Um debate se impõe cada vez mais sobre a saúde no Brasil: como oferecer o melhor atendimento às pessoas e garantir a sustentabilidade do sistema. A resposta, inevitavelmente, passa por uma transformação no olhar de quem oferece o acesso, mudando o enfoque do cuidado – da doença para a prevenção.
Nesse sentido, o cuidado integrado, que acompanha o paciente por toda a sua jornada de atendimento e tem como alicerce a atenção primária, se mostra como uma alternativa importante também no atendimento privado. O tema foi debatido por especialistas de diversos países durante o fórum realizado no Einstein.
No Brasil, a experiência do Sistema Único de Saúde (SUS) com as Unidades Básicas de Saúde (UBS) como porta de entrada e o atendimento dos médicos da família e dos agentes comunitários de saúde mostram um caminho em que a proximidade com o paciente e o acompanhamento da sua saúde, mesmo antes de a doença surgir, são respostas potencialmente replicáveis no serviço privado.
A ideia é oferecer um atendimento em que o paciente seja recebido e orientado por um médico da família, e apenas seja encaminhado para médicos de outras especialidades e faça exames específicos conforme a necessidade. Isso é melhor para o paciente, que mantém o foco na prevenção e evita procedimentos desnecessários, e para o sistema, desafogando unidades onde são atendidos os casos mais críticos, como os hospitais.
A mudança no olhar, porém, pode não ser tão simples. “É um grande desafio nos adequarmos às medidas preventivas, pois, como o nome diz, estamos atuando antes dos agravos acontecerem e temos a possibilidade de refletir mais sobre saúde e como preservá-la”, observa o diretor do Sistema de Saúde Einstein, Eliezer Silva.
Para engajar os usuários e todos os outros atores do sistema privado em um novo modelo de atendimento, é preciso que as pessoas entendam as suas vantagens. “Com o cuidado integrado, as pessoas, além de manterem o foco em adotar hábitos de vida mais saudáveis, utilizarão menos os recursos do sistema de saúde, permitindo um reequilíbrio”, diz Silva.
O médico e professor da Harvard Medical School, Dan Schwarz, ressalta que a prevenção e o autocuidado devem ter um papel mais central quando discutimos a saúde dos indivíduos. “O tempo que um paciente fica em uma consulta ou dentro de um hospital é muito curto, se pensarmos no tempo de atenção que ele deve ter com a saúde. Precisamos ampliar o cuidado integrado”, disse, durante o fórum.
Para o diretor-geral do Einstein, Henrique Neves, o cenário de transição epidemiológica que o sistema de saúde enfrenta após dois anos de pandemia gera oportunidade de reforçar o foco na prevenção. “Temos as doenças infecciosas convivendo com as doenças crônicas, e essa transição coloca uma obrigação adicional sobre sistema que implica entender muito bem onde investir para reduzir essa carga, seja na prevenção ou na detecção precoce.”
A vice-presidente sênior de Estratégia e Transformação da Saúde da População no Bellin Health, EUA, Andrea Werner, por sua vez, destacou a importância de investir nas equipes de saúde da família. “Temos que pensar em como priorizar o cuidado personalizado como medida para desafogar o fluxo nos hospitais. É essencial empoderar os profissionais que fazem a primeira interação com os pacientes para que isso aconteça.”
O tempo que um paciente fica em uma consulta ou dentro de um hospital é muito curto, se pensarmos no tempo de atenção que ele deve ter com a saúde'
Dan Schwarz, médico e professor da Harvard Medical School
Fórum reúne CEOs e estudantes para propor compromissos em ESG para o setor
Um espaço para discutir mudanças dentro do sistema de saúde, com lideranças do setor de vários países da região. A abertura do 7º Fórum Latino-Americano de Qualidade e Segurança na Saúde,realizado pela ociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein e pelo Institute for Healthcare Improvement (IHI), propiciou essa oportunidade, trazendo importantes nomes que contribuem com o debate sobre saúde no mundo para propor, em conjunto, compromissos no combate às mudanças climáticas e em busca de maior equidade na saúde.
Na noite do último dia 12, lideranças executivas se reuniram com estudantes de Medicina, em uma atividade colaborativa no CEO Day, para endereçar o que o setor pode fazer em termos de políticas ESG (sigla em inglês para ações ambientais, sociais e de governança). "ESG é um processo. Para cada indivíduo ou cada empresa, veremos estágios diferentes de uma jornada comum", afirmou Sidney Klajner, presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, na abertura. "O caminho adiante é longo, mas estarmos aqui hoje já é um grande avanço na direção correta."
Os estudantes de Medicina do Einstein trouxeram o sentido de urgência em uma carta endereçada às lideranças. “Almejamos que a abordagem de ações socioambientais pelas empresas deixem de ser mera formalidade ou mandatórias fachadas, e passem a ser algo intrínseco à estruturação corporativa nos mais diversos meios", disseram os estudantes na carta.
“É importante termos este evento ocorrendo no ambiente acadêmico com a possibilidade de trazermos também os líderes do futuro para os debates”, afirmou Claudio Lottenberg, presidente do Conselho Deliberativo da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein. Ele ressaltou ainda a importância de se enfrentar, como sistema, os desafios apontados pelos estudantes. “O ESG propõe uma mudança de cultura difícil, que implica uma nova mentalidade: mudar de forma estrutural e não compensatória, não por obrigação, mas por convicção.”
Papel da comunicação
O fórum também reuniu lideranças de comunicação do setor para discutir o papel da informação na promoção da saúde. Altos representantes de organizações da indústria farmacêutica, de equipamentos, operadoras de saúde e hospitais referência públicos e privados participaram de debates com jornalistas da América Latina sobre como a cobertura de saúde e a boa informação podem contribuir com a busca por equidade.
Em um workshop na sequên-
cia, os representantes de comunicação do setor debateram caminhos convergentes e uma agenda única e coletiva que pode contribuir para a transformação da saúde.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.