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Ainda as bugigangas

Tributar plataformas estrangeiras é questão de isonomia, mas interesses eleitoreiros se impõem

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Por Notas & Informações
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O governo Lula da Silva tem tido uma atitude absolutamente incongruente no imbróglio sobre a taxação de compras internacionais de até US$ 50. Nada, além do mero populismo eleitoreiro, explica tanta hesitação em voltar a aplicar o Imposto de Importação sobre produtos adquiridos em plataformas estrangeiras. Não se trata de protecionismo. Tributar esses sites é tratar as empresas nacionais com um mínimo de isonomia.

De um lado, a medida pode preservar empregos e impulsionar a produção local, as vendas e a economia. De outro, a taxação tem tudo a ver com a agenda da equipe econômica, que conta com a ampliação da base de arrecadação como principal arma para reequilibrar as contas públicas.

Se é hora de cobrar quem não paga imposto, como diz o ministro Fernando Haddad, nada mais justo começar por quem inunda o País com bugigangas vendidas por valores que, tudo indica, não cobrem nem o custo de produção nem o gasto com o transporte até o Brasil.

É preciso desinterditar esse debate com fatos, não crenças. A isenção de Imposto de Importação para produtos de até US$ 50 é uma regra antiga e que só valia para transações entre pessoas físicas. Não há, nem nunca houve, isenção para o comércio eletrônico.

O que havia era fraude: empresas se passavam por pessoas físicas para se beneficiar dessa brecha, omitiam o valor dos itens comercializados para se enquadrar na cota e fracionavam as remessas para driblar o sistema e se utilizar de uma isenção que nunca lhes coube.

Ao criar o programa Remessa Conforme no ano passado, a intenção da equipe econômica era aplicar o imposto sobre as empresas, que, evidentemente, repassariam o custo ao consumidor. Era esperado que a oposição fizesse barulho com a medida. Por outro lado, era uma agenda que unia setores que muitas vezes estão em flancos opostos, como a indústria e o comércio.

De maneira inacreditável, Lula da Silva se rendeu ao barulho das redes sociais – como se elas representassem o verdadeiro espaço público dos tempos atuais e não uma arena dominada por robôs e vândalos virtuais. Mas o pior é que o presidente ignorou seus técnicos e cedeu ao discurso de palpiteiros, entre os quais a primeira-dama Rosângela Lula da Silva, para quem os mais pobres são os principais clientes das plataformas internacionais.

Não adiantou nada. Mesmo sem ter aplicado o Imposto de Importação, como já deveria ter feito no ano passado, é Lula da Silva quem paga o pato pelo fato de os governadores terem aumentado o ICMS cobrado sobre as compras feitas por meio desses sites. E, ainda assim, a tributação dessas plataformas continua a ser muito menor do que aquela que incide sobre a indústria e o comércio locais.

Taxar essas plataformas é medida tão óbvia que conta até com o apoio de quem resiste à elevação de impostos, como o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Passou da hora de o governo tratar esse tema com a seriedade que ele requer. Que o Congresso tenha a coragem de aprovar a retomada da taxação, e que Lula da Silva tenha a coragem de não vetá-la.