Artistas da Bendita Trupe fazem estudo sério, mas inocente


Peça Miserê Bandalha, em cartaz, poderia fazer mais do que pesquisa cênica

Por Agencia Estado

São cada vez mais freqüentes os artistas de teatro que assumem a criação desde a narrativa até a formalização cênica. Os grupos de criação, sem desdenhar os problemas de linguagem, têm reafirmado o valor da observação direta como material para a invenção artística. Assim foi o processo de construção de Miserê Bandalha, espetáculo criado coletivamente pela Bendita Trupe. Assunto, personagens e desenvolvimento da narrativa estão impregnados do material de pesquisa que os artistas utilizaram na criação do trabalho. E, neste caso, o estudo sério aparece em primeiro plano no resultado cênico. Testemunhas do seu tempo, os artistas da Bendita Trupe elegeram como tema o território cada vez mais vasto do crime organizado, ponto em que se focaliza também o interesse dos meios de comunicação de massa neste momento. O cinema ficcional, os documentários e a música nos lembram incessantemente da contigüidade geográfica entre bandidos e cidadãos honestos, da conivência entre políticos e criminosos e da troca de conhecimento entre esses dois estratos sociais. Apesar dessa massa de informações posta em circulação, o espetáculo criado pela Bendita Trupe parece-nos ter a inocência das primeiras descobertas. Miserê Bandalha exibe, com um tom de espanto, entre indignado e fascinado, a aglutinação de um grupo de jovens para brincar de surfe ou qualquer jogo adolescente, depois o recrutamento para o crime organizado e, em seguida, o cotidiano "empresarial" de um negócio que, fazendo-se as mudanças devidas, funciona como qualquer outro. Eliminar a concorrência, por exemplo, tem um sentido literal. Além disso, o comércio de drogas e armas conquista novos mercados, tem estratégias de publicidade, preocupa-se com a diminuição de custos operacionais, etc. Enfim, segue o padrão de outras atividades empresariais. Mundo ao reverso, em que tudo funciona a contento para a prosperidade dos donos do capital - estão do "lado" certo da vida errada" - e não tão bem para os assalariados, o universo representado pelo espetáculo não difere do que se apresenta no noticiário policial e nos estudos sobre a criminalidade entre os jovens pobres. Bem explicado através da organização das cenas, o aspecto racional do crime como negócio e poder político se sobrepõe a considerações de fundo humanitário. Agentes inconscientes desse cenário, os jovens marginais, ocupando diferentes lugares na escala administrativa do crime, obedecem às convenções lingüísticas e comportamentais do ambiente. São representados em cena com fidelidade que nos parece etnográfica. A concepção cênica, orientada por Johana Albuquerque, tem a alta voltagem física e sonora desse mundo paralelo (margem, morro ou periferia), onde se comprimem multidões em espaços pequenos obrigando as figuras à velocidade, à exacerbação da fala e dos gestos e a uma constante reivindicação por visibilidade. Essa imitação escrupulosa parece-nos, neste caso, excessiva. Os personagens berram mais do que falam, pulam sem cessar, sugerindo alterações químicas no organismo e debilidade cultural que não lhes permite viver outra coisa além das injunções do presente. É um esforço distinguir um personagem do outro porque não diferem pelo objetivo ou linguagem. Essa homogeneidade - plenamente justificada por argumentos sociológicos - não funciona bem como resultado cênico. Cenas histéricas, sem nenhum engodo empático, tornam-se mais cansativas do que assustadoras. Concebido e executado por um grupo muito sério, Miserê Bandalha faz exatamente o que se propõe a fazer: pesquisa cênica. E, no entanto, o grupo tem todas as condições para fazer mais do que isso. Inteligência de soluções visuais, técnica de atuação apurada e vigor intelectual estão visíveis em cena, postos a serviço de uma comunicação importante. Nas obras de invenção, contudo, podem entrar o imaginado no lugar do visto, o medo dos narradores, os silêncios raros, desejados ou temidos, a imobilidade pensativa e tantas outras coisas que, por contraste, transcendem o universo pesquisado e o tornam uma passagem aberta para outras situações e experiências. Miserê Bandalha. 85 min. 14 anos. Teatro João Caetano (438 lug.). R. Borges Lagoa, 650, V. Clementino, 5573-3774, metrô Santa Cruz. 6.ª e sáb., 21h; dom., 20h30. R$ 10. Até 30/4.

São cada vez mais freqüentes os artistas de teatro que assumem a criação desde a narrativa até a formalização cênica. Os grupos de criação, sem desdenhar os problemas de linguagem, têm reafirmado o valor da observação direta como material para a invenção artística. Assim foi o processo de construção de Miserê Bandalha, espetáculo criado coletivamente pela Bendita Trupe. Assunto, personagens e desenvolvimento da narrativa estão impregnados do material de pesquisa que os artistas utilizaram na criação do trabalho. E, neste caso, o estudo sério aparece em primeiro plano no resultado cênico. Testemunhas do seu tempo, os artistas da Bendita Trupe elegeram como tema o território cada vez mais vasto do crime organizado, ponto em que se focaliza também o interesse dos meios de comunicação de massa neste momento. O cinema ficcional, os documentários e a música nos lembram incessantemente da contigüidade geográfica entre bandidos e cidadãos honestos, da conivência entre políticos e criminosos e da troca de conhecimento entre esses dois estratos sociais. Apesar dessa massa de informações posta em circulação, o espetáculo criado pela Bendita Trupe parece-nos ter a inocência das primeiras descobertas. Miserê Bandalha exibe, com um tom de espanto, entre indignado e fascinado, a aglutinação de um grupo de jovens para brincar de surfe ou qualquer jogo adolescente, depois o recrutamento para o crime organizado e, em seguida, o cotidiano "empresarial" de um negócio que, fazendo-se as mudanças devidas, funciona como qualquer outro. Eliminar a concorrência, por exemplo, tem um sentido literal. Além disso, o comércio de drogas e armas conquista novos mercados, tem estratégias de publicidade, preocupa-se com a diminuição de custos operacionais, etc. Enfim, segue o padrão de outras atividades empresariais. Mundo ao reverso, em que tudo funciona a contento para a prosperidade dos donos do capital - estão do "lado" certo da vida errada" - e não tão bem para os assalariados, o universo representado pelo espetáculo não difere do que se apresenta no noticiário policial e nos estudos sobre a criminalidade entre os jovens pobres. Bem explicado através da organização das cenas, o aspecto racional do crime como negócio e poder político se sobrepõe a considerações de fundo humanitário. Agentes inconscientes desse cenário, os jovens marginais, ocupando diferentes lugares na escala administrativa do crime, obedecem às convenções lingüísticas e comportamentais do ambiente. São representados em cena com fidelidade que nos parece etnográfica. A concepção cênica, orientada por Johana Albuquerque, tem a alta voltagem física e sonora desse mundo paralelo (margem, morro ou periferia), onde se comprimem multidões em espaços pequenos obrigando as figuras à velocidade, à exacerbação da fala e dos gestos e a uma constante reivindicação por visibilidade. Essa imitação escrupulosa parece-nos, neste caso, excessiva. Os personagens berram mais do que falam, pulam sem cessar, sugerindo alterações químicas no organismo e debilidade cultural que não lhes permite viver outra coisa além das injunções do presente. É um esforço distinguir um personagem do outro porque não diferem pelo objetivo ou linguagem. Essa homogeneidade - plenamente justificada por argumentos sociológicos - não funciona bem como resultado cênico. Cenas histéricas, sem nenhum engodo empático, tornam-se mais cansativas do que assustadoras. Concebido e executado por um grupo muito sério, Miserê Bandalha faz exatamente o que se propõe a fazer: pesquisa cênica. E, no entanto, o grupo tem todas as condições para fazer mais do que isso. Inteligência de soluções visuais, técnica de atuação apurada e vigor intelectual estão visíveis em cena, postos a serviço de uma comunicação importante. Nas obras de invenção, contudo, podem entrar o imaginado no lugar do visto, o medo dos narradores, os silêncios raros, desejados ou temidos, a imobilidade pensativa e tantas outras coisas que, por contraste, transcendem o universo pesquisado e o tornam uma passagem aberta para outras situações e experiências. Miserê Bandalha. 85 min. 14 anos. Teatro João Caetano (438 lug.). R. Borges Lagoa, 650, V. Clementino, 5573-3774, metrô Santa Cruz. 6.ª e sáb., 21h; dom., 20h30. R$ 10. Até 30/4.

São cada vez mais freqüentes os artistas de teatro que assumem a criação desde a narrativa até a formalização cênica. Os grupos de criação, sem desdenhar os problemas de linguagem, têm reafirmado o valor da observação direta como material para a invenção artística. Assim foi o processo de construção de Miserê Bandalha, espetáculo criado coletivamente pela Bendita Trupe. Assunto, personagens e desenvolvimento da narrativa estão impregnados do material de pesquisa que os artistas utilizaram na criação do trabalho. E, neste caso, o estudo sério aparece em primeiro plano no resultado cênico. Testemunhas do seu tempo, os artistas da Bendita Trupe elegeram como tema o território cada vez mais vasto do crime organizado, ponto em que se focaliza também o interesse dos meios de comunicação de massa neste momento. O cinema ficcional, os documentários e a música nos lembram incessantemente da contigüidade geográfica entre bandidos e cidadãos honestos, da conivência entre políticos e criminosos e da troca de conhecimento entre esses dois estratos sociais. Apesar dessa massa de informações posta em circulação, o espetáculo criado pela Bendita Trupe parece-nos ter a inocência das primeiras descobertas. Miserê Bandalha exibe, com um tom de espanto, entre indignado e fascinado, a aglutinação de um grupo de jovens para brincar de surfe ou qualquer jogo adolescente, depois o recrutamento para o crime organizado e, em seguida, o cotidiano "empresarial" de um negócio que, fazendo-se as mudanças devidas, funciona como qualquer outro. Eliminar a concorrência, por exemplo, tem um sentido literal. Além disso, o comércio de drogas e armas conquista novos mercados, tem estratégias de publicidade, preocupa-se com a diminuição de custos operacionais, etc. Enfim, segue o padrão de outras atividades empresariais. Mundo ao reverso, em que tudo funciona a contento para a prosperidade dos donos do capital - estão do "lado" certo da vida errada" - e não tão bem para os assalariados, o universo representado pelo espetáculo não difere do que se apresenta no noticiário policial e nos estudos sobre a criminalidade entre os jovens pobres. Bem explicado através da organização das cenas, o aspecto racional do crime como negócio e poder político se sobrepõe a considerações de fundo humanitário. Agentes inconscientes desse cenário, os jovens marginais, ocupando diferentes lugares na escala administrativa do crime, obedecem às convenções lingüísticas e comportamentais do ambiente. São representados em cena com fidelidade que nos parece etnográfica. A concepção cênica, orientada por Johana Albuquerque, tem a alta voltagem física e sonora desse mundo paralelo (margem, morro ou periferia), onde se comprimem multidões em espaços pequenos obrigando as figuras à velocidade, à exacerbação da fala e dos gestos e a uma constante reivindicação por visibilidade. Essa imitação escrupulosa parece-nos, neste caso, excessiva. Os personagens berram mais do que falam, pulam sem cessar, sugerindo alterações químicas no organismo e debilidade cultural que não lhes permite viver outra coisa além das injunções do presente. É um esforço distinguir um personagem do outro porque não diferem pelo objetivo ou linguagem. Essa homogeneidade - plenamente justificada por argumentos sociológicos - não funciona bem como resultado cênico. Cenas histéricas, sem nenhum engodo empático, tornam-se mais cansativas do que assustadoras. Concebido e executado por um grupo muito sério, Miserê Bandalha faz exatamente o que se propõe a fazer: pesquisa cênica. E, no entanto, o grupo tem todas as condições para fazer mais do que isso. Inteligência de soluções visuais, técnica de atuação apurada e vigor intelectual estão visíveis em cena, postos a serviço de uma comunicação importante. Nas obras de invenção, contudo, podem entrar o imaginado no lugar do visto, o medo dos narradores, os silêncios raros, desejados ou temidos, a imobilidade pensativa e tantas outras coisas que, por contraste, transcendem o universo pesquisado e o tornam uma passagem aberta para outras situações e experiências. Miserê Bandalha. 85 min. 14 anos. Teatro João Caetano (438 lug.). R. Borges Lagoa, 650, V. Clementino, 5573-3774, metrô Santa Cruz. 6.ª e sáb., 21h; dom., 20h30. R$ 10. Até 30/4.

São cada vez mais freqüentes os artistas de teatro que assumem a criação desde a narrativa até a formalização cênica. Os grupos de criação, sem desdenhar os problemas de linguagem, têm reafirmado o valor da observação direta como material para a invenção artística. Assim foi o processo de construção de Miserê Bandalha, espetáculo criado coletivamente pela Bendita Trupe. Assunto, personagens e desenvolvimento da narrativa estão impregnados do material de pesquisa que os artistas utilizaram na criação do trabalho. E, neste caso, o estudo sério aparece em primeiro plano no resultado cênico. Testemunhas do seu tempo, os artistas da Bendita Trupe elegeram como tema o território cada vez mais vasto do crime organizado, ponto em que se focaliza também o interesse dos meios de comunicação de massa neste momento. O cinema ficcional, os documentários e a música nos lembram incessantemente da contigüidade geográfica entre bandidos e cidadãos honestos, da conivência entre políticos e criminosos e da troca de conhecimento entre esses dois estratos sociais. Apesar dessa massa de informações posta em circulação, o espetáculo criado pela Bendita Trupe parece-nos ter a inocência das primeiras descobertas. Miserê Bandalha exibe, com um tom de espanto, entre indignado e fascinado, a aglutinação de um grupo de jovens para brincar de surfe ou qualquer jogo adolescente, depois o recrutamento para o crime organizado e, em seguida, o cotidiano "empresarial" de um negócio que, fazendo-se as mudanças devidas, funciona como qualquer outro. Eliminar a concorrência, por exemplo, tem um sentido literal. Além disso, o comércio de drogas e armas conquista novos mercados, tem estratégias de publicidade, preocupa-se com a diminuição de custos operacionais, etc. Enfim, segue o padrão de outras atividades empresariais. Mundo ao reverso, em que tudo funciona a contento para a prosperidade dos donos do capital - estão do "lado" certo da vida errada" - e não tão bem para os assalariados, o universo representado pelo espetáculo não difere do que se apresenta no noticiário policial e nos estudos sobre a criminalidade entre os jovens pobres. Bem explicado através da organização das cenas, o aspecto racional do crime como negócio e poder político se sobrepõe a considerações de fundo humanitário. Agentes inconscientes desse cenário, os jovens marginais, ocupando diferentes lugares na escala administrativa do crime, obedecem às convenções lingüísticas e comportamentais do ambiente. São representados em cena com fidelidade que nos parece etnográfica. A concepção cênica, orientada por Johana Albuquerque, tem a alta voltagem física e sonora desse mundo paralelo (margem, morro ou periferia), onde se comprimem multidões em espaços pequenos obrigando as figuras à velocidade, à exacerbação da fala e dos gestos e a uma constante reivindicação por visibilidade. Essa imitação escrupulosa parece-nos, neste caso, excessiva. Os personagens berram mais do que falam, pulam sem cessar, sugerindo alterações químicas no organismo e debilidade cultural que não lhes permite viver outra coisa além das injunções do presente. É um esforço distinguir um personagem do outro porque não diferem pelo objetivo ou linguagem. Essa homogeneidade - plenamente justificada por argumentos sociológicos - não funciona bem como resultado cênico. Cenas histéricas, sem nenhum engodo empático, tornam-se mais cansativas do que assustadoras. Concebido e executado por um grupo muito sério, Miserê Bandalha faz exatamente o que se propõe a fazer: pesquisa cênica. E, no entanto, o grupo tem todas as condições para fazer mais do que isso. Inteligência de soluções visuais, técnica de atuação apurada e vigor intelectual estão visíveis em cena, postos a serviço de uma comunicação importante. Nas obras de invenção, contudo, podem entrar o imaginado no lugar do visto, o medo dos narradores, os silêncios raros, desejados ou temidos, a imobilidade pensativa e tantas outras coisas que, por contraste, transcendem o universo pesquisado e o tornam uma passagem aberta para outras situações e experiências. Miserê Bandalha. 85 min. 14 anos. Teatro João Caetano (438 lug.). R. Borges Lagoa, 650, V. Clementino, 5573-3774, metrô Santa Cruz. 6.ª e sáb., 21h; dom., 20h30. R$ 10. Até 30/4.

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