Imagine só!

Atenção: Este alimento contém DNA!


Pesquisas retratam a dificuldade de cientistas se comunicarem com a sociedade sobre temas de grande complexidade, como alimentos transgênicos, mudanças climáticas e pesquisas com animais

Por Herton Escobar
Frutas e vegetais em um supermercado na Califórnia. Foto: Herton Escobar

Pergunta: Você comeria um tomate todo recheado de DNA vegetal? E que tal um delicioso bife de fibras musculares bovinas, cheias de actina e miosina? Talvez com um embrião de galinha precoce, fritinho na manteiga, para acompanhar?

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Pode parecer assustador (e até um pouco nojento) à primeira vista, mas praticamente tudo que você come -- seja planta, seja animal, orgânico, transgênico ou convencional, in natura ou processado -- está cheio de DNA, aquela famosa molécula em forma de escada retorcida, feita de adenina (A), timina (T), citosina (C), guanina (G), fósforo e açúcares. Aliás, não só de DNA, mas também de RNA, ribossomos, mitocôndrias, membranas celulares, retículos endoplasmáticos, milhões e milhões de diferentes proteínas e tudo mais que se pode esperar encontrar dentro uma célula. Por uma razão muito simples: todos os seres vivos são feitos de células, e todas as células contêm DNA. É a molécula básica da vida.

Muita gente, porém, não sabe ou nunca parou para pensar sobre isso. O que ajuda a explicar o resultado de uma pesquisa de opinião publicada no mês passado pelo Departamento de Economia Agrícola da Universidade Estadual de Oklahoma, nos EUA, segundo a qual 80% dos entrevistados disse ser a favor da "rotulagem obrigatória de alimentos contendo DNA". (Leia o estudo aqui: http://goo.gl/r6vF7y)

Avisar as pessoas de que um alimento "contém DNA", obviamente, não faz o menor sentido. Seria o mesmo que exigir a rotulagem de bebidas "contendo água". Uma informação 100% irrelevante, que só serviria para confundir o consumidor, dando a impressão de que o DNA é algo a ser temido. Não é.

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Dizer que um alimento contém DNA é tão relevante quanto dizer que uma bebida contém água.

Curiosamente, o porcentual de pessoas que disseram ser favoráveis a rotulagem de "alimentos contendo DNA" é praticamente o mesmo de pessoas que defenderam a rotulagem de "alimentos produzidos com engenharia genética" -- uma maneira mais técnica (e mais assustadora, admito, apesar de não ser essa a intenção) de se referir aos "alimentos transgênicos". O que sugere -- assim como já foi constatado por outras pesquisas -- que o público em geral tem pouco conhecimento de biologia, menos ainda de biologia molecular, e muito menos ainda de engenharia genética. E como é natural do ser humano temer aquilo que não entende, é perfeitamente compreensível que a maioria das pessoas mantenham um pé atrás com relação aos transgênicos. Se elas têm receio de comer "alimentos com DNA", imagine então "alimentos geneticamente modificados"! Na dúvida, melhor evitar.

Do ponto de vista do consumo humano, porém, não há nenhuma diferença entre convencional e transgênico. Se você é uma erva daninha num campo de soja ou uma lagarta que gosta de atacar plantações de milho, aí sim, é bom ficar longe dos transgênicos. Se você é um ser humano comum pode ficar tranquilo, a soja e o milho transgênicos já são consumidos em grande escala há mais de 15 anos e não há nenhuma evidência de que eles possam causar qualquer mal ao meio ambiente ou à sua saúde (apesar de toda a polêmica). O DNA desses transgênicos é tão inofensivo para você quanto o de qualquer brócoli ou tomate orgânico que você come diariamente na sua salada.

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Comunicação difícil

Entender o porquê dessa segurança, porém, não é uma tarefa simples. Exige a compreensão de uma série de conceitos de química, biologia molecular, ecologia, toxicologia, metabolismo e até evolução. E essa é grande dificuldade de se comunicar com o público sobre temas complexos da ciência -- dizer que faz mal e cultivar o medo do desconhecido é fácil; demonstrar que não faz mal e educar as pessoas sobre metabolismo de ácidos nucleicos é muito mais difícil.

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Rato usado em pesquisas sobre lesões medulares na UFRJ. Foto: Paulo Vitor/Estadao

O que ajuda a explicar uma outra pesquisa publicada recentemente, na última edição da revista Science, segundo a qual 88% dos cientistas nos EUA acreditam que é seguro consumir alimentos transgênicos, versus 37%, apenas, da população em geral. (Clique aqui para mais detalhes: http://goo.gl/bflJPQ)

Os dados são de uma consulta realizada pelo Pew Research Center, em parceria com a Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS, publisher da Science), com a intenção de comparar as percepções do público leigo e da comunidade científica sobre temas polêmicos da atualidade. E elas são muito diferentes! Além dos alimentos transgênicos, foram abordadas a experimentação animal, o uso de pesticidas na agricultura, a influência humana nas mudanças climáticas, vacinação de crianças e evolução humana, entre outros. Veja alguns dos resultados abaixo:

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Alimentos geneticamente modificados: 88% dos cientistas entendem que eles são seguros para comer, comparado a apenas 37% do público geral (esse foi o tema com a maior diferença de opinião entre os dois grupos: 51 pontos percentuais)

Uso de animais em pesquisa: 89% dos cientistas são a favor, ante 37% do público geral

Alimentos cultivados com o uso de pesticidas: 68% dos cientistas entendem que eles são seguros para consumo, comparado a 28% do público geral

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Mudanças climáticas globais: 87% dos cientistas entendem que elas são causadas principalmente por atividades humanas, comparado a 50% do público geral que também coloca a culpa no homem

Evolução humana: 98% dos cientistas entende que os seres humanos evoluíram ao longo do tempo, comparado com 65% do público geral

Vacinação infantil: 86% dos cientistas entendem que vacinas como a tríplice contra sarampo, caxumba e rubéola deveriam ser obrigatórias na infância, comparado a 68% do público geral que pensa da mesma forma

Para entender porque a vacinação é um tema polêmico, leia aqui no blog: Disney, sarampo e a fantasia da vacina que causa autismo

Cada um desses temas, é claro, seria merecedor de uma longa discussão. A mensagem geral da pesquisa, porém, é a mesma para todos eles: existe uma grande diferença entre a maneira como cientistas e leigos enxergam um mesmo assunto, e isso impõe uma barreira considerável à comunicação da ciência com a sociedade sobre temas complexos. Veja abaixo um gráfico produzido pelo Pew Research Center, que resume os resultados da pesquisa:

Correção: Esse artigo foi modificado às 10h45 para esclarecer que os resultados da pesquisa do Pew Research Center referem-se ao porcentual de pessoas de cada grupo (cientistas vs. público geral) que concordaram com uma mesma afirmação, não que discordaram dela.

Frutas e vegetais em um supermercado na Califórnia. Foto: Herton Escobar

Pergunta: Você comeria um tomate todo recheado de DNA vegetal? E que tal um delicioso bife de fibras musculares bovinas, cheias de actina e miosina? Talvez com um embrião de galinha precoce, fritinho na manteiga, para acompanhar?

Pode parecer assustador (e até um pouco nojento) à primeira vista, mas praticamente tudo que você come -- seja planta, seja animal, orgânico, transgênico ou convencional, in natura ou processado -- está cheio de DNA, aquela famosa molécula em forma de escada retorcida, feita de adenina (A), timina (T), citosina (C), guanina (G), fósforo e açúcares. Aliás, não só de DNA, mas também de RNA, ribossomos, mitocôndrias, membranas celulares, retículos endoplasmáticos, milhões e milhões de diferentes proteínas e tudo mais que se pode esperar encontrar dentro uma célula. Por uma razão muito simples: todos os seres vivos são feitos de células, e todas as células contêm DNA. É a molécula básica da vida.

Muita gente, porém, não sabe ou nunca parou para pensar sobre isso. O que ajuda a explicar o resultado de uma pesquisa de opinião publicada no mês passado pelo Departamento de Economia Agrícola da Universidade Estadual de Oklahoma, nos EUA, segundo a qual 80% dos entrevistados disse ser a favor da "rotulagem obrigatória de alimentos contendo DNA". (Leia o estudo aqui: http://goo.gl/r6vF7y)

Avisar as pessoas de que um alimento "contém DNA", obviamente, não faz o menor sentido. Seria o mesmo que exigir a rotulagem de bebidas "contendo água". Uma informação 100% irrelevante, que só serviria para confundir o consumidor, dando a impressão de que o DNA é algo a ser temido. Não é.

Dizer que um alimento contém DNA é tão relevante quanto dizer que uma bebida contém água.

Curiosamente, o porcentual de pessoas que disseram ser favoráveis a rotulagem de "alimentos contendo DNA" é praticamente o mesmo de pessoas que defenderam a rotulagem de "alimentos produzidos com engenharia genética" -- uma maneira mais técnica (e mais assustadora, admito, apesar de não ser essa a intenção) de se referir aos "alimentos transgênicos". O que sugere -- assim como já foi constatado por outras pesquisas -- que o público em geral tem pouco conhecimento de biologia, menos ainda de biologia molecular, e muito menos ainda de engenharia genética. E como é natural do ser humano temer aquilo que não entende, é perfeitamente compreensível que a maioria das pessoas mantenham um pé atrás com relação aos transgênicos. Se elas têm receio de comer "alimentos com DNA", imagine então "alimentos geneticamente modificados"! Na dúvida, melhor evitar.

Do ponto de vista do consumo humano, porém, não há nenhuma diferença entre convencional e transgênico. Se você é uma erva daninha num campo de soja ou uma lagarta que gosta de atacar plantações de milho, aí sim, é bom ficar longe dos transgênicos. Se você é um ser humano comum pode ficar tranquilo, a soja e o milho transgênicos já são consumidos em grande escala há mais de 15 anos e não há nenhuma evidência de que eles possam causar qualquer mal ao meio ambiente ou à sua saúde (apesar de toda a polêmica). O DNA desses transgênicos é tão inofensivo para você quanto o de qualquer brócoli ou tomate orgânico que você come diariamente na sua salada.

Comunicação difícil

Entender o porquê dessa segurança, porém, não é uma tarefa simples. Exige a compreensão de uma série de conceitos de química, biologia molecular, ecologia, toxicologia, metabolismo e até evolução. E essa é grande dificuldade de se comunicar com o público sobre temas complexos da ciência -- dizer que faz mal e cultivar o medo do desconhecido é fácil; demonstrar que não faz mal e educar as pessoas sobre metabolismo de ácidos nucleicos é muito mais difícil.

Rato usado em pesquisas sobre lesões medulares na UFRJ. Foto: Paulo Vitor/Estadao

O que ajuda a explicar uma outra pesquisa publicada recentemente, na última edição da revista Science, segundo a qual 88% dos cientistas nos EUA acreditam que é seguro consumir alimentos transgênicos, versus 37%, apenas, da população em geral. (Clique aqui para mais detalhes: http://goo.gl/bflJPQ)

Os dados são de uma consulta realizada pelo Pew Research Center, em parceria com a Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS, publisher da Science), com a intenção de comparar as percepções do público leigo e da comunidade científica sobre temas polêmicos da atualidade. E elas são muito diferentes! Além dos alimentos transgênicos, foram abordadas a experimentação animal, o uso de pesticidas na agricultura, a influência humana nas mudanças climáticas, vacinação de crianças e evolução humana, entre outros. Veja alguns dos resultados abaixo:

Alimentos geneticamente modificados: 88% dos cientistas entendem que eles são seguros para comer, comparado a apenas 37% do público geral (esse foi o tema com a maior diferença de opinião entre os dois grupos: 51 pontos percentuais)

Uso de animais em pesquisa: 89% dos cientistas são a favor, ante 37% do público geral

Alimentos cultivados com o uso de pesticidas: 68% dos cientistas entendem que eles são seguros para consumo, comparado a 28% do público geral

Mudanças climáticas globais: 87% dos cientistas entendem que elas são causadas principalmente por atividades humanas, comparado a 50% do público geral que também coloca a culpa no homem

Evolução humana: 98% dos cientistas entende que os seres humanos evoluíram ao longo do tempo, comparado com 65% do público geral

Vacinação infantil: 86% dos cientistas entendem que vacinas como a tríplice contra sarampo, caxumba e rubéola deveriam ser obrigatórias na infância, comparado a 68% do público geral que pensa da mesma forma

Para entender porque a vacinação é um tema polêmico, leia aqui no blog: Disney, sarampo e a fantasia da vacina que causa autismo

Cada um desses temas, é claro, seria merecedor de uma longa discussão. A mensagem geral da pesquisa, porém, é a mesma para todos eles: existe uma grande diferença entre a maneira como cientistas e leigos enxergam um mesmo assunto, e isso impõe uma barreira considerável à comunicação da ciência com a sociedade sobre temas complexos. Veja abaixo um gráfico produzido pelo Pew Research Center, que resume os resultados da pesquisa:

Correção: Esse artigo foi modificado às 10h45 para esclarecer que os resultados da pesquisa do Pew Research Center referem-se ao porcentual de pessoas de cada grupo (cientistas vs. público geral) que concordaram com uma mesma afirmação, não que discordaram dela.

Frutas e vegetais em um supermercado na Califórnia. Foto: Herton Escobar

Pergunta: Você comeria um tomate todo recheado de DNA vegetal? E que tal um delicioso bife de fibras musculares bovinas, cheias de actina e miosina? Talvez com um embrião de galinha precoce, fritinho na manteiga, para acompanhar?

Pode parecer assustador (e até um pouco nojento) à primeira vista, mas praticamente tudo que você come -- seja planta, seja animal, orgânico, transgênico ou convencional, in natura ou processado -- está cheio de DNA, aquela famosa molécula em forma de escada retorcida, feita de adenina (A), timina (T), citosina (C), guanina (G), fósforo e açúcares. Aliás, não só de DNA, mas também de RNA, ribossomos, mitocôndrias, membranas celulares, retículos endoplasmáticos, milhões e milhões de diferentes proteínas e tudo mais que se pode esperar encontrar dentro uma célula. Por uma razão muito simples: todos os seres vivos são feitos de células, e todas as células contêm DNA. É a molécula básica da vida.

Muita gente, porém, não sabe ou nunca parou para pensar sobre isso. O que ajuda a explicar o resultado de uma pesquisa de opinião publicada no mês passado pelo Departamento de Economia Agrícola da Universidade Estadual de Oklahoma, nos EUA, segundo a qual 80% dos entrevistados disse ser a favor da "rotulagem obrigatória de alimentos contendo DNA". (Leia o estudo aqui: http://goo.gl/r6vF7y)

Avisar as pessoas de que um alimento "contém DNA", obviamente, não faz o menor sentido. Seria o mesmo que exigir a rotulagem de bebidas "contendo água". Uma informação 100% irrelevante, que só serviria para confundir o consumidor, dando a impressão de que o DNA é algo a ser temido. Não é.

Dizer que um alimento contém DNA é tão relevante quanto dizer que uma bebida contém água.

Curiosamente, o porcentual de pessoas que disseram ser favoráveis a rotulagem de "alimentos contendo DNA" é praticamente o mesmo de pessoas que defenderam a rotulagem de "alimentos produzidos com engenharia genética" -- uma maneira mais técnica (e mais assustadora, admito, apesar de não ser essa a intenção) de se referir aos "alimentos transgênicos". O que sugere -- assim como já foi constatado por outras pesquisas -- que o público em geral tem pouco conhecimento de biologia, menos ainda de biologia molecular, e muito menos ainda de engenharia genética. E como é natural do ser humano temer aquilo que não entende, é perfeitamente compreensível que a maioria das pessoas mantenham um pé atrás com relação aos transgênicos. Se elas têm receio de comer "alimentos com DNA", imagine então "alimentos geneticamente modificados"! Na dúvida, melhor evitar.

Do ponto de vista do consumo humano, porém, não há nenhuma diferença entre convencional e transgênico. Se você é uma erva daninha num campo de soja ou uma lagarta que gosta de atacar plantações de milho, aí sim, é bom ficar longe dos transgênicos. Se você é um ser humano comum pode ficar tranquilo, a soja e o milho transgênicos já são consumidos em grande escala há mais de 15 anos e não há nenhuma evidência de que eles possam causar qualquer mal ao meio ambiente ou à sua saúde (apesar de toda a polêmica). O DNA desses transgênicos é tão inofensivo para você quanto o de qualquer brócoli ou tomate orgânico que você come diariamente na sua salada.

Comunicação difícil

Entender o porquê dessa segurança, porém, não é uma tarefa simples. Exige a compreensão de uma série de conceitos de química, biologia molecular, ecologia, toxicologia, metabolismo e até evolução. E essa é grande dificuldade de se comunicar com o público sobre temas complexos da ciência -- dizer que faz mal e cultivar o medo do desconhecido é fácil; demonstrar que não faz mal e educar as pessoas sobre metabolismo de ácidos nucleicos é muito mais difícil.

Rato usado em pesquisas sobre lesões medulares na UFRJ. Foto: Paulo Vitor/Estadao

O que ajuda a explicar uma outra pesquisa publicada recentemente, na última edição da revista Science, segundo a qual 88% dos cientistas nos EUA acreditam que é seguro consumir alimentos transgênicos, versus 37%, apenas, da população em geral. (Clique aqui para mais detalhes: http://goo.gl/bflJPQ)

Os dados são de uma consulta realizada pelo Pew Research Center, em parceria com a Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS, publisher da Science), com a intenção de comparar as percepções do público leigo e da comunidade científica sobre temas polêmicos da atualidade. E elas são muito diferentes! Além dos alimentos transgênicos, foram abordadas a experimentação animal, o uso de pesticidas na agricultura, a influência humana nas mudanças climáticas, vacinação de crianças e evolução humana, entre outros. Veja alguns dos resultados abaixo:

Alimentos geneticamente modificados: 88% dos cientistas entendem que eles são seguros para comer, comparado a apenas 37% do público geral (esse foi o tema com a maior diferença de opinião entre os dois grupos: 51 pontos percentuais)

Uso de animais em pesquisa: 89% dos cientistas são a favor, ante 37% do público geral

Alimentos cultivados com o uso de pesticidas: 68% dos cientistas entendem que eles são seguros para consumo, comparado a 28% do público geral

Mudanças climáticas globais: 87% dos cientistas entendem que elas são causadas principalmente por atividades humanas, comparado a 50% do público geral que também coloca a culpa no homem

Evolução humana: 98% dos cientistas entende que os seres humanos evoluíram ao longo do tempo, comparado com 65% do público geral

Vacinação infantil: 86% dos cientistas entendem que vacinas como a tríplice contra sarampo, caxumba e rubéola deveriam ser obrigatórias na infância, comparado a 68% do público geral que pensa da mesma forma

Para entender porque a vacinação é um tema polêmico, leia aqui no blog: Disney, sarampo e a fantasia da vacina que causa autismo

Cada um desses temas, é claro, seria merecedor de uma longa discussão. A mensagem geral da pesquisa, porém, é a mesma para todos eles: existe uma grande diferença entre a maneira como cientistas e leigos enxergam um mesmo assunto, e isso impõe uma barreira considerável à comunicação da ciência com a sociedade sobre temas complexos. Veja abaixo um gráfico produzido pelo Pew Research Center, que resume os resultados da pesquisa:

Correção: Esse artigo foi modificado às 10h45 para esclarecer que os resultados da pesquisa do Pew Research Center referem-se ao porcentual de pessoas de cada grupo (cientistas vs. público geral) que concordaram com uma mesma afirmação, não que discordaram dela.

Frutas e vegetais em um supermercado na Califórnia. Foto: Herton Escobar

Pergunta: Você comeria um tomate todo recheado de DNA vegetal? E que tal um delicioso bife de fibras musculares bovinas, cheias de actina e miosina? Talvez com um embrião de galinha precoce, fritinho na manteiga, para acompanhar?

Pode parecer assustador (e até um pouco nojento) à primeira vista, mas praticamente tudo que você come -- seja planta, seja animal, orgânico, transgênico ou convencional, in natura ou processado -- está cheio de DNA, aquela famosa molécula em forma de escada retorcida, feita de adenina (A), timina (T), citosina (C), guanina (G), fósforo e açúcares. Aliás, não só de DNA, mas também de RNA, ribossomos, mitocôndrias, membranas celulares, retículos endoplasmáticos, milhões e milhões de diferentes proteínas e tudo mais que se pode esperar encontrar dentro uma célula. Por uma razão muito simples: todos os seres vivos são feitos de células, e todas as células contêm DNA. É a molécula básica da vida.

Muita gente, porém, não sabe ou nunca parou para pensar sobre isso. O que ajuda a explicar o resultado de uma pesquisa de opinião publicada no mês passado pelo Departamento de Economia Agrícola da Universidade Estadual de Oklahoma, nos EUA, segundo a qual 80% dos entrevistados disse ser a favor da "rotulagem obrigatória de alimentos contendo DNA". (Leia o estudo aqui: http://goo.gl/r6vF7y)

Avisar as pessoas de que um alimento "contém DNA", obviamente, não faz o menor sentido. Seria o mesmo que exigir a rotulagem de bebidas "contendo água". Uma informação 100% irrelevante, que só serviria para confundir o consumidor, dando a impressão de que o DNA é algo a ser temido. Não é.

Dizer que um alimento contém DNA é tão relevante quanto dizer que uma bebida contém água.

Curiosamente, o porcentual de pessoas que disseram ser favoráveis a rotulagem de "alimentos contendo DNA" é praticamente o mesmo de pessoas que defenderam a rotulagem de "alimentos produzidos com engenharia genética" -- uma maneira mais técnica (e mais assustadora, admito, apesar de não ser essa a intenção) de se referir aos "alimentos transgênicos". O que sugere -- assim como já foi constatado por outras pesquisas -- que o público em geral tem pouco conhecimento de biologia, menos ainda de biologia molecular, e muito menos ainda de engenharia genética. E como é natural do ser humano temer aquilo que não entende, é perfeitamente compreensível que a maioria das pessoas mantenham um pé atrás com relação aos transgênicos. Se elas têm receio de comer "alimentos com DNA", imagine então "alimentos geneticamente modificados"! Na dúvida, melhor evitar.

Do ponto de vista do consumo humano, porém, não há nenhuma diferença entre convencional e transgênico. Se você é uma erva daninha num campo de soja ou uma lagarta que gosta de atacar plantações de milho, aí sim, é bom ficar longe dos transgênicos. Se você é um ser humano comum pode ficar tranquilo, a soja e o milho transgênicos já são consumidos em grande escala há mais de 15 anos e não há nenhuma evidência de que eles possam causar qualquer mal ao meio ambiente ou à sua saúde (apesar de toda a polêmica). O DNA desses transgênicos é tão inofensivo para você quanto o de qualquer brócoli ou tomate orgânico que você come diariamente na sua salada.

Comunicação difícil

Entender o porquê dessa segurança, porém, não é uma tarefa simples. Exige a compreensão de uma série de conceitos de química, biologia molecular, ecologia, toxicologia, metabolismo e até evolução. E essa é grande dificuldade de se comunicar com o público sobre temas complexos da ciência -- dizer que faz mal e cultivar o medo do desconhecido é fácil; demonstrar que não faz mal e educar as pessoas sobre metabolismo de ácidos nucleicos é muito mais difícil.

Rato usado em pesquisas sobre lesões medulares na UFRJ. Foto: Paulo Vitor/Estadao

O que ajuda a explicar uma outra pesquisa publicada recentemente, na última edição da revista Science, segundo a qual 88% dos cientistas nos EUA acreditam que é seguro consumir alimentos transgênicos, versus 37%, apenas, da população em geral. (Clique aqui para mais detalhes: http://goo.gl/bflJPQ)

Os dados são de uma consulta realizada pelo Pew Research Center, em parceria com a Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS, publisher da Science), com a intenção de comparar as percepções do público leigo e da comunidade científica sobre temas polêmicos da atualidade. E elas são muito diferentes! Além dos alimentos transgênicos, foram abordadas a experimentação animal, o uso de pesticidas na agricultura, a influência humana nas mudanças climáticas, vacinação de crianças e evolução humana, entre outros. Veja alguns dos resultados abaixo:

Alimentos geneticamente modificados: 88% dos cientistas entendem que eles são seguros para comer, comparado a apenas 37% do público geral (esse foi o tema com a maior diferença de opinião entre os dois grupos: 51 pontos percentuais)

Uso de animais em pesquisa: 89% dos cientistas são a favor, ante 37% do público geral

Alimentos cultivados com o uso de pesticidas: 68% dos cientistas entendem que eles são seguros para consumo, comparado a 28% do público geral

Mudanças climáticas globais: 87% dos cientistas entendem que elas são causadas principalmente por atividades humanas, comparado a 50% do público geral que também coloca a culpa no homem

Evolução humana: 98% dos cientistas entende que os seres humanos evoluíram ao longo do tempo, comparado com 65% do público geral

Vacinação infantil: 86% dos cientistas entendem que vacinas como a tríplice contra sarampo, caxumba e rubéola deveriam ser obrigatórias na infância, comparado a 68% do público geral que pensa da mesma forma

Para entender porque a vacinação é um tema polêmico, leia aqui no blog: Disney, sarampo e a fantasia da vacina que causa autismo

Cada um desses temas, é claro, seria merecedor de uma longa discussão. A mensagem geral da pesquisa, porém, é a mesma para todos eles: existe uma grande diferença entre a maneira como cientistas e leigos enxergam um mesmo assunto, e isso impõe uma barreira considerável à comunicação da ciência com a sociedade sobre temas complexos. Veja abaixo um gráfico produzido pelo Pew Research Center, que resume os resultados da pesquisa:

Correção: Esse artigo foi modificado às 10h45 para esclarecer que os resultados da pesquisa do Pew Research Center referem-se ao porcentual de pessoas de cada grupo (cientistas vs. público geral) que concordaram com uma mesma afirmação, não que discordaram dela.

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