No interior do cerrado, onde não tem Viagra, vale uma garrafada de pinga com raiz de rufão. Para cicatrizar pequenos machucados, a dica é um banho de água fria com casca de barbatimão. E para feridas mais antigas nada melhor do que uma pomada ou um chá de casca de pacari. Todas são plantas medicinais da região, onde, fora dos grandes centros, o conhecimento de raizeiros e benzedeiras vale tanto quanto o posto de saúde mais próximo. Senão mais. Centenas desses curandeiros estarão reunidos a partir desta quinta-feira na cidade de Goiás para trocar experiências e fazer a edição final da Farmacopéia Popular do Cerrado, um projeto inédito entre comunidades tradicionais para documentar e legitimar seu conhecimento. O debate faz parte do 4.º Encontro de Parteiras, Benzedeiras e Raizeiras do Cerrado - cujo nome é uma homenagem às mulheres, mas inclui os homens. O barbatimão, o pacari e o rufão compõem o fascículo inicial, que deve ser publicado até o fim do ano. Eles foram selecionados de um grupo de 320 plantas medicinais identificadas na região do Alto e Médio Jequitinhonha, no norte de Minas, em trabalho coordenado pela Articulação Pacari - uma rede de aproximadamente 80 comunidades, instituições e organizações não-governamentais (ONGs). A idéia inicial, segundo a organizadora, Jaqueline Evangelista, é promover a auto-regulamentação das chamadas farmácias populares, que atendem a população com base na medicina tradicional e estão espalhadas por todo o cerrado. A farmacopéia trará informações detalhadas sobre a biologia das plantas, a preparação e o uso corretos dos medicamentos. Alguns dos segredos familiares, entretanto, serão preservados. "Não colocamos a receita nem a dosagem exata dos remédios", avisa Jaqueline. Outro objetivo do projeto é usar a farmacopéia como um registro de autoria sobre os conhecimentos tradicionais, de forma que pesquisadores ou empresas não possam se apropriar deles para fins comerciais.
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