Estado em segredo


Para analista, o vaivém do sigilo de documentos em São Paulocria insegurança jurídica e estimula violações no acesso a dados públicos

Por Paula Martins
Atualização:

Na última semana fomos surpreendidos por mais uma ação normativa do governo paulista no sentido de classificar como sigilosos seus documentos, em especial, aqueles referentes à segurança pública. Assim como em tentativas anteriores de classificação dos documentos da Sabesp – em meio à crise hídrica – e do transporte metropolitano, a ação causou grande debate e questionamento público, o que levou as autoridades estaduais a recuar e anunciar uma mudança em sua posição.

Esses casos não são isolados, mas infelizmente representativos de dezenas de outros que apontam para o despreparo do Poder Público em observar a Constituição Federal (CF) e a Lei de Acesso a Informações Públicas (LAI) – ressalvadas devidas e louváveis exceções.

Mas voltemos ao caso paulista. A resolução da Secretaria de Segurança Pública trazia uma tabela com categorias de enorme amplitude de documentos que passariam a ser considerados de caráter reservado, secreto ou ultrassecreto – entre eles, boletins de ocorrência, distribuição do efetivo, manuais e procedimentos administrativos padrão. Além da tabela, no entanto, o texto da norma explicitava que qualquer informação referente a atuação logística e atividades operacionais das polícias, assim como toda informação estratégica sobre criminalidade organizada, entre muitas outras igualmente indeterminadas em sua generalidade, deveriam ser mantidas em sigilo, longe dos olhos da população.

continua após a publicidade

A explicação apresentada para manter os documentos em confidencialidade por prazos que variavam de 5 a 100 anos foram a proteção de informações pessoais e a garantia da segurança da sociedade e do Estado.

Realmente, tanto a LAI como a Constituição autorizam que, em casos concretos e excepcionais, quando demonstrado efetivo risco à segurança, sejam resguardadas certas informações. Dados pessoais, na verdade, são protegidos independentemente de classificação.

Ao classificar de forma genérica e fazendo uso de amplas categorias, a resolução desrespeitava o espírito da LAI, que determina que a transparência deve ser a regra. No caso dos dados pessoais, a classificação acabava por comprometer o uso de instrumentos muito mais inteligentes, eficientes e indicados em regulamentação, como o uso de tarjas ou versões públicas, com o ocultamento apenas dos trechos protegidos – prática comum nas leis de acesso de outros países, como EUA e Canadá. Além disso, vale lembrar que as informações pessoais protegidas são unicamente aquelas referentes à intimidade, vida privada, honra e imagem de indivíduos.

continua após a publicidade

A resolução demonstrava partir da premissa de que as informações sobre segurança pública não interessam “ao povo”. É difícil aceitar que vários documentos listados ali, como categoria, poderiam impor risco à investigações e à atuação policial se divulgados. Por outro lado, dados sobre BOs e crime organizado, por exemplo, são úteis à sociedade para uma variedade de fins, inclusive para pesquisa, acompanhamento da atividade policial, participação na elaboração de políticas públicas para o setor da segurança etc. Os manuais e procedimentos padrão, por exemplo, são instrumentos essenciais para informar a sociedade sobre o comportamento que se espera de policiais em determinadas circunstâncias e podem ser também importante referência para verificação de irregularidades e abusos. Tais documentos, como o nome indica, não se referem a operações concretas e específicas, mas sim a operações-padrão e por isso não poderiam antecipar uma estratégia ou frustrar uma ação, como em algum momento alegado.

É possível citar situações recentes que demonstram o impacto da falta de transparência na segurança pública. Em 2014, por exemplo, a Ponte Jornalismo solicitou à Polícia Militar acesso às normas que regem o uso de balas de borracha e aquelas que regem a atuação policial em reintegrações de posse. Ambos documentos foram negados, tendo a PM indicado que seriam classificados como secretos. O mesmo ocorreu com pedidos à PM sobre o volume de gás lacrimogêneo usado contra manifestantes, assim como o contingente policial enviado para acompanhar manifestações. O intuito era verificar a proporcionalidade, da ação estatal, mas a informação foi considerada sigilosa. Por outro lado, quando divulgadas, informações como essa permitem melhor compreensão da sociedade em que vivemos. No ano passado, por exemplo, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública publicou estudo com base em dados de 2014 que indicam que as capitais brasileiras registram um homicídio a cada meia hora – tal estudo só foi possível através do uso da LAI.

A imposição de sigilo pode também ocultar a inexistência de certos dados que deveriam ser produzidos pelos órgãos públicos e que seriam essenciais e imprescindíveis à atuação estatal – a carência de informações gera não apenas opacidade, mas políticas públicas sem base em evidencia e dados.

continua após a publicidade

Após a repercussão negativa da resolução que apresentava a tabela de prazos de sigilo, o governo paulista publicou um novo decreto, em 18 de fevereiro. O decreto, porém, reitera o procedimento determinado para classificação de documentos previsto em norma estadual desde 2012, com pequenas modificações. Nele indica-se que apenas documentos específicos podem ser classificados nos três graus de sigilo previstos pela LAI, analisados caso a caso. É preciso agora atentar para sua implementação. E acompanhar se a classificação criada pela Secretaria de Segurança Publica será efetivamente deixada de lado.

As posições do governo do Estado, até aqui, passam mensagens contraditórias, que apenas servem para confundir a sociedade e criam insegurança jurídica. O caso da segurança pública, que se seguiu aos mesmos problemas enfrentados com a confidencialidade de documentos da Sabesp e do Metrô em 2015, indicam falta de compromisso do governo com a transparência. O vaivém de manifestações demonstra pouca seriedade com a questão e abre espaço para que, na atabalhoada edição e reedição de normas, ocorram abusos e violações ao direito de acesso a informações publicas.

PAULA MARTINSÉ ADVOGADA E DIRETORA-EXECUTIVA DA ARTIGO 19, ORGANIZAÇÃO DE DEFESA DA TRANSPARÊNCIA PÚBLICA

Na última semana fomos surpreendidos por mais uma ação normativa do governo paulista no sentido de classificar como sigilosos seus documentos, em especial, aqueles referentes à segurança pública. Assim como em tentativas anteriores de classificação dos documentos da Sabesp – em meio à crise hídrica – e do transporte metropolitano, a ação causou grande debate e questionamento público, o que levou as autoridades estaduais a recuar e anunciar uma mudança em sua posição.

Esses casos não são isolados, mas infelizmente representativos de dezenas de outros que apontam para o despreparo do Poder Público em observar a Constituição Federal (CF) e a Lei de Acesso a Informações Públicas (LAI) – ressalvadas devidas e louváveis exceções.

Mas voltemos ao caso paulista. A resolução da Secretaria de Segurança Pública trazia uma tabela com categorias de enorme amplitude de documentos que passariam a ser considerados de caráter reservado, secreto ou ultrassecreto – entre eles, boletins de ocorrência, distribuição do efetivo, manuais e procedimentos administrativos padrão. Além da tabela, no entanto, o texto da norma explicitava que qualquer informação referente a atuação logística e atividades operacionais das polícias, assim como toda informação estratégica sobre criminalidade organizada, entre muitas outras igualmente indeterminadas em sua generalidade, deveriam ser mantidas em sigilo, longe dos olhos da população.

A explicação apresentada para manter os documentos em confidencialidade por prazos que variavam de 5 a 100 anos foram a proteção de informações pessoais e a garantia da segurança da sociedade e do Estado.

Realmente, tanto a LAI como a Constituição autorizam que, em casos concretos e excepcionais, quando demonstrado efetivo risco à segurança, sejam resguardadas certas informações. Dados pessoais, na verdade, são protegidos independentemente de classificação.

Ao classificar de forma genérica e fazendo uso de amplas categorias, a resolução desrespeitava o espírito da LAI, que determina que a transparência deve ser a regra. No caso dos dados pessoais, a classificação acabava por comprometer o uso de instrumentos muito mais inteligentes, eficientes e indicados em regulamentação, como o uso de tarjas ou versões públicas, com o ocultamento apenas dos trechos protegidos – prática comum nas leis de acesso de outros países, como EUA e Canadá. Além disso, vale lembrar que as informações pessoais protegidas são unicamente aquelas referentes à intimidade, vida privada, honra e imagem de indivíduos.

A resolução demonstrava partir da premissa de que as informações sobre segurança pública não interessam “ao povo”. É difícil aceitar que vários documentos listados ali, como categoria, poderiam impor risco à investigações e à atuação policial se divulgados. Por outro lado, dados sobre BOs e crime organizado, por exemplo, são úteis à sociedade para uma variedade de fins, inclusive para pesquisa, acompanhamento da atividade policial, participação na elaboração de políticas públicas para o setor da segurança etc. Os manuais e procedimentos padrão, por exemplo, são instrumentos essenciais para informar a sociedade sobre o comportamento que se espera de policiais em determinadas circunstâncias e podem ser também importante referência para verificação de irregularidades e abusos. Tais documentos, como o nome indica, não se referem a operações concretas e específicas, mas sim a operações-padrão e por isso não poderiam antecipar uma estratégia ou frustrar uma ação, como em algum momento alegado.

É possível citar situações recentes que demonstram o impacto da falta de transparência na segurança pública. Em 2014, por exemplo, a Ponte Jornalismo solicitou à Polícia Militar acesso às normas que regem o uso de balas de borracha e aquelas que regem a atuação policial em reintegrações de posse. Ambos documentos foram negados, tendo a PM indicado que seriam classificados como secretos. O mesmo ocorreu com pedidos à PM sobre o volume de gás lacrimogêneo usado contra manifestantes, assim como o contingente policial enviado para acompanhar manifestações. O intuito era verificar a proporcionalidade, da ação estatal, mas a informação foi considerada sigilosa. Por outro lado, quando divulgadas, informações como essa permitem melhor compreensão da sociedade em que vivemos. No ano passado, por exemplo, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública publicou estudo com base em dados de 2014 que indicam que as capitais brasileiras registram um homicídio a cada meia hora – tal estudo só foi possível através do uso da LAI.

A imposição de sigilo pode também ocultar a inexistência de certos dados que deveriam ser produzidos pelos órgãos públicos e que seriam essenciais e imprescindíveis à atuação estatal – a carência de informações gera não apenas opacidade, mas políticas públicas sem base em evidencia e dados.

Após a repercussão negativa da resolução que apresentava a tabela de prazos de sigilo, o governo paulista publicou um novo decreto, em 18 de fevereiro. O decreto, porém, reitera o procedimento determinado para classificação de documentos previsto em norma estadual desde 2012, com pequenas modificações. Nele indica-se que apenas documentos específicos podem ser classificados nos três graus de sigilo previstos pela LAI, analisados caso a caso. É preciso agora atentar para sua implementação. E acompanhar se a classificação criada pela Secretaria de Segurança Publica será efetivamente deixada de lado.

As posições do governo do Estado, até aqui, passam mensagens contraditórias, que apenas servem para confundir a sociedade e criam insegurança jurídica. O caso da segurança pública, que se seguiu aos mesmos problemas enfrentados com a confidencialidade de documentos da Sabesp e do Metrô em 2015, indicam falta de compromisso do governo com a transparência. O vaivém de manifestações demonstra pouca seriedade com a questão e abre espaço para que, na atabalhoada edição e reedição de normas, ocorram abusos e violações ao direito de acesso a informações publicas.

PAULA MARTINSÉ ADVOGADA E DIRETORA-EXECUTIVA DA ARTIGO 19, ORGANIZAÇÃO DE DEFESA DA TRANSPARÊNCIA PÚBLICA

Na última semana fomos surpreendidos por mais uma ação normativa do governo paulista no sentido de classificar como sigilosos seus documentos, em especial, aqueles referentes à segurança pública. Assim como em tentativas anteriores de classificação dos documentos da Sabesp – em meio à crise hídrica – e do transporte metropolitano, a ação causou grande debate e questionamento público, o que levou as autoridades estaduais a recuar e anunciar uma mudança em sua posição.

Esses casos não são isolados, mas infelizmente representativos de dezenas de outros que apontam para o despreparo do Poder Público em observar a Constituição Federal (CF) e a Lei de Acesso a Informações Públicas (LAI) – ressalvadas devidas e louváveis exceções.

Mas voltemos ao caso paulista. A resolução da Secretaria de Segurança Pública trazia uma tabela com categorias de enorme amplitude de documentos que passariam a ser considerados de caráter reservado, secreto ou ultrassecreto – entre eles, boletins de ocorrência, distribuição do efetivo, manuais e procedimentos administrativos padrão. Além da tabela, no entanto, o texto da norma explicitava que qualquer informação referente a atuação logística e atividades operacionais das polícias, assim como toda informação estratégica sobre criminalidade organizada, entre muitas outras igualmente indeterminadas em sua generalidade, deveriam ser mantidas em sigilo, longe dos olhos da população.

A explicação apresentada para manter os documentos em confidencialidade por prazos que variavam de 5 a 100 anos foram a proteção de informações pessoais e a garantia da segurança da sociedade e do Estado.

Realmente, tanto a LAI como a Constituição autorizam que, em casos concretos e excepcionais, quando demonstrado efetivo risco à segurança, sejam resguardadas certas informações. Dados pessoais, na verdade, são protegidos independentemente de classificação.

Ao classificar de forma genérica e fazendo uso de amplas categorias, a resolução desrespeitava o espírito da LAI, que determina que a transparência deve ser a regra. No caso dos dados pessoais, a classificação acabava por comprometer o uso de instrumentos muito mais inteligentes, eficientes e indicados em regulamentação, como o uso de tarjas ou versões públicas, com o ocultamento apenas dos trechos protegidos – prática comum nas leis de acesso de outros países, como EUA e Canadá. Além disso, vale lembrar que as informações pessoais protegidas são unicamente aquelas referentes à intimidade, vida privada, honra e imagem de indivíduos.

A resolução demonstrava partir da premissa de que as informações sobre segurança pública não interessam “ao povo”. É difícil aceitar que vários documentos listados ali, como categoria, poderiam impor risco à investigações e à atuação policial se divulgados. Por outro lado, dados sobre BOs e crime organizado, por exemplo, são úteis à sociedade para uma variedade de fins, inclusive para pesquisa, acompanhamento da atividade policial, participação na elaboração de políticas públicas para o setor da segurança etc. Os manuais e procedimentos padrão, por exemplo, são instrumentos essenciais para informar a sociedade sobre o comportamento que se espera de policiais em determinadas circunstâncias e podem ser também importante referência para verificação de irregularidades e abusos. Tais documentos, como o nome indica, não se referem a operações concretas e específicas, mas sim a operações-padrão e por isso não poderiam antecipar uma estratégia ou frustrar uma ação, como em algum momento alegado.

É possível citar situações recentes que demonstram o impacto da falta de transparência na segurança pública. Em 2014, por exemplo, a Ponte Jornalismo solicitou à Polícia Militar acesso às normas que regem o uso de balas de borracha e aquelas que regem a atuação policial em reintegrações de posse. Ambos documentos foram negados, tendo a PM indicado que seriam classificados como secretos. O mesmo ocorreu com pedidos à PM sobre o volume de gás lacrimogêneo usado contra manifestantes, assim como o contingente policial enviado para acompanhar manifestações. O intuito era verificar a proporcionalidade, da ação estatal, mas a informação foi considerada sigilosa. Por outro lado, quando divulgadas, informações como essa permitem melhor compreensão da sociedade em que vivemos. No ano passado, por exemplo, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública publicou estudo com base em dados de 2014 que indicam que as capitais brasileiras registram um homicídio a cada meia hora – tal estudo só foi possível através do uso da LAI.

A imposição de sigilo pode também ocultar a inexistência de certos dados que deveriam ser produzidos pelos órgãos públicos e que seriam essenciais e imprescindíveis à atuação estatal – a carência de informações gera não apenas opacidade, mas políticas públicas sem base em evidencia e dados.

Após a repercussão negativa da resolução que apresentava a tabela de prazos de sigilo, o governo paulista publicou um novo decreto, em 18 de fevereiro. O decreto, porém, reitera o procedimento determinado para classificação de documentos previsto em norma estadual desde 2012, com pequenas modificações. Nele indica-se que apenas documentos específicos podem ser classificados nos três graus de sigilo previstos pela LAI, analisados caso a caso. É preciso agora atentar para sua implementação. E acompanhar se a classificação criada pela Secretaria de Segurança Publica será efetivamente deixada de lado.

As posições do governo do Estado, até aqui, passam mensagens contraditórias, que apenas servem para confundir a sociedade e criam insegurança jurídica. O caso da segurança pública, que se seguiu aos mesmos problemas enfrentados com a confidencialidade de documentos da Sabesp e do Metrô em 2015, indicam falta de compromisso do governo com a transparência. O vaivém de manifestações demonstra pouca seriedade com a questão e abre espaço para que, na atabalhoada edição e reedição de normas, ocorram abusos e violações ao direito de acesso a informações publicas.

PAULA MARTINSÉ ADVOGADA E DIRETORA-EXECUTIVA DA ARTIGO 19, ORGANIZAÇÃO DE DEFESA DA TRANSPARÊNCIA PÚBLICA

Na última semana fomos surpreendidos por mais uma ação normativa do governo paulista no sentido de classificar como sigilosos seus documentos, em especial, aqueles referentes à segurança pública. Assim como em tentativas anteriores de classificação dos documentos da Sabesp – em meio à crise hídrica – e do transporte metropolitano, a ação causou grande debate e questionamento público, o que levou as autoridades estaduais a recuar e anunciar uma mudança em sua posição.

Esses casos não são isolados, mas infelizmente representativos de dezenas de outros que apontam para o despreparo do Poder Público em observar a Constituição Federal (CF) e a Lei de Acesso a Informações Públicas (LAI) – ressalvadas devidas e louváveis exceções.

Mas voltemos ao caso paulista. A resolução da Secretaria de Segurança Pública trazia uma tabela com categorias de enorme amplitude de documentos que passariam a ser considerados de caráter reservado, secreto ou ultrassecreto – entre eles, boletins de ocorrência, distribuição do efetivo, manuais e procedimentos administrativos padrão. Além da tabela, no entanto, o texto da norma explicitava que qualquer informação referente a atuação logística e atividades operacionais das polícias, assim como toda informação estratégica sobre criminalidade organizada, entre muitas outras igualmente indeterminadas em sua generalidade, deveriam ser mantidas em sigilo, longe dos olhos da população.

A explicação apresentada para manter os documentos em confidencialidade por prazos que variavam de 5 a 100 anos foram a proteção de informações pessoais e a garantia da segurança da sociedade e do Estado.

Realmente, tanto a LAI como a Constituição autorizam que, em casos concretos e excepcionais, quando demonstrado efetivo risco à segurança, sejam resguardadas certas informações. Dados pessoais, na verdade, são protegidos independentemente de classificação.

Ao classificar de forma genérica e fazendo uso de amplas categorias, a resolução desrespeitava o espírito da LAI, que determina que a transparência deve ser a regra. No caso dos dados pessoais, a classificação acabava por comprometer o uso de instrumentos muito mais inteligentes, eficientes e indicados em regulamentação, como o uso de tarjas ou versões públicas, com o ocultamento apenas dos trechos protegidos – prática comum nas leis de acesso de outros países, como EUA e Canadá. Além disso, vale lembrar que as informações pessoais protegidas são unicamente aquelas referentes à intimidade, vida privada, honra e imagem de indivíduos.

A resolução demonstrava partir da premissa de que as informações sobre segurança pública não interessam “ao povo”. É difícil aceitar que vários documentos listados ali, como categoria, poderiam impor risco à investigações e à atuação policial se divulgados. Por outro lado, dados sobre BOs e crime organizado, por exemplo, são úteis à sociedade para uma variedade de fins, inclusive para pesquisa, acompanhamento da atividade policial, participação na elaboração de políticas públicas para o setor da segurança etc. Os manuais e procedimentos padrão, por exemplo, são instrumentos essenciais para informar a sociedade sobre o comportamento que se espera de policiais em determinadas circunstâncias e podem ser também importante referência para verificação de irregularidades e abusos. Tais documentos, como o nome indica, não se referem a operações concretas e específicas, mas sim a operações-padrão e por isso não poderiam antecipar uma estratégia ou frustrar uma ação, como em algum momento alegado.

É possível citar situações recentes que demonstram o impacto da falta de transparência na segurança pública. Em 2014, por exemplo, a Ponte Jornalismo solicitou à Polícia Militar acesso às normas que regem o uso de balas de borracha e aquelas que regem a atuação policial em reintegrações de posse. Ambos documentos foram negados, tendo a PM indicado que seriam classificados como secretos. O mesmo ocorreu com pedidos à PM sobre o volume de gás lacrimogêneo usado contra manifestantes, assim como o contingente policial enviado para acompanhar manifestações. O intuito era verificar a proporcionalidade, da ação estatal, mas a informação foi considerada sigilosa. Por outro lado, quando divulgadas, informações como essa permitem melhor compreensão da sociedade em que vivemos. No ano passado, por exemplo, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública publicou estudo com base em dados de 2014 que indicam que as capitais brasileiras registram um homicídio a cada meia hora – tal estudo só foi possível através do uso da LAI.

A imposição de sigilo pode também ocultar a inexistência de certos dados que deveriam ser produzidos pelos órgãos públicos e que seriam essenciais e imprescindíveis à atuação estatal – a carência de informações gera não apenas opacidade, mas políticas públicas sem base em evidencia e dados.

Após a repercussão negativa da resolução que apresentava a tabela de prazos de sigilo, o governo paulista publicou um novo decreto, em 18 de fevereiro. O decreto, porém, reitera o procedimento determinado para classificação de documentos previsto em norma estadual desde 2012, com pequenas modificações. Nele indica-se que apenas documentos específicos podem ser classificados nos três graus de sigilo previstos pela LAI, analisados caso a caso. É preciso agora atentar para sua implementação. E acompanhar se a classificação criada pela Secretaria de Segurança Publica será efetivamente deixada de lado.

As posições do governo do Estado, até aqui, passam mensagens contraditórias, que apenas servem para confundir a sociedade e criam insegurança jurídica. O caso da segurança pública, que se seguiu aos mesmos problemas enfrentados com a confidencialidade de documentos da Sabesp e do Metrô em 2015, indicam falta de compromisso do governo com a transparência. O vaivém de manifestações demonstra pouca seriedade com a questão e abre espaço para que, na atabalhoada edição e reedição de normas, ocorram abusos e violações ao direito de acesso a informações publicas.

PAULA MARTINSÉ ADVOGADA E DIRETORA-EXECUTIVA DA ARTIGO 19, ORGANIZAÇÃO DE DEFESA DA TRANSPARÊNCIA PÚBLICA

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.