Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

O baixinho do bar


'Sem o Baixinho, aquele espaço era só um bar. E ninguém se interessa por um bar sem alma'

Por Gilberto Amendola

Senti um frio na barriga ao entrar no bar. Depois de tanto tempo, eu estava regressando ao balcão das mil e uma noites. Ainda sem saber direito como agir, tirei minha máscara e perguntei: e o Baixinho? 

O garçom era uma instituição daquele lugar, uma lenda que nos foi arrancada pela maldita pandemia.

Sem o Baixinho, aquele espaço era só um bar. E ninguém se interessa por um bar sem alma. Nós, os clientes, estávamos órfãos daquela figura radiante, piadista, malandra e pouco recatada. O Baixinho era o nosso terapeuta não licenciado. Com suas sabias palavras e conselhos, como “vai ser ferrar, maninho” (o “ferrar” entra aqui para substituir uma palavra muito mais eloquente), ele salvou muitos casamentos, empregos e vidas. 

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Ele era a nossa Sherazade, o nosso Buda, o nosso Shiva, o nosso Noam Chomsky do salaminho temperado. 

Com minha long neck nas mãos e máscara pendurada em uma orelha, me toquei que quase nada sabia da vida do Baixinho. Ele era o “Baixinho do Bar”, alguém que eu deixava uma caixinha melhor nos finais de ano e azucrinava quando o time dele perdia. 

O Baixinho era aquele alívio cômico no fim do dia. Alguém que sempre sacava uma pérola inesperada para amenizar nossas cabeçadas e frustrações. O Baixinho era aquele que a gente achou que sempre estaria aqui – como parte do elenco de apoio de uma comédia de bêbados e falastrões.

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Imagem ilustrativa de funcionário de bar Foto: Pixabay/@Life-Of-Pix

Nunca soube onde o Baixinho morava, se tinha filhos ou se guardava algum sonho de infância. Nunca percebi se ele, alguma vez, ficou magoado com alguma brincadeira mais pesada. Deve ter ficado. 

O nome do “Baixinho”? Bom, nunca ninguém viu o RG, mas é consenso no bar que ele se chamava Altair. Mas pode não ser. Neste bar, somos um bando de egoístas saudosos do bem-estar e do entretenimento que o Baixinho nos proporcionava. Puxei um brinde para o nosso amigo pouco conhecido, nosso amigo quase imaginário.

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Deixei todo mundo triste com a constatação da nossa superficialidade. Terminei minha long neck, empurrei umas notas no balcão e fui embora. 

No caminho, pensei em todos os “baixinhos” que a pandemia levou. O zelador gente fina do meu prédio; o dono da banca que guardava meu jornal de domingo; o barbeiro que nunca acertou meu corte de cabelo...

Todos eles fazem falta. E eu nunca conheci de verdade nenhum deles. Sou incapaz de lembrar um nome. Essa pandemia ainda precisa servir pra mudar certas coisas na gente...

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*Gilberto Amendola É repórter do Estadão e observador da vida urbana

Senti um frio na barriga ao entrar no bar. Depois de tanto tempo, eu estava regressando ao balcão das mil e uma noites. Ainda sem saber direito como agir, tirei minha máscara e perguntei: e o Baixinho? 

O garçom era uma instituição daquele lugar, uma lenda que nos foi arrancada pela maldita pandemia.

Sem o Baixinho, aquele espaço era só um bar. E ninguém se interessa por um bar sem alma. Nós, os clientes, estávamos órfãos daquela figura radiante, piadista, malandra e pouco recatada. O Baixinho era o nosso terapeuta não licenciado. Com suas sabias palavras e conselhos, como “vai ser ferrar, maninho” (o “ferrar” entra aqui para substituir uma palavra muito mais eloquente), ele salvou muitos casamentos, empregos e vidas. 

Ele era a nossa Sherazade, o nosso Buda, o nosso Shiva, o nosso Noam Chomsky do salaminho temperado. 

Com minha long neck nas mãos e máscara pendurada em uma orelha, me toquei que quase nada sabia da vida do Baixinho. Ele era o “Baixinho do Bar”, alguém que eu deixava uma caixinha melhor nos finais de ano e azucrinava quando o time dele perdia. 

O Baixinho era aquele alívio cômico no fim do dia. Alguém que sempre sacava uma pérola inesperada para amenizar nossas cabeçadas e frustrações. O Baixinho era aquele que a gente achou que sempre estaria aqui – como parte do elenco de apoio de uma comédia de bêbados e falastrões.

Imagem ilustrativa de funcionário de bar Foto: Pixabay/@Life-Of-Pix

Nunca soube onde o Baixinho morava, se tinha filhos ou se guardava algum sonho de infância. Nunca percebi se ele, alguma vez, ficou magoado com alguma brincadeira mais pesada. Deve ter ficado. 

O nome do “Baixinho”? Bom, nunca ninguém viu o RG, mas é consenso no bar que ele se chamava Altair. Mas pode não ser. Neste bar, somos um bando de egoístas saudosos do bem-estar e do entretenimento que o Baixinho nos proporcionava. Puxei um brinde para o nosso amigo pouco conhecido, nosso amigo quase imaginário.

Deixei todo mundo triste com a constatação da nossa superficialidade. Terminei minha long neck, empurrei umas notas no balcão e fui embora. 

No caminho, pensei em todos os “baixinhos” que a pandemia levou. O zelador gente fina do meu prédio; o dono da banca que guardava meu jornal de domingo; o barbeiro que nunca acertou meu corte de cabelo...

Todos eles fazem falta. E eu nunca conheci de verdade nenhum deles. Sou incapaz de lembrar um nome. Essa pandemia ainda precisa servir pra mudar certas coisas na gente...

*Gilberto Amendola É repórter do Estadão e observador da vida urbana

Senti um frio na barriga ao entrar no bar. Depois de tanto tempo, eu estava regressando ao balcão das mil e uma noites. Ainda sem saber direito como agir, tirei minha máscara e perguntei: e o Baixinho? 

O garçom era uma instituição daquele lugar, uma lenda que nos foi arrancada pela maldita pandemia.

Sem o Baixinho, aquele espaço era só um bar. E ninguém se interessa por um bar sem alma. Nós, os clientes, estávamos órfãos daquela figura radiante, piadista, malandra e pouco recatada. O Baixinho era o nosso terapeuta não licenciado. Com suas sabias palavras e conselhos, como “vai ser ferrar, maninho” (o “ferrar” entra aqui para substituir uma palavra muito mais eloquente), ele salvou muitos casamentos, empregos e vidas. 

Ele era a nossa Sherazade, o nosso Buda, o nosso Shiva, o nosso Noam Chomsky do salaminho temperado. 

Com minha long neck nas mãos e máscara pendurada em uma orelha, me toquei que quase nada sabia da vida do Baixinho. Ele era o “Baixinho do Bar”, alguém que eu deixava uma caixinha melhor nos finais de ano e azucrinava quando o time dele perdia. 

O Baixinho era aquele alívio cômico no fim do dia. Alguém que sempre sacava uma pérola inesperada para amenizar nossas cabeçadas e frustrações. O Baixinho era aquele que a gente achou que sempre estaria aqui – como parte do elenco de apoio de uma comédia de bêbados e falastrões.

Imagem ilustrativa de funcionário de bar Foto: Pixabay/@Life-Of-Pix

Nunca soube onde o Baixinho morava, se tinha filhos ou se guardava algum sonho de infância. Nunca percebi se ele, alguma vez, ficou magoado com alguma brincadeira mais pesada. Deve ter ficado. 

O nome do “Baixinho”? Bom, nunca ninguém viu o RG, mas é consenso no bar que ele se chamava Altair. Mas pode não ser. Neste bar, somos um bando de egoístas saudosos do bem-estar e do entretenimento que o Baixinho nos proporcionava. Puxei um brinde para o nosso amigo pouco conhecido, nosso amigo quase imaginário.

Deixei todo mundo triste com a constatação da nossa superficialidade. Terminei minha long neck, empurrei umas notas no balcão e fui embora. 

No caminho, pensei em todos os “baixinhos” que a pandemia levou. O zelador gente fina do meu prédio; o dono da banca que guardava meu jornal de domingo; o barbeiro que nunca acertou meu corte de cabelo...

Todos eles fazem falta. E eu nunca conheci de verdade nenhum deles. Sou incapaz de lembrar um nome. Essa pandemia ainda precisa servir pra mudar certas coisas na gente...

*Gilberto Amendola É repórter do Estadão e observador da vida urbana

Senti um frio na barriga ao entrar no bar. Depois de tanto tempo, eu estava regressando ao balcão das mil e uma noites. Ainda sem saber direito como agir, tirei minha máscara e perguntei: e o Baixinho? 

O garçom era uma instituição daquele lugar, uma lenda que nos foi arrancada pela maldita pandemia.

Sem o Baixinho, aquele espaço era só um bar. E ninguém se interessa por um bar sem alma. Nós, os clientes, estávamos órfãos daquela figura radiante, piadista, malandra e pouco recatada. O Baixinho era o nosso terapeuta não licenciado. Com suas sabias palavras e conselhos, como “vai ser ferrar, maninho” (o “ferrar” entra aqui para substituir uma palavra muito mais eloquente), ele salvou muitos casamentos, empregos e vidas. 

Ele era a nossa Sherazade, o nosso Buda, o nosso Shiva, o nosso Noam Chomsky do salaminho temperado. 

Com minha long neck nas mãos e máscara pendurada em uma orelha, me toquei que quase nada sabia da vida do Baixinho. Ele era o “Baixinho do Bar”, alguém que eu deixava uma caixinha melhor nos finais de ano e azucrinava quando o time dele perdia. 

O Baixinho era aquele alívio cômico no fim do dia. Alguém que sempre sacava uma pérola inesperada para amenizar nossas cabeçadas e frustrações. O Baixinho era aquele que a gente achou que sempre estaria aqui – como parte do elenco de apoio de uma comédia de bêbados e falastrões.

Imagem ilustrativa de funcionário de bar Foto: Pixabay/@Life-Of-Pix

Nunca soube onde o Baixinho morava, se tinha filhos ou se guardava algum sonho de infância. Nunca percebi se ele, alguma vez, ficou magoado com alguma brincadeira mais pesada. Deve ter ficado. 

O nome do “Baixinho”? Bom, nunca ninguém viu o RG, mas é consenso no bar que ele se chamava Altair. Mas pode não ser. Neste bar, somos um bando de egoístas saudosos do bem-estar e do entretenimento que o Baixinho nos proporcionava. Puxei um brinde para o nosso amigo pouco conhecido, nosso amigo quase imaginário.

Deixei todo mundo triste com a constatação da nossa superficialidade. Terminei minha long neck, empurrei umas notas no balcão e fui embora. 

No caminho, pensei em todos os “baixinhos” que a pandemia levou. O zelador gente fina do meu prédio; o dono da banca que guardava meu jornal de domingo; o barbeiro que nunca acertou meu corte de cabelo...

Todos eles fazem falta. E eu nunca conheci de verdade nenhum deles. Sou incapaz de lembrar um nome. Essa pandemia ainda precisa servir pra mudar certas coisas na gente...

*Gilberto Amendola É repórter do Estadão e observador da vida urbana

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