O mal-estar dos sauditas com o Líbano


Em fevereiro, a Arábia Saudita anunciou o congelamento de uma doação de US$ 4 bilhões ao Exército libanês, destinados à compra de equipamento de fabricação francesa. O reino wahabita manifestava assim seu descontentamento com a política externa do Líbano, que considera complacente demais em relação ao Irã. A medida ilustra também as mudanças ocorridas na Arábia Saudita com a subida ao trono, em janeiro de 2015, do rei Salman bin Abdel Aziz, que sucedeu a seu meio-irmão falecido, Abdullah.

Por Issa Goraieb

Nesse panorama de pequena revolução palaciana, o novo monarca, de 80 anos e sofrendo do Mal de Alzheimer, se apressou em mudar a antiga ordem da sucessão ao trono: descartando o príncipe herdeiro Moqren, ele nomeou seu sobrinho Mohamed bin Nayef como príncipe herdeiro, mas também o próprio filho, igualmente chamado Mohamed, como vice-príncipe herdeiro. Embora segundo na linha sucessória, esse último não demorou em deflagrar a guerra dos dois Mohameds, firmando-se como o verdadeiro homem forte do reino e adotando uma política resolutamente ofensiva contra o Irã.

De novo, o Líbano sofre os solavancos de todas essas mudanças. Trata-se, desta vez, do profundo mal-estar que vem abalando as tradicionalmente privilegiadas relações entre o reino saudita, guardião dos lugares sagrados de Meca, e a comunidade sunita do Líbano. Como contraponto, estão os fortes laços que unem os xiitas libaneses ao Irã – o que dá a Riad e Teerã uma influência preponderante sobre a vida política libanesa.

Primeira reviravolta: o ex-primeiro-ministro Saad Hariri, filho e sucessor do líder sunita assassinado em 2005, Rafik Hariri, considerado o garoto querido do reino, não parece gozar mais da confiança dos sauditas ou, no mínimo, de uma ala influente do poder em Riad. 

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O chefe da Corrente do Futuro, formação que representa os sunitas moderados, criticou sua incapacidade de conter o fulgurante crescimento do poder do Hezbollah no Líbano.

O fato é que o governo de Riad demora a liberar as somas colossais que ele deve a sua gigantesca rede de empresas – seus milhares de empregados não recebem há meses. Num incidente raríssimo no país tão orgulhoso da ordem pública como a Arábia Saudita, alguns funcionários enraivecidos saquearam o escritório pessoal de Hariri em Riad. 

Mesmo em Beirute, funcionários da estação de TV e do jornal do ex-primeiro-ministro também estão há meses sem receber. Em consequência desse grave problema de caixa, a Corrente do Futuro não está mais em condições de assumir o programa de assistência social de que se beneficiavam seus partidários.

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Segunda reviravolta: é simples consequência da primeira. Em todas as recentes eleições municipais de Trípoli, segunda cidade do Líbano, de população maciçamente sunita, a lista da coalizão apoiada por Hariri foi amplamente derrotada pela apoiada por Achraf Rifi, um dos antigos pilares da Corrente do Futuro, que entrou em rebelião contra a autoridade de seu chefe.

Fortemente hostil ao Hezbollah, esse general aposentado da polícia e ministro demissionário da Justiça também condenou a pusilanimidade de Hariri frente ao Hezbollah – e registre-se que os eleitores lhe deram razão. Ao fazerem isso, teriam tido eles a bênção da embaixada saudita?

A dúvida surge à luz da terceira reviravolta, da verdadeira bomba midiática que foi uma recente aparição na TV do ministro do Interior, Mohamed Machnouk, próximo a Hariri. Afirmando que falava em caráter estritamente pessoal, ele declarou que algumas das iniciativas mais infelizes de Hariri na realidade foram resultado da pressão saudita.

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O ministro se referia principalmente à visita a Damasco que Hariri fez em 2010 quando ainda era chefe do governo e quando a Síria estava sob forte suspeita de ter tramado o assassinato de seu pai. Ainda segundo Machnouk, a Arábia Saudita teria se juntado à Grã-Bretanha e aos Estados Unidos para recomendar a Hariri a candidatura à presidência da República do deputado Suleiman Frangié, amigo do presidente sírio, Bashar Assad.

Na noite de quinta-feira, o líder da Corrente do Futuro fez uma autocrítica em discurso, reafirmando, no entanto, seu compromisso com a linha moderada que defende e agradecendo calorosamente à Arábia Saudita pelo constante apoio que dá ao Líbano. Mas, por enquanto, o mal-estar continua. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

*É COLUNISTA DO 'ESTADO' E JORNALISTA RADICADO EM BEIRUTE

Nesse panorama de pequena revolução palaciana, o novo monarca, de 80 anos e sofrendo do Mal de Alzheimer, se apressou em mudar a antiga ordem da sucessão ao trono: descartando o príncipe herdeiro Moqren, ele nomeou seu sobrinho Mohamed bin Nayef como príncipe herdeiro, mas também o próprio filho, igualmente chamado Mohamed, como vice-príncipe herdeiro. Embora segundo na linha sucessória, esse último não demorou em deflagrar a guerra dos dois Mohameds, firmando-se como o verdadeiro homem forte do reino e adotando uma política resolutamente ofensiva contra o Irã.

De novo, o Líbano sofre os solavancos de todas essas mudanças. Trata-se, desta vez, do profundo mal-estar que vem abalando as tradicionalmente privilegiadas relações entre o reino saudita, guardião dos lugares sagrados de Meca, e a comunidade sunita do Líbano. Como contraponto, estão os fortes laços que unem os xiitas libaneses ao Irã – o que dá a Riad e Teerã uma influência preponderante sobre a vida política libanesa.

Primeira reviravolta: o ex-primeiro-ministro Saad Hariri, filho e sucessor do líder sunita assassinado em 2005, Rafik Hariri, considerado o garoto querido do reino, não parece gozar mais da confiança dos sauditas ou, no mínimo, de uma ala influente do poder em Riad. 

O chefe da Corrente do Futuro, formação que representa os sunitas moderados, criticou sua incapacidade de conter o fulgurante crescimento do poder do Hezbollah no Líbano.

O fato é que o governo de Riad demora a liberar as somas colossais que ele deve a sua gigantesca rede de empresas – seus milhares de empregados não recebem há meses. Num incidente raríssimo no país tão orgulhoso da ordem pública como a Arábia Saudita, alguns funcionários enraivecidos saquearam o escritório pessoal de Hariri em Riad. 

Mesmo em Beirute, funcionários da estação de TV e do jornal do ex-primeiro-ministro também estão há meses sem receber. Em consequência desse grave problema de caixa, a Corrente do Futuro não está mais em condições de assumir o programa de assistência social de que se beneficiavam seus partidários.

Segunda reviravolta: é simples consequência da primeira. Em todas as recentes eleições municipais de Trípoli, segunda cidade do Líbano, de população maciçamente sunita, a lista da coalizão apoiada por Hariri foi amplamente derrotada pela apoiada por Achraf Rifi, um dos antigos pilares da Corrente do Futuro, que entrou em rebelião contra a autoridade de seu chefe.

Fortemente hostil ao Hezbollah, esse general aposentado da polícia e ministro demissionário da Justiça também condenou a pusilanimidade de Hariri frente ao Hezbollah – e registre-se que os eleitores lhe deram razão. Ao fazerem isso, teriam tido eles a bênção da embaixada saudita?

A dúvida surge à luz da terceira reviravolta, da verdadeira bomba midiática que foi uma recente aparição na TV do ministro do Interior, Mohamed Machnouk, próximo a Hariri. Afirmando que falava em caráter estritamente pessoal, ele declarou que algumas das iniciativas mais infelizes de Hariri na realidade foram resultado da pressão saudita.

O ministro se referia principalmente à visita a Damasco que Hariri fez em 2010 quando ainda era chefe do governo e quando a Síria estava sob forte suspeita de ter tramado o assassinato de seu pai. Ainda segundo Machnouk, a Arábia Saudita teria se juntado à Grã-Bretanha e aos Estados Unidos para recomendar a Hariri a candidatura à presidência da República do deputado Suleiman Frangié, amigo do presidente sírio, Bashar Assad.

Na noite de quinta-feira, o líder da Corrente do Futuro fez uma autocrítica em discurso, reafirmando, no entanto, seu compromisso com a linha moderada que defende e agradecendo calorosamente à Arábia Saudita pelo constante apoio que dá ao Líbano. Mas, por enquanto, o mal-estar continua. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

*É COLUNISTA DO 'ESTADO' E JORNALISTA RADICADO EM BEIRUTE

Nesse panorama de pequena revolução palaciana, o novo monarca, de 80 anos e sofrendo do Mal de Alzheimer, se apressou em mudar a antiga ordem da sucessão ao trono: descartando o príncipe herdeiro Moqren, ele nomeou seu sobrinho Mohamed bin Nayef como príncipe herdeiro, mas também o próprio filho, igualmente chamado Mohamed, como vice-príncipe herdeiro. Embora segundo na linha sucessória, esse último não demorou em deflagrar a guerra dos dois Mohameds, firmando-se como o verdadeiro homem forte do reino e adotando uma política resolutamente ofensiva contra o Irã.

De novo, o Líbano sofre os solavancos de todas essas mudanças. Trata-se, desta vez, do profundo mal-estar que vem abalando as tradicionalmente privilegiadas relações entre o reino saudita, guardião dos lugares sagrados de Meca, e a comunidade sunita do Líbano. Como contraponto, estão os fortes laços que unem os xiitas libaneses ao Irã – o que dá a Riad e Teerã uma influência preponderante sobre a vida política libanesa.

Primeira reviravolta: o ex-primeiro-ministro Saad Hariri, filho e sucessor do líder sunita assassinado em 2005, Rafik Hariri, considerado o garoto querido do reino, não parece gozar mais da confiança dos sauditas ou, no mínimo, de uma ala influente do poder em Riad. 

O chefe da Corrente do Futuro, formação que representa os sunitas moderados, criticou sua incapacidade de conter o fulgurante crescimento do poder do Hezbollah no Líbano.

O fato é que o governo de Riad demora a liberar as somas colossais que ele deve a sua gigantesca rede de empresas – seus milhares de empregados não recebem há meses. Num incidente raríssimo no país tão orgulhoso da ordem pública como a Arábia Saudita, alguns funcionários enraivecidos saquearam o escritório pessoal de Hariri em Riad. 

Mesmo em Beirute, funcionários da estação de TV e do jornal do ex-primeiro-ministro também estão há meses sem receber. Em consequência desse grave problema de caixa, a Corrente do Futuro não está mais em condições de assumir o programa de assistência social de que se beneficiavam seus partidários.

Segunda reviravolta: é simples consequência da primeira. Em todas as recentes eleições municipais de Trípoli, segunda cidade do Líbano, de população maciçamente sunita, a lista da coalizão apoiada por Hariri foi amplamente derrotada pela apoiada por Achraf Rifi, um dos antigos pilares da Corrente do Futuro, que entrou em rebelião contra a autoridade de seu chefe.

Fortemente hostil ao Hezbollah, esse general aposentado da polícia e ministro demissionário da Justiça também condenou a pusilanimidade de Hariri frente ao Hezbollah – e registre-se que os eleitores lhe deram razão. Ao fazerem isso, teriam tido eles a bênção da embaixada saudita?

A dúvida surge à luz da terceira reviravolta, da verdadeira bomba midiática que foi uma recente aparição na TV do ministro do Interior, Mohamed Machnouk, próximo a Hariri. Afirmando que falava em caráter estritamente pessoal, ele declarou que algumas das iniciativas mais infelizes de Hariri na realidade foram resultado da pressão saudita.

O ministro se referia principalmente à visita a Damasco que Hariri fez em 2010 quando ainda era chefe do governo e quando a Síria estava sob forte suspeita de ter tramado o assassinato de seu pai. Ainda segundo Machnouk, a Arábia Saudita teria se juntado à Grã-Bretanha e aos Estados Unidos para recomendar a Hariri a candidatura à presidência da República do deputado Suleiman Frangié, amigo do presidente sírio, Bashar Assad.

Na noite de quinta-feira, o líder da Corrente do Futuro fez uma autocrítica em discurso, reafirmando, no entanto, seu compromisso com a linha moderada que defende e agradecendo calorosamente à Arábia Saudita pelo constante apoio que dá ao Líbano. Mas, por enquanto, o mal-estar continua. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

*É COLUNISTA DO 'ESTADO' E JORNALISTA RADICADO EM BEIRUTE

Nesse panorama de pequena revolução palaciana, o novo monarca, de 80 anos e sofrendo do Mal de Alzheimer, se apressou em mudar a antiga ordem da sucessão ao trono: descartando o príncipe herdeiro Moqren, ele nomeou seu sobrinho Mohamed bin Nayef como príncipe herdeiro, mas também o próprio filho, igualmente chamado Mohamed, como vice-príncipe herdeiro. Embora segundo na linha sucessória, esse último não demorou em deflagrar a guerra dos dois Mohameds, firmando-se como o verdadeiro homem forte do reino e adotando uma política resolutamente ofensiva contra o Irã.

De novo, o Líbano sofre os solavancos de todas essas mudanças. Trata-se, desta vez, do profundo mal-estar que vem abalando as tradicionalmente privilegiadas relações entre o reino saudita, guardião dos lugares sagrados de Meca, e a comunidade sunita do Líbano. Como contraponto, estão os fortes laços que unem os xiitas libaneses ao Irã – o que dá a Riad e Teerã uma influência preponderante sobre a vida política libanesa.

Primeira reviravolta: o ex-primeiro-ministro Saad Hariri, filho e sucessor do líder sunita assassinado em 2005, Rafik Hariri, considerado o garoto querido do reino, não parece gozar mais da confiança dos sauditas ou, no mínimo, de uma ala influente do poder em Riad. 

O chefe da Corrente do Futuro, formação que representa os sunitas moderados, criticou sua incapacidade de conter o fulgurante crescimento do poder do Hezbollah no Líbano.

O fato é que o governo de Riad demora a liberar as somas colossais que ele deve a sua gigantesca rede de empresas – seus milhares de empregados não recebem há meses. Num incidente raríssimo no país tão orgulhoso da ordem pública como a Arábia Saudita, alguns funcionários enraivecidos saquearam o escritório pessoal de Hariri em Riad. 

Mesmo em Beirute, funcionários da estação de TV e do jornal do ex-primeiro-ministro também estão há meses sem receber. Em consequência desse grave problema de caixa, a Corrente do Futuro não está mais em condições de assumir o programa de assistência social de que se beneficiavam seus partidários.

Segunda reviravolta: é simples consequência da primeira. Em todas as recentes eleições municipais de Trípoli, segunda cidade do Líbano, de população maciçamente sunita, a lista da coalizão apoiada por Hariri foi amplamente derrotada pela apoiada por Achraf Rifi, um dos antigos pilares da Corrente do Futuro, que entrou em rebelião contra a autoridade de seu chefe.

Fortemente hostil ao Hezbollah, esse general aposentado da polícia e ministro demissionário da Justiça também condenou a pusilanimidade de Hariri frente ao Hezbollah – e registre-se que os eleitores lhe deram razão. Ao fazerem isso, teriam tido eles a bênção da embaixada saudita?

A dúvida surge à luz da terceira reviravolta, da verdadeira bomba midiática que foi uma recente aparição na TV do ministro do Interior, Mohamed Machnouk, próximo a Hariri. Afirmando que falava em caráter estritamente pessoal, ele declarou que algumas das iniciativas mais infelizes de Hariri na realidade foram resultado da pressão saudita.

O ministro se referia principalmente à visita a Damasco que Hariri fez em 2010 quando ainda era chefe do governo e quando a Síria estava sob forte suspeita de ter tramado o assassinato de seu pai. Ainda segundo Machnouk, a Arábia Saudita teria se juntado à Grã-Bretanha e aos Estados Unidos para recomendar a Hariri a candidatura à presidência da República do deputado Suleiman Frangié, amigo do presidente sírio, Bashar Assad.

Na noite de quinta-feira, o líder da Corrente do Futuro fez uma autocrítica em discurso, reafirmando, no entanto, seu compromisso com a linha moderada que defende e agradecendo calorosamente à Arábia Saudita pelo constante apoio que dá ao Líbano. Mas, por enquanto, o mal-estar continua. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

*É COLUNISTA DO 'ESTADO' E JORNALISTA RADICADO EM BEIRUTE

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