A demência frontotemporal (DFT) é um tipo menos prevalente de demência que acomete geralmente indivíduos entre 45 e 65 anos de idade. Nos últimos anos, a doença ganhou destaque com os casos do ator Bruce Willis e do jornalista Maurício Kubrusly, mas chegar ao diagnóstico correto ainda é um desafio longo e, em alguns casos, a demora pode colocar pessoas em risco.
“Como é uma doença pouco conhecida pelos médicos e confundida facilmente com transtornos psiquiátricos, o diagnóstico em geral é tardio. Algumas vezes, inclusive, os pacientes têm alterações graves do comportamento que levam a transgressões e até à prisão”, afirma Elisa de Paula França Resende, coordenadora do Departamento Científico de Neurologia Cognitiva e do Envelhecimento da Academia Brasileira de Neurologia (ABN).
O quadro é frequentemente confundido com transtornos psiquiátricos, como esquizofrenia e transtorno bipolar.
Por outro lado, uma pesquisa realizada na Universidade de Queensland, na Austrália, descobriu que 70% dos pacientes avaliados com suspeita de DFT não tinham a doença.

Confusão de sintomas
A doença não afeta predominantemente a memória, como o Alzheimer. “No Alzheimer, um quadro típico é a perda de memória. Na DFT, a memória não é comprometida precocemente”, aponta Jerusa Smid, neurologista e coordenadora do Grupo Médico Assistencial de Memória e Cognição do Hospital Israelita Albert Einstein.
Ela se manifesta primeiro com mudanças no comportamento do paciente — como se a pessoa mudasse de personalidade.
Como os sintomas são parecidos aos de transtornos mentais e comportamentais, é comum que os pacientes procurem primeiro psiquiatras para só depois chegarem a neurologistas, conta Felipe Aydar Sandoval, neurologista do Hospital Sírio-Libanês.
Além disso, pode ocorrer uma má interpretação de exames cerebrais e testes cognitivos, um dos fatores que mais causam diagnósticos errados, segundo os especialistas. “Por vezes, o diagnóstico da DFT pode ser difícil mesmo para profissionais especializados”, ressalta Sandoval.
Principais sintomas
A DFT pode se manifestar de diferentes formas. Na afasia progressiva não fluente, por exemplo, o paciente começa a ter dificuldade de se expressar por meio da linguagem e torna-se menos comunicativo, mais calado.
Já na afasia semântica, a capacidade de compreender o significado de palavras e objetos é afetada e o paciente não consegue discernir uma televisão, uma vassoura ou uma casa, por exemplo. Também é comum que ele pronuncie frases sem sentido algum.
A variante comportamental, por sua vez, tende a ser a versão mais desafiadora, pois desde o início os sintomas envolvem desinibição, atitudes impulsivas, inadequadas e repetitivas. A pessoa passa a se comportar de forma inadequada e constrangedora. Ela pode xingar desconhecidos na rua ou mesmo fraudar documentos, sem medir as consequências. Os pacientes também podem perder a empatia, tornando-se indiferentes e deixando de demonstrar afeto por outras pessoas, incluindo familiares próximos.
Geralmente, os primeiros sintomas envolvem mudanças comportamentais. Em seguida, é comum que o paciente passe a apresentar dificuldade para se comunicar.
Causas
As causas da demência frontotemporal ainda não são totalmente conhecidas, mas existe uma correlação com a questão hereditária. Caso algum familiar tenha a doença, maiores são as chances de desenvolver o quadro.
Os especialistas também já identificaram que, no cérebro do paciente com DFT, ocorre um acúmulo anormal de três proteínas: tau, TDP-43 e fus. Isso acaba sendo tóxico para os neurônios, que aos poucos vão morrendo, causando os sintomas da doença.
O aspecto anatômico do cérebro também é diferente: além de reduzido em peso e volume, ele pode apresentar uma aparência encolhida em algumas áreas. “Quando olhamos o cérebro do paciente com demência frontotemporal, vemos uma atrofia na região frontal e temporal”, explica Jerusa.
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“Esse fato é importante para o diagnóstico, pois pode ser identificado por exames de imagem. Mas os achados nem sempre são tão evidentes, exigindo atenção de quem interpreta visualmente essas imagens”, diz Sandoval. Normalmente, são realizados exames de tomografia computadorizada e ressonância magnética para determinar as partes do cérebro afetadas.
Existe cura?
Paulo Caramelli, neurologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), destaca que, assim como o Alzheimer, ainda não há cura para a DFT. “Mas existe tratamento. Ele pode ser medicamentoso — se a pessoa tem sintomas depressivos, podem ser prescritos remédios para diminuir esses sintomas, por exemplo — e não medicamentoso”.
O tratamento não medicamentoso começa com uma explicação da doença para a família. Os familiares precisam conhecer o quadro para não serem surpreendidos pelos sintomas mais graves e para terem ciência dos possíveis impactos da DFT na vida e nos relacionamentos do paciente.
Ele envolve o acompanhamento com uma equipe multidisciplinar composta por psicólogo, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo, afirma Caramelli.
Segundo Sandoval, terapias como a reabilitação cognitiva, atividade física adequada e diferentes treinos de linguagem também são importantes instrumentos no tratamento.