Marcas de cosméticos reinventam embalagens para driblar lixo plástico

Empresas de beleza miram uso de papelão prensado, vidro e plástico sem cores para diminuir lixo e impacto ambiental, de olho em problemas mundiais e clientela exigente

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Por Redação
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Especial para o Estado

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O Brasil é o quarto maior produtor de lixo plástico do mundo e, entre os grandes produtores do resíduo, é o que menos recicla, de acordo com estudo do Fundo Mundial para a Natureza (WWF, na sigla em inglês). Contraditoriamente, o País está entre as seis nações cujos consumidores mais demandam sustentabilidade das empresas, de acordo com dados da Nielsen, que mede comportamento de consumo e mercado.

Neste cenário, as marcas estão reinventando o modo de entregar seu produto ao consumidor e resultados interessantes estão surgindo na indústria cosmética. A gigante L’Oréal, por exemplo, lançou em 2018 a Seeds Phytonutrients, a primeira linha para corpo e cabelos em que os produtos (mesmo os líquidos) são envasados em embalagens de papelão prensado. Apesar de não dispensar 100% o uso do plástico, a marca abriu caminhos para inspirar inclusive pequenas empresas.

Por aqui, a marca de maquiagem vegana (sem produtos de origem animal) Organela seguiu o mesmo caminho e lançou batons, bases e blushes em embalagens de papelão. A primeira tentativa não performou tão bem no dia a dia das consumidoras e a marca teve de recorrer ao plástico para embalar os cosméticos orgânicos certificados pela Ecocert. Mas para 2020 já fecharam negócio com um novo fornecedor de embalagens de papelão.

Simple Organic, pequena empresa de cosméticos criada no Brasil, se preocupa com o descarte das embalagens Foto: Felipe Rau/Estadão

“Tivemos um problema sério com a antiga embalagem de papelão. Muitas pessoas reclamaram da fragilidade dela, que amassava ou que perdia a qualidade quando molhava”, conta Fernanda Santa Cruz, proprietária da marca de Joinville (SC), que vende de forma online para todo o País.

“Agora, encontrei um novo fornecedor, a Milano, que tem qualidade superior. Eles ficaram dois anos estudando e fazendo testes para desenvolver esse tipo de embalagem de papelão”, diz a empreendedora, que no fim do ano já estava com a arte pronta para a gráfica. “Não sei se todos os produtos vão dar certo no papelão. Vamos analisar. Não adianta ter um produto lindo e ecológico, mas que não funciona no dia a dia.”

O problema do lixo plástico é tamanho que hoje ele representa 75% do lixo marinho, cita Larissa Kuroki, coordenadora de conteúdos e metodologias do Instituto Akatu, ONG que trabalha pela conscientização e mobilização da sociedade para o consumo consciente.

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“Em relação à geração de resíduos plásticos pelo setor industrial, a indústria de embalagens é a que mais contribui. Foram 141 milhões de toneladas em 2015, ou 54% do setor”, aponta ela, citando artigo científico da revista Science.

Segundo Kuroki, as empresas estão investindo em alternativas diversas, que vão de redução de embalagens, pesquisa e desenvolvimento de novos materiais, incorporação de material reciclado, embalagens refiláveis, até implementação de sistemas de logística reversa. Entre modelos interessantes para uso na indústria, ela cita produtos em refil, utilização de PET reciclado, plástico verde (feito da cana-de-açúcar) e banimento do PVC.

Vidro e plástico sem cores

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De olho em alternativas, a também catarinense Simple Organic foi criada há dois anos com foco em embalagens que tragam baixo impacto ambiental. A marca usa recipientes de vidro, não utiliza multicamada de plástico nem embalagens com plástico em diversas cores, já que isso dificulta ou impossibilita a reciclagem, comenta a fundadora Patricia Lima.

Além disso, os produtos levam embalagens brancas ou pretas com rótulo para ser retirado e possível de ser reciclado. A marca, que conta com 22 endereços pelo País (o investimento médio para franquia de loja é de R$ 145 mil), mantém fábrica em Palhoça (SC).

Patricia Lima, fundadora da Simple Organic. Marca usa recipientes de vidro, não utiliza multicamada de plástico nem embalagens com plástico em diversas cores, já que isso dificulta ou impossibilita a reciclagem Foto: João Paulo Santos

Para 2020, a Simple Organic planeja uma linha de hidratantes corporais em embalagem de plástico com um ativo que reduz em 95% o tempo de decomposição.

“Tivemos conquistas muito importantes. Recentemente, recebemos o certificado do Instituto Lixo Zero, que é reconhecido pelo Zero Waste International Alliance”, conta Patricia. “Eles certificam empresas que reduzem seu impacto e gerenciam bem o resíduo sólido. O nosso desenvolvimento de embalagem é sempre pensado no menor impacto ambiental.”

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A marca britânica The Body Shop - que tem plano de expansão no Brasil com foco em franquias (investimento em loja em torno de R$ 350 mil) - encontrou outra alternativa. Como explica Karina Meyer, diretora de marketing da empresa na América Latina, há no mundo uma fonte abundante de plástico reciclável. “E é por isso que a marca iniciou a parceria com a Plastic for Change para reutilizar o plástico reciclado que vem de Bengaluru, na Índia.”

Para ela, essa iniciativa não é apenas uma forma de combater a crise global do plástico, “mas também de ajudar 2.500 catadores de lixo em Bengaluru com uma renda estável e preços justos”. Karina ainda conta que, em 2022, a marca pretende chegar a 75% PCR (pós-consumo reciclado) de plástico em todas as linhas de produto. “Trata-se de um grande salto a partir dos nossos atuais 10% PCR de plástico”, diz ela.

Apesar da iniciativa das marcas, o consumidor também deve se atentar aos seus hábitos, acrescenta Larissa, do Instituto Akatu. “Precisamos consumir de modo mais consciente para minimizar nossos impactos no ambiente, na economia, na sociedade e em nossas próprias vidas. O consumo consciente não significa deixar de consumir, mas fazê-lo de maneira diferente.”

Cuidado com o greenwashing

Usado desde a década de 1990, o termo designa a prática de fazer afirmações infundadas sobre sustentabilidade. Segundo o Greenpeace, é o “ato de enganar consumidores em relação às práticas ambientais de uma companhia ou em relação aos benefícios ambientais de um determinado produto ou serviço”.

Loja Simple Organic, em São Paulo. Foto: Felipe Rau/Estadão

Veja dicas sobre o que fazer para se certificar de que uma empresa não está praticando greenwashing:

  • No site da marca, procure links institucionais “sobre nós” e “o que fazemos”, além do relatório de atividades. Se a informação que você procura não estiver disponível, não hesite em mandar um e-mail ou ligar para a empresa pedindo esclarecimento
  • Procure por certificações nos rótulos dos produtos, pois elas garantem que ele tenha sido produzido conforme a empresa comunica. O selo I’m green, por exemplo, desenvolvido pela Braskem, identifica produtos que utilizam plástico verde em sua composição
  • Sempre que possível opte pela compra de pequenos produtores, de preferência produtores locais, pois isso permite que você tenha contato direto com os envolvidos na cadeia produtiva Fonte: Instituto Akatu

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