A proatividade de governadores e políticas ambientais nos Estados devem ajudar o Brasil na 26.º Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021 (COP-26), em Glasgow, que começa no próximo dia 31. Essa é a expectativa do engenheiro florestal Virgílio Viana, nomeado em setembro, pelo papa Francisco, para a Pontifícia Academia das Ciências Sociais – o primeiro brasileiro no colegiado.
Quais motivos levaram à sua escolha para uma cadeira na Pontifícia Academia das Ciências Sociais? De que forma vai auxiliar?
Acredito que um dos fatores foi, de um lado, a minha experiência e atividade acadêmica: tenho PHD (em Biologia Evolutiva) em Harvard (University), e fui professor da USP (na Escola Superior de Agricultura) por muitos anos. De outro, minha vivência como gestor público. Fui secretário de Meio Ambiente do Amazonas (2002-2008) e agora estou como superintendente-geral de uma organização da sociedade civil, a Fundação Amazônia Sustentável. Esse conjunto de experiências me coloca numa posição privilegiada de contribuir para a agenda. Além dos desafios relacionados a encontrar soluções para os grandes temas da humanidade, que fazem parte do universo de preocupações e atuação do papa Francisco. A academia funciona como uma unidade que alimenta o papa e a Santa Sé através da análise científica dos grandes temas. Vale lembrar que esse papa, em particular, tem um olhar muito além do catolicismo. Ele se preocupa com temas que afetam todas as matizes religiosas, todos os povos. Ao longo do seu papado, ele se posiciona como uma pessoa com voz escutada por todos, independentemente da preferência religiosa. Uma das coisas importantes é que a Academia de Ciências Sociais está sendo fortalecida com o objetivo de dar solidez aos posicionamentos do papa. Um dos exemplos é a encíclica, que foi feita pelo papado em 2015, um texto irretocável do ponto de vista científico, que fala sobre os futuros da humanidade, do planeta, etc. Como membro da academia, vou participar de estudos e seminários sobre temas relacionados ao futuro.
O olhar internacional para a Amazônia se fortalece?
O tema deixou de ser uma coisa restrita a ambientalistas e cientistas. Agora está nos conselhos das grandes empresas, dos grandes fundos de investimentos, da população em geral. Portanto, passou a fazer parte da agenda política dos governos. O mundo está numa mudança radical. Todas as empresas estão sendo instadas e provocadas a terem suas estratégias ESG (sigla em inglês para as atuações nas áreas ambiental, social e de governança). É uma mudança profunda. Deixou de ser uma coisa periférica, de estratégia empresarial, para ser de grande importância.
O Brasil pode sair com um saldo positivo da COP 26? Como? Quais as expectativas para a reunião?
O Brasil pode, sim, sair com saldo positivo. Em especial, diante do posicionamento dos governadores, que têm sido proativos e ambiciosos nas suas políticas estaduais, e do interesse da cooperação internacional em apoiar governos subnacionais. Por outro lado, o apoio das lideranças empresariais brasileiras, lideranças da sociedade civil e da academia, manifestando que o Brasil é maior do que apenas a posição do governo federal. Esses outros setores podem contribuir para o que o Brasil volte com saldo positivo da COP-26. Acredito que vamos ter avanços importantes não apenas na esfera das negociações intergovernamentais, mas também no campo empresarial, da sociedade civil e das universidades.
As empresas brasileiras estão preparadas para abrir mão de lucros e pensar agora na Amazônia?
É um processo em curso. Tem algumas empresas que são mais avançadas que outras. A grande maioria já acordou para isso. Você participa de eventos empresariais, como o Fórum de Davos, na Suíça, e o discurso e todo o posicionamento são muito fortes sobre o tema das mudanças climáticas. O assunto deixou de ser restrito ao Ministério do Meio Ambiente, também interessa ao Ministério da Economia.
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