A casa do futuro próximo

Arquitetos discutem o desenho dos ambientes na era pós-pandemia

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Por Marcelo Lima
Atualização:
Separado por divisória de vidro, home office passa a integrar o quarto, na proposta de Fernanda Marques Foto: Fernanda Marques Arquitetos

De repente, nos vemos utilizando nossas casas como escritório, sala de aula, espaço de reunião e até academia de ginástica. Alguns, proprietários de um quarto vago, gozam de um pouco mais de privacidade, enquanto outros, ainda na mesa da sala de jantar ou da cozinha, tentam transpor a linha tênue que separa hoje o mundo do trabalho do espaço doméstico. Como sabemos, a vida não será a mesma após o surto da covid-19. E isso passa, invariavelmente, pelo desenho de nossas casas. Por certo, vamos procurar minimizar nossa dependência do mundo externo, estaremos mais zelosos quanto à higiene, mais criteriosos em relação ao que entra nos nossos lares – das visitas aos alimentos. Mas nem tudo será só restrição. Há boas novas no horizonte.  “Os dias passados em quarentena nos deixaram mais atentos a nossas necessidades, a espaços subutilizados, a pequenas melhorias há muito adiadas. E claro que tudo isso vai impactar o projeto da casa no futuro próximo”, afirma a arquiteta Fernanda Marques (fernandamarques.com.br), uma das profissionais convidadas pelo Estado, ao lado dos também arquitetos Consuelo Jorge (consuelojorge.com.br) e Otto Felix (ottofelix.com.br), para imaginar a casa da era pós-pandemia.  “Para a sala, aposto em vegetação. Não em um vaso aqui e ali, mas em grandes paredes vivas. Além da interação com as plantas ser super benéfica para nosso equilíbrio, elas formam um cenário interessante para chamadas de vídeo, que prometem ser cada vez mais frequentes”, observa Consuelo.  Reunidas em um único espaço, sala de estar, área de refeições e varanda podem, segundo ela, estimular a convivência familiar e ainda ampliar as possibilidades de trabalho remoto. Nesse sentido, optar por móveis mais versáteis será fundamental. Um sofá modular, no centro do ambiente, pode permitir que alguém trabalhe de um lado, enquanto outro assiste TV. Assim como uma poltrona de leitura, equipada com uma mesinha móvel. Sem falar da tela de TV, que pode ser compartilhada com o computador. “Já que trabalhar em casa se tornou uma realidade, precisamos repensar a casa para que isso aconteça da forma mais confortável possível”, diz. Adepta incondicional das plantas abertas – sem divisórias ou paredes internas –, Fernanda Marques também vê com bons olhos a ideia de integrar ambientes, embora admita que, por razões de privacidade ou de desempenho profissional, fechar algumas portas, atualmente, pode ser altamente recomendável. Sobretudo quando o espaço for reduzido e houver mais pessoas trabalhando ou estudando ao mesmo tempo. “Desde que se torne permanente, o trabalho realizado em casa, para se revelar produtivo, deve contar com um home office propriamente equipado, bem iluminado e isolado em termos acústicos. Não basta providenciar uma mesa, uma cadeira e uma luminária”, considera a arquiteta, que sugere divisórias de vidro, com mais ou menos transparência, como uma solução viável para quem busca privacidade, ainda que partilhando o espaço da sala, ou mesmo de um quarto.

Logo na entrada da cozinha, apartamento recebe sapateira no projeto de Otto Felix Foto: Estudio Otto Felix

Sapatos na entrada. De acordo com ela, o antigo hall, quase aposentado por desuso, mas ainda presente em muitos imóveis, subitamente passou a desempenhar papel de destaque na geografia da nova casa. Dessa vez, para cumprir a nobre função de proteger a casa da invasão de sapatos, roupas e demais itens ameaçadores da segurança doméstica. “Acredito que, tal como acontece no Oriente, reservar um espaço, que seja um armário ou uma prateleira, para deixar os sapatos antes de entrar será obrigatório. Nos meus projetos, já recomendo utilizar luz ultravioleta (que são bactericidas) nestes locais”, argumenta o arquiteto Otto Felix, que se declara particularmente interessado em desvendar o funcionamento das áreas mais funcionais e dinâmicas da casa. “Temos hoje a oportunidade de repensar a função de cada espaço doméstico. Uma cozinha que funcione também para lavar, guardar, plantar e até compostar está prestes a nascer. Espero que as incorporadoras entendam essas demandas e possam agir rápido”, considera ele. Em seu formato ideal, a cozinha do arquiteto prevê armários para armazenar mantimentos por pelo menos uma semana, uma pequena horta que pode ser instalada até em cima da pia, além de uma torneira equipada com gás ozônio, já no mercado, que elimina agrotóxicos dos alimentos. Já para a lavanderia, além da máquina de lavar e do tanque, Otto recomenda a instalação de um varal embutido. Se possível, também equipado com raios ultravioleta. Além disso, segundo Felix, visando otimizar o espaço doméstico, devem crescer em importância áreas aparentemente esquecidas, tais como cantos e corredores, que passarão a ser vistas como potenciais locais de armazenamento. “A partir de agora, todos os espaços devem ser considerados. Da maneira mais racional e inteligente possível.”

Integrada a sala de jantar e à varanda, áreade estar recebe móveis adaptados tanto ao lazer como ao trabalho. Projeto Consuelo Jorge Foto: Consuelo Joge Arquitetos
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