Gestão Bolsonaro veta indicação de professora da USP que listou erros na pandemia para comitê da OMS

Ministério diz não ter visto ‘perfil adequado para a função’. Entidades científicas falam em ação ‘ideológica’ e saem em defesa de Deisy Ventura, que criticou gestão federal da crise sanitária

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Foto do author Roberta Jansen
Atualização:

RIO - O Ministério da Saúde vetou a indicação do nome da pesquisadora da USP Deisy Ventura para integrar o comitê que atualizará o Regulamento Sanitário Internacional (RSI), um dos mais importantes da Organização Mundial de Saúde (OMS). Em nota, o ministério limitou-se a afirmar que “foi consultado sobre a indicação da profissional e considerou que não era o perfil adequado para a função”.

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Deisy Ventura é professora titular de ética da Faculdade de Saúde Pública da USP. Lá, coordena o programa de pós-graduação em saúde global e sustentabilidade. Também é professora do programa de pós-graduação do Instituto de Relações Internacionais da USP. Teve forte atuação pública durante a pandemia de covid-19.

A especialista é coordenadora do único grupo de trabalho do País sobre reforma do RSI. É formado por profissionais da USP e da Fiocruz.

O principal objetivo do comitê da OMS é oferecer conselhos técnicos ao diretor-geral da entidade, em caso de “emergência de saúde pública de interesse internacional”. O comitê inicia os trabalhos já na semana que vem.

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Deisy Ventura criticou o governo Bolsonaro na pandemia Foto: ENSP/Fiocruz

Pelo menos três entidades ligadas à ciência e à saúde pública criticaram a decisão do Ministério da Saúde. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Faculdade de Saúde Pública da USP e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) acusaram o governo de agir na contramão dos interesses do País.

“Ao se opor ao nome da pesquisadora sem apresentar explicações, o Ministério da Saúde age de forma puramente ideológica enquanto a OMS busca escolher entre as personalidades mais qualificadas por sua competência técnica”, sustenta a nota da SBPC e da Abrasco.

A universidade também se manifestou. “A professora Deisy teve atuação destacada no enfrentamento da pandemia de covid-19, contribuindo de modo inestimável para a proteção social”, apontou a nota da USP. “Sua projeção como liderança acadêmica motivou o convite da OMS para participar da importantíssima missão de rever o regulamento sanitário internacional. O injustificado veto (...) envergonha o País em nível global.”

No início de 2021, no auge da pandemia, a equipe de Deisy Ventura publicou um estudo, segundo o qual o presidente Jair Bolsonaro teria optado pela estratégia de alcançar o mais rapidamente possível a imunidade de rebanho por meio da disseminação intencional do vírus. Por isso, o presidente demorou a comprar vacinas, defendeu um tratamento ineficaz e boicotou as políticas de isolamento social, sustentou a especialista.

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“Nosso estudo mostra que há um plano sistemático de disseminação do coronavírus no Brasil promovida pelo governo federal por razões eleitoreiras e econômicas”, afirmou a pesquisadora em entrevista ao Estadão na ocasião do lançamento do trabalho.

Para chegar a essa conclusão, o grupo analisou 3.049 normas federais relativas à pandemia produzidas em 2020. Também estudou as falas públicas do presidente. O estudo teve grande repercussão internacional. E embasou um pedido de impeachment contra Bolsonaro por crime de responsabilidade.

“Trata-se de uma pessoa altamente qualificada”, afirmou o presidente da SBPC, Renato Janine Ribeiro. “Mas ela é uma das autoras do trabalho que afirma que o presidente contribuiu propositalmente para o aumento do número de mortes pela covid-19.”

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