Economia e políticas públicas

Opinião|Manter ou não manter a meta, eis a questão


Alexandre Manoel, economista da AZ Quest, que sempre esteve mais otimista do que a média de mercado com o governo de Lula 3, considera que é vital manter a meta de déficit primário zero em 2024.

Por Fernando Dantas

O governo tem muito a perder, ou muito a ganhar, na decisão sobre mexer ou não na meta de resultado primário de 2024 (déficit zero), na visão do economista Alexandre Manoel, sócio e economista-chefe da gestora AZ Quest, e com experiência no setor público em passagem pelo Ministério da Fazenda.

A posição de Manoel é clara: o governo deve manter a meta de primário zerado para 2024.

O economista da AZ Quest se destaca por, desde o início do terceiro mandato de Lula, ter mantido uma posição bem menos cética sobre a qualidade da atual política econômica do que a média do mercado financeiro.

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E é a partir dessa premissa que ele estrutura o seu raciocínio sobre as vantagens para o governo de manter a meta de primário para 2024 (e sobre as desvantagens de mudar).

Manoel considera que a equipe econômica do atual governo, liderada por Fernando Haddad, ministro da Fazenda, conseguiu afastar, dos temores do mercado, o chamado "risco de cauda" (diz-se de evento de probabilidade muito baixa mas que, por vezes, ocorre), isto é, uma deterioração explosiva da política fiscal.

Apesar disso, na sua opinião, o consenso de mercado permanece muito cético em relação à política econômica. Para ele, há analistas que não compreenderam o quão restritivo o novo arcabouço fiscal é (principalmente a partir de 2025), e outros que compreenderam mas pensam que o governo vai tentar contornar ou mudar as regras quando bater nessas restrições.

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Em relação a 2024, o que está "pegando" é a meta de primário, e muitos no mercado consideram que, diante da grande dificuldade de cumpri-la, o governo poderia mudar a meta.

Manoel recorda que os analistas duvidavam que o teto seria substituído por um arcabouço com restrição efetiva de despesas, mas isso acabou ocorrendo. Duvidaram e duvidam das metas de primário até 2026, mas o governo está correndo atrás de um pacote de receitas para tentar viabilizá-las.

Existe também muito ceticismo em relação às projeções das receitas que o governo pretende obter com suas diversas medidas, como a estimativa de R$ 54,7 bilhões no caso do voto de qualidade do CARF (voto de Minerva a favor do governo em disputas tributárias), recém-aprovado pelo Congresso. Mas há, por outro lado, gente que conhece o assunto e que pensa que pode ser até mais, contrapõe Manoel.

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O analista da AZ Quest nota que Haddad e as equipes técnicas da Fazenda e do Planejamento estão com um discurso bastante harmonizado de cumprir a meta de 2024 recorrendo às ferramentas disponíveis: a ampliação das receitas, busca eventual de receitas "one-off" (que só ocorrem uma vez) e, se tudo isso for insuficiente, contingenciamento de despesas. Em termos de cumprir o arcabouço no médio prazo, é preciso reavaliar em algum momento a atual regra de gastos com saúde e educação (vinculadas à variação da receita).

"O problema é que o mercado não acredita que o governo vai topar fazer contingenciamento caso não consiga as receitas suficientes", diz Manoel. Nesse caso, a meta de 2024 precisaria ser mudada no processo legislativo do Orçamento. Isso se daria ou no final deste ano ou no primeiro bimestre do próximo.

Na abordagem do sócio da AZ Quest, diante do ceticismo do mercado, o governo está numa situação parecida com a da história de São Tomé, em que é preciso ver para crer - isto é, o mercado só vai reagir favoravelmente à medida que o governo for provando que entrega seus compromissos.

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Isso, por sua vez, na interpretação de Manoel, tem consequências econômicas muito relevantes.

"Se o mercado acreditasse nas metas e compromissos do governo, os preços dos ativos brasileiros hoje seriam muito melhores, o que afeta especialmente os juros futuros, que têm muito o que andar [no sentido de caírem]".

O economista aponta, inclusive, que o Brasil está bem em termos de esforço fiscal na comparação internacional. Tendo saído da pandemia com dívida pública como proporção do PIB igual ou até um pouco menor do que entrou, o País aprovou regras restritivas ao crescimento da despesa com um governo de esquerda, enquanto outros países estão fazendo ajustes fiscais mais lentos ou nem estão fazendo. Ele menciona o recente anúncio pelo governo mexicano de um substancial aumento do déficit público em 2024, ano de eleições gerais.

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Porém, como o mercado não compra essa visão de credibilidade fiscal da gestão de Lula 3, não entregar a meta de 2024 (isto é, modificá-la) seria - na visão do analista - jogar fora todo o esforço do governo até agora de controlar as expectativas fiscais.

Por outro lado, acrescenta Manoel, "se o governo cumprir, o prêmio será gigante".

Ele considera inclusive que essa conquista final da confiança do mercado na política fiscal pode ser o "gatilho" que finalmente fará os investidores internacionais cristalizarem a visão de que o País é hoje um destaque entre emergentes como Chile, Colômbia, México e Argentina, e passarem das palavras à ação em termos de investir no Brasil.

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Para Manoel, "a meta de primário é bastante desafiadora, mas a essa altura o governo não tem outra opção melhor do que cumpri-la". Ele lembra que há o contingenciamento, em último caso, mas também a possibilidade de receitas "one-off", como a antecipação de recebíveis do pré-sal que cabem à PPSA (estatal criada para gerir o óleo-lucro da partilha), com grande potencial.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 12/9/2023, terça-feira.

O governo tem muito a perder, ou muito a ganhar, na decisão sobre mexer ou não na meta de resultado primário de 2024 (déficit zero), na visão do economista Alexandre Manoel, sócio e economista-chefe da gestora AZ Quest, e com experiência no setor público em passagem pelo Ministério da Fazenda.

A posição de Manoel é clara: o governo deve manter a meta de primário zerado para 2024.

O economista da AZ Quest se destaca por, desde o início do terceiro mandato de Lula, ter mantido uma posição bem menos cética sobre a qualidade da atual política econômica do que a média do mercado financeiro.

E é a partir dessa premissa que ele estrutura o seu raciocínio sobre as vantagens para o governo de manter a meta de primário para 2024 (e sobre as desvantagens de mudar).

Manoel considera que a equipe econômica do atual governo, liderada por Fernando Haddad, ministro da Fazenda, conseguiu afastar, dos temores do mercado, o chamado "risco de cauda" (diz-se de evento de probabilidade muito baixa mas que, por vezes, ocorre), isto é, uma deterioração explosiva da política fiscal.

Apesar disso, na sua opinião, o consenso de mercado permanece muito cético em relação à política econômica. Para ele, há analistas que não compreenderam o quão restritivo o novo arcabouço fiscal é (principalmente a partir de 2025), e outros que compreenderam mas pensam que o governo vai tentar contornar ou mudar as regras quando bater nessas restrições.

Em relação a 2024, o que está "pegando" é a meta de primário, e muitos no mercado consideram que, diante da grande dificuldade de cumpri-la, o governo poderia mudar a meta.

Manoel recorda que os analistas duvidavam que o teto seria substituído por um arcabouço com restrição efetiva de despesas, mas isso acabou ocorrendo. Duvidaram e duvidam das metas de primário até 2026, mas o governo está correndo atrás de um pacote de receitas para tentar viabilizá-las.

Existe também muito ceticismo em relação às projeções das receitas que o governo pretende obter com suas diversas medidas, como a estimativa de R$ 54,7 bilhões no caso do voto de qualidade do CARF (voto de Minerva a favor do governo em disputas tributárias), recém-aprovado pelo Congresso. Mas há, por outro lado, gente que conhece o assunto e que pensa que pode ser até mais, contrapõe Manoel.

O analista da AZ Quest nota que Haddad e as equipes técnicas da Fazenda e do Planejamento estão com um discurso bastante harmonizado de cumprir a meta de 2024 recorrendo às ferramentas disponíveis: a ampliação das receitas, busca eventual de receitas "one-off" (que só ocorrem uma vez) e, se tudo isso for insuficiente, contingenciamento de despesas. Em termos de cumprir o arcabouço no médio prazo, é preciso reavaliar em algum momento a atual regra de gastos com saúde e educação (vinculadas à variação da receita).

"O problema é que o mercado não acredita que o governo vai topar fazer contingenciamento caso não consiga as receitas suficientes", diz Manoel. Nesse caso, a meta de 2024 precisaria ser mudada no processo legislativo do Orçamento. Isso se daria ou no final deste ano ou no primeiro bimestre do próximo.

Na abordagem do sócio da AZ Quest, diante do ceticismo do mercado, o governo está numa situação parecida com a da história de São Tomé, em que é preciso ver para crer - isto é, o mercado só vai reagir favoravelmente à medida que o governo for provando que entrega seus compromissos.

Isso, por sua vez, na interpretação de Manoel, tem consequências econômicas muito relevantes.

"Se o mercado acreditasse nas metas e compromissos do governo, os preços dos ativos brasileiros hoje seriam muito melhores, o que afeta especialmente os juros futuros, que têm muito o que andar [no sentido de caírem]".

O economista aponta, inclusive, que o Brasil está bem em termos de esforço fiscal na comparação internacional. Tendo saído da pandemia com dívida pública como proporção do PIB igual ou até um pouco menor do que entrou, o País aprovou regras restritivas ao crescimento da despesa com um governo de esquerda, enquanto outros países estão fazendo ajustes fiscais mais lentos ou nem estão fazendo. Ele menciona o recente anúncio pelo governo mexicano de um substancial aumento do déficit público em 2024, ano de eleições gerais.

Porém, como o mercado não compra essa visão de credibilidade fiscal da gestão de Lula 3, não entregar a meta de 2024 (isto é, modificá-la) seria - na visão do analista - jogar fora todo o esforço do governo até agora de controlar as expectativas fiscais.

Por outro lado, acrescenta Manoel, "se o governo cumprir, o prêmio será gigante".

Ele considera inclusive que essa conquista final da confiança do mercado na política fiscal pode ser o "gatilho" que finalmente fará os investidores internacionais cristalizarem a visão de que o País é hoje um destaque entre emergentes como Chile, Colômbia, México e Argentina, e passarem das palavras à ação em termos de investir no Brasil.

Para Manoel, "a meta de primário é bastante desafiadora, mas a essa altura o governo não tem outra opção melhor do que cumpri-la". Ele lembra que há o contingenciamento, em último caso, mas também a possibilidade de receitas "one-off", como a antecipação de recebíveis do pré-sal que cabem à PPSA (estatal criada para gerir o óleo-lucro da partilha), com grande potencial.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 12/9/2023, terça-feira.

O governo tem muito a perder, ou muito a ganhar, na decisão sobre mexer ou não na meta de resultado primário de 2024 (déficit zero), na visão do economista Alexandre Manoel, sócio e economista-chefe da gestora AZ Quest, e com experiência no setor público em passagem pelo Ministério da Fazenda.

A posição de Manoel é clara: o governo deve manter a meta de primário zerado para 2024.

O economista da AZ Quest se destaca por, desde o início do terceiro mandato de Lula, ter mantido uma posição bem menos cética sobre a qualidade da atual política econômica do que a média do mercado financeiro.

E é a partir dessa premissa que ele estrutura o seu raciocínio sobre as vantagens para o governo de manter a meta de primário para 2024 (e sobre as desvantagens de mudar).

Manoel considera que a equipe econômica do atual governo, liderada por Fernando Haddad, ministro da Fazenda, conseguiu afastar, dos temores do mercado, o chamado "risco de cauda" (diz-se de evento de probabilidade muito baixa mas que, por vezes, ocorre), isto é, uma deterioração explosiva da política fiscal.

Apesar disso, na sua opinião, o consenso de mercado permanece muito cético em relação à política econômica. Para ele, há analistas que não compreenderam o quão restritivo o novo arcabouço fiscal é (principalmente a partir de 2025), e outros que compreenderam mas pensam que o governo vai tentar contornar ou mudar as regras quando bater nessas restrições.

Em relação a 2024, o que está "pegando" é a meta de primário, e muitos no mercado consideram que, diante da grande dificuldade de cumpri-la, o governo poderia mudar a meta.

Manoel recorda que os analistas duvidavam que o teto seria substituído por um arcabouço com restrição efetiva de despesas, mas isso acabou ocorrendo. Duvidaram e duvidam das metas de primário até 2026, mas o governo está correndo atrás de um pacote de receitas para tentar viabilizá-las.

Existe também muito ceticismo em relação às projeções das receitas que o governo pretende obter com suas diversas medidas, como a estimativa de R$ 54,7 bilhões no caso do voto de qualidade do CARF (voto de Minerva a favor do governo em disputas tributárias), recém-aprovado pelo Congresso. Mas há, por outro lado, gente que conhece o assunto e que pensa que pode ser até mais, contrapõe Manoel.

O analista da AZ Quest nota que Haddad e as equipes técnicas da Fazenda e do Planejamento estão com um discurso bastante harmonizado de cumprir a meta de 2024 recorrendo às ferramentas disponíveis: a ampliação das receitas, busca eventual de receitas "one-off" (que só ocorrem uma vez) e, se tudo isso for insuficiente, contingenciamento de despesas. Em termos de cumprir o arcabouço no médio prazo, é preciso reavaliar em algum momento a atual regra de gastos com saúde e educação (vinculadas à variação da receita).

"O problema é que o mercado não acredita que o governo vai topar fazer contingenciamento caso não consiga as receitas suficientes", diz Manoel. Nesse caso, a meta de 2024 precisaria ser mudada no processo legislativo do Orçamento. Isso se daria ou no final deste ano ou no primeiro bimestre do próximo.

Na abordagem do sócio da AZ Quest, diante do ceticismo do mercado, o governo está numa situação parecida com a da história de São Tomé, em que é preciso ver para crer - isto é, o mercado só vai reagir favoravelmente à medida que o governo for provando que entrega seus compromissos.

Isso, por sua vez, na interpretação de Manoel, tem consequências econômicas muito relevantes.

"Se o mercado acreditasse nas metas e compromissos do governo, os preços dos ativos brasileiros hoje seriam muito melhores, o que afeta especialmente os juros futuros, que têm muito o que andar [no sentido de caírem]".

O economista aponta, inclusive, que o Brasil está bem em termos de esforço fiscal na comparação internacional. Tendo saído da pandemia com dívida pública como proporção do PIB igual ou até um pouco menor do que entrou, o País aprovou regras restritivas ao crescimento da despesa com um governo de esquerda, enquanto outros países estão fazendo ajustes fiscais mais lentos ou nem estão fazendo. Ele menciona o recente anúncio pelo governo mexicano de um substancial aumento do déficit público em 2024, ano de eleições gerais.

Porém, como o mercado não compra essa visão de credibilidade fiscal da gestão de Lula 3, não entregar a meta de 2024 (isto é, modificá-la) seria - na visão do analista - jogar fora todo o esforço do governo até agora de controlar as expectativas fiscais.

Por outro lado, acrescenta Manoel, "se o governo cumprir, o prêmio será gigante".

Ele considera inclusive que essa conquista final da confiança do mercado na política fiscal pode ser o "gatilho" que finalmente fará os investidores internacionais cristalizarem a visão de que o País é hoje um destaque entre emergentes como Chile, Colômbia, México e Argentina, e passarem das palavras à ação em termos de investir no Brasil.

Para Manoel, "a meta de primário é bastante desafiadora, mas a essa altura o governo não tem outra opção melhor do que cumpri-la". Ele lembra que há o contingenciamento, em último caso, mas também a possibilidade de receitas "one-off", como a antecipação de recebíveis do pré-sal que cabem à PPSA (estatal criada para gerir o óleo-lucro da partilha), com grande potencial.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 12/9/2023, terça-feira.

O governo tem muito a perder, ou muito a ganhar, na decisão sobre mexer ou não na meta de resultado primário de 2024 (déficit zero), na visão do economista Alexandre Manoel, sócio e economista-chefe da gestora AZ Quest, e com experiência no setor público em passagem pelo Ministério da Fazenda.

A posição de Manoel é clara: o governo deve manter a meta de primário zerado para 2024.

O economista da AZ Quest se destaca por, desde o início do terceiro mandato de Lula, ter mantido uma posição bem menos cética sobre a qualidade da atual política econômica do que a média do mercado financeiro.

E é a partir dessa premissa que ele estrutura o seu raciocínio sobre as vantagens para o governo de manter a meta de primário para 2024 (e sobre as desvantagens de mudar).

Manoel considera que a equipe econômica do atual governo, liderada por Fernando Haddad, ministro da Fazenda, conseguiu afastar, dos temores do mercado, o chamado "risco de cauda" (diz-se de evento de probabilidade muito baixa mas que, por vezes, ocorre), isto é, uma deterioração explosiva da política fiscal.

Apesar disso, na sua opinião, o consenso de mercado permanece muito cético em relação à política econômica. Para ele, há analistas que não compreenderam o quão restritivo o novo arcabouço fiscal é (principalmente a partir de 2025), e outros que compreenderam mas pensam que o governo vai tentar contornar ou mudar as regras quando bater nessas restrições.

Em relação a 2024, o que está "pegando" é a meta de primário, e muitos no mercado consideram que, diante da grande dificuldade de cumpri-la, o governo poderia mudar a meta.

Manoel recorda que os analistas duvidavam que o teto seria substituído por um arcabouço com restrição efetiva de despesas, mas isso acabou ocorrendo. Duvidaram e duvidam das metas de primário até 2026, mas o governo está correndo atrás de um pacote de receitas para tentar viabilizá-las.

Existe também muito ceticismo em relação às projeções das receitas que o governo pretende obter com suas diversas medidas, como a estimativa de R$ 54,7 bilhões no caso do voto de qualidade do CARF (voto de Minerva a favor do governo em disputas tributárias), recém-aprovado pelo Congresso. Mas há, por outro lado, gente que conhece o assunto e que pensa que pode ser até mais, contrapõe Manoel.

O analista da AZ Quest nota que Haddad e as equipes técnicas da Fazenda e do Planejamento estão com um discurso bastante harmonizado de cumprir a meta de 2024 recorrendo às ferramentas disponíveis: a ampliação das receitas, busca eventual de receitas "one-off" (que só ocorrem uma vez) e, se tudo isso for insuficiente, contingenciamento de despesas. Em termos de cumprir o arcabouço no médio prazo, é preciso reavaliar em algum momento a atual regra de gastos com saúde e educação (vinculadas à variação da receita).

"O problema é que o mercado não acredita que o governo vai topar fazer contingenciamento caso não consiga as receitas suficientes", diz Manoel. Nesse caso, a meta de 2024 precisaria ser mudada no processo legislativo do Orçamento. Isso se daria ou no final deste ano ou no primeiro bimestre do próximo.

Na abordagem do sócio da AZ Quest, diante do ceticismo do mercado, o governo está numa situação parecida com a da história de São Tomé, em que é preciso ver para crer - isto é, o mercado só vai reagir favoravelmente à medida que o governo for provando que entrega seus compromissos.

Isso, por sua vez, na interpretação de Manoel, tem consequências econômicas muito relevantes.

"Se o mercado acreditasse nas metas e compromissos do governo, os preços dos ativos brasileiros hoje seriam muito melhores, o que afeta especialmente os juros futuros, que têm muito o que andar [no sentido de caírem]".

O economista aponta, inclusive, que o Brasil está bem em termos de esforço fiscal na comparação internacional. Tendo saído da pandemia com dívida pública como proporção do PIB igual ou até um pouco menor do que entrou, o País aprovou regras restritivas ao crescimento da despesa com um governo de esquerda, enquanto outros países estão fazendo ajustes fiscais mais lentos ou nem estão fazendo. Ele menciona o recente anúncio pelo governo mexicano de um substancial aumento do déficit público em 2024, ano de eleições gerais.

Porém, como o mercado não compra essa visão de credibilidade fiscal da gestão de Lula 3, não entregar a meta de 2024 (isto é, modificá-la) seria - na visão do analista - jogar fora todo o esforço do governo até agora de controlar as expectativas fiscais.

Por outro lado, acrescenta Manoel, "se o governo cumprir, o prêmio será gigante".

Ele considera inclusive que essa conquista final da confiança do mercado na política fiscal pode ser o "gatilho" que finalmente fará os investidores internacionais cristalizarem a visão de que o País é hoje um destaque entre emergentes como Chile, Colômbia, México e Argentina, e passarem das palavras à ação em termos de investir no Brasil.

Para Manoel, "a meta de primário é bastante desafiadora, mas a essa altura o governo não tem outra opção melhor do que cumpri-la". Ele lembra que há o contingenciamento, em último caso, mas também a possibilidade de receitas "one-off", como a antecipação de recebíveis do pré-sal que cabem à PPSA (estatal criada para gerir o óleo-lucro da partilha), com grande potencial.

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