SÃO PAULO - O número de casos de dengue registrados no Brasil em 2019 foi o segundo mais alto da série histórica, segundo o Ministério da Saúde. Os dados, de janeiro a 7 de dezembro, apontam 1,527 milhão de notificações, concentradas principalmente nas regiões Centro-Oeste e Sudeste. Quase dois terços das ocorrências foram em São Paulo, Minas e Espírito Santo. E a tendência é de que os registros continuem altos em 2020.
A série histórica do governo federal teve início em 1975. O ano passado fica atrás somente de 2015, quando houve quase 1,7 milhão de registros da doença no País, conforme o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do ministério. Mas superou as notificações dos anos de 2017 e 2018, que registraram cerca de 239 mil e 266 mil casos prováveis da doença, respectivamente.
Para Rodrigo Said, coordenador-geral de Vigilância de Arboviroses do Ministério da Saúde, o verão com altas temperaturas e chuvas intensas contribuiu para o quadro. Outro fator foi a circulação de um novo sorotipo do vírus. “Desde 2010, as epidemias eram causadas pelos sorotipos 1 e 4. Tivemos uma alteração para o sorotipo 2 em 2018, principalmente nas regiões Centro-Oeste e Sudeste.” De acordo com ele, o sorotipo 2 não circulava nessas áreas desde o ano de 2008.
Em 2019, foram registrados 754 óbitos pela doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, ante 155 no ano anterior. Já em 2017, o balanço da pasta foi de 185 mortes.
“A ocorrência do óbito por dengue está ligada a questões individuais, como a resposta do paciente à doença. Também tem fatores relacionados ao vírus. O 2 que está circulando pode ocasionar apresentações mais graves e número maior de óbitos. Além disso, a literatura médica mostra que a segunda infecção pode ser mais grave do que a primeira”, afirma Said.
Só no Estado de São Paulo, em 2019 foram registrados cerca de 442 mil casos da doença, ante 19,7 mil casos no ano anterior. Na capital, o total de registros não foi alto (cerca de 16,8 mil). A doença se concentrou, principalmente, no oeste paulista, como na regiões de Ribeirão Preto e Presidente Prudente.
Segundo o ministério, a doença costuma alternar biênios de alta e baixa incidência. Os anos de 2017 e 2018 haviam sido períodos com menos registros do vírus. Por isso, Said afirma ser possível que o quadro de alta de registros se mantenha este ano.
“O ministério tem desenvolvido várias atividades com as secretarias, de controle e pesquisa sobre o Aedes, mas precisamos mobilizar a nossa população para desenvolver ações efetivas para eliminação e redução dos criadouros dos mosquitos”, diz Said. O intervalo de dezembro a maio é considerado o período propício para a doença.
“Estamos com 22 pesquisas contratadas na área e fazendo investimentos para o diagnóstico laboratorial, para o desenvolvimento de vacinas e expansão do uso da Wolbachia (micro-organismo que faz com que o mosquito perca a capacidade de transmitir vírus na picada).” A troca do inseticida usado também será feita em 2020 - como o mesmo produto tem sido usado nos últimos sete anos, isso pode ter favorecido o surgimento de insetos mais resistentes.
Fraqueza
Acostumada a orientar a população sobre os riscos da doença, a agente comunitária de saúde Paula Amaral, de 36 anos, tem sentido no corpo os efeitos da dengue. “É muita fraqueza. Não conseguia amamentar o meu filho”, diz ela, mãe de uma criança de um ano e sete meses e de um adolescente de 14 anos. Embora os sintomas ainda estejam presentes, Paula afirma que já está melhorando.
Ela é moradora de Bandeira, no Vale do Jequitinhonha (MG), cidade de 5 mil habitantes que aparece entre os três municípios do Estado com incidência considerada alta do vírus no último mês de 2019. “Em novembro tivemos grande mobilização, com mutirões de limpeza em todo o município”, diz a secretária de Saúde de Bandeira, Paula Figueiredo. Segundo ela, o procedimento continua. Paula diz não ter ideia de onde foi infectada pelo vírus.
“A dengue é uma doença que tem leque de apresentações muito variado. Tem o extremo benigno, quando a pessoa tem e nem sabe, e o outro extremo, com forma fulminante”, diz Celso Granato, professor de infectologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “O mais comum é a doença leve, quando o paciente fica febril e tem fraqueza. Nas formas mais graves, a pessoa pode ter encefalite, miocardite e hepatite.”
Síndica de um prédio na Vila Clementino, zona sul de São Paulo, Catarina Anderáos, de 43 anos, não tem notícia de casos de dengue entre os moradores há quatro anos. A estatística favorável não é um acaso. “Coloco cartazes nos elevadores e distribuo comunicados por WhatsApp aos moradores. O objetivo é incentivar ações que evitem acúmulo de água e lixo.”
Zika e chikungunya
Outras doenças transmitidas pelo Aedes também tiveram alta. Os casos de zika passaram de 8,7 mil em 2018 para 10,7 mil ano passado. “Zika teve incidência muito baixa em 2019, mas houve dispersão do vírus em todo o Brasil. Por isso, é importante fazer o acompanhamento das gestantes”, afirma Said. O vírus está associado a casos de microcefalia em bebês.Chikungunya também registrou aumento de casos, de 87,7 mil registros (2018) para 130,8 mil (2019), mas, segundo Said, a circulação do vírus está concentrada em dois Estados: Rio e Rio Grande do Norte.
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