A tendência de crescimento do ganho de peso nas populações ignora os avisos de alerta das autoridades de saúde pública em relação à epidemia de sobrepeso e obesidade que assola tanto países desenvolvidos como países emergentes. É isso que aponta a Pesquisa Nacional de Saúde do IBGE, que mostra dados de 2013. Segundo o estudo, entre 55% e 60% da população brasileira apresenta sobrepeso e de 20% a 25%, obesidade! Pela primeira vez podemos dizer que os números começam a chegar perto dos norte-americanos - não há do que se orgulhar - e, se nada for feito, em breve conseguiremos cumprir a façanha dos mexicanos, que conseguiram ultrapassar a prevalência dos gringos.
No Brasil, os levantamentos recentes demonstram um crescimento secular da obesidade em todas as classes sociais, em todas as regiões doPaís, tanto em áreas urbanas como em rurais e em todas as faixas etárias. Existe uma tendência à estagnação do crescimento nas mulheres de nível socioeconômico mais elevado da Região Sudeste, talvez associada ao maior nível de informação, educação ou acesso a tratamento médico.
O aumento da prevalência na população infantil e adolescente é particularmente inquietante, mas o que esta pesquisa mostra é que, numa época em que a economia do Brasil ainda ia de vento em popa (os dados são de 2013 e a calmaria não tinha ainda trazido recessão e inflação ao cenário econômico), há dados preocupantes. Apesar de uma imensa maioria das gestantes ter acompanhamento pré-natal (mais de 97%), põe-se em dúvida a qualidade desse atendimento, já que uma em quatro crianças não recebe a vacina tetravalente e cerca de uma em três não faz o teste do pezinho.
Daquelas com menos de 2 anos, um terço tomam bebidas artificiais como sucos e refrigerantes e mais da metade comem bolachas recheadas e bolos. Certamente o aumento da renda familiar não se refletiu na escolha mais acertada em relação à compra dos alimentos mais apropriados no que se refere a prover um estilo de vida saudável para a família, o que caracteriza um estilo de vida ruim.
A redução progressiva no uso da força muscular nas atividades operárias e domésticas está ao longo do tempo também ligada ao aumento da prevalência da obesidade. Cada vez que usamos um controle remoto em vez de uma manivela ou deixamos de levantar do sofá para atender um telefone, deixamos de gastar calorias. As telas gradativamente substituem os jogos de amarelinha, os carrinhos de rolemã, os jogos de queimada, o futebol de rua, o pião, a bicicleta.
O parque é substituído pelo videogame. O passeio com o cachorro, trocado por pet-games. A recomendação das diretrizes das sociedades médicas para crianças e adolescentes é de no máximo duas horas de tela por dia (incluindo televisão, computador, videogame, celular e tablets) e para crianças com menos que 2 anos, nada!
O fato é que em nosso País não há educação nutricional nas escolas e estratégias de prevenção da obesidade deveriam ser iniciadas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), com o médico, que a cada dia, prescreve mais e mais medicamentos para hipertensão, diabete, colesterol elevado, artrose de joelho e coluna (ou seja, as doenças desencadeadas ou agravadas pelo excesso de peso).
O sonho seria ter um nutricionista em cada UBS! Nas unidades secundárias (AMAs), os endocrinologistas não têm estratégias terapêuticas para empregar para seus pacientes obesos, a não ser esperar o quadro se agravar e encaminhá-los para o único tratamento (de fato) oferecido pelo SUS: a cirurgia bariátrica. Ainda assim, para alguns milhões de obesos mórbidos no Brasil (o dado não é preciso), o SUS realiza alguns milhares de cirurgias bariátricas por ano, com longas listas de espera.
Para frear o crescimento da obesidade no Brasil, é essencial o desenvolvimento de novas estratégias de prevenção, que envolvam educação nutricional em escolas, forte capacitação médica e paramédica em UBSs, e para cuidar dos milhões de brasileiros acometidos pela doença mais prevalente em nossa população, precisamos de disponibilidade de tratamento clínico nos AMAs pelos endocrinologistas, e aumento dos serviços de cirurgia.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.