'Minha história vem de uma luta árdua da região'


Educação. Neto dos primeiros moradores a brigar por uma USP na zona leste, aluno conclui graduação com pesquisa sobre bairro

Por Ocimara Balmant

Nos últimos quatro anos, Caio Martins, de 22 anos, saiu de casa todas as manhãs e caminhou por dez minutos até a Universidade de São Paulo (USP). No caminho não estavam os casarões que rodeiam a Cidade Universitária, no Butantã, mas as ruelas de Ermelino Matarazzo, bairro periférico que abriga o câmpus da zona leste da instituição e onde o jovem vive desde que nasceu. Graduado há uma semana, Caio é um exemplar raro do projeto que motivou a criação da USP Leste: facilitar o acesso da comunidade local."Minha história é resultado de uma luta muito árdua da região. Muita gente brigou por décadas por esse câmpus", afirma. O discurso do recém-formado no curso de Gestão de Políticas Públicas vem embasado: seu trabalho de conclusão de curso foi exatamente sobre a participação popular e os movimentos sociais em Ermelino Matarazzo. Pela primeira vez naquele câmpus, a defesa aconteceu fora da USP. A apresentação foi em uma associação de bairro. Na plateia, amigos, líderes locais e, na hora em que o "dez" foi anunciado, dona Amélia Martins, de 79 anos, levantou chorando. O abraço no neto era também uma homenagem à região onde vive há mais de meio século. Amélia chegou por ali em 1945, vinda do interior do Estado, conheceu o marido na antiga fábrica dos Matarazzos, teve duas filhas e engajou a família na luta pelos sonhos da região. "No dia do lançamento da pedra fundamental da USP, chovia tanto que a lama chegava até o joelho", lembra Wania Martins da Silveira, mãe de Caio. "Tinha gente que pensava que não valia a pena tanto esforço, abaixo-assinado. Mas pensei nos meus filhos. Um já está lá, a outra vai em breve". Se a caçula Renata, de 15 anos, optar por um dos 12 cursos oferecidos na unidade e conseguir aprovação no vestibular, a família vai ajudar a engrossar a fatia ainda magra de estudantes da região matriculados ali. Na sala de Caio, por exemplo, dos 60 estudantes, somente 5 eram da zona leste. E nem precisa de estatística para medir essa disparidade, afirma ele. Basta observar os trens que chegam à estação USP Leste, acoplada ao câmpus. As locomotivas provenientes de bairros mais distantes da zona leste, como São Miguel Paulista e Cidade Tiradentes, chegam vazias. As que chegam da região central estão sempre lotadas.Dos vagões repletos, descem paulistanos de outras áreas da capital, mas principalmente gente nova na cidade e com o perfil parecido ao que se vê no câmpus Butantã. São egressos de escolas particulares do interior, que vêm para São Paulo mantidos pelos pais. A maioria mora em repúblicas localizadas no Tatuapé ou Anália Franco, bairros razoavelmente próximos à universidade, porém mais valorizados. São eles que fazem com que chegue a 30% o porcentual de moradores na zona leste."Eles chegam do interior direto para a periferia de São Paulo. Aqui, ele sai da aula e vai tomar cerveja nos botecos de Ermelino. Uma pena que, muitas vezes, a interação com o bairro termina aí", avalia o professor Wagner Iglecias, orientador de Caio. "Por isso, a importância e o simbolismo do trabalho dele".Anacronismo. A pouca articulação com as necessidades da região é antiga. Em 2003, dois anos antes da inauguração do câmpus, uma pesquisa da própria USP ouviu mais de 5 mil alunos de ensino médio para conhecer as suas preferências. No topo da lista estavam graduações tradicionais, como Engenharia, Medicina e Direito. Apesar disso, nenhuma delas entrou no rol da USP Leste - o estatuto da universidade proíbe que um curso seja oferecido em mais de uma unidade no mesmo município. Nasceu assim a Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), com um cardápio de dez cursos inéditos na universidade, como Lazer e Turismo e Ciências da Natureza.O curso de Gestão de Políticas Públicas, por exemplo, não era o preferido de Caio. Quando prestou vestibular, no fim de 2007, ele queria Jornalismo. Para ficar perto de casa e valorizar a luta da família pela implantação da USP Leste, abriu uma exceção. "Vi as disciplinas e me interessei pela ideia de trabalhar pelos interesses da comunidade."A escolha tem dado certo. Caio estagiou na subprefeitura de Ermelino Matarazzo e está esperançoso em ser aprovado em um concurso público ou conseguir uma vaga no terceiro setor. Mas ele é exceção. Na falta do curso de sua preferência, muita gente prefere manter a escolha inicial e trocar a possível vaga na USP por uma em uma das instituições privadas da região, com ajuda dos incentivos federais como o Prouni (Programa Universidade para Todos) e o Fies (que possibilita ao aluno financiar até 100% do curso e começar a pagar apenas depois da formatura).O melhor amigo de Caio, por exemplo, preferiu fazer Ciência da Computação em uma instituição particular e com bolsa do Prouni. Uma preferência perceptível até no cursinho gratuito criado pelos alunos da USP Leste para ajudar os estudantes da região a se prepararem para o vestibular. "Dei aulas de história e vi muita gente escolher uma universidade privada. Principalmente aqueles que já estavam no mercado de trabalho e não queriam trocar de área ou não tinham coragem de arriscar um curso pouco conhecido".Sonhos. Como futuro gestor público da região - Caio não pretende arredar o pé de Ermelino Matarazzo -, ele sonha com uma USP repleta de cursos atrativos e com os seus vizinhos na lista de matriculados.Só para garantir, a mãe e a avó estão empenhadas na chegada da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Se conseguirem e a implementação ocorrer em até três anos, Renata vai ter mais opções.

Nos últimos quatro anos, Caio Martins, de 22 anos, saiu de casa todas as manhãs e caminhou por dez minutos até a Universidade de São Paulo (USP). No caminho não estavam os casarões que rodeiam a Cidade Universitária, no Butantã, mas as ruelas de Ermelino Matarazzo, bairro periférico que abriga o câmpus da zona leste da instituição e onde o jovem vive desde que nasceu. Graduado há uma semana, Caio é um exemplar raro do projeto que motivou a criação da USP Leste: facilitar o acesso da comunidade local."Minha história é resultado de uma luta muito árdua da região. Muita gente brigou por décadas por esse câmpus", afirma. O discurso do recém-formado no curso de Gestão de Políticas Públicas vem embasado: seu trabalho de conclusão de curso foi exatamente sobre a participação popular e os movimentos sociais em Ermelino Matarazzo. Pela primeira vez naquele câmpus, a defesa aconteceu fora da USP. A apresentação foi em uma associação de bairro. Na plateia, amigos, líderes locais e, na hora em que o "dez" foi anunciado, dona Amélia Martins, de 79 anos, levantou chorando. O abraço no neto era também uma homenagem à região onde vive há mais de meio século. Amélia chegou por ali em 1945, vinda do interior do Estado, conheceu o marido na antiga fábrica dos Matarazzos, teve duas filhas e engajou a família na luta pelos sonhos da região. "No dia do lançamento da pedra fundamental da USP, chovia tanto que a lama chegava até o joelho", lembra Wania Martins da Silveira, mãe de Caio. "Tinha gente que pensava que não valia a pena tanto esforço, abaixo-assinado. Mas pensei nos meus filhos. Um já está lá, a outra vai em breve". Se a caçula Renata, de 15 anos, optar por um dos 12 cursos oferecidos na unidade e conseguir aprovação no vestibular, a família vai ajudar a engrossar a fatia ainda magra de estudantes da região matriculados ali. Na sala de Caio, por exemplo, dos 60 estudantes, somente 5 eram da zona leste. E nem precisa de estatística para medir essa disparidade, afirma ele. Basta observar os trens que chegam à estação USP Leste, acoplada ao câmpus. As locomotivas provenientes de bairros mais distantes da zona leste, como São Miguel Paulista e Cidade Tiradentes, chegam vazias. As que chegam da região central estão sempre lotadas.Dos vagões repletos, descem paulistanos de outras áreas da capital, mas principalmente gente nova na cidade e com o perfil parecido ao que se vê no câmpus Butantã. São egressos de escolas particulares do interior, que vêm para São Paulo mantidos pelos pais. A maioria mora em repúblicas localizadas no Tatuapé ou Anália Franco, bairros razoavelmente próximos à universidade, porém mais valorizados. São eles que fazem com que chegue a 30% o porcentual de moradores na zona leste."Eles chegam do interior direto para a periferia de São Paulo. Aqui, ele sai da aula e vai tomar cerveja nos botecos de Ermelino. Uma pena que, muitas vezes, a interação com o bairro termina aí", avalia o professor Wagner Iglecias, orientador de Caio. "Por isso, a importância e o simbolismo do trabalho dele".Anacronismo. A pouca articulação com as necessidades da região é antiga. Em 2003, dois anos antes da inauguração do câmpus, uma pesquisa da própria USP ouviu mais de 5 mil alunos de ensino médio para conhecer as suas preferências. No topo da lista estavam graduações tradicionais, como Engenharia, Medicina e Direito. Apesar disso, nenhuma delas entrou no rol da USP Leste - o estatuto da universidade proíbe que um curso seja oferecido em mais de uma unidade no mesmo município. Nasceu assim a Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), com um cardápio de dez cursos inéditos na universidade, como Lazer e Turismo e Ciências da Natureza.O curso de Gestão de Políticas Públicas, por exemplo, não era o preferido de Caio. Quando prestou vestibular, no fim de 2007, ele queria Jornalismo. Para ficar perto de casa e valorizar a luta da família pela implantação da USP Leste, abriu uma exceção. "Vi as disciplinas e me interessei pela ideia de trabalhar pelos interesses da comunidade."A escolha tem dado certo. Caio estagiou na subprefeitura de Ermelino Matarazzo e está esperançoso em ser aprovado em um concurso público ou conseguir uma vaga no terceiro setor. Mas ele é exceção. Na falta do curso de sua preferência, muita gente prefere manter a escolha inicial e trocar a possível vaga na USP por uma em uma das instituições privadas da região, com ajuda dos incentivos federais como o Prouni (Programa Universidade para Todos) e o Fies (que possibilita ao aluno financiar até 100% do curso e começar a pagar apenas depois da formatura).O melhor amigo de Caio, por exemplo, preferiu fazer Ciência da Computação em uma instituição particular e com bolsa do Prouni. Uma preferência perceptível até no cursinho gratuito criado pelos alunos da USP Leste para ajudar os estudantes da região a se prepararem para o vestibular. "Dei aulas de história e vi muita gente escolher uma universidade privada. Principalmente aqueles que já estavam no mercado de trabalho e não queriam trocar de área ou não tinham coragem de arriscar um curso pouco conhecido".Sonhos. Como futuro gestor público da região - Caio não pretende arredar o pé de Ermelino Matarazzo -, ele sonha com uma USP repleta de cursos atrativos e com os seus vizinhos na lista de matriculados.Só para garantir, a mãe e a avó estão empenhadas na chegada da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Se conseguirem e a implementação ocorrer em até três anos, Renata vai ter mais opções.

Nos últimos quatro anos, Caio Martins, de 22 anos, saiu de casa todas as manhãs e caminhou por dez minutos até a Universidade de São Paulo (USP). No caminho não estavam os casarões que rodeiam a Cidade Universitária, no Butantã, mas as ruelas de Ermelino Matarazzo, bairro periférico que abriga o câmpus da zona leste da instituição e onde o jovem vive desde que nasceu. Graduado há uma semana, Caio é um exemplar raro do projeto que motivou a criação da USP Leste: facilitar o acesso da comunidade local."Minha história é resultado de uma luta muito árdua da região. Muita gente brigou por décadas por esse câmpus", afirma. O discurso do recém-formado no curso de Gestão de Políticas Públicas vem embasado: seu trabalho de conclusão de curso foi exatamente sobre a participação popular e os movimentos sociais em Ermelino Matarazzo. Pela primeira vez naquele câmpus, a defesa aconteceu fora da USP. A apresentação foi em uma associação de bairro. Na plateia, amigos, líderes locais e, na hora em que o "dez" foi anunciado, dona Amélia Martins, de 79 anos, levantou chorando. O abraço no neto era também uma homenagem à região onde vive há mais de meio século. Amélia chegou por ali em 1945, vinda do interior do Estado, conheceu o marido na antiga fábrica dos Matarazzos, teve duas filhas e engajou a família na luta pelos sonhos da região. "No dia do lançamento da pedra fundamental da USP, chovia tanto que a lama chegava até o joelho", lembra Wania Martins da Silveira, mãe de Caio. "Tinha gente que pensava que não valia a pena tanto esforço, abaixo-assinado. Mas pensei nos meus filhos. Um já está lá, a outra vai em breve". Se a caçula Renata, de 15 anos, optar por um dos 12 cursos oferecidos na unidade e conseguir aprovação no vestibular, a família vai ajudar a engrossar a fatia ainda magra de estudantes da região matriculados ali. Na sala de Caio, por exemplo, dos 60 estudantes, somente 5 eram da zona leste. E nem precisa de estatística para medir essa disparidade, afirma ele. Basta observar os trens que chegam à estação USP Leste, acoplada ao câmpus. As locomotivas provenientes de bairros mais distantes da zona leste, como São Miguel Paulista e Cidade Tiradentes, chegam vazias. As que chegam da região central estão sempre lotadas.Dos vagões repletos, descem paulistanos de outras áreas da capital, mas principalmente gente nova na cidade e com o perfil parecido ao que se vê no câmpus Butantã. São egressos de escolas particulares do interior, que vêm para São Paulo mantidos pelos pais. A maioria mora em repúblicas localizadas no Tatuapé ou Anália Franco, bairros razoavelmente próximos à universidade, porém mais valorizados. São eles que fazem com que chegue a 30% o porcentual de moradores na zona leste."Eles chegam do interior direto para a periferia de São Paulo. Aqui, ele sai da aula e vai tomar cerveja nos botecos de Ermelino. Uma pena que, muitas vezes, a interação com o bairro termina aí", avalia o professor Wagner Iglecias, orientador de Caio. "Por isso, a importância e o simbolismo do trabalho dele".Anacronismo. A pouca articulação com as necessidades da região é antiga. Em 2003, dois anos antes da inauguração do câmpus, uma pesquisa da própria USP ouviu mais de 5 mil alunos de ensino médio para conhecer as suas preferências. No topo da lista estavam graduações tradicionais, como Engenharia, Medicina e Direito. Apesar disso, nenhuma delas entrou no rol da USP Leste - o estatuto da universidade proíbe que um curso seja oferecido em mais de uma unidade no mesmo município. Nasceu assim a Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), com um cardápio de dez cursos inéditos na universidade, como Lazer e Turismo e Ciências da Natureza.O curso de Gestão de Políticas Públicas, por exemplo, não era o preferido de Caio. Quando prestou vestibular, no fim de 2007, ele queria Jornalismo. Para ficar perto de casa e valorizar a luta da família pela implantação da USP Leste, abriu uma exceção. "Vi as disciplinas e me interessei pela ideia de trabalhar pelos interesses da comunidade."A escolha tem dado certo. Caio estagiou na subprefeitura de Ermelino Matarazzo e está esperançoso em ser aprovado em um concurso público ou conseguir uma vaga no terceiro setor. Mas ele é exceção. Na falta do curso de sua preferência, muita gente prefere manter a escolha inicial e trocar a possível vaga na USP por uma em uma das instituições privadas da região, com ajuda dos incentivos federais como o Prouni (Programa Universidade para Todos) e o Fies (que possibilita ao aluno financiar até 100% do curso e começar a pagar apenas depois da formatura).O melhor amigo de Caio, por exemplo, preferiu fazer Ciência da Computação em uma instituição particular e com bolsa do Prouni. Uma preferência perceptível até no cursinho gratuito criado pelos alunos da USP Leste para ajudar os estudantes da região a se prepararem para o vestibular. "Dei aulas de história e vi muita gente escolher uma universidade privada. Principalmente aqueles que já estavam no mercado de trabalho e não queriam trocar de área ou não tinham coragem de arriscar um curso pouco conhecido".Sonhos. Como futuro gestor público da região - Caio não pretende arredar o pé de Ermelino Matarazzo -, ele sonha com uma USP repleta de cursos atrativos e com os seus vizinhos na lista de matriculados.Só para garantir, a mãe e a avó estão empenhadas na chegada da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Se conseguirem e a implementação ocorrer em até três anos, Renata vai ter mais opções.

Nos últimos quatro anos, Caio Martins, de 22 anos, saiu de casa todas as manhãs e caminhou por dez minutos até a Universidade de São Paulo (USP). No caminho não estavam os casarões que rodeiam a Cidade Universitária, no Butantã, mas as ruelas de Ermelino Matarazzo, bairro periférico que abriga o câmpus da zona leste da instituição e onde o jovem vive desde que nasceu. Graduado há uma semana, Caio é um exemplar raro do projeto que motivou a criação da USP Leste: facilitar o acesso da comunidade local."Minha história é resultado de uma luta muito árdua da região. Muita gente brigou por décadas por esse câmpus", afirma. O discurso do recém-formado no curso de Gestão de Políticas Públicas vem embasado: seu trabalho de conclusão de curso foi exatamente sobre a participação popular e os movimentos sociais em Ermelino Matarazzo. Pela primeira vez naquele câmpus, a defesa aconteceu fora da USP. A apresentação foi em uma associação de bairro. Na plateia, amigos, líderes locais e, na hora em que o "dez" foi anunciado, dona Amélia Martins, de 79 anos, levantou chorando. O abraço no neto era também uma homenagem à região onde vive há mais de meio século. Amélia chegou por ali em 1945, vinda do interior do Estado, conheceu o marido na antiga fábrica dos Matarazzos, teve duas filhas e engajou a família na luta pelos sonhos da região. "No dia do lançamento da pedra fundamental da USP, chovia tanto que a lama chegava até o joelho", lembra Wania Martins da Silveira, mãe de Caio. "Tinha gente que pensava que não valia a pena tanto esforço, abaixo-assinado. Mas pensei nos meus filhos. Um já está lá, a outra vai em breve". Se a caçula Renata, de 15 anos, optar por um dos 12 cursos oferecidos na unidade e conseguir aprovação no vestibular, a família vai ajudar a engrossar a fatia ainda magra de estudantes da região matriculados ali. Na sala de Caio, por exemplo, dos 60 estudantes, somente 5 eram da zona leste. E nem precisa de estatística para medir essa disparidade, afirma ele. Basta observar os trens que chegam à estação USP Leste, acoplada ao câmpus. As locomotivas provenientes de bairros mais distantes da zona leste, como São Miguel Paulista e Cidade Tiradentes, chegam vazias. As que chegam da região central estão sempre lotadas.Dos vagões repletos, descem paulistanos de outras áreas da capital, mas principalmente gente nova na cidade e com o perfil parecido ao que se vê no câmpus Butantã. São egressos de escolas particulares do interior, que vêm para São Paulo mantidos pelos pais. A maioria mora em repúblicas localizadas no Tatuapé ou Anália Franco, bairros razoavelmente próximos à universidade, porém mais valorizados. São eles que fazem com que chegue a 30% o porcentual de moradores na zona leste."Eles chegam do interior direto para a periferia de São Paulo. Aqui, ele sai da aula e vai tomar cerveja nos botecos de Ermelino. Uma pena que, muitas vezes, a interação com o bairro termina aí", avalia o professor Wagner Iglecias, orientador de Caio. "Por isso, a importância e o simbolismo do trabalho dele".Anacronismo. A pouca articulação com as necessidades da região é antiga. Em 2003, dois anos antes da inauguração do câmpus, uma pesquisa da própria USP ouviu mais de 5 mil alunos de ensino médio para conhecer as suas preferências. No topo da lista estavam graduações tradicionais, como Engenharia, Medicina e Direito. Apesar disso, nenhuma delas entrou no rol da USP Leste - o estatuto da universidade proíbe que um curso seja oferecido em mais de uma unidade no mesmo município. Nasceu assim a Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), com um cardápio de dez cursos inéditos na universidade, como Lazer e Turismo e Ciências da Natureza.O curso de Gestão de Políticas Públicas, por exemplo, não era o preferido de Caio. Quando prestou vestibular, no fim de 2007, ele queria Jornalismo. Para ficar perto de casa e valorizar a luta da família pela implantação da USP Leste, abriu uma exceção. "Vi as disciplinas e me interessei pela ideia de trabalhar pelos interesses da comunidade."A escolha tem dado certo. Caio estagiou na subprefeitura de Ermelino Matarazzo e está esperançoso em ser aprovado em um concurso público ou conseguir uma vaga no terceiro setor. Mas ele é exceção. Na falta do curso de sua preferência, muita gente prefere manter a escolha inicial e trocar a possível vaga na USP por uma em uma das instituições privadas da região, com ajuda dos incentivos federais como o Prouni (Programa Universidade para Todos) e o Fies (que possibilita ao aluno financiar até 100% do curso e começar a pagar apenas depois da formatura).O melhor amigo de Caio, por exemplo, preferiu fazer Ciência da Computação em uma instituição particular e com bolsa do Prouni. Uma preferência perceptível até no cursinho gratuito criado pelos alunos da USP Leste para ajudar os estudantes da região a se prepararem para o vestibular. "Dei aulas de história e vi muita gente escolher uma universidade privada. Principalmente aqueles que já estavam no mercado de trabalho e não queriam trocar de área ou não tinham coragem de arriscar um curso pouco conhecido".Sonhos. Como futuro gestor público da região - Caio não pretende arredar o pé de Ermelino Matarazzo -, ele sonha com uma USP repleta de cursos atrativos e com os seus vizinhos na lista de matriculados.Só para garantir, a mãe e a avó estão empenhadas na chegada da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Se conseguirem e a implementação ocorrer em até três anos, Renata vai ter mais opções.

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