O carro-bomba de ontem em Beirute não foi uma surpresa. Quando o Hezbollah decidiu se envolver abertamente na Guerra da Síria em apoio a Bashar al Assad, a maior parte dos analistas, inclusive este blogueiro, sabia que áreas xiitas de Beirute se tornariam alvo de terrorismo de simpatizantes da oposição síria, das crescentes facções salafistas no Líbano ou de entidades interessadas em desestabilizar o país.
O próprio xeque Hassan Nasrallah e seus seguidores sabiam disso. Os ataques terroristas entraram na equação quando o Hezbollah decidiu se envolver na Guerra da Síria. A estratégia, por enquanto, é não revidar. O líder da organização libanesa não tem interesse em um conflito civil no Líbano neste momento.
Seu foco está na Guerra da Síria, onde suas forças, aliadas a Assad, estão vencendo o conflito. Agora também começam a voltar a desfrutar de amparo de alas seculares árabes de países como o Egito, onde o regime do general Sisi vê a oposição síria como um sinônimo da Irmandade Muçulmana.
Ao mesmo tempo, o Hezbollah não quer deixar a sua base no sul do Líbano desguardada. Seu maior inimigo é Israel e a organização quer estar preparada para um conflito. Na Síria, suas operações se diferem das que seriam usadas em uma guerra contra os israelenses, em que seriam utilizados os milhares de mísseis para alvejar o norte do país e, desta vez, Tel Aviv.
Dentro do Líbano, o Hezbollah segue priorizando a sua aliança com os cristãos seguidores de Michel Aoun, certamente o mais popular líder cristão do país dos cedros. Tem havido atritos com o presidente Michel Suleiman, mas nada suficiente para um rompimento. O grupo sabe também que as tradicionais lideranças sunitas, incluindo Saad Hariri, não possuem interesse em uma guerra civil.
O desafio, para a organização, será manter a balança de estado de prontidão diante de Israel e a Guerra Civil da Síria com os ataques terroristas no Líbano e o crescimento de seus adversários salafistas. Também há dificuldade em lidar com as centenas de milhares de refugiados sírios no território libanês que =, em muitos casos, consideram a organização xiita um inimigo. Não será fácil. O atual status quo do Líbano está por um fio.
Guga Chacra, comentarista de política internacional do Estadão e do programa Globo News Em Pauta em Nova York, é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia. Já foi correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Oriente Médio e em NY. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires