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No campo, produção visa impactar menos

Plantio direto, fixação de nitrogênio e integração de sistemas ganham espaço no País

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Por Redação
5 min de leitura
Getty Imagens 

Oúltimo relatório consolidado do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (Seeg), iniciativa do Observatório do Clima, mostrou que em 2019 o setor da agropecuária foi responsável direta ou indiretamente por 72% das emissões no Brasil. Só esse dado já colocaria a atividade no topo das prioridades na agenda das mudanças climáticas, mas a importância estratégica do setor para a segurança alimentar no futuro, que se configura na necessidade  de ampliar a produção, acrescenta vários graus de dificuldade para a política de mitigação das emissões.

Estimativas do Banco Mundial dão conta de que a população mundial deve atingir a marca de 8,5 bilhões de pessoas até 2030, chegando a 10 bilhões em 2050. Os esforços das últimas décadas e nas vindouras são de atingir ganhos constantes de produtividade sem que isso exerça uma pressão extra sobre o uso da terra e dos recursos hídricos.

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Os dados disponíveis mostram que o trabalho vem sendo feito. O Seeg compilou e comparou números do IBGE e concluiu que a intensidade de carbono da produção agropecuária, ou seja, o volume de CO2 emitido por quantidade de alimento produzido, vem caindo. Na agricultura, a produção de grãos mais que dobrou (120%) entre 2005 e 2018, enquanto as emissões aumentaram menos de 60%. A produção de carne pela pecuária de corte no mesmo período cresceu 25%, ao passo que a emissão aumentou ao redor de 5%.

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) tem cumprido um papel estratégico nesse processo de transformação. Boa parte dos trabalhos da empresa, que é referência mundial do setor, se concentra no desenvolvimento de tecnologias sustentáveis como o plantio direto, a fixação de nitrogênio, a integração lavoura-pecuária-floresta, a recuperação de pastagens e o manejo de dejetos animais.

De acordo com Celso Moretti, presidente da Embrapa, uma das tecnologias de destaque é o plantio direto ou “na palha”, que já abrange mais de 50 milhões de hectares no Brasil. “Basicamente, você vai colhendo uma cultura e semeando a próxima em cima da palha. É uma enorme contribuição porque revolve menos o solo, que é grande armazenador de carbono em seus poros. Quando não revolve o solo, mantém o carbono”, explica.

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Outro desenvolvimento importante é o da fixação de nitrogênio, hoje utilizada em 36 milhões de hectares no Brasil. “Desenvolvemos bactérias que conseguem pegar o nitrogênio na atmosfera. Outras culturas compram o adubo nitrogenado, cuja produção é de fonte fóssil”, diz o presidente da Embrapa. Segundo ele, apenas no complexo soja, já foi economizado o equivalente a R$ 28 bilhões só pela substituição de adubos nitrogenados.

A integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), por sua vez, é uma forma de compensar um dos maiores causadores de geração de gases do efeito estufa, que é o metano liberado pelo rebanho bovino, o chamado arroto de boi, fruto da digestão dos animais. Numa mesma área, após colheita da soja, por exemplo, o produtor entra com a pastagem, acrescida do plantio de árvores. “O metano dos animais é capturado pelo componente florestal. Para cada animal num hectare, precisa de 20 árvores para neutralizar o metano que ele produziu”, compara Moretti.

Plano ABC

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Essas tecnologias são a base do Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas (Plano ABC), uma política decenal que está passando neste ano por revisão e atualização. Rodrigo Lima, diretor-geral da consultoria Agroicone, lembra que o plano reuniu no início da última década toda a tecnologia que podia ser mensurada e o que era possível de ser alcançado no futuro. “Hoje, o compromisso é mais amplo, de redução de carbono. Como produzir mais e melhor, manejando florestas, adaptando sistemas produtivos”, detalha.

Em abril, ao lançar as bases para o próximo decênio (Plano ABC+), os dados apresentados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) mostraram que nos últimos 10 anos as práticas agrícolas com baixa emissão de carbono passaram a ser adotadas em 52 milhões de hectares no País, o que corresponde a 1,5 vez o tamanho da Alemanha. Segundo Lima, isso equivale a uma meta de carbono de 170 milhões de toneladas de CO2 equivalente, 115% maior que o previsto.

O diretor da Agroicone afirma que a perseguição desses objetivos de sustentabilidade é importante, mas a análise precisa ser mais ampla. “Gosto de pensar nas metas não como uma obrigação, mas como uma oportunidade de desenvolver a agricultura”, afirma. Assim, ele acredita que o ABC+ precisa expandir o rol de tecnologias contempladas, com maior uso de energias renováveis, especialmente de bioenergia, como as obtidas com bagaço de laranja ou biometano de cana, por exemplo.

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Uma das discussões inadiáveis, segundo Lima, é a inclusão dos pequenos produtores no programa. “Eles não têm a tecnologia, não têm assistência e não têm acesso aos financiamentos”, lista. A dificuldade do acesso ao crédito e à assistência técnica para realizar os projetos sustentáveis é um ponto essencial para ser ajustado no ABC+, defende o diretor da Agroicone.

Leite e soja

Segundo Celso Moretti, presidente da Embrapa, o selo de carbono neutro vai chegar a outros produtos. “Além da carne carbono neutro, estamos desenvolvendo desde o ano passado a primeira produção de leite de baixo carbono no Brasil”, informa. As empresas trabalham no momento em formatar indicadores de sustentabilidade com aceitação internacional. “Esse leite de baixo carbono em breve deverá estar nas gôndolas dos supermercados”, prevê.

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A unidade Embrapa Soja lançou no início de abril as bases do Programa Soja Baixo Carbono, que busca a diminuição nessa cultura dos gases do efeito estufa na atmosfera. Para Moretti, chegar ao complexo soja para desenvolver uma certificação foi algo natural. “A ideia é pensar a soja brasileira como um sistema, com plantio direto, fixação de nitrogênio e integração lavoura-pecuária-floresta. É certeza que, com isso, teremos emissões menores que competidores como os Estados Unidos e a Argentina”, afirma.  Segundo ele, é questão de tempo até que o selo de carbono neutro chegue também a outras culturas, como o café e o arroz.

Selo de carbono neutro

Desde o ano passado, as gôndolas de algumas unidades da rede Pão de Açúcar oferecem cortes de uma linha de carnes desenvolvida por um frigorífico privado em parceria com a Embrapa, com atributos de sustentabilidade baseados na pegada neutra de carbono. A produtora de carnes investiu R$ 10 milhões no projeto, que consumiu 10 anos de pesquisas. Segundo a empresa de tecnologia agrária, essa carne traz a certificação de carbono neutro (CCN) feita por auditoria independente, indicando que o gado foi criado em sistemas de integração do tipo silvipastoril (pecuária-floresta) ou agrossilvipastoril (lavoura-pecuária-floresta). O projeto tem a participação de 12 centros de pesquisa da Embrapa e envolve uma rede de mais de 150 pesquisadores, além de outras instituições.

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