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Mercado regulado de carbono patina no Brasil

Regulamentação tramita a passos lentos no Congresso; tendência é de que mercado voluntário ganhe cada vez mais terreno nos próximos anos

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Por Estadão Blue Studio
Atualização:
3 min de leitura

A sessão do dia 21 de dezembro de 2023, no apagar das luzes do ano legislativo, chegou a ser comemorada por quem defende um sistema regulado de carbono no Brasil. O Projeto de Lei 2.148/2015 passou pela Câmara e absorveu a maior parte do PL 412/2022, que propõe a regulação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE) e define as bases para a criação do mercado regulado de carbono no Brasil. O texto está no Senado e, se for muito modificado, terá de voltar para ser apreciado pelos deputados federais. Uma visão otimista mira o fim do ano como uma data provável de uma eventual aprovação.

“O atraso na aprovação acaba gerando uma situação de insegurança para que o setor privado possa priorizar e investir ainda mais nesse mercado. Seja em priorizar projetos tecnológicos de processos produtivos para descarbonização ou projetos de créditos de carbono. Projetos como os de agricultura regenerativa chegam a demorar de 3 a 5 anos para gerar um volume considerável de créditos e exigem investimentos. Ter a certeza de que esses créditos serão válidos também num mercado regulado poderia aumentar a quantidade de projetos dessa natureza”, afirma Fernando Beltrame, mestre em compostagem pela USP, engenheiro pela Unicamp e CEO da Eccaplan.

Demora na regulamentação do mercado de carbono no Brasil preocupa Foto: Getty Images

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Caminhos para o mercado

A compra e a venda de créditos de carbono podem, grosso modo, seguir dois caminhos. O do mercado regulado e o do mercado voluntário. No caso do regulado, entidades como o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), que representa mais de 110 companhias com atuação no Brasil – cujo faturamento somado equivale a cerca de 50% do PIB nacional –, trabalham desde 2016 para que uma lei seja aprovada. Diversos trechos do PL foram construídos por especialistas envolvidos com a instituição seguindo a lógica de que a criação do mercado regulado de carbono é ainda mais importante neste momento em que o País tem a oportunidade de liderar a nova economia global, gerando empregos e renda com base em iniciativas verdes.

E é justamente por isso que a demora na regulamentação preocupa. Marina Grossi, presidente do Cebds, já declarou recentemente em eventos públicos que teme que o Brasil perca a janela de oportunidades que está aberta. Esse possível atraso pode gerar vários problemas como uma maior taxação para produtos brasileiros que queiram entrar na Comunidade Europeia.

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Uma saída, como defendem vários executivos da iniciativa privada, é acelerar o ambiente de net zero no Brasil por meio de outras trilhas. “É importante lembrar que outras motivações, além do legislativo, levam o setor privado a se mover rumo ao net zero. Como exigências de investidores, exigências de entidades que regulam o mercado mobiliário no caso das empresas de capital aberto, restrições nas importações, acordos setoriais, pressões da sociedade civil e mesmo consumidores mais conscientes e exigentes”, explica Beltrame. Não que a aprovação do sistema regulado de créditos de carbono não seria importante para acelerar toda a jornada, explica o executivo. “Mas esse movimento em direção a uma economia de baixo carbono e que atinja o net zero é um caminho de uma só direção”, esclarece Beltrame.

Mesmo com a aprovação até o fim do ano, o mercado regulado no Brasil demoraria uns cinco anos para estar maduro segundo estimativas de especialistas. Isso porque, como lembra Beltrame, o PL ainda vai precisar de desdobramentos e regulamentações posteriores, como os requisitos das metodologias dos próprios Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões, para funcionar de fato.

O fato de o mercado voluntário ter esse nome não significa que ele não siga regras, certificações e balizamentos rígidos. Por isso, apesar de os dois serem complementares, tudo indica que no Brasil esse modelo sem a intervenção estatal vai ganhar cada vez mais terreno nos próximos anos. Uma tendência nesse caso é que o mercado voluntário, inclusive, passe por um processo de fagocitose. Nos últimos anos, tanto o mercado suíço se juntou ao europeu quanto o do Canadá passou a fazer parte do mercado voluntário da Califórnia.

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Em termos globais, segundo um relatório da Shell e do Boston Consulting Group (BCG), o mercado voluntário de compensação de carbono, que valia cerca de US$ 2 bilhões em 2021, crescerá para US$ 10 bilhões a 40 bilhões até 2030.

Para entender

Como funciona a venda e compra de carbono

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Mercado regulado

São definidos por meio de lei, seja por entes nacionais, estaduais ou regionais. Os governos costumam determinar como vai funcionar o jogo e quais setores específicos poderão jogar. Após essa definição, são criados os limites de emissão que, por exemplo, o setor de combustíveis fósseis poderá atingir. Na prática, são criadas permissões que são compradas e vendidas de forma fechada, dentro de cada mercado.

Mercado voluntário

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As empresas que vão atrás de permissões para emitir estão fazendo isso de forma voluntária. Elas podem comprar os créditos de carbono, em tese, de outros países. A relação é apenas entre comprador e vendedor. Quem mais está correndo atrás disso são corporações que vêm sendo pressionadas, pela opinião pública, para colaborar com as mudanças climáticas globais.