Thomaz e João Farkas, pai e filho, têm obras lançadas sobre o Brasil profundo


Viagens para a Amazônia dão origem à exposição e livro

Por Antonio Gonçalves Filho

Uma coincidência faz com que pai e filho estejam novamente reunidos, mesmo após a morte do primeiro. Uma entre muitas, evoque-se. Thomaz Farkas (1924-2011), o pai, era fotógrafo. O filho, João Farkas, 70, também fotógrafo, faz exposição e lança um livro sobre a Amazônia, que percorreu em 1985, dez anos após o pai ter registrado a mesma viagem. Thomaz ganha igualmente um livro dedicado a ele (com suas fotos de Brasília) pela gráfica Ipsis. Outra coincidência: Thomaz ganhou sua primeira câmera fotográfica aos oito anos, do pai Desidério, empresário húngaro que criou no Brasil a rede de lojas Fotoptica. João Farkas, ao completar oito anos, também foi presenteado pelo pai com uma Voigtländer.

Como se vê, Thomas Farkas não exagerava quando dizia aos filhos que o hipossulfito corria nas veias da família. Nascido em Budapeste e criado no bairro do Pacaembu, em São Paulo, Thomaz viveu a vida toda rodeado de câmeras. A família Farkas já era sócia da família Hatschek (sobrenome de sua mãe Thereza) em Budapeste, antes de Desidério se instalar no Brasil e continuar os negócios aqui. Único filho do casal, Thomas teve quatro filhos: Beatriz, Pedro, João e Kiko. Pedro Farkas, como se sabe, é um dos grandes fotógrafos do cinema brasileiro (A Ostra e o Vento, Inocência). Kiko é designer e supervisiona a edição dos livros do clã. João, que começou sua carreira como poeta, não resistiu ao chamado da fotografia.

A exemplo do pai, um dos pioneiros da foto abstrata brasileira, João enveredou pelo documental e é hoje um dos poucos fotógrafos brasileiros a integrar o seleto acervo da Maison Européenne de la Photographie, que este ano comprou 16 imagens dele, justamente as da exposição Amazônia Ocupada, na Galeria Marcelo Guarnieri. Lá estão 34 fotos feitas entre 1984 e 1993 no território amazônico, então em processo de ocupação por garimpeiros. Nas diversas viagens à região, ele chegou a registrar 12 mil imagens históricas em zonas de difícil acesso. Dessas, 120 estão no livro que tem o mesmo título da mostra. Ele chega agora às livrarias, numa edição conjunta das Edições Sesc e Editora Madalena que custa R$ 110. Paralelamente à exposição na galeria, João mostra mais 70 fotos da série amazônica no Sesc Bom Retiro.

continua após a publicidade
Compassivo. João Farkas e o povo sofrido da Amazônia Foto: Tiago Queiroz|Estadão

João Farkas era criança quando viajou com o pai e a mãe ela primeira vez à Amazônia. Adolescente, formou-se vendo as imagens que George Love (1937-1995) registrava para a extinta revista Realidade (seu livro é dedicado ao fotógrafo norte-americano). Love e Claudia Andujar foram pioneiros ao fotografar índios da região. Os primeiros habitantes também estão na Amazônia Ocupada de João, mas já aculturados. Na mostra e no livro, o panorama do lugar que guarda um terço da reserva mundial de florestas não é idílico nem paradisíaco. É a terra desolada do garimpo, da prostituição e de migrantes do Sul que tentaram a sorte por lá.

O fotógrafo compara esses pioneiros ao intrépido herói islandês do livro Gente Independente, de Halldór Laxness, um rude trabalhador que se recusa a deixar sua terra e partir, mesmo enfrentando condições adversas. “Os pioneiros têm orgulho, sentem-se donos do próprio nariz”, observa. Também porque estavam numa região que o Brasil considera o fim do mundo, eles precisavam de um registro dessa obstinação. “Então, a relação com o fotógrafo mudou, pois meu testemunho passou a ser valioso para eles”. De imediato, o que se vê nas fotos de colonos e garimpeiros é uma disposição voluntária de posar. São imagens comoventes de pessoas simples, mas fiéis aos seus princípios.

continua após a publicidade
reference

O pai Thomaz retratou essa gente amazônica há 40 anos com o mesmo olhar compassivo. Na época, 1975, convidado pelo cineasta Geraldo Sarno e o zoólogo e compositor Paulo Vanzolini, embarcou numa viagem pelo Rio Negro, como costumava fazer nos anos 1960, ao liderar a Caravana Farkas (leia texto nesta página), que deu ao Brasil alguns dos melhores documentários sobre o povo e a cultura do Brasil. Homem de firme convicção ideológica, Thomaz, que começou sua carreira ligado do fotocineclubismo, deixou de lado as pesquisas formais abstratas e partiu para o registro documental por influência do arquiteto Vilanova Artigas (1915-1985) e do escritor baiano Jorge Amado (1912-2001). Outra grande influência foi o fotojornalista piauiense José Medeiros (1921-1990).

reference
continua após a publicidade

O acervo de Thomas Farkas, hoje cedido em comodato ao Instituto Moreira Salles, tem 35 mil negativos. “Há ainda muitas imagens familiares e fotos que ficaram guardadas anos em caixas”, revela João. Thomaz não ligava para essa história de ser um ícone da foto experimental e demorou para se decidir a lançar um livro seu. Ex-integrante do Foto Cine Clube Bandeirante, onde ingressou aos 18 anos, suas construções geométricas nada ficavam a dever aos construtivistas russos. As fotos do livro que a Ipsis lança agora constitui uma prova vigorosa de seu interesse pela arquitetura: são imagens que registram Brasília em obras, entre 1958 e 1960, e a capital 40 anos depois, entre 1998 e 2000. “O curioso é que encontramos fotos coloridas feitas na época da construção”, diz João. “Ele sempre se interessou por inovações tecnológicas e, aos 80 anos, mostrou entusiasmo pela fotografia digital”. Pena que ela chegou tarde para o pai. Mas não para o filho.

AMAZÔNIA OCUPADA Galeria Marcelo Guarnieri. Alameda Lorena, 1.966, tel. 3063-5410. Sesc Bom Retiro. Al. Nothmann, 185, tel. 3332-3600.

Uma coincidência faz com que pai e filho estejam novamente reunidos, mesmo após a morte do primeiro. Uma entre muitas, evoque-se. Thomaz Farkas (1924-2011), o pai, era fotógrafo. O filho, João Farkas, 70, também fotógrafo, faz exposição e lança um livro sobre a Amazônia, que percorreu em 1985, dez anos após o pai ter registrado a mesma viagem. Thomaz ganha igualmente um livro dedicado a ele (com suas fotos de Brasília) pela gráfica Ipsis. Outra coincidência: Thomaz ganhou sua primeira câmera fotográfica aos oito anos, do pai Desidério, empresário húngaro que criou no Brasil a rede de lojas Fotoptica. João Farkas, ao completar oito anos, também foi presenteado pelo pai com uma Voigtländer.

Como se vê, Thomas Farkas não exagerava quando dizia aos filhos que o hipossulfito corria nas veias da família. Nascido em Budapeste e criado no bairro do Pacaembu, em São Paulo, Thomaz viveu a vida toda rodeado de câmeras. A família Farkas já era sócia da família Hatschek (sobrenome de sua mãe Thereza) em Budapeste, antes de Desidério se instalar no Brasil e continuar os negócios aqui. Único filho do casal, Thomas teve quatro filhos: Beatriz, Pedro, João e Kiko. Pedro Farkas, como se sabe, é um dos grandes fotógrafos do cinema brasileiro (A Ostra e o Vento, Inocência). Kiko é designer e supervisiona a edição dos livros do clã. João, que começou sua carreira como poeta, não resistiu ao chamado da fotografia.

A exemplo do pai, um dos pioneiros da foto abstrata brasileira, João enveredou pelo documental e é hoje um dos poucos fotógrafos brasileiros a integrar o seleto acervo da Maison Européenne de la Photographie, que este ano comprou 16 imagens dele, justamente as da exposição Amazônia Ocupada, na Galeria Marcelo Guarnieri. Lá estão 34 fotos feitas entre 1984 e 1993 no território amazônico, então em processo de ocupação por garimpeiros. Nas diversas viagens à região, ele chegou a registrar 12 mil imagens históricas em zonas de difícil acesso. Dessas, 120 estão no livro que tem o mesmo título da mostra. Ele chega agora às livrarias, numa edição conjunta das Edições Sesc e Editora Madalena que custa R$ 110. Paralelamente à exposição na galeria, João mostra mais 70 fotos da série amazônica no Sesc Bom Retiro.

Compassivo. João Farkas e o povo sofrido da Amazônia Foto: Tiago Queiroz|Estadão

João Farkas era criança quando viajou com o pai e a mãe ela primeira vez à Amazônia. Adolescente, formou-se vendo as imagens que George Love (1937-1995) registrava para a extinta revista Realidade (seu livro é dedicado ao fotógrafo norte-americano). Love e Claudia Andujar foram pioneiros ao fotografar índios da região. Os primeiros habitantes também estão na Amazônia Ocupada de João, mas já aculturados. Na mostra e no livro, o panorama do lugar que guarda um terço da reserva mundial de florestas não é idílico nem paradisíaco. É a terra desolada do garimpo, da prostituição e de migrantes do Sul que tentaram a sorte por lá.

O fotógrafo compara esses pioneiros ao intrépido herói islandês do livro Gente Independente, de Halldór Laxness, um rude trabalhador que se recusa a deixar sua terra e partir, mesmo enfrentando condições adversas. “Os pioneiros têm orgulho, sentem-se donos do próprio nariz”, observa. Também porque estavam numa região que o Brasil considera o fim do mundo, eles precisavam de um registro dessa obstinação. “Então, a relação com o fotógrafo mudou, pois meu testemunho passou a ser valioso para eles”. De imediato, o que se vê nas fotos de colonos e garimpeiros é uma disposição voluntária de posar. São imagens comoventes de pessoas simples, mas fiéis aos seus princípios.

reference

O pai Thomaz retratou essa gente amazônica há 40 anos com o mesmo olhar compassivo. Na época, 1975, convidado pelo cineasta Geraldo Sarno e o zoólogo e compositor Paulo Vanzolini, embarcou numa viagem pelo Rio Negro, como costumava fazer nos anos 1960, ao liderar a Caravana Farkas (leia texto nesta página), que deu ao Brasil alguns dos melhores documentários sobre o povo e a cultura do Brasil. Homem de firme convicção ideológica, Thomaz, que começou sua carreira ligado do fotocineclubismo, deixou de lado as pesquisas formais abstratas e partiu para o registro documental por influência do arquiteto Vilanova Artigas (1915-1985) e do escritor baiano Jorge Amado (1912-2001). Outra grande influência foi o fotojornalista piauiense José Medeiros (1921-1990).

reference

O acervo de Thomas Farkas, hoje cedido em comodato ao Instituto Moreira Salles, tem 35 mil negativos. “Há ainda muitas imagens familiares e fotos que ficaram guardadas anos em caixas”, revela João. Thomaz não ligava para essa história de ser um ícone da foto experimental e demorou para se decidir a lançar um livro seu. Ex-integrante do Foto Cine Clube Bandeirante, onde ingressou aos 18 anos, suas construções geométricas nada ficavam a dever aos construtivistas russos. As fotos do livro que a Ipsis lança agora constitui uma prova vigorosa de seu interesse pela arquitetura: são imagens que registram Brasília em obras, entre 1958 e 1960, e a capital 40 anos depois, entre 1998 e 2000. “O curioso é que encontramos fotos coloridas feitas na época da construção”, diz João. “Ele sempre se interessou por inovações tecnológicas e, aos 80 anos, mostrou entusiasmo pela fotografia digital”. Pena que ela chegou tarde para o pai. Mas não para o filho.

AMAZÔNIA OCUPADA Galeria Marcelo Guarnieri. Alameda Lorena, 1.966, tel. 3063-5410. Sesc Bom Retiro. Al. Nothmann, 185, tel. 3332-3600.

Uma coincidência faz com que pai e filho estejam novamente reunidos, mesmo após a morte do primeiro. Uma entre muitas, evoque-se. Thomaz Farkas (1924-2011), o pai, era fotógrafo. O filho, João Farkas, 70, também fotógrafo, faz exposição e lança um livro sobre a Amazônia, que percorreu em 1985, dez anos após o pai ter registrado a mesma viagem. Thomaz ganha igualmente um livro dedicado a ele (com suas fotos de Brasília) pela gráfica Ipsis. Outra coincidência: Thomaz ganhou sua primeira câmera fotográfica aos oito anos, do pai Desidério, empresário húngaro que criou no Brasil a rede de lojas Fotoptica. João Farkas, ao completar oito anos, também foi presenteado pelo pai com uma Voigtländer.

Como se vê, Thomas Farkas não exagerava quando dizia aos filhos que o hipossulfito corria nas veias da família. Nascido em Budapeste e criado no bairro do Pacaembu, em São Paulo, Thomaz viveu a vida toda rodeado de câmeras. A família Farkas já era sócia da família Hatschek (sobrenome de sua mãe Thereza) em Budapeste, antes de Desidério se instalar no Brasil e continuar os negócios aqui. Único filho do casal, Thomas teve quatro filhos: Beatriz, Pedro, João e Kiko. Pedro Farkas, como se sabe, é um dos grandes fotógrafos do cinema brasileiro (A Ostra e o Vento, Inocência). Kiko é designer e supervisiona a edição dos livros do clã. João, que começou sua carreira como poeta, não resistiu ao chamado da fotografia.

A exemplo do pai, um dos pioneiros da foto abstrata brasileira, João enveredou pelo documental e é hoje um dos poucos fotógrafos brasileiros a integrar o seleto acervo da Maison Européenne de la Photographie, que este ano comprou 16 imagens dele, justamente as da exposição Amazônia Ocupada, na Galeria Marcelo Guarnieri. Lá estão 34 fotos feitas entre 1984 e 1993 no território amazônico, então em processo de ocupação por garimpeiros. Nas diversas viagens à região, ele chegou a registrar 12 mil imagens históricas em zonas de difícil acesso. Dessas, 120 estão no livro que tem o mesmo título da mostra. Ele chega agora às livrarias, numa edição conjunta das Edições Sesc e Editora Madalena que custa R$ 110. Paralelamente à exposição na galeria, João mostra mais 70 fotos da série amazônica no Sesc Bom Retiro.

Compassivo. João Farkas e o povo sofrido da Amazônia Foto: Tiago Queiroz|Estadão

João Farkas era criança quando viajou com o pai e a mãe ela primeira vez à Amazônia. Adolescente, formou-se vendo as imagens que George Love (1937-1995) registrava para a extinta revista Realidade (seu livro é dedicado ao fotógrafo norte-americano). Love e Claudia Andujar foram pioneiros ao fotografar índios da região. Os primeiros habitantes também estão na Amazônia Ocupada de João, mas já aculturados. Na mostra e no livro, o panorama do lugar que guarda um terço da reserva mundial de florestas não é idílico nem paradisíaco. É a terra desolada do garimpo, da prostituição e de migrantes do Sul que tentaram a sorte por lá.

O fotógrafo compara esses pioneiros ao intrépido herói islandês do livro Gente Independente, de Halldór Laxness, um rude trabalhador que se recusa a deixar sua terra e partir, mesmo enfrentando condições adversas. “Os pioneiros têm orgulho, sentem-se donos do próprio nariz”, observa. Também porque estavam numa região que o Brasil considera o fim do mundo, eles precisavam de um registro dessa obstinação. “Então, a relação com o fotógrafo mudou, pois meu testemunho passou a ser valioso para eles”. De imediato, o que se vê nas fotos de colonos e garimpeiros é uma disposição voluntária de posar. São imagens comoventes de pessoas simples, mas fiéis aos seus princípios.

reference

O pai Thomaz retratou essa gente amazônica há 40 anos com o mesmo olhar compassivo. Na época, 1975, convidado pelo cineasta Geraldo Sarno e o zoólogo e compositor Paulo Vanzolini, embarcou numa viagem pelo Rio Negro, como costumava fazer nos anos 1960, ao liderar a Caravana Farkas (leia texto nesta página), que deu ao Brasil alguns dos melhores documentários sobre o povo e a cultura do Brasil. Homem de firme convicção ideológica, Thomaz, que começou sua carreira ligado do fotocineclubismo, deixou de lado as pesquisas formais abstratas e partiu para o registro documental por influência do arquiteto Vilanova Artigas (1915-1985) e do escritor baiano Jorge Amado (1912-2001). Outra grande influência foi o fotojornalista piauiense José Medeiros (1921-1990).

reference

O acervo de Thomas Farkas, hoje cedido em comodato ao Instituto Moreira Salles, tem 35 mil negativos. “Há ainda muitas imagens familiares e fotos que ficaram guardadas anos em caixas”, revela João. Thomaz não ligava para essa história de ser um ícone da foto experimental e demorou para se decidir a lançar um livro seu. Ex-integrante do Foto Cine Clube Bandeirante, onde ingressou aos 18 anos, suas construções geométricas nada ficavam a dever aos construtivistas russos. As fotos do livro que a Ipsis lança agora constitui uma prova vigorosa de seu interesse pela arquitetura: são imagens que registram Brasília em obras, entre 1958 e 1960, e a capital 40 anos depois, entre 1998 e 2000. “O curioso é que encontramos fotos coloridas feitas na época da construção”, diz João. “Ele sempre se interessou por inovações tecnológicas e, aos 80 anos, mostrou entusiasmo pela fotografia digital”. Pena que ela chegou tarde para o pai. Mas não para o filho.

AMAZÔNIA OCUPADA Galeria Marcelo Guarnieri. Alameda Lorena, 1.966, tel. 3063-5410. Sesc Bom Retiro. Al. Nothmann, 185, tel. 3332-3600.

Uma coincidência faz com que pai e filho estejam novamente reunidos, mesmo após a morte do primeiro. Uma entre muitas, evoque-se. Thomaz Farkas (1924-2011), o pai, era fotógrafo. O filho, João Farkas, 70, também fotógrafo, faz exposição e lança um livro sobre a Amazônia, que percorreu em 1985, dez anos após o pai ter registrado a mesma viagem. Thomaz ganha igualmente um livro dedicado a ele (com suas fotos de Brasília) pela gráfica Ipsis. Outra coincidência: Thomaz ganhou sua primeira câmera fotográfica aos oito anos, do pai Desidério, empresário húngaro que criou no Brasil a rede de lojas Fotoptica. João Farkas, ao completar oito anos, também foi presenteado pelo pai com uma Voigtländer.

Como se vê, Thomas Farkas não exagerava quando dizia aos filhos que o hipossulfito corria nas veias da família. Nascido em Budapeste e criado no bairro do Pacaembu, em São Paulo, Thomaz viveu a vida toda rodeado de câmeras. A família Farkas já era sócia da família Hatschek (sobrenome de sua mãe Thereza) em Budapeste, antes de Desidério se instalar no Brasil e continuar os negócios aqui. Único filho do casal, Thomas teve quatro filhos: Beatriz, Pedro, João e Kiko. Pedro Farkas, como se sabe, é um dos grandes fotógrafos do cinema brasileiro (A Ostra e o Vento, Inocência). Kiko é designer e supervisiona a edição dos livros do clã. João, que começou sua carreira como poeta, não resistiu ao chamado da fotografia.

A exemplo do pai, um dos pioneiros da foto abstrata brasileira, João enveredou pelo documental e é hoje um dos poucos fotógrafos brasileiros a integrar o seleto acervo da Maison Européenne de la Photographie, que este ano comprou 16 imagens dele, justamente as da exposição Amazônia Ocupada, na Galeria Marcelo Guarnieri. Lá estão 34 fotos feitas entre 1984 e 1993 no território amazônico, então em processo de ocupação por garimpeiros. Nas diversas viagens à região, ele chegou a registrar 12 mil imagens históricas em zonas de difícil acesso. Dessas, 120 estão no livro que tem o mesmo título da mostra. Ele chega agora às livrarias, numa edição conjunta das Edições Sesc e Editora Madalena que custa R$ 110. Paralelamente à exposição na galeria, João mostra mais 70 fotos da série amazônica no Sesc Bom Retiro.

Compassivo. João Farkas e o povo sofrido da Amazônia Foto: Tiago Queiroz|Estadão

João Farkas era criança quando viajou com o pai e a mãe ela primeira vez à Amazônia. Adolescente, formou-se vendo as imagens que George Love (1937-1995) registrava para a extinta revista Realidade (seu livro é dedicado ao fotógrafo norte-americano). Love e Claudia Andujar foram pioneiros ao fotografar índios da região. Os primeiros habitantes também estão na Amazônia Ocupada de João, mas já aculturados. Na mostra e no livro, o panorama do lugar que guarda um terço da reserva mundial de florestas não é idílico nem paradisíaco. É a terra desolada do garimpo, da prostituição e de migrantes do Sul que tentaram a sorte por lá.

O fotógrafo compara esses pioneiros ao intrépido herói islandês do livro Gente Independente, de Halldór Laxness, um rude trabalhador que se recusa a deixar sua terra e partir, mesmo enfrentando condições adversas. “Os pioneiros têm orgulho, sentem-se donos do próprio nariz”, observa. Também porque estavam numa região que o Brasil considera o fim do mundo, eles precisavam de um registro dessa obstinação. “Então, a relação com o fotógrafo mudou, pois meu testemunho passou a ser valioso para eles”. De imediato, o que se vê nas fotos de colonos e garimpeiros é uma disposição voluntária de posar. São imagens comoventes de pessoas simples, mas fiéis aos seus princípios.

reference

O pai Thomaz retratou essa gente amazônica há 40 anos com o mesmo olhar compassivo. Na época, 1975, convidado pelo cineasta Geraldo Sarno e o zoólogo e compositor Paulo Vanzolini, embarcou numa viagem pelo Rio Negro, como costumava fazer nos anos 1960, ao liderar a Caravana Farkas (leia texto nesta página), que deu ao Brasil alguns dos melhores documentários sobre o povo e a cultura do Brasil. Homem de firme convicção ideológica, Thomaz, que começou sua carreira ligado do fotocineclubismo, deixou de lado as pesquisas formais abstratas e partiu para o registro documental por influência do arquiteto Vilanova Artigas (1915-1985) e do escritor baiano Jorge Amado (1912-2001). Outra grande influência foi o fotojornalista piauiense José Medeiros (1921-1990).

reference

O acervo de Thomas Farkas, hoje cedido em comodato ao Instituto Moreira Salles, tem 35 mil negativos. “Há ainda muitas imagens familiares e fotos que ficaram guardadas anos em caixas”, revela João. Thomaz não ligava para essa história de ser um ícone da foto experimental e demorou para se decidir a lançar um livro seu. Ex-integrante do Foto Cine Clube Bandeirante, onde ingressou aos 18 anos, suas construções geométricas nada ficavam a dever aos construtivistas russos. As fotos do livro que a Ipsis lança agora constitui uma prova vigorosa de seu interesse pela arquitetura: são imagens que registram Brasília em obras, entre 1958 e 1960, e a capital 40 anos depois, entre 1998 e 2000. “O curioso é que encontramos fotos coloridas feitas na época da construção”, diz João. “Ele sempre se interessou por inovações tecnológicas e, aos 80 anos, mostrou entusiasmo pela fotografia digital”. Pena que ela chegou tarde para o pai. Mas não para o filho.

AMAZÔNIA OCUPADA Galeria Marcelo Guarnieri. Alameda Lorena, 1.966, tel. 3063-5410. Sesc Bom Retiro. Al. Nothmann, 185, tel. 3332-3600.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.