É falso que Paulo Freire nunca tenha sido professor e só tenha formação em Direito


No mês em que pedagogo brasileiro completaria 100 anos, grupos bolsonaristas espalharam informações falsas sobre sua biografia

Por Gabi Coelho

Postagens nas redes sociais espalham as informações falsas de que o pedagogo Paulo Freire (1921-1997)  "nunca foi professor", que sua única formação foi bacharel em Direito e que sua experiência com alfabetização foi com adultos em acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ao Estadão Verifica, pesquisadores da obra de Freire disseram que o conteúdo é falso. O educador de fato estudou Direito, mas não exerceu a profissão e se tornou professor, com diversos títulos na área.

 

O educador iniciou sua carreira dando aulas de português no Colégio Oswaldo Cruz, de Recife (PE), em 1944, e só deixou o magistério em 1990, quando saiu da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) para comandar a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo na gestão de Luiza Erundina (então no PT, hoje no PSOL).

continua após a publicidade

Segundo o pesquisador Sérgio Haddad, biógrafo de Paulo Freire, "foi nesse período também que ele começou a dar aulas particulares. Posteriormente, a partir de 1947, trabalhou no SESI de Pernambuco como coordenador e professor de operários e de filhos de operários".

A única experiência de Freire com crianças em idade de alfabetização, de acordo com Haddad, foi em 1955, ano em que fundou juntamente com um grupo de educadores o Instituto Capibaribe. O espaço tinha a finalidade de educar crianças, formar professores e atualizar famílias. 

"No ensino superior, deu aulas na Escola de Serviço Social da Universidade de Recife, depois, em 1955, foi nomeado professor catedrático interino [professor titular] de História e Filosofia da Educação na Escola de Belas Artes", disse o pesquisador, autor do livro O educador: um perfil de Paulo Freire.

continua após a publicidade

Apesar de ter se graduado como bacharel de Direito, Freire se tornou doutor em filosofia e história da educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) em 1959, e também recebeu 41 títulos de doutor honoris causa em universidades renomadas, como Cambridge e Oxford, no Reino Unido.

Sérgio Haddad conta que, "também no exterior, além de assessorar o Ministério de Educação do Chile, Paulo Freire foi professor da Universidade de Harvard e de Genebra. Trabalhou com os governos africanos, ex-colônias portuguesas de 1975 a 1980, quando voltou ao Brasil do exílio. Sua vida foi dedicada à educação, como podemos ver". 

continua após a publicidade

Relação de Paulo Freire com o MST

O post viral também alega que a única experiência de Freire em alfabetização foi com adultos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. A afirmação é falsa. Na verdade, as origens do MST estão ligadas a conflitos fundiários nas décadas de 1970 e 1980 no Sul do Brasil; o movimento só foi institucionalizado em 1984. O método de Freire de alfabetização foi sistematizado em 1962, quando ele era professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Na década de 1980, o pedagogo lecionava na Unicamp. O Estadão Verifica não encontrou registros de que ele tenha dado aulas para o MST.

Criada por Paulo Freire e conhecida pela maneira de educar conectada ao cotidiano e às experiências dos estudantes, a metodologia freiriana tornou-se conhecida não só no Brasil, mas no mundo. A coordenadora do Projeto de Alfabetização de Jovens e Adultos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Francisca Maciel, explica que princípios do método criado pelo brasileiro são usados na educação de várias faixas etárias. 

continua após a publicidade

"Atualmente, o que a gente constata é que muitos professores dentro e fora do Brasil usam os princípios da proposta metodológica de Paulo Freire em sala de aula, desde a educação infantil", disse ela. "Não dá pra dizer que Freire tem só alfabetização de jovens e adultos. É a formação de uma pessoa, em todas as etapas da vida. Os princípios freirianos vão muito além dos muros da educação. Hoje a saúde, a engenharia, diferentes áreas do conhecimento tomam os princípios para suas formações". 

Ataques do presidente

Paulo Freire faria 100 anos neste mês. O intelectual é alvo constante de ataques do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de seus seguidores. Na opinião de Sérgio Haddad, a busca pelo educador e o aumento de desinformação sobre sua obra "vêm desde a campanha eleitoral".

continua após a publicidade

Na última quinta-feira, 16, a Justiça Federal do Rio proibiu o governo federal de tomar qualquer atitude que atente contra a dignidade de Paulo Freire. 

Na mesma semana, uma das maiores universidades do mundo, Columbia, em Nova York, anunciou no centenário do educador brasileiro uma série de eventos e incentivos para pesquisa sobre o seu trabalho. "Equidade, educação antirracista, gênero, a preocupação com diferentes camadas de opressão e exploração são temas com muita força na academia atualmente. E foram explorados há muitas décadas por Freire", disse o professor brasileiro de Columbia Paulo Blikstein, ao Estadão.

Com mais de 12 mil interações no Facebook e quase 18 mil no Twitter, a publicação falsa analisada aqui foi feita por Paula Marisa, youtuber bolsonarista e ex-candidata a vereadora de Canoas (RS), em 2020. O Estadão Verifica entrou em contato com a autora do post, mas não teve retorno até o momento da publicação desta checagem. 

continua após a publicidade

Aos Fatos e">">AFP também apuraram a informação que circula nas redes sociais. 

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Postagens nas redes sociais espalham as informações falsas de que o pedagogo Paulo Freire (1921-1997)  "nunca foi professor", que sua única formação foi bacharel em Direito e que sua experiência com alfabetização foi com adultos em acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ao Estadão Verifica, pesquisadores da obra de Freire disseram que o conteúdo é falso. O educador de fato estudou Direito, mas não exerceu a profissão e se tornou professor, com diversos títulos na área.

 

O educador iniciou sua carreira dando aulas de português no Colégio Oswaldo Cruz, de Recife (PE), em 1944, e só deixou o magistério em 1990, quando saiu da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) para comandar a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo na gestão de Luiza Erundina (então no PT, hoje no PSOL).

Segundo o pesquisador Sérgio Haddad, biógrafo de Paulo Freire, "foi nesse período também que ele começou a dar aulas particulares. Posteriormente, a partir de 1947, trabalhou no SESI de Pernambuco como coordenador e professor de operários e de filhos de operários".

A única experiência de Freire com crianças em idade de alfabetização, de acordo com Haddad, foi em 1955, ano em que fundou juntamente com um grupo de educadores o Instituto Capibaribe. O espaço tinha a finalidade de educar crianças, formar professores e atualizar famílias. 

"No ensino superior, deu aulas na Escola de Serviço Social da Universidade de Recife, depois, em 1955, foi nomeado professor catedrático interino [professor titular] de História e Filosofia da Educação na Escola de Belas Artes", disse o pesquisador, autor do livro O educador: um perfil de Paulo Freire.

Apesar de ter se graduado como bacharel de Direito, Freire se tornou doutor em filosofia e história da educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) em 1959, e também recebeu 41 títulos de doutor honoris causa em universidades renomadas, como Cambridge e Oxford, no Reino Unido.

Sérgio Haddad conta que, "também no exterior, além de assessorar o Ministério de Educação do Chile, Paulo Freire foi professor da Universidade de Harvard e de Genebra. Trabalhou com os governos africanos, ex-colônias portuguesas de 1975 a 1980, quando voltou ao Brasil do exílio. Sua vida foi dedicada à educação, como podemos ver". 

Relação de Paulo Freire com o MST

O post viral também alega que a única experiência de Freire em alfabetização foi com adultos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. A afirmação é falsa. Na verdade, as origens do MST estão ligadas a conflitos fundiários nas décadas de 1970 e 1980 no Sul do Brasil; o movimento só foi institucionalizado em 1984. O método de Freire de alfabetização foi sistematizado em 1962, quando ele era professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Na década de 1980, o pedagogo lecionava na Unicamp. O Estadão Verifica não encontrou registros de que ele tenha dado aulas para o MST.

Criada por Paulo Freire e conhecida pela maneira de educar conectada ao cotidiano e às experiências dos estudantes, a metodologia freiriana tornou-se conhecida não só no Brasil, mas no mundo. A coordenadora do Projeto de Alfabetização de Jovens e Adultos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Francisca Maciel, explica que princípios do método criado pelo brasileiro são usados na educação de várias faixas etárias. 

"Atualmente, o que a gente constata é que muitos professores dentro e fora do Brasil usam os princípios da proposta metodológica de Paulo Freire em sala de aula, desde a educação infantil", disse ela. "Não dá pra dizer que Freire tem só alfabetização de jovens e adultos. É a formação de uma pessoa, em todas as etapas da vida. Os princípios freirianos vão muito além dos muros da educação. Hoje a saúde, a engenharia, diferentes áreas do conhecimento tomam os princípios para suas formações". 

Ataques do presidente

Paulo Freire faria 100 anos neste mês. O intelectual é alvo constante de ataques do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de seus seguidores. Na opinião de Sérgio Haddad, a busca pelo educador e o aumento de desinformação sobre sua obra "vêm desde a campanha eleitoral".

Na última quinta-feira, 16, a Justiça Federal do Rio proibiu o governo federal de tomar qualquer atitude que atente contra a dignidade de Paulo Freire. 

Na mesma semana, uma das maiores universidades do mundo, Columbia, em Nova York, anunciou no centenário do educador brasileiro uma série de eventos e incentivos para pesquisa sobre o seu trabalho. "Equidade, educação antirracista, gênero, a preocupação com diferentes camadas de opressão e exploração são temas com muita força na academia atualmente. E foram explorados há muitas décadas por Freire", disse o professor brasileiro de Columbia Paulo Blikstein, ao Estadão.

Com mais de 12 mil interações no Facebook e quase 18 mil no Twitter, a publicação falsa analisada aqui foi feita por Paula Marisa, youtuber bolsonarista e ex-candidata a vereadora de Canoas (RS), em 2020. O Estadão Verifica entrou em contato com a autora do post, mas não teve retorno até o momento da publicação desta checagem. 

Aos Fatos e">">AFP também apuraram a informação que circula nas redes sociais. 

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Postagens nas redes sociais espalham as informações falsas de que o pedagogo Paulo Freire (1921-1997)  "nunca foi professor", que sua única formação foi bacharel em Direito e que sua experiência com alfabetização foi com adultos em acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ao Estadão Verifica, pesquisadores da obra de Freire disseram que o conteúdo é falso. O educador de fato estudou Direito, mas não exerceu a profissão e se tornou professor, com diversos títulos na área.

 

O educador iniciou sua carreira dando aulas de português no Colégio Oswaldo Cruz, de Recife (PE), em 1944, e só deixou o magistério em 1990, quando saiu da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) para comandar a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo na gestão de Luiza Erundina (então no PT, hoje no PSOL).

Segundo o pesquisador Sérgio Haddad, biógrafo de Paulo Freire, "foi nesse período também que ele começou a dar aulas particulares. Posteriormente, a partir de 1947, trabalhou no SESI de Pernambuco como coordenador e professor de operários e de filhos de operários".

A única experiência de Freire com crianças em idade de alfabetização, de acordo com Haddad, foi em 1955, ano em que fundou juntamente com um grupo de educadores o Instituto Capibaribe. O espaço tinha a finalidade de educar crianças, formar professores e atualizar famílias. 

"No ensino superior, deu aulas na Escola de Serviço Social da Universidade de Recife, depois, em 1955, foi nomeado professor catedrático interino [professor titular] de História e Filosofia da Educação na Escola de Belas Artes", disse o pesquisador, autor do livro O educador: um perfil de Paulo Freire.

Apesar de ter se graduado como bacharel de Direito, Freire se tornou doutor em filosofia e história da educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) em 1959, e também recebeu 41 títulos de doutor honoris causa em universidades renomadas, como Cambridge e Oxford, no Reino Unido.

Sérgio Haddad conta que, "também no exterior, além de assessorar o Ministério de Educação do Chile, Paulo Freire foi professor da Universidade de Harvard e de Genebra. Trabalhou com os governos africanos, ex-colônias portuguesas de 1975 a 1980, quando voltou ao Brasil do exílio. Sua vida foi dedicada à educação, como podemos ver". 

Relação de Paulo Freire com o MST

O post viral também alega que a única experiência de Freire em alfabetização foi com adultos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. A afirmação é falsa. Na verdade, as origens do MST estão ligadas a conflitos fundiários nas décadas de 1970 e 1980 no Sul do Brasil; o movimento só foi institucionalizado em 1984. O método de Freire de alfabetização foi sistematizado em 1962, quando ele era professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Na década de 1980, o pedagogo lecionava na Unicamp. O Estadão Verifica não encontrou registros de que ele tenha dado aulas para o MST.

Criada por Paulo Freire e conhecida pela maneira de educar conectada ao cotidiano e às experiências dos estudantes, a metodologia freiriana tornou-se conhecida não só no Brasil, mas no mundo. A coordenadora do Projeto de Alfabetização de Jovens e Adultos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Francisca Maciel, explica que princípios do método criado pelo brasileiro são usados na educação de várias faixas etárias. 

"Atualmente, o que a gente constata é que muitos professores dentro e fora do Brasil usam os princípios da proposta metodológica de Paulo Freire em sala de aula, desde a educação infantil", disse ela. "Não dá pra dizer que Freire tem só alfabetização de jovens e adultos. É a formação de uma pessoa, em todas as etapas da vida. Os princípios freirianos vão muito além dos muros da educação. Hoje a saúde, a engenharia, diferentes áreas do conhecimento tomam os princípios para suas formações". 

Ataques do presidente

Paulo Freire faria 100 anos neste mês. O intelectual é alvo constante de ataques do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de seus seguidores. Na opinião de Sérgio Haddad, a busca pelo educador e o aumento de desinformação sobre sua obra "vêm desde a campanha eleitoral".

Na última quinta-feira, 16, a Justiça Federal do Rio proibiu o governo federal de tomar qualquer atitude que atente contra a dignidade de Paulo Freire. 

Na mesma semana, uma das maiores universidades do mundo, Columbia, em Nova York, anunciou no centenário do educador brasileiro uma série de eventos e incentivos para pesquisa sobre o seu trabalho. "Equidade, educação antirracista, gênero, a preocupação com diferentes camadas de opressão e exploração são temas com muita força na academia atualmente. E foram explorados há muitas décadas por Freire", disse o professor brasileiro de Columbia Paulo Blikstein, ao Estadão.

Com mais de 12 mil interações no Facebook e quase 18 mil no Twitter, a publicação falsa analisada aqui foi feita por Paula Marisa, youtuber bolsonarista e ex-candidata a vereadora de Canoas (RS), em 2020. O Estadão Verifica entrou em contato com a autora do post, mas não teve retorno até o momento da publicação desta checagem. 

Aos Fatos e">">AFP também apuraram a informação que circula nas redes sociais. 

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Postagens nas redes sociais espalham as informações falsas de que o pedagogo Paulo Freire (1921-1997)  "nunca foi professor", que sua única formação foi bacharel em Direito e que sua experiência com alfabetização foi com adultos em acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ao Estadão Verifica, pesquisadores da obra de Freire disseram que o conteúdo é falso. O educador de fato estudou Direito, mas não exerceu a profissão e se tornou professor, com diversos títulos na área.

 

O educador iniciou sua carreira dando aulas de português no Colégio Oswaldo Cruz, de Recife (PE), em 1944, e só deixou o magistério em 1990, quando saiu da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) para comandar a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo na gestão de Luiza Erundina (então no PT, hoje no PSOL).

Segundo o pesquisador Sérgio Haddad, biógrafo de Paulo Freire, "foi nesse período também que ele começou a dar aulas particulares. Posteriormente, a partir de 1947, trabalhou no SESI de Pernambuco como coordenador e professor de operários e de filhos de operários".

A única experiência de Freire com crianças em idade de alfabetização, de acordo com Haddad, foi em 1955, ano em que fundou juntamente com um grupo de educadores o Instituto Capibaribe. O espaço tinha a finalidade de educar crianças, formar professores e atualizar famílias. 

"No ensino superior, deu aulas na Escola de Serviço Social da Universidade de Recife, depois, em 1955, foi nomeado professor catedrático interino [professor titular] de História e Filosofia da Educação na Escola de Belas Artes", disse o pesquisador, autor do livro O educador: um perfil de Paulo Freire.

Apesar de ter se graduado como bacharel de Direito, Freire se tornou doutor em filosofia e história da educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) em 1959, e também recebeu 41 títulos de doutor honoris causa em universidades renomadas, como Cambridge e Oxford, no Reino Unido.

Sérgio Haddad conta que, "também no exterior, além de assessorar o Ministério de Educação do Chile, Paulo Freire foi professor da Universidade de Harvard e de Genebra. Trabalhou com os governos africanos, ex-colônias portuguesas de 1975 a 1980, quando voltou ao Brasil do exílio. Sua vida foi dedicada à educação, como podemos ver". 

Relação de Paulo Freire com o MST

O post viral também alega que a única experiência de Freire em alfabetização foi com adultos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. A afirmação é falsa. Na verdade, as origens do MST estão ligadas a conflitos fundiários nas décadas de 1970 e 1980 no Sul do Brasil; o movimento só foi institucionalizado em 1984. O método de Freire de alfabetização foi sistematizado em 1962, quando ele era professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Na década de 1980, o pedagogo lecionava na Unicamp. O Estadão Verifica não encontrou registros de que ele tenha dado aulas para o MST.

Criada por Paulo Freire e conhecida pela maneira de educar conectada ao cotidiano e às experiências dos estudantes, a metodologia freiriana tornou-se conhecida não só no Brasil, mas no mundo. A coordenadora do Projeto de Alfabetização de Jovens e Adultos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Francisca Maciel, explica que princípios do método criado pelo brasileiro são usados na educação de várias faixas etárias. 

"Atualmente, o que a gente constata é que muitos professores dentro e fora do Brasil usam os princípios da proposta metodológica de Paulo Freire em sala de aula, desde a educação infantil", disse ela. "Não dá pra dizer que Freire tem só alfabetização de jovens e adultos. É a formação de uma pessoa, em todas as etapas da vida. Os princípios freirianos vão muito além dos muros da educação. Hoje a saúde, a engenharia, diferentes áreas do conhecimento tomam os princípios para suas formações". 

Ataques do presidente

Paulo Freire faria 100 anos neste mês. O intelectual é alvo constante de ataques do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de seus seguidores. Na opinião de Sérgio Haddad, a busca pelo educador e o aumento de desinformação sobre sua obra "vêm desde a campanha eleitoral".

Na última quinta-feira, 16, a Justiça Federal do Rio proibiu o governo federal de tomar qualquer atitude que atente contra a dignidade de Paulo Freire. 

Na mesma semana, uma das maiores universidades do mundo, Columbia, em Nova York, anunciou no centenário do educador brasileiro uma série de eventos e incentivos para pesquisa sobre o seu trabalho. "Equidade, educação antirracista, gênero, a preocupação com diferentes camadas de opressão e exploração são temas com muita força na academia atualmente. E foram explorados há muitas décadas por Freire", disse o professor brasileiro de Columbia Paulo Blikstein, ao Estadão.

Com mais de 12 mil interações no Facebook e quase 18 mil no Twitter, a publicação falsa analisada aqui foi feita por Paula Marisa, youtuber bolsonarista e ex-candidata a vereadora de Canoas (RS), em 2020. O Estadão Verifica entrou em contato com a autora do post, mas não teve retorno até o momento da publicação desta checagem. 

Aos Fatos e">">AFP também apuraram a informação que circula nas redes sociais. 

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.