Sempre há um caminho pelo meio

Uma diferença de R$ 40 bilhões


A nova equipe econômica busca se diferenciar da antiga, liderada por Mantega e Arno Augustin, trazendo números mais realistas para as projeções oficiais. Mas continua inflando receitas...que somente poderão ser alcançadas com novos aumentos de impostos.

Por João Villaverde

Quarenta bilhões de reais. Esta é, aproximadamente, a diferença entre a previsão oficial de receitas que o governo Dilma Rousseff anunciou na semana passada e o que realmente se espera que entre nos cofres federais neste ano. Sim, a estimativa de arrecadação ao longo de 2015 feita pelo governo está cerca de R$ 40 bilhões acima do que é "realista" prever, segundo especialistas em contas públicas e também segundo técnicos do próprio Ministério da Fazenda consultados por este blog.

Isso é de grande importância e o leitor já deve ter entendido que isso deve chegar ao bolso dele.

continua após a publicidade
Ministros da Casa Civil (Aloizio Mercadante) e da Fazenda (Joaquim Levy) defendem o ajuste fiscal. Foto de André Dusek/Estadão Foto: Estadão

Na semana passada, o governo editou o decreto de programação orçamentária e financeira. A parte mais "pop" deste decreto foi o corte de R$ 69,9 bilhões em despesas federais, anunciado pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. Só que neste decreto o governo também reduziu a projeção oficial de crescimento da economia. Até sexta-feira, a previsão do governo era de uma alta de 0,8% no PIB de 2015. No decreto, o governo trouxe uma previsão realista - o que foi elogiado por todos que acompanham as contas pública. Agora, o governo prevê que o PIB cairá 1,2% neste ano. Será a maior recessão dos últimos 25 anos. Não é um cenário pessimista: há gente no mercado que trabalha com uma queda ainda maior.

Pois bem. O governo "atualizou" sua projeção de PIB, mas na hora de acertar suas projeções de receitas... a redução não seguiu a mesma proporção. Como se sabe, a relação entre o PIB e as receitas do governo é quase perfeita: estatisticamente falando é de quase "um para um". Isto é, se o PIB cresce 1%, a receita deve crescer por volta de 1% também.

continua após a publicidade

O governo colocou uma previsão de PIB de -1,2%, mas as receitas crescendo 4%, em termos reais. Há uma diferença de mais de R$ 60 bilhões aí, mas todos avaliam que mesmo neste ano ruim, a arrecadação não deve cair em relação a 2014, ficando praticamente no mesmo patamar. Neste caso, a diferença é de R$ 40 bilhões.

São estes R$ 40 bilhões que estão inflando a projeção oficial do governo para as receitas federais.

Como resolver isso? Há dois caminhos.

continua após a publicidade

1) Dentro de dois meses, o governo será obrigado a editar um novo decreto de programação orçamentária. Neste caso, ele pode fazer uma nova projeção de receitas, adequando o número à realidade. Até lá, os dados mensais da Receita Federal continuarão dando mostras de que a projeção da nova equipe econômica parece aquelas feitas pela antiga equipe, de Guido Mantega e Arno Augustin. De janeiro a abril, a Receita recolheu 2,7% menos impostos, em termos reais, que em igual período do ano passado. Mais: abril de 2015 foi o pior mês de abril para a Receita em cinco anos. Sabe-se, já, que os dados de maio também são ruins. O governo ficará mais dois meses acumulando dados ruins da realidade até, enfim, revisar suas projeções de receitas?

2) O governo pode aumentar mais impostos, em busca desta diferença de R$ 40 bilhões.

Qual caminho será adotado?

continua após a publicidade

Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi questionado justamente sobre isso, logo após participar da reunião de coordenação política com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto. Ele deu uma dica importante. Ao ser perguntado se a projeção de receitas do governo era realista e se ela implicava em mais impostos para ser atingida, Levy respondeu: "Sim, ela é realista... mas vamos ter que nos esforçar".

Se é realista, não é preciso de esforço, não é? ( vídeo da entrevista de segunda - aos 28 minutos, a fala de Levy com a dica)

Ou seja, estamos diante de um cenário que parece combinar as duas saídas que apresentamos pouco acima. O governo deve aumentar novos impostos e, também, reduzir um pouco mais suas projeções de receitas.

continua após a publicidade

O ano de ajuste fiscal está apenas começando.

****

Sobre novos impostos, fontes da equipe econômica já avisaram que alguns tributos estão na mira. São eles: o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o PIS/Cofins e a extinção do benefício fiscal chamado Juros sobre Capital Próprio (JCP), que favorece grandes empresas e bancos de capital aberto. Além disso, o governo não descarta uma possível volta da CPMF, o antigo "imposto do chefe", extinto em dezembro de 2007.

continua após a publicidade

****

Um caminho alternativo à alta de impostos é um corte ainda maior nos gastos públicos. Levy pressionou internamente para que o corte de despesas do governo beirasse R$ 80 bilhões, mas afinal cedeu - a contragosto - para o contingenciamento anunciado, de R$ 69,9 bilhões. Parte do esforço fiscal do governo também depende das medidas provisórias que o Senado vai votar nesta semana, que estão há 7 dias de perderem a validade.

Se o Senado aprovar, como quer o governo, os gastos com programas obrigatórios como o seguro-desemprego e o abono salarial podem ser R$ 5 bilhões menores neste ano, como prevê oficialmente o governo no decreto de programação orçamentária. Mas se as medidas não passarem, elas vão "caducar". O governo será forçado a, dentro de dois meses, aumentar em pelo menos R$ 5 bilhões suas estimativas com essas despesas, que são obrigatórias. Isso pode ser compensando com um aumento no corte das despesas discricionárias (os citados R$ 69,9 bilhões) ou, novamente, com mais impostos.

Seja como for, a situação fiscal é tão crítica depois das "pedaladas fiscais" e do forte aumento da dívida pública bruta, verificado no ano passado, que o governo não pode, simplesmente, anunciar uma meta menor para este ano e assim evitar mais aumentos de impostos e/ou cortes de gastos adicionais.

****

Em tempo: A proposta de Orçamento para 2015 enviada no ano passado pela equipe antiga - os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento) e o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin - merece ser lembrada hoje (clique aqui).

Veja, caro leitor, o que a equipe econômica pensava sobre 2015 em agosto do ano passado, quando todos já tinham um quadro razoavelmente claro das dificuldades que estavam adiante da economia.

O governo previa que a inflação terminaria 2015 com uma alta de 5% (será maior que 8%, segundo o mercado e o próprio governo hoje admite) e que o PIB cresceria 3% (haverá uma recessão de 1,2% segundo o próprio governo hoje admite).

Além disso, a equipe antiga previa uma alta tão forte das receitas (porque baseada na alta de 3% do PIB) que seria possível cumprir uma meta fiscal equivalente a 2% do PIB. A nova equipe reduziu a meta fiscal para 1,2% do PIB e mesmo depois de todos os esforços do ajuste para chegar lá ninguém no mercado hoje, maio de 2015, acredita que chegará em 1,2%. Imagine se ainda estivesse em 2%?

Previsões irreais, contabilidade criativa, "pedaladas fiscais" e aumento da dívida pública. Este é o quadro que arruinou a credibilidade da política fiscal do governo Dilma Rousseff. Será que o ajuste conduzido agora em 2015 será capaz de reverter as expectativas?

****

Atualização de 29/05/2015

O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, concedeu ontem (quinta-feira, 28 de maio), uma entrevista exclusiva ao Estadão, publicada na edição de hoje. Quando questionamos o ministro sobre essa diferença de R$ 40 bilhões, Barbosa afirmou que o governo vai buscar todo tipo de recurso fiscal para atingir essa meta de receitas.

Segundo Barbosa, a projeção de aumento de receitas mesmo em ano de grave recessão é realista porque: "Teremos algumas operações patrimoniais que geram arrecadação para o governo". Ele citou a operação do Banco do Brasil (BB) com a Cielo, que gerou um ganho patrimonial ao BB. Com isso, o BB pagou mais Imposto de Renda (IR) e mais Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). "Esse dinheiro era para ter entrado em 2014, mas acabou sendo pago agora em 2015. Foram quase R$ 5 bilhões em receita com IR e CSLL somente com essa operação", disse Barbosa.

Mas e os R$ 35 bilhões restantes? Segundo ele: "O governo está trabalhando na abertura de capital da Caixa Seguradora. Se o governo tiver sucesso nisso - e estamos trabalhando para que tenha - isso vai gerar uma valorização da Caixa que vai se traduzir em aumento da arrecadação com IR e CSLL neste ano". E o que mais que o governo aposta? "Tem a privatização da Companhia Energética de Goiás (Celg), que estamos preparando, o leilão da folha de pagamento dos servidores da União e da área de prestação de serviço da Loteria".

Ou seja, caro leitor: o governo está apostando em receitas extraordinárias, que serão obtidas com a venda de estatais e leilões especiais para cumprir sua meta de receita neste ano. Se tudo der certo, Barbosa acredita que, até dezembro, a previsão vai se confirmar.

Vamos ver.

Quarenta bilhões de reais. Esta é, aproximadamente, a diferença entre a previsão oficial de receitas que o governo Dilma Rousseff anunciou na semana passada e o que realmente se espera que entre nos cofres federais neste ano. Sim, a estimativa de arrecadação ao longo de 2015 feita pelo governo está cerca de R$ 40 bilhões acima do que é "realista" prever, segundo especialistas em contas públicas e também segundo técnicos do próprio Ministério da Fazenda consultados por este blog.

Isso é de grande importância e o leitor já deve ter entendido que isso deve chegar ao bolso dele.

Ministros da Casa Civil (Aloizio Mercadante) e da Fazenda (Joaquim Levy) defendem o ajuste fiscal. Foto de André Dusek/Estadão Foto: Estadão

Na semana passada, o governo editou o decreto de programação orçamentária e financeira. A parte mais "pop" deste decreto foi o corte de R$ 69,9 bilhões em despesas federais, anunciado pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. Só que neste decreto o governo também reduziu a projeção oficial de crescimento da economia. Até sexta-feira, a previsão do governo era de uma alta de 0,8% no PIB de 2015. No decreto, o governo trouxe uma previsão realista - o que foi elogiado por todos que acompanham as contas pública. Agora, o governo prevê que o PIB cairá 1,2% neste ano. Será a maior recessão dos últimos 25 anos. Não é um cenário pessimista: há gente no mercado que trabalha com uma queda ainda maior.

Pois bem. O governo "atualizou" sua projeção de PIB, mas na hora de acertar suas projeções de receitas... a redução não seguiu a mesma proporção. Como se sabe, a relação entre o PIB e as receitas do governo é quase perfeita: estatisticamente falando é de quase "um para um". Isto é, se o PIB cresce 1%, a receita deve crescer por volta de 1% também.

O governo colocou uma previsão de PIB de -1,2%, mas as receitas crescendo 4%, em termos reais. Há uma diferença de mais de R$ 60 bilhões aí, mas todos avaliam que mesmo neste ano ruim, a arrecadação não deve cair em relação a 2014, ficando praticamente no mesmo patamar. Neste caso, a diferença é de R$ 40 bilhões.

São estes R$ 40 bilhões que estão inflando a projeção oficial do governo para as receitas federais.

Como resolver isso? Há dois caminhos.

1) Dentro de dois meses, o governo será obrigado a editar um novo decreto de programação orçamentária. Neste caso, ele pode fazer uma nova projeção de receitas, adequando o número à realidade. Até lá, os dados mensais da Receita Federal continuarão dando mostras de que a projeção da nova equipe econômica parece aquelas feitas pela antiga equipe, de Guido Mantega e Arno Augustin. De janeiro a abril, a Receita recolheu 2,7% menos impostos, em termos reais, que em igual período do ano passado. Mais: abril de 2015 foi o pior mês de abril para a Receita em cinco anos. Sabe-se, já, que os dados de maio também são ruins. O governo ficará mais dois meses acumulando dados ruins da realidade até, enfim, revisar suas projeções de receitas?

2) O governo pode aumentar mais impostos, em busca desta diferença de R$ 40 bilhões.

Qual caminho será adotado?

Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi questionado justamente sobre isso, logo após participar da reunião de coordenação política com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto. Ele deu uma dica importante. Ao ser perguntado se a projeção de receitas do governo era realista e se ela implicava em mais impostos para ser atingida, Levy respondeu: "Sim, ela é realista... mas vamos ter que nos esforçar".

Se é realista, não é preciso de esforço, não é? ( vídeo da entrevista de segunda - aos 28 minutos, a fala de Levy com a dica)

Ou seja, estamos diante de um cenário que parece combinar as duas saídas que apresentamos pouco acima. O governo deve aumentar novos impostos e, também, reduzir um pouco mais suas projeções de receitas.

O ano de ajuste fiscal está apenas começando.

****

Sobre novos impostos, fontes da equipe econômica já avisaram que alguns tributos estão na mira. São eles: o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o PIS/Cofins e a extinção do benefício fiscal chamado Juros sobre Capital Próprio (JCP), que favorece grandes empresas e bancos de capital aberto. Além disso, o governo não descarta uma possível volta da CPMF, o antigo "imposto do chefe", extinto em dezembro de 2007.

****

Um caminho alternativo à alta de impostos é um corte ainda maior nos gastos públicos. Levy pressionou internamente para que o corte de despesas do governo beirasse R$ 80 bilhões, mas afinal cedeu - a contragosto - para o contingenciamento anunciado, de R$ 69,9 bilhões. Parte do esforço fiscal do governo também depende das medidas provisórias que o Senado vai votar nesta semana, que estão há 7 dias de perderem a validade.

Se o Senado aprovar, como quer o governo, os gastos com programas obrigatórios como o seguro-desemprego e o abono salarial podem ser R$ 5 bilhões menores neste ano, como prevê oficialmente o governo no decreto de programação orçamentária. Mas se as medidas não passarem, elas vão "caducar". O governo será forçado a, dentro de dois meses, aumentar em pelo menos R$ 5 bilhões suas estimativas com essas despesas, que são obrigatórias. Isso pode ser compensando com um aumento no corte das despesas discricionárias (os citados R$ 69,9 bilhões) ou, novamente, com mais impostos.

Seja como for, a situação fiscal é tão crítica depois das "pedaladas fiscais" e do forte aumento da dívida pública bruta, verificado no ano passado, que o governo não pode, simplesmente, anunciar uma meta menor para este ano e assim evitar mais aumentos de impostos e/ou cortes de gastos adicionais.

****

Em tempo: A proposta de Orçamento para 2015 enviada no ano passado pela equipe antiga - os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento) e o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin - merece ser lembrada hoje (clique aqui).

Veja, caro leitor, o que a equipe econômica pensava sobre 2015 em agosto do ano passado, quando todos já tinham um quadro razoavelmente claro das dificuldades que estavam adiante da economia.

O governo previa que a inflação terminaria 2015 com uma alta de 5% (será maior que 8%, segundo o mercado e o próprio governo hoje admite) e que o PIB cresceria 3% (haverá uma recessão de 1,2% segundo o próprio governo hoje admite).

Além disso, a equipe antiga previa uma alta tão forte das receitas (porque baseada na alta de 3% do PIB) que seria possível cumprir uma meta fiscal equivalente a 2% do PIB. A nova equipe reduziu a meta fiscal para 1,2% do PIB e mesmo depois de todos os esforços do ajuste para chegar lá ninguém no mercado hoje, maio de 2015, acredita que chegará em 1,2%. Imagine se ainda estivesse em 2%?

Previsões irreais, contabilidade criativa, "pedaladas fiscais" e aumento da dívida pública. Este é o quadro que arruinou a credibilidade da política fiscal do governo Dilma Rousseff. Será que o ajuste conduzido agora em 2015 será capaz de reverter as expectativas?

****

Atualização de 29/05/2015

O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, concedeu ontem (quinta-feira, 28 de maio), uma entrevista exclusiva ao Estadão, publicada na edição de hoje. Quando questionamos o ministro sobre essa diferença de R$ 40 bilhões, Barbosa afirmou que o governo vai buscar todo tipo de recurso fiscal para atingir essa meta de receitas.

Segundo Barbosa, a projeção de aumento de receitas mesmo em ano de grave recessão é realista porque: "Teremos algumas operações patrimoniais que geram arrecadação para o governo". Ele citou a operação do Banco do Brasil (BB) com a Cielo, que gerou um ganho patrimonial ao BB. Com isso, o BB pagou mais Imposto de Renda (IR) e mais Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). "Esse dinheiro era para ter entrado em 2014, mas acabou sendo pago agora em 2015. Foram quase R$ 5 bilhões em receita com IR e CSLL somente com essa operação", disse Barbosa.

Mas e os R$ 35 bilhões restantes? Segundo ele: "O governo está trabalhando na abertura de capital da Caixa Seguradora. Se o governo tiver sucesso nisso - e estamos trabalhando para que tenha - isso vai gerar uma valorização da Caixa que vai se traduzir em aumento da arrecadação com IR e CSLL neste ano". E o que mais que o governo aposta? "Tem a privatização da Companhia Energética de Goiás (Celg), que estamos preparando, o leilão da folha de pagamento dos servidores da União e da área de prestação de serviço da Loteria".

Ou seja, caro leitor: o governo está apostando em receitas extraordinárias, que serão obtidas com a venda de estatais e leilões especiais para cumprir sua meta de receita neste ano. Se tudo der certo, Barbosa acredita que, até dezembro, a previsão vai se confirmar.

Vamos ver.

Quarenta bilhões de reais. Esta é, aproximadamente, a diferença entre a previsão oficial de receitas que o governo Dilma Rousseff anunciou na semana passada e o que realmente se espera que entre nos cofres federais neste ano. Sim, a estimativa de arrecadação ao longo de 2015 feita pelo governo está cerca de R$ 40 bilhões acima do que é "realista" prever, segundo especialistas em contas públicas e também segundo técnicos do próprio Ministério da Fazenda consultados por este blog.

Isso é de grande importância e o leitor já deve ter entendido que isso deve chegar ao bolso dele.

Ministros da Casa Civil (Aloizio Mercadante) e da Fazenda (Joaquim Levy) defendem o ajuste fiscal. Foto de André Dusek/Estadão Foto: Estadão

Na semana passada, o governo editou o decreto de programação orçamentária e financeira. A parte mais "pop" deste decreto foi o corte de R$ 69,9 bilhões em despesas federais, anunciado pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. Só que neste decreto o governo também reduziu a projeção oficial de crescimento da economia. Até sexta-feira, a previsão do governo era de uma alta de 0,8% no PIB de 2015. No decreto, o governo trouxe uma previsão realista - o que foi elogiado por todos que acompanham as contas pública. Agora, o governo prevê que o PIB cairá 1,2% neste ano. Será a maior recessão dos últimos 25 anos. Não é um cenário pessimista: há gente no mercado que trabalha com uma queda ainda maior.

Pois bem. O governo "atualizou" sua projeção de PIB, mas na hora de acertar suas projeções de receitas... a redução não seguiu a mesma proporção. Como se sabe, a relação entre o PIB e as receitas do governo é quase perfeita: estatisticamente falando é de quase "um para um". Isto é, se o PIB cresce 1%, a receita deve crescer por volta de 1% também.

O governo colocou uma previsão de PIB de -1,2%, mas as receitas crescendo 4%, em termos reais. Há uma diferença de mais de R$ 60 bilhões aí, mas todos avaliam que mesmo neste ano ruim, a arrecadação não deve cair em relação a 2014, ficando praticamente no mesmo patamar. Neste caso, a diferença é de R$ 40 bilhões.

São estes R$ 40 bilhões que estão inflando a projeção oficial do governo para as receitas federais.

Como resolver isso? Há dois caminhos.

1) Dentro de dois meses, o governo será obrigado a editar um novo decreto de programação orçamentária. Neste caso, ele pode fazer uma nova projeção de receitas, adequando o número à realidade. Até lá, os dados mensais da Receita Federal continuarão dando mostras de que a projeção da nova equipe econômica parece aquelas feitas pela antiga equipe, de Guido Mantega e Arno Augustin. De janeiro a abril, a Receita recolheu 2,7% menos impostos, em termos reais, que em igual período do ano passado. Mais: abril de 2015 foi o pior mês de abril para a Receita em cinco anos. Sabe-se, já, que os dados de maio também são ruins. O governo ficará mais dois meses acumulando dados ruins da realidade até, enfim, revisar suas projeções de receitas?

2) O governo pode aumentar mais impostos, em busca desta diferença de R$ 40 bilhões.

Qual caminho será adotado?

Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi questionado justamente sobre isso, logo após participar da reunião de coordenação política com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto. Ele deu uma dica importante. Ao ser perguntado se a projeção de receitas do governo era realista e se ela implicava em mais impostos para ser atingida, Levy respondeu: "Sim, ela é realista... mas vamos ter que nos esforçar".

Se é realista, não é preciso de esforço, não é? ( vídeo da entrevista de segunda - aos 28 minutos, a fala de Levy com a dica)

Ou seja, estamos diante de um cenário que parece combinar as duas saídas que apresentamos pouco acima. O governo deve aumentar novos impostos e, também, reduzir um pouco mais suas projeções de receitas.

O ano de ajuste fiscal está apenas começando.

****

Sobre novos impostos, fontes da equipe econômica já avisaram que alguns tributos estão na mira. São eles: o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o PIS/Cofins e a extinção do benefício fiscal chamado Juros sobre Capital Próprio (JCP), que favorece grandes empresas e bancos de capital aberto. Além disso, o governo não descarta uma possível volta da CPMF, o antigo "imposto do chefe", extinto em dezembro de 2007.

****

Um caminho alternativo à alta de impostos é um corte ainda maior nos gastos públicos. Levy pressionou internamente para que o corte de despesas do governo beirasse R$ 80 bilhões, mas afinal cedeu - a contragosto - para o contingenciamento anunciado, de R$ 69,9 bilhões. Parte do esforço fiscal do governo também depende das medidas provisórias que o Senado vai votar nesta semana, que estão há 7 dias de perderem a validade.

Se o Senado aprovar, como quer o governo, os gastos com programas obrigatórios como o seguro-desemprego e o abono salarial podem ser R$ 5 bilhões menores neste ano, como prevê oficialmente o governo no decreto de programação orçamentária. Mas se as medidas não passarem, elas vão "caducar". O governo será forçado a, dentro de dois meses, aumentar em pelo menos R$ 5 bilhões suas estimativas com essas despesas, que são obrigatórias. Isso pode ser compensando com um aumento no corte das despesas discricionárias (os citados R$ 69,9 bilhões) ou, novamente, com mais impostos.

Seja como for, a situação fiscal é tão crítica depois das "pedaladas fiscais" e do forte aumento da dívida pública bruta, verificado no ano passado, que o governo não pode, simplesmente, anunciar uma meta menor para este ano e assim evitar mais aumentos de impostos e/ou cortes de gastos adicionais.

****

Em tempo: A proposta de Orçamento para 2015 enviada no ano passado pela equipe antiga - os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento) e o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin - merece ser lembrada hoje (clique aqui).

Veja, caro leitor, o que a equipe econômica pensava sobre 2015 em agosto do ano passado, quando todos já tinham um quadro razoavelmente claro das dificuldades que estavam adiante da economia.

O governo previa que a inflação terminaria 2015 com uma alta de 5% (será maior que 8%, segundo o mercado e o próprio governo hoje admite) e que o PIB cresceria 3% (haverá uma recessão de 1,2% segundo o próprio governo hoje admite).

Além disso, a equipe antiga previa uma alta tão forte das receitas (porque baseada na alta de 3% do PIB) que seria possível cumprir uma meta fiscal equivalente a 2% do PIB. A nova equipe reduziu a meta fiscal para 1,2% do PIB e mesmo depois de todos os esforços do ajuste para chegar lá ninguém no mercado hoje, maio de 2015, acredita que chegará em 1,2%. Imagine se ainda estivesse em 2%?

Previsões irreais, contabilidade criativa, "pedaladas fiscais" e aumento da dívida pública. Este é o quadro que arruinou a credibilidade da política fiscal do governo Dilma Rousseff. Será que o ajuste conduzido agora em 2015 será capaz de reverter as expectativas?

****

Atualização de 29/05/2015

O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, concedeu ontem (quinta-feira, 28 de maio), uma entrevista exclusiva ao Estadão, publicada na edição de hoje. Quando questionamos o ministro sobre essa diferença de R$ 40 bilhões, Barbosa afirmou que o governo vai buscar todo tipo de recurso fiscal para atingir essa meta de receitas.

Segundo Barbosa, a projeção de aumento de receitas mesmo em ano de grave recessão é realista porque: "Teremos algumas operações patrimoniais que geram arrecadação para o governo". Ele citou a operação do Banco do Brasil (BB) com a Cielo, que gerou um ganho patrimonial ao BB. Com isso, o BB pagou mais Imposto de Renda (IR) e mais Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). "Esse dinheiro era para ter entrado em 2014, mas acabou sendo pago agora em 2015. Foram quase R$ 5 bilhões em receita com IR e CSLL somente com essa operação", disse Barbosa.

Mas e os R$ 35 bilhões restantes? Segundo ele: "O governo está trabalhando na abertura de capital da Caixa Seguradora. Se o governo tiver sucesso nisso - e estamos trabalhando para que tenha - isso vai gerar uma valorização da Caixa que vai se traduzir em aumento da arrecadação com IR e CSLL neste ano". E o que mais que o governo aposta? "Tem a privatização da Companhia Energética de Goiás (Celg), que estamos preparando, o leilão da folha de pagamento dos servidores da União e da área de prestação de serviço da Loteria".

Ou seja, caro leitor: o governo está apostando em receitas extraordinárias, que serão obtidas com a venda de estatais e leilões especiais para cumprir sua meta de receita neste ano. Se tudo der certo, Barbosa acredita que, até dezembro, a previsão vai se confirmar.

Vamos ver.

Quarenta bilhões de reais. Esta é, aproximadamente, a diferença entre a previsão oficial de receitas que o governo Dilma Rousseff anunciou na semana passada e o que realmente se espera que entre nos cofres federais neste ano. Sim, a estimativa de arrecadação ao longo de 2015 feita pelo governo está cerca de R$ 40 bilhões acima do que é "realista" prever, segundo especialistas em contas públicas e também segundo técnicos do próprio Ministério da Fazenda consultados por este blog.

Isso é de grande importância e o leitor já deve ter entendido que isso deve chegar ao bolso dele.

Ministros da Casa Civil (Aloizio Mercadante) e da Fazenda (Joaquim Levy) defendem o ajuste fiscal. Foto de André Dusek/Estadão Foto: Estadão

Na semana passada, o governo editou o decreto de programação orçamentária e financeira. A parte mais "pop" deste decreto foi o corte de R$ 69,9 bilhões em despesas federais, anunciado pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. Só que neste decreto o governo também reduziu a projeção oficial de crescimento da economia. Até sexta-feira, a previsão do governo era de uma alta de 0,8% no PIB de 2015. No decreto, o governo trouxe uma previsão realista - o que foi elogiado por todos que acompanham as contas pública. Agora, o governo prevê que o PIB cairá 1,2% neste ano. Será a maior recessão dos últimos 25 anos. Não é um cenário pessimista: há gente no mercado que trabalha com uma queda ainda maior.

Pois bem. O governo "atualizou" sua projeção de PIB, mas na hora de acertar suas projeções de receitas... a redução não seguiu a mesma proporção. Como se sabe, a relação entre o PIB e as receitas do governo é quase perfeita: estatisticamente falando é de quase "um para um". Isto é, se o PIB cresce 1%, a receita deve crescer por volta de 1% também.

O governo colocou uma previsão de PIB de -1,2%, mas as receitas crescendo 4%, em termos reais. Há uma diferença de mais de R$ 60 bilhões aí, mas todos avaliam que mesmo neste ano ruim, a arrecadação não deve cair em relação a 2014, ficando praticamente no mesmo patamar. Neste caso, a diferença é de R$ 40 bilhões.

São estes R$ 40 bilhões que estão inflando a projeção oficial do governo para as receitas federais.

Como resolver isso? Há dois caminhos.

1) Dentro de dois meses, o governo será obrigado a editar um novo decreto de programação orçamentária. Neste caso, ele pode fazer uma nova projeção de receitas, adequando o número à realidade. Até lá, os dados mensais da Receita Federal continuarão dando mostras de que a projeção da nova equipe econômica parece aquelas feitas pela antiga equipe, de Guido Mantega e Arno Augustin. De janeiro a abril, a Receita recolheu 2,7% menos impostos, em termos reais, que em igual período do ano passado. Mais: abril de 2015 foi o pior mês de abril para a Receita em cinco anos. Sabe-se, já, que os dados de maio também são ruins. O governo ficará mais dois meses acumulando dados ruins da realidade até, enfim, revisar suas projeções de receitas?

2) O governo pode aumentar mais impostos, em busca desta diferença de R$ 40 bilhões.

Qual caminho será adotado?

Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi questionado justamente sobre isso, logo após participar da reunião de coordenação política com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto. Ele deu uma dica importante. Ao ser perguntado se a projeção de receitas do governo era realista e se ela implicava em mais impostos para ser atingida, Levy respondeu: "Sim, ela é realista... mas vamos ter que nos esforçar".

Se é realista, não é preciso de esforço, não é? ( vídeo da entrevista de segunda - aos 28 minutos, a fala de Levy com a dica)

Ou seja, estamos diante de um cenário que parece combinar as duas saídas que apresentamos pouco acima. O governo deve aumentar novos impostos e, também, reduzir um pouco mais suas projeções de receitas.

O ano de ajuste fiscal está apenas começando.

****

Sobre novos impostos, fontes da equipe econômica já avisaram que alguns tributos estão na mira. São eles: o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o PIS/Cofins e a extinção do benefício fiscal chamado Juros sobre Capital Próprio (JCP), que favorece grandes empresas e bancos de capital aberto. Além disso, o governo não descarta uma possível volta da CPMF, o antigo "imposto do chefe", extinto em dezembro de 2007.

****

Um caminho alternativo à alta de impostos é um corte ainda maior nos gastos públicos. Levy pressionou internamente para que o corte de despesas do governo beirasse R$ 80 bilhões, mas afinal cedeu - a contragosto - para o contingenciamento anunciado, de R$ 69,9 bilhões. Parte do esforço fiscal do governo também depende das medidas provisórias que o Senado vai votar nesta semana, que estão há 7 dias de perderem a validade.

Se o Senado aprovar, como quer o governo, os gastos com programas obrigatórios como o seguro-desemprego e o abono salarial podem ser R$ 5 bilhões menores neste ano, como prevê oficialmente o governo no decreto de programação orçamentária. Mas se as medidas não passarem, elas vão "caducar". O governo será forçado a, dentro de dois meses, aumentar em pelo menos R$ 5 bilhões suas estimativas com essas despesas, que são obrigatórias. Isso pode ser compensando com um aumento no corte das despesas discricionárias (os citados R$ 69,9 bilhões) ou, novamente, com mais impostos.

Seja como for, a situação fiscal é tão crítica depois das "pedaladas fiscais" e do forte aumento da dívida pública bruta, verificado no ano passado, que o governo não pode, simplesmente, anunciar uma meta menor para este ano e assim evitar mais aumentos de impostos e/ou cortes de gastos adicionais.

****

Em tempo: A proposta de Orçamento para 2015 enviada no ano passado pela equipe antiga - os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento) e o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin - merece ser lembrada hoje (clique aqui).

Veja, caro leitor, o que a equipe econômica pensava sobre 2015 em agosto do ano passado, quando todos já tinham um quadro razoavelmente claro das dificuldades que estavam adiante da economia.

O governo previa que a inflação terminaria 2015 com uma alta de 5% (será maior que 8%, segundo o mercado e o próprio governo hoje admite) e que o PIB cresceria 3% (haverá uma recessão de 1,2% segundo o próprio governo hoje admite).

Além disso, a equipe antiga previa uma alta tão forte das receitas (porque baseada na alta de 3% do PIB) que seria possível cumprir uma meta fiscal equivalente a 2% do PIB. A nova equipe reduziu a meta fiscal para 1,2% do PIB e mesmo depois de todos os esforços do ajuste para chegar lá ninguém no mercado hoje, maio de 2015, acredita que chegará em 1,2%. Imagine se ainda estivesse em 2%?

Previsões irreais, contabilidade criativa, "pedaladas fiscais" e aumento da dívida pública. Este é o quadro que arruinou a credibilidade da política fiscal do governo Dilma Rousseff. Será que o ajuste conduzido agora em 2015 será capaz de reverter as expectativas?

****

Atualização de 29/05/2015

O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, concedeu ontem (quinta-feira, 28 de maio), uma entrevista exclusiva ao Estadão, publicada na edição de hoje. Quando questionamos o ministro sobre essa diferença de R$ 40 bilhões, Barbosa afirmou que o governo vai buscar todo tipo de recurso fiscal para atingir essa meta de receitas.

Segundo Barbosa, a projeção de aumento de receitas mesmo em ano de grave recessão é realista porque: "Teremos algumas operações patrimoniais que geram arrecadação para o governo". Ele citou a operação do Banco do Brasil (BB) com a Cielo, que gerou um ganho patrimonial ao BB. Com isso, o BB pagou mais Imposto de Renda (IR) e mais Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). "Esse dinheiro era para ter entrado em 2014, mas acabou sendo pago agora em 2015. Foram quase R$ 5 bilhões em receita com IR e CSLL somente com essa operação", disse Barbosa.

Mas e os R$ 35 bilhões restantes? Segundo ele: "O governo está trabalhando na abertura de capital da Caixa Seguradora. Se o governo tiver sucesso nisso - e estamos trabalhando para que tenha - isso vai gerar uma valorização da Caixa que vai se traduzir em aumento da arrecadação com IR e CSLL neste ano". E o que mais que o governo aposta? "Tem a privatização da Companhia Energética de Goiás (Celg), que estamos preparando, o leilão da folha de pagamento dos servidores da União e da área de prestação de serviço da Loteria".

Ou seja, caro leitor: o governo está apostando em receitas extraordinárias, que serão obtidas com a venda de estatais e leilões especiais para cumprir sua meta de receita neste ano. Se tudo der certo, Barbosa acredita que, até dezembro, a previsão vai se confirmar.

Vamos ver.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.