BRASÍLIA - O Ministério da Fazenda está disposto a negociar o novo modelo de desoneração da folha de pagamentos com o Congresso, desde que alguma medida compense o gasto tributário, fundamental para perseguir a meta de déficit zero em 2024.
O secretário de Política Econômica da pasta, Guilherme Mello, afirma ao Estadão/Broadcast que o sucesso da nova política para a folha determinará a ampliação dos setores beneficiados, respeitando a premissa de encontrar uma fonte de compensação do benefício.
Mello afirma que a equipe econômica não se opõe a negociar o modelo de desoneração, que pode até custar mais do que os R$ 6 bilhões da proposta da Fazenda, se aproximando dos R$ 9 bilhões da política atual.
“É possível? É. Desde que você encontre outra fonte de receita. Para nós, o mais fundamental é que o princípio da neutralidade fiscal desse benefício seja respeitado”, disse o secretário, frisando que o Congresso compreende esse princípio.
No fim de 2023, o governo enviou ao Congresso uma medida provisória revogando a lei que havia prorrogado o atual modelo de desoneração da folha até 2027 para 17 setores, pelo qual há substituição da contribuição previdenciária por um porcentual fixo do faturamento, o que gerou desconforto entre os parlamentares. A proposta da Fazenda traz uma reoneração gradual do benefício, oferecendo uma alíquota de contribuição previdenciária menor sobre o primeiro salário mínimo.
Mello avalia que essa fórmula pode ser estendida para mais setores no futuro, mas essa é uma discussão que precisará ser feita em conjunto com a reforma sobre a renda. O secretário pontuou que o Brasil precisa rever a tributação sobre a renda para gerar mais progressividade, o que reduziria o impacto dos impostos sobre o consumo para arrecadação e permitiria uma revisão das políticas de tributação sobre a folha, com foco no aumento da formalização do trabalho.
“É exatamente esse o desenho que a gente pensou e realmente serve como um piloto para, a partir do sucesso dessa política, eventualmente ampliar para os demais setores, a depender do avanço da discussão da tributação sobre a renda, sempre mantendo a carga tributária. Para estender para todos os setores da economia, tem um custo, e esse custo, se está perdendo arrecadação de um lado, precisa recuperar de outro”, diz.
A Fazenda também está estudando uma proposta alternativa para as prefeituras. Ao prorrogar a desoneração da folha, o Congresso inseriu no projeto um dispositivo que permite que prefeituras também tenham um benefício de redução da alíquota da contribuição previdenciária. Essa medida gerou controvérsia no governo, que a considera inconstitucional porque a reforma da Previdência vedou alguns tipos de alteração no sistema. De acordo com Mello, a equipe econômica está discutindo uma opção para os municípios.
Impacto não resolvido
Embora tenha proposto ao Congresso um novo modelo de benefício sobre a folha de pagamentos cuja renúncia tributária tem compensação prevista, a equipe econômica ainda não tem resolvido o buraco fiscal que será gerado pela manutenção da desoneração nos meses de janeiro, fevereiro e março deste ano.
Quando construiu a Medida Provisória para reonerar progressivamente a contribuição patronal, a Fazenda considerou que o novo modelo iria vigorar em 1º de janeiro deste ano. Precisou, contudo, ceder de última hora e prever a vigência somente a partir de abril. O mesmo ocorreu com o benefício previdenciário direcionado aos municípios, que ainda valerá até o fim de março.
O tamanho da renúncia que sairá da manutenção temporária desses dois benefícios só deve ser mais bem conhecido no primeiro relatório bimestral do governo, quando a equipe econômica faz uma reestimativa das receitas e despesas para promover eventuais bloqueios e cumprir a meta de déficit zero.
Pelos cálculos da Fazenda, se fosse mantida durante todo o ano de 2024, a desoneração da folha criada em 2011 teria custo de R$ 12 bilhões, enquanto a benesse para as prefeituras geraria uma renúncia de R$ 4 bilhões — impactos não previstos no Orçamento.
Já o modelo de reoneração gradual da folha proposto pela pasta custaria R$ 5,62 bilhões, compensado com o fim gradual do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com impacto positivo de R$ 6 bilhões neste ano.
Mello afirmou ao Estadão/Broadcast que o gasto tributário nesses três primeiros meses do ano pode acabar sendo compensando, por exemplo, com medidas para aumento de arrecadação que estejam subestimadas. Ele, contudo, reconheceu que a renúncia não está “totalmente resolvida”.
“Isso é uma discussão que, de alguma forma, vai ter que ser feita pelo Tesouro. Eu diria que existe um gasto tributário, mas existem medidas também que estão subestimadas, que podem gerar um efeito maior. Então, de alguma forma, isso pode se equilibrar”, disse o secretário, segundo quem o relatório bimestral mostrará como isso “evoluiu”.
Embora precise encarar essa renúncia fiscal, o custo limitado a esses três meses já será uma vitória da Fazenda, que enfrenta grande resistência no Congresso para conseguir aprovar o modelo de reoneração. Por isso, Mello afirma que o interesse da pasta é “resolver daqui para frente”.
“Ele (o impacto fiscal em três meses) de alguma forma não está totalmente resolvido, mas nós já, de alguma forma, incorporamos ele nas nossas estimativas. Agora, o que é importante, em três meses você tem impacto, mas é limitado. O que nos interessa é encontrar uma alternativa que consiga compatibilizar gasto e fonte. O que fizemos na nossa MP foi isso. Nós construímos uma política de desoneração que consideramos eficiente, alinhada com as experiências internacionais, e que o tamanho dela equivale exatamente à recomposição de receitas a partir do fim do Perse”, disse o secretário.