A Secretaria da Saúde paulista informou nesta terça-feira, 23, que o estoque de medicamentos usados para a intubação de pacientes é suficiente para "uma semana para os hospitais públicos que atendem casos de covid-19" no Estado. A situação de risco de desabastecimento do 'kit intubação' já ocorre em outros Estados. No Distrito Federal, as prateleiras de 26 medicamentos para pacientes de covid estão vazias. Esses fármacos são usados em processos de intubação de pacientes na UTI.
O aumento de internações pela doença está associado à escassez de analgésicos, sedativos e bloqueadores musculares, utilizados no invasivo procedimento de intubação dos pacientes graves de covid-19. Para evitar o colapso, os conselhos dos secretários estaduais e municipais de saúde recomendaram a suspensão de cirurgias eletivas para pouparmedicamentos. Procurado para comentar o quadro no País e medidas que devem ser adotadas, o Ministério da Saúde não se posicionou até as 19 horas.
A secretaria paulista informou que tem pressionado o governo federal para estabelecer medidas para abastecer o Sistema Único de Saúde (SUS) com as medicações. " Apesar disso, o governo federal fez somente uma liberação de neurobloqueadores em quantidade suficiente para apenas dez dias de consumo. Atualmente, o Estado tem estoque estimado para uma semana para os hospitais públicos que atendem casos de covid-19", disse, em nota.
A reportagem apurou que o Hospital Geral de Cotia, na Grande São Paulo, já estava com falta dos sedativos Propofol e Midazolam e que profissionais estavam fazendo a substituição do Midazolam por Diazepam, um ansiolítico com propriedades sedativas. A secretaria nega.
"Tanto no Hospital Geral de Cotia quanto em qualquer unidade, hámonitoramento dos estoques de insumos e medicamentos. Há, sim, Propofol e Midazolam, e o uso é feito de forma racional e somente mediante indicação médica, como ocorre em qualquer serviço de saúde".
Medicamento é necessário para o paciente não sentir dor
Professor da Faculdade de Saúde Pública da USP, Gonzalo Vecina diz que, sem as medicações, é difícil fazer o procedimento e manter os pacientes intubados. Mas há soluções para garantir a assistência aos pacientes. "O paciente pode apresentar resistência em aceitar ser intubado e aceitar a respiração pela máscara.Teria de ver uma maneira de comprar esse material no mercado ou discutir com o anestesista outro tipo de anestésico. É possível, é uma situação emergencial", diz ele, que foi secretário municipal de Saúde de São Paulo e é colunista do Estadão.
Médico intensivista e diretor de pesquisa do HCor, Alexandre Biasi diz que essas medicações são importantes para garantir não só que o paciente não sinta dores, mas que não ocorram intercorrências por movimentos, inclusive da respiração, feitos pelo paciente. "Logo depois que intuba, tem de continuar usando analgésicos e sedativos. Pacientes com covid, com insuficiência respiratória grave, precisam de ventilação adequada e que não produza lesão nos pulmões."
Marcio Sommer Bittencourt, médico do centro de pesquisa clínica e epidemiológica do Hospital Universitário da USP, diz que a situação ainda não é de esgotamento de todas as medicações disponíveis e que substituições podem ser realizadas, mas que exigem redesenho de protocolos e que as drogas adotadas podem não ser tão eficazes.
"Não é o estoque de tudo que está acabando de uma vez. Tem de readequar a equipe para usar medicamentos diferentes, mas não estão faltando todas as classes. Se isso acontecer, será uma situação mais complicada. Se acabar sedativo ou analgésico, tem alternativas mais raras. Vai dando um jeito, mas vai piorando a qualidade da assistência. Se não tiver o bloqueador, vai ter dificuldade de ventilar." Segundo Bittencourt, as alternativas podem ser menos eficientes e ter mais efeitos colaterais. " Se a droga não é primeira escolha, tem pontos negativos."
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