedora social, descobriu a doença em 2010, aos 30 anos, e compartilhou sua experiência: “Numa madrugada de setembro, senti fortes dores abdominais. Entre vários diagnósticos equivocados e muitas idas ao pronto-socorro, eu sabia que era grave. Mesmo assim, o médico me mandou pra casa e me deu um remédio para gases. Até que um plantonista mais atencioso pediu mais exames e eu fui da emergência encaminhada ao centro cirúrgico. Dez dias depois, fui tirar os pontos da cirurgia e o médico disse que eu tinha câncer”.
O mesmo aconteceu com a contabilista Anne Carrari. Em 2015, percebeu que estava com um inchaço na barriga, progressivo e persistente. Em menos de um mês, ela procurou três médicos, os dois primeiros disseram que eram gases e que ela não precisava se preocupar. No terceiro atendimento, dentro de um pronto-socorro, ela recebeu o diagnóstico de câncer de ovário, já em estágio metastático.
Hoje ela convive com a doença e também tem o gene com mutação BRCA1, que aumenta o risco do desenvolvimento de câncer de mama, ovário e outros tipos de câncer. Atualmente, Anne é membro do comitê de pacientes do Instituto Oncoguia e se dedica a ajudar outras mulheres por meio do Instagram @sobrevivi_ao_cancer_de_ovario.
“Os tratamentos já foram muitos. Já fiz duas cirurgias citorredutoras grandes, retirei o baço, retirei partes de outros órgãos, já fiz todos os protocolos para câncer de ovário. Hoje eu faço alguns tratamentos sistêmicos e trato o câncer como uma doença crônica graças a essa evolução da oncologia que me permite tratamento mesmo no meu caso”, conta.
O futuro depende da informação
“Lá em 2015, quando fui diagnosticada, recorri à internet para encontrar informações e entender como seria minha caminhada e não achava nada. Eu me sentia culpada porque me considerava uma pessoa esclarecida, mas nunca tinha ouvido falar em câncer de ovário”, lembra Anne. E ela ainda completa: “Eu sei o que é se sentir sozinha tendo um câncer pouco falado, com poucas campanhas de conscientização. E eu entendi que esse era meu propósito: disseminar informação de qualidade para que as mulheres tenham mais chances de diagnóstico mais precoce possível”.
Para Quézia, que hoje atua como voluntária ajudando outras pacientes, o apoio e a informação também são fundamentais durante o tratamento. “Como jornalista, fiquei bastante incomodada com as fake news sobre câncer e por isso criei o Oncofake: Observatório de Notícias sobre câncer, para separar o que é verdade e o que é fake no universo oncológico.”
Anne ainda conta que sua filha é de uma geração que busca mais informações, já fez seu teste genético, que trouxe boas notícias, mas não deixa de fazer acompanhamento ginecológico e fica sempre muito atenta aos sinais do corpo. “Se tratando de câncer de ovário, informação é poder”, finaliza.