Eduardo Suplicy: V.Exa. um aparte?José Sarney: Muito obrigado!
Não sei se vocês repararam no finalzinho (acima destacado) do já célebre último discurso de José Sarney, mas a conversa de doido que há meses se insinua no Congresso poderia ter atingido ali um momento de clímax não fosse o probleminha de audição - ou de atenção - do presidente do Senado. Em vez de conceder a palavra requerida em caráter solidário, Sarney deu as costas ao pedido de pitaco do nobre colega, cruzou os microfones na tribuna e saiu falando sozinho pelo plenário.
A história agora talvez fosse outra se um hipotético aparte concedido ao experiente Suplicy ajudasse o aliado maranhense a desenvolver melhor essa retórica de hospício que ensaiou em frases como "essa crise não é minha" ou "eu não sei o que é ato secreto, ninguém aqui sabe o que é ato secreto". Seu discurso lembrava um pouco o de Tarso, o jovem esquizofrênico de 'Caminho das Índias'. Não vem ao caso aqui discutir se José Sarney está gagá, lelé ou tantã, mas não se deve, a exemplo da trama da novela das oito, ignorar a maluquice do personagem.
Suplicy não teve chance de dizer que entendia os pensamentos confusos de seu companheiro de base aliada do governo, mas é fundamental que algum familiar - de preferência alguém que não trabalhe no Senado - perceba que o ente querido está variando. O que não é nenhuma vergonha para a biografia de ninguém. Muito pelo contrário, interditar o velho à esta altura do campeonato pode absolvê-lo de tudo o mais que sugere seu impeachment político.
Ainda que alguma dúvida no diagnóstico psicológico do senador tenha sobrevivido ao vazio dos argumentos que apresentou em defesa própria na última terça-feira, depois que ele chamou o Romeu Tuma de Nicolau, francamente, melhor insistir no ponto crucial levantado por Eduardo Suplicy:
"V.Exa. um aparte?"
Ele vai nos agradecer por isso pelo resto da vida.
Texto publicado na coluna 'Ambulatório da Notícia' publicada neste domingo no caderno Aliás do 'Estadão'.