'Tenho de dar graças a Deus de conseguir enterrar o corpo', diz mulher de vítima de Brumadinho


Jonatas Lima Nascimento era funcionário da Vale há 13 anos e teve a identificação confirmada no sábado. 'Não vão mais existir sobreviventes, só vítimas', lamenta mulher

Por Felipe Resk
Bombeiros buscam vítimas após rompimento de lama Foto: Washington Alves/Reuters

Na manhã da tragédia em Brumadinho, o operador de equipamentos de instalação Jonatas Lima Nascimento, de 36 anos, acordou mais tarde e às 5h40 ainda não havia se trocado para trabalhar. A mulher Daihene Nascimento, de 33, até estranhou: “Parecia que ele, inconscientemente, estava enrolando para não ir, sabe?”

Não era o comum. Funcionário da Vale há 13 anos, Jonatas levantava com duas horas de antecedência para o expediente no Córrego do Feijão, que começava às 7 horas – lá era responsável por carregar vagões com os minérios que seriam transportados de trem.

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“Sempre tive orgulho de dizer que ele é trabalhador, decente, honesto. Nunca perdia o horário do ônibus, sabe? Pai de família mesmo, que tem gosto de trabalhar para sustentar os filhos”, diz a mulher.

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Ainda de manhã, ele ligou duas vezes para Daihene. Em  uma, contou que havia levado por engano a chave  dela para a mineradora. Na outra,  comemorou que havia assinado o aviso de férias. A notícia do rompimento da barreira 1 da Vale veio por volta de 12h30. Desde então, os familiares perderam contato. “Tentei ligar, não conseguia. Sabia que tinha uma coisa errada", conta.

Preocupada, Daihene tentou falar com colegas e chefes do marido, sem sucesso. Só à tarde conseguiu que um técnico da Vale atendesse o celular. “Ele engasgou... Falou para mim: ‘Meus Deus, eu não posso falar isso não, mas acho que você perdeu ele”, diz. “Corri atrás de notícia, mas não apareceu ninguém da empresa. A falta de informação é um desespero que você não tem noção.”

Veja em tempo real as últimas notícias sobre a tragédia de Brumadinho

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Só no sábado, 26, o corpo de Jonatas foi identificado pela Polícia Civil  após análise de impressão digital. Até o momento, são 58 mortos na tragédia, a maioria ainda sem reconhecimento. Com ele, encontraram apenas um objeto: a chave de casa de Daihene.

Veja imagens do rompimento de barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho

1 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
2 | 37

Moradores

Foto: Mauro Pimentel/AFP
3 | 37

Catástrofe ambiental e humana

Foto: Adriano Machado/Reuters
4 | 37

Animais

Foto: Wilton Junior/Estadão
5 | 37

Dificuldade no resgate

Foto: Douglas Magno/AFP
6 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Douglas Magno/AFP
7 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
8 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
9 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
10 | 37

Catástrofe ambiental e humana

Foto: Adriano Machado/Reuters
11 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
12 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Douglas Magno/AFP
13 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
14 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
15 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
16 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
17 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
18 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
19 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
20 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
21 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
22 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Ernesto Rodrigues/Estadão
23 | 37

Presidente Bolsonaro

Foto: Isac Nóbrega/Presidência da República
24 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Paulo Fonseca/EFE
25 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros de Minas Gerais
26 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Wilton Junior/Estadão
27 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Wilton Junior/Estadão
28 | 37

Batalha pela Vida

29 | 37

Estrada

Foto: Wilton Junior/Estadão
30 | 37

Carro atolado

Foto: Wilton Junior/Estadão
31 | 37

Helicoptero

Foto: Wilton Junior/Estadão
32 | 37

Bombeiros tentam encontrar sobreviventes em Brumadinho

Foto: Washington Alves/Reuters
33 | 37

Corpo encontrado

Foto: Wilton Júnior/Estadão
34 | 37

Ponte

Foto: Antonio Lacerta/EFE
35 | 37

Área devastada

Foto: Wilton Júnior/Estadão
36 | 37

Equipe de resgate

Foto: Antonio Lacerda/EFE
37 | 37

Resgate aéreo

Foto: Giazi Cavalcante/Código 19

Para a família, chegaram apenas informações extraoficiais de que Jonatas estaria no centro de carregamento, uma área baixa, na hora do incidente. Por imagens, é possível ver que o local ficou inundado de lama. “Não vai existir mais sobreviventes, só vítimas. Tenho que dar graças a Deus de conseguir enterrar o corpo dele”, afirma a mulher.

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O velório aconteceu na manhã de domingo, 27, em Congonhas, cidade natal de Jonatas. “Eu já enterrei ele e até agora não tive uma palavra da empresa. É uma sensação ruim, parece que ele está sendo tratado como indigente. Que era só um número.”

No dia 10 de janeiro, os dois completaram 15 anos de casados. “A gente passou fome junto”, diz Daihene. “Logo que ele entrou na Vale, a gente teve de se mudar para Barão de Cocais, o salário não era grande coisa. Pagamos caminhão de mudança e aluguel adiantado, dias depois não tinha um centavo no bolso e a gente não conhecia ninguém. O lanche que ele ganhava na empresa, ele guardava para mim.”

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Os bombeiros retomaram as buscas por sobreviventes na manhã deste sábado. Na véspera, o rompimento de uma barragem de contenção de resíduos da Vale deixou pelo menos nove mortos e 300 desaparecidos.

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“O Jonatas era super tranquilo, alegre”, descreve a cunhada Driely Mariely, de 25 anos. “Era quem sempre organizava as festas da família. Não abria mão de um churrasco e de uma cervejinha. Já deixou muita saudade.”

O casal tem dois filhos: Fernanda, de 10 anos, e Artur, de 6. Após a confirmação da morte, Daihene chamou as crianças para conversar. Os meninos choraram muito, conta. Foi o mais novo quem perguntou: “E o que vai fazer com as coisas do papai? Não quero que doe as roupas dele”, disse. “Quando crescer, quero ser igual a ele.”

'Pelo menos, a gente conseguiu enterro digno'

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“Era uma pessoa super dócil, tranquilo. Nunca vi ele entrando numa confusão.” É assim que Virlene Mercês da silva, de 26 anos, descreve o primo Fabrício Henrique da Silva, também de 26, outra vítima confirmada da tragédia de Brumadinho. Entre os familiares, o sentimento é de revolta: “Não vamos deixar impune. Vai ser tudo apurado. Vamos descobrir todos os culpados”.

Segundo a prima, Fabrício perdeu o pai em um acidente de moto quando tinha apenas 8 anos. O mais velho de quatro filhos, ele assumiu o papel de “homem da casa”, diz Virlene. “Ele tem uma irmãzinha de 5 anos, de outro casamento da mãe: é o maior grude.”

Para ela, a cruzada travada pela família por informações no dia seguinte ao rompimento da barragem retrata o “descaso” com as vítimas. “As famílias chegam ao IML desesperadas, querendo saber de seus desaparecidos, mas não deixam entrar. Eles só dizem para esperar a ligação.”

Fabrício gostava de jogar vôlei e futebol, de malhar e de brincar carnaval, segundo conta Virlene. “Era um irmão, meu amigo confidencial”, diz. Na Vale, trabalhava na área de mecânica. “De todos os ruins, a gente pelo menos conseguiu dar um enterro digno a ele.”

Na cidade, todos conhecem alguém que morreu ou está desaparecido. Só Virlene é próxima de outras sete pessoas, entre elas o cunhado Edirley Antonio Campos, de quem ainda não se tem notícia. “A gente não sabe se está vivo ou se está morto”, conta. Segundo Virlene, Campos é casado e tem uma filha de 3 anos.  “Cada tempo que passa a esperança é menos e menos.”

Bombeiros buscam vítimas após rompimento de lama Foto: Washington Alves/Reuters

Na manhã da tragédia em Brumadinho, o operador de equipamentos de instalação Jonatas Lima Nascimento, de 36 anos, acordou mais tarde e às 5h40 ainda não havia se trocado para trabalhar. A mulher Daihene Nascimento, de 33, até estranhou: “Parecia que ele, inconscientemente, estava enrolando para não ir, sabe?”

Não era o comum. Funcionário da Vale há 13 anos, Jonatas levantava com duas horas de antecedência para o expediente no Córrego do Feijão, que começava às 7 horas – lá era responsável por carregar vagões com os minérios que seriam transportados de trem.

reference

“Sempre tive orgulho de dizer que ele é trabalhador, decente, honesto. Nunca perdia o horário do ônibus, sabe? Pai de família mesmo, que tem gosto de trabalhar para sustentar os filhos”, diz a mulher.

Ainda de manhã, ele ligou duas vezes para Daihene. Em  uma, contou que havia levado por engano a chave  dela para a mineradora. Na outra,  comemorou que havia assinado o aviso de férias. A notícia do rompimento da barreira 1 da Vale veio por volta de 12h30. Desde então, os familiares perderam contato. “Tentei ligar, não conseguia. Sabia que tinha uma coisa errada", conta.

Preocupada, Daihene tentou falar com colegas e chefes do marido, sem sucesso. Só à tarde conseguiu que um técnico da Vale atendesse o celular. “Ele engasgou... Falou para mim: ‘Meus Deus, eu não posso falar isso não, mas acho que você perdeu ele”, diz. “Corri atrás de notícia, mas não apareceu ninguém da empresa. A falta de informação é um desespero que você não tem noção.”

Veja em tempo real as últimas notícias sobre a tragédia de Brumadinho

Só no sábado, 26, o corpo de Jonatas foi identificado pela Polícia Civil  após análise de impressão digital. Até o momento, são 58 mortos na tragédia, a maioria ainda sem reconhecimento. Com ele, encontraram apenas um objeto: a chave de casa de Daihene.

Veja imagens do rompimento de barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho

1 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
2 | 37

Moradores

Foto: Mauro Pimentel/AFP
3 | 37

Catástrofe ambiental e humana

Foto: Adriano Machado/Reuters
4 | 37

Animais

Foto: Wilton Junior/Estadão
5 | 37

Dificuldade no resgate

Foto: Douglas Magno/AFP
6 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Douglas Magno/AFP
7 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
8 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
9 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
10 | 37

Catástrofe ambiental e humana

Foto: Adriano Machado/Reuters
11 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
12 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Douglas Magno/AFP
13 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
14 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
15 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
16 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
17 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
18 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
19 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
20 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
21 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
22 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Ernesto Rodrigues/Estadão
23 | 37

Presidente Bolsonaro

Foto: Isac Nóbrega/Presidência da República
24 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Paulo Fonseca/EFE
25 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros de Minas Gerais
26 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Wilton Junior/Estadão
27 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Wilton Junior/Estadão
28 | 37

Batalha pela Vida

29 | 37

Estrada

Foto: Wilton Junior/Estadão
30 | 37

Carro atolado

Foto: Wilton Junior/Estadão
31 | 37

Helicoptero

Foto: Wilton Junior/Estadão
32 | 37

Bombeiros tentam encontrar sobreviventes em Brumadinho

Foto: Washington Alves/Reuters
33 | 37

Corpo encontrado

Foto: Wilton Júnior/Estadão
34 | 37

Ponte

Foto: Antonio Lacerta/EFE
35 | 37

Área devastada

Foto: Wilton Júnior/Estadão
36 | 37

Equipe de resgate

Foto: Antonio Lacerda/EFE
37 | 37

Resgate aéreo

Foto: Giazi Cavalcante/Código 19

Para a família, chegaram apenas informações extraoficiais de que Jonatas estaria no centro de carregamento, uma área baixa, na hora do incidente. Por imagens, é possível ver que o local ficou inundado de lama. “Não vai existir mais sobreviventes, só vítimas. Tenho que dar graças a Deus de conseguir enterrar o corpo dele”, afirma a mulher.

O velório aconteceu na manhã de domingo, 27, em Congonhas, cidade natal de Jonatas. “Eu já enterrei ele e até agora não tive uma palavra da empresa. É uma sensação ruim, parece que ele está sendo tratado como indigente. Que era só um número.”

No dia 10 de janeiro, os dois completaram 15 anos de casados. “A gente passou fome junto”, diz Daihene. “Logo que ele entrou na Vale, a gente teve de se mudar para Barão de Cocais, o salário não era grande coisa. Pagamos caminhão de mudança e aluguel adiantado, dias depois não tinha um centavo no bolso e a gente não conhecia ninguém. O lanche que ele ganhava na empresa, ele guardava para mim.”

Seu navegador não suporta esse video.

Os bombeiros retomaram as buscas por sobreviventes na manhã deste sábado. Na véspera, o rompimento de uma barragem de contenção de resíduos da Vale deixou pelo menos nove mortos e 300 desaparecidos.

“O Jonatas era super tranquilo, alegre”, descreve a cunhada Driely Mariely, de 25 anos. “Era quem sempre organizava as festas da família. Não abria mão de um churrasco e de uma cervejinha. Já deixou muita saudade.”

O casal tem dois filhos: Fernanda, de 10 anos, e Artur, de 6. Após a confirmação da morte, Daihene chamou as crianças para conversar. Os meninos choraram muito, conta. Foi o mais novo quem perguntou: “E o que vai fazer com as coisas do papai? Não quero que doe as roupas dele”, disse. “Quando crescer, quero ser igual a ele.”

'Pelo menos, a gente conseguiu enterro digno'

“Era uma pessoa super dócil, tranquilo. Nunca vi ele entrando numa confusão.” É assim que Virlene Mercês da silva, de 26 anos, descreve o primo Fabrício Henrique da Silva, também de 26, outra vítima confirmada da tragédia de Brumadinho. Entre os familiares, o sentimento é de revolta: “Não vamos deixar impune. Vai ser tudo apurado. Vamos descobrir todos os culpados”.

Segundo a prima, Fabrício perdeu o pai em um acidente de moto quando tinha apenas 8 anos. O mais velho de quatro filhos, ele assumiu o papel de “homem da casa”, diz Virlene. “Ele tem uma irmãzinha de 5 anos, de outro casamento da mãe: é o maior grude.”

Para ela, a cruzada travada pela família por informações no dia seguinte ao rompimento da barragem retrata o “descaso” com as vítimas. “As famílias chegam ao IML desesperadas, querendo saber de seus desaparecidos, mas não deixam entrar. Eles só dizem para esperar a ligação.”

Fabrício gostava de jogar vôlei e futebol, de malhar e de brincar carnaval, segundo conta Virlene. “Era um irmão, meu amigo confidencial”, diz. Na Vale, trabalhava na área de mecânica. “De todos os ruins, a gente pelo menos conseguiu dar um enterro digno a ele.”

Na cidade, todos conhecem alguém que morreu ou está desaparecido. Só Virlene é próxima de outras sete pessoas, entre elas o cunhado Edirley Antonio Campos, de quem ainda não se tem notícia. “A gente não sabe se está vivo ou se está morto”, conta. Segundo Virlene, Campos é casado e tem uma filha de 3 anos.  “Cada tempo que passa a esperança é menos e menos.”

Bombeiros buscam vítimas após rompimento de lama Foto: Washington Alves/Reuters

Na manhã da tragédia em Brumadinho, o operador de equipamentos de instalação Jonatas Lima Nascimento, de 36 anos, acordou mais tarde e às 5h40 ainda não havia se trocado para trabalhar. A mulher Daihene Nascimento, de 33, até estranhou: “Parecia que ele, inconscientemente, estava enrolando para não ir, sabe?”

Não era o comum. Funcionário da Vale há 13 anos, Jonatas levantava com duas horas de antecedência para o expediente no Córrego do Feijão, que começava às 7 horas – lá era responsável por carregar vagões com os minérios que seriam transportados de trem.

reference

“Sempre tive orgulho de dizer que ele é trabalhador, decente, honesto. Nunca perdia o horário do ônibus, sabe? Pai de família mesmo, que tem gosto de trabalhar para sustentar os filhos”, diz a mulher.

Ainda de manhã, ele ligou duas vezes para Daihene. Em  uma, contou que havia levado por engano a chave  dela para a mineradora. Na outra,  comemorou que havia assinado o aviso de férias. A notícia do rompimento da barreira 1 da Vale veio por volta de 12h30. Desde então, os familiares perderam contato. “Tentei ligar, não conseguia. Sabia que tinha uma coisa errada", conta.

Preocupada, Daihene tentou falar com colegas e chefes do marido, sem sucesso. Só à tarde conseguiu que um técnico da Vale atendesse o celular. “Ele engasgou... Falou para mim: ‘Meus Deus, eu não posso falar isso não, mas acho que você perdeu ele”, diz. “Corri atrás de notícia, mas não apareceu ninguém da empresa. A falta de informação é um desespero que você não tem noção.”

Veja em tempo real as últimas notícias sobre a tragédia de Brumadinho

Só no sábado, 26, o corpo de Jonatas foi identificado pela Polícia Civil  após análise de impressão digital. Até o momento, são 58 mortos na tragédia, a maioria ainda sem reconhecimento. Com ele, encontraram apenas um objeto: a chave de casa de Daihene.

Veja imagens do rompimento de barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho

1 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
2 | 37

Moradores

Foto: Mauro Pimentel/AFP
3 | 37

Catástrofe ambiental e humana

Foto: Adriano Machado/Reuters
4 | 37

Animais

Foto: Wilton Junior/Estadão
5 | 37

Dificuldade no resgate

Foto: Douglas Magno/AFP
6 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Douglas Magno/AFP
7 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
8 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
9 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
10 | 37

Catástrofe ambiental e humana

Foto: Adriano Machado/Reuters
11 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
12 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Douglas Magno/AFP
13 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
14 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
15 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
16 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
17 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
18 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
19 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Washington Alves/Reuters
20 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
21 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
22 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Ernesto Rodrigues/Estadão
23 | 37

Presidente Bolsonaro

Foto: Isac Nóbrega/Presidência da República
24 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Paulo Fonseca/EFE
25 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Corpo de Bombeiros de Minas Gerais
26 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Wilton Junior/Estadão
27 | 37

Tragédia em Minas Gerais

Foto: Wilton Junior/Estadão
28 | 37

Batalha pela Vida

29 | 37

Estrada

Foto: Wilton Junior/Estadão
30 | 37

Carro atolado

Foto: Wilton Junior/Estadão
31 | 37

Helicoptero

Foto: Wilton Junior/Estadão
32 | 37

Bombeiros tentam encontrar sobreviventes em Brumadinho

Foto: Washington Alves/Reuters
33 | 37

Corpo encontrado

Foto: Wilton Júnior/Estadão
34 | 37

Ponte

Foto: Antonio Lacerta/EFE
35 | 37

Área devastada

Foto: Wilton Júnior/Estadão
36 | 37

Equipe de resgate

Foto: Antonio Lacerda/EFE
37 | 37

Resgate aéreo

Foto: Giazi Cavalcante/Código 19

Para a família, chegaram apenas informações extraoficiais de que Jonatas estaria no centro de carregamento, uma área baixa, na hora do incidente. Por imagens, é possível ver que o local ficou inundado de lama. “Não vai existir mais sobreviventes, só vítimas. Tenho que dar graças a Deus de conseguir enterrar o corpo dele”, afirma a mulher.

O velório aconteceu na manhã de domingo, 27, em Congonhas, cidade natal de Jonatas. “Eu já enterrei ele e até agora não tive uma palavra da empresa. É uma sensação ruim, parece que ele está sendo tratado como indigente. Que era só um número.”

No dia 10 de janeiro, os dois completaram 15 anos de casados. “A gente passou fome junto”, diz Daihene. “Logo que ele entrou na Vale, a gente teve de se mudar para Barão de Cocais, o salário não era grande coisa. Pagamos caminhão de mudança e aluguel adiantado, dias depois não tinha um centavo no bolso e a gente não conhecia ninguém. O lanche que ele ganhava na empresa, ele guardava para mim.”

Seu navegador não suporta esse video.

Os bombeiros retomaram as buscas por sobreviventes na manhã deste sábado. Na véspera, o rompimento de uma barragem de contenção de resíduos da Vale deixou pelo menos nove mortos e 300 desaparecidos.

“O Jonatas era super tranquilo, alegre”, descreve a cunhada Driely Mariely, de 25 anos. “Era quem sempre organizava as festas da família. Não abria mão de um churrasco e de uma cervejinha. Já deixou muita saudade.”

O casal tem dois filhos: Fernanda, de 10 anos, e Artur, de 6. Após a confirmação da morte, Daihene chamou as crianças para conversar. Os meninos choraram muito, conta. Foi o mais novo quem perguntou: “E o que vai fazer com as coisas do papai? Não quero que doe as roupas dele”, disse. “Quando crescer, quero ser igual a ele.”

'Pelo menos, a gente conseguiu enterro digno'

“Era uma pessoa super dócil, tranquilo. Nunca vi ele entrando numa confusão.” É assim que Virlene Mercês da silva, de 26 anos, descreve o primo Fabrício Henrique da Silva, também de 26, outra vítima confirmada da tragédia de Brumadinho. Entre os familiares, o sentimento é de revolta: “Não vamos deixar impune. Vai ser tudo apurado. Vamos descobrir todos os culpados”.

Segundo a prima, Fabrício perdeu o pai em um acidente de moto quando tinha apenas 8 anos. O mais velho de quatro filhos, ele assumiu o papel de “homem da casa”, diz Virlene. “Ele tem uma irmãzinha de 5 anos, de outro casamento da mãe: é o maior grude.”

Para ela, a cruzada travada pela família por informações no dia seguinte ao rompimento da barragem retrata o “descaso” com as vítimas. “As famílias chegam ao IML desesperadas, querendo saber de seus desaparecidos, mas não deixam entrar. Eles só dizem para esperar a ligação.”

Fabrício gostava de jogar vôlei e futebol, de malhar e de brincar carnaval, segundo conta Virlene. “Era um irmão, meu amigo confidencial”, diz. Na Vale, trabalhava na área de mecânica. “De todos os ruins, a gente pelo menos conseguiu dar um enterro digno a ele.”

Na cidade, todos conhecem alguém que morreu ou está desaparecido. Só Virlene é próxima de outras sete pessoas, entre elas o cunhado Edirley Antonio Campos, de quem ainda não se tem notícia. “A gente não sabe se está vivo ou se está morto”, conta. Segundo Virlene, Campos é casado e tem uma filha de 3 anos.  “Cada tempo que passa a esperança é menos e menos.”

Bombeiros buscam vítimas após rompimento de lama Foto: Washington Alves/Reuters

Na manhã da tragédia em Brumadinho, o operador de equipamentos de instalação Jonatas Lima Nascimento, de 36 anos, acordou mais tarde e às 5h40 ainda não havia se trocado para trabalhar. A mulher Daihene Nascimento, de 33, até estranhou: “Parecia que ele, inconscientemente, estava enrolando para não ir, sabe?”

Não era o comum. Funcionário da Vale há 13 anos, Jonatas levantava com duas horas de antecedência para o expediente no Córrego do Feijão, que começava às 7 horas – lá era responsável por carregar vagões com os minérios que seriam transportados de trem.

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“Sempre tive orgulho de dizer que ele é trabalhador, decente, honesto. Nunca perdia o horário do ônibus, sabe? Pai de família mesmo, que tem gosto de trabalhar para sustentar os filhos”, diz a mulher.

Ainda de manhã, ele ligou duas vezes para Daihene. Em  uma, contou que havia levado por engano a chave  dela para a mineradora. Na outra,  comemorou que havia assinado o aviso de férias. A notícia do rompimento da barreira 1 da Vale veio por volta de 12h30. Desde então, os familiares perderam contato. “Tentei ligar, não conseguia. Sabia que tinha uma coisa errada", conta.

Preocupada, Daihene tentou falar com colegas e chefes do marido, sem sucesso. Só à tarde conseguiu que um técnico da Vale atendesse o celular. “Ele engasgou... Falou para mim: ‘Meus Deus, eu não posso falar isso não, mas acho que você perdeu ele”, diz. “Corri atrás de notícia, mas não apareceu ninguém da empresa. A falta de informação é um desespero que você não tem noção.”

Veja em tempo real as últimas notícias sobre a tragédia de Brumadinho

Só no sábado, 26, o corpo de Jonatas foi identificado pela Polícia Civil  após análise de impressão digital. Até o momento, são 58 mortos na tragédia, a maioria ainda sem reconhecimento. Com ele, encontraram apenas um objeto: a chave de casa de Daihene.

Veja imagens do rompimento de barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho

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Tragédia em Minas Gerais

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2 | 37

Moradores

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Catástrofe ambiental e humana

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4 | 37

Animais

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Dificuldade no resgate

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6 | 37

Tragédia em Minas Gerais

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Tragédia em Minas Gerais

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Tragédia em Minas Gerais

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9 | 37

Tragédia em Minas Gerais

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10 | 37

Catástrofe ambiental e humana

Foto: Adriano Machado/Reuters
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Tragédia em Minas Gerais

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12 | 37

Tragédia em Minas Gerais

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Tragédia em Minas Gerais

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15 | 37

Tragédia em Minas Gerais

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16 | 37

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Foto: Ernesto Rodrigues/Estadão
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Foto: Wilton Junior/Estadão
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Batalha pela Vida

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Estrada

Foto: Wilton Junior/Estadão
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Carro atolado

Foto: Wilton Junior/Estadão
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Helicoptero

Foto: Wilton Junior/Estadão
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Bombeiros tentam encontrar sobreviventes em Brumadinho

Foto: Washington Alves/Reuters
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Corpo encontrado

Foto: Wilton Júnior/Estadão
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Ponte

Foto: Antonio Lacerta/EFE
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Área devastada

Foto: Wilton Júnior/Estadão
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Equipe de resgate

Foto: Antonio Lacerda/EFE
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Resgate aéreo

Foto: Giazi Cavalcante/Código 19

Para a família, chegaram apenas informações extraoficiais de que Jonatas estaria no centro de carregamento, uma área baixa, na hora do incidente. Por imagens, é possível ver que o local ficou inundado de lama. “Não vai existir mais sobreviventes, só vítimas. Tenho que dar graças a Deus de conseguir enterrar o corpo dele”, afirma a mulher.

O velório aconteceu na manhã de domingo, 27, em Congonhas, cidade natal de Jonatas. “Eu já enterrei ele e até agora não tive uma palavra da empresa. É uma sensação ruim, parece que ele está sendo tratado como indigente. Que era só um número.”

No dia 10 de janeiro, os dois completaram 15 anos de casados. “A gente passou fome junto”, diz Daihene. “Logo que ele entrou na Vale, a gente teve de se mudar para Barão de Cocais, o salário não era grande coisa. Pagamos caminhão de mudança e aluguel adiantado, dias depois não tinha um centavo no bolso e a gente não conhecia ninguém. O lanche que ele ganhava na empresa, ele guardava para mim.”

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Os bombeiros retomaram as buscas por sobreviventes na manhã deste sábado. Na véspera, o rompimento de uma barragem de contenção de resíduos da Vale deixou pelo menos nove mortos e 300 desaparecidos.

“O Jonatas era super tranquilo, alegre”, descreve a cunhada Driely Mariely, de 25 anos. “Era quem sempre organizava as festas da família. Não abria mão de um churrasco e de uma cervejinha. Já deixou muita saudade.”

O casal tem dois filhos: Fernanda, de 10 anos, e Artur, de 6. Após a confirmação da morte, Daihene chamou as crianças para conversar. Os meninos choraram muito, conta. Foi o mais novo quem perguntou: “E o que vai fazer com as coisas do papai? Não quero que doe as roupas dele”, disse. “Quando crescer, quero ser igual a ele.”

'Pelo menos, a gente conseguiu enterro digno'

“Era uma pessoa super dócil, tranquilo. Nunca vi ele entrando numa confusão.” É assim que Virlene Mercês da silva, de 26 anos, descreve o primo Fabrício Henrique da Silva, também de 26, outra vítima confirmada da tragédia de Brumadinho. Entre os familiares, o sentimento é de revolta: “Não vamos deixar impune. Vai ser tudo apurado. Vamos descobrir todos os culpados”.

Segundo a prima, Fabrício perdeu o pai em um acidente de moto quando tinha apenas 8 anos. O mais velho de quatro filhos, ele assumiu o papel de “homem da casa”, diz Virlene. “Ele tem uma irmãzinha de 5 anos, de outro casamento da mãe: é o maior grude.”

Para ela, a cruzada travada pela família por informações no dia seguinte ao rompimento da barragem retrata o “descaso” com as vítimas. “As famílias chegam ao IML desesperadas, querendo saber de seus desaparecidos, mas não deixam entrar. Eles só dizem para esperar a ligação.”

Fabrício gostava de jogar vôlei e futebol, de malhar e de brincar carnaval, segundo conta Virlene. “Era um irmão, meu amigo confidencial”, diz. Na Vale, trabalhava na área de mecânica. “De todos os ruins, a gente pelo menos conseguiu dar um enterro digno a ele.”

Na cidade, todos conhecem alguém que morreu ou está desaparecido. Só Virlene é próxima de outras sete pessoas, entre elas o cunhado Edirley Antonio Campos, de quem ainda não se tem notícia. “A gente não sabe se está vivo ou se está morto”, conta. Segundo Virlene, Campos é casado e tem uma filha de 3 anos.  “Cada tempo que passa a esperança é menos e menos.”

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