A denúncia anônima feita por um funcionário da Casa Branca contra o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que culminou na abertura de um pedido de impeachment relacionado a um telefonema com o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, é embasada pela política do “whistleblower”, também presente na legislação brasileira.
Trump tem atacado a denúncia anônima, afirmando que trata-se de informações fornecidas por “espiões e traidores”, dignas de punição.
A Câmara pretende ouvir o denunciante e manter sua identidade anônima, enquanto a Trump afirmou que a Casa Branca está trabalhando para descobrir de quem se trata, o que vai contra a constituição americana, que possibilita denúncias anônimas sob a proteção da lei.
O que é um whistleblower?
O significado da palavra, em tradução livre para o português, é “assoprador de apito”. No vocabulário jurídico, trata-se de um funcionário que divulga informações que ele considera como “evidência de ilegalidade, gasto exagerado ou fraude, má administração, abuso de poder, atos errados no geral, ou um perigo específico e substancial à saúde pública e segurança”, de acordo com a ONG Government Accountability Project, que advoga para whistleblowers.
O denunciante pode ser funcionário de uma empresa privada, uma ONG ou do governo. No caso do governo federal, define-se que o whistleblower faça parte de um processo em que ele abre uma denúncia por meios seguros, como a um comitê no Congresso, caso que se aplica ao denunciante de Trump.
Como um whistleblower entra com uma denúncia?
Algumas agências americanas que estão no ramo civil possibilitam que a denúncia seja feita a um superior, inclusive incentivando os funcionários a denunciarem por meio do oferecimento de acréscimos no salário ou recompensas. Além de seus superiores, os whistleblowers podem levar a denúncia diretamente a congressistas ou à imprensa.
Já em relação às agências de inteligência do governo, como é o caso do denunciante de Trump, o caminho da denúncia não é tão fácil, já que a informação pode ser classificada como sigilosa pelo presidente. A Casa Branca chegou a impor sigilo sobre o conteúdo da denúncia, mas a Câmara dos Deputados conseguiu aprovar uma ata com a solicitação para que o texto fosse de acesso dos congressistas.
Os funcionários de agências de inteligência podem ir ao procurador-geral ou ao seu superior para denunciar. Para levar o acusação diretamente ao Congresso, seria necessária a autorização da agência a qual ele pertence.
Como são encaminhadas as denúncias de whistleblowers da inteligência?
O Ato de Proteção do Whistleblower da Comunidade de Inteligência, de 1998, exige que em caso do procurador-geral determinar a acusação como crível e urgente, o diretor da inteligência nacional “deve, no prazo de sete dias... encaminhar tal denúncia aos comitês de inteligência”.
Se o procurador-geral não julgar a denúncia crível ou urgente, o whistleblower pode encaminhá-la ao Congresso. Mas, para ficar com a identidade sob proteção, o whistleblower deve seguir as ordens do diretor de inteligência nacional para não comprometer a segurança nacional com excesso de informações.
O que aconteceu no caso que envolve Trump?
A denúncia do whistleblower não foi encaminhada aos comitês de inteligência do Congresso no prazo estabelecido, o que quebrou a regra e alterou o rito. O diretor de Inteligência Nacional, Joseph Maguire, afirmou que isso ocorreu devido ao fato de que a denúncia envolve o presidente da República, que goza de privilégio do poder Executivo.
Os whistleblowers da inteligência nacional são protegidos?
As leis americanas protegem, de fato, funcionários governamentais que denunciam violações da lei e demais abusos, previnindo agências federais de fazer retaliações contra funcionários. Mas essas leis não se aplicam na íntegra a funcionários da segurança nacional ou inteligência.
O ato de 1998 aprovado pelo Congresso criou um caminho para que whistleblowers da inteligência levassem reclamações ou informações ao Congresso. Em 2010, foi aprovado pelos congressistas o Escritório do Inspetor Geral da Comunidade de Inteligência, abrindo outro caminho para que denúncias fossem feitas. E em 2012, o então presidente Barack Obama aprovou um ato legal para proteger whistleblowers da inteligência de retaliação, como de sofrer demissões ou perder a garantia de segurança.