Uma nova esperança para o Egito


Complexo de ciência e tecnologia em construção no Cairo é passo importante rumo a um país democrático e sustentável, política e economicamente, pós-revolução

Por Ahmed H. Zewail e Global View Point

Quase 100 dias após a revolução, o Egito hoje está bem diferente do país que vivenciei quando milhões de pessoas foram às ruas exigindo a queda do regime de Mubarak. Apesar de uma miríade de problemas, hoje existe uma nova energia, ou, como os egípcios afirmam, "hawa gadi" ("um novo ar"). A grande questão é como canalizar esta energia para forjar um novo Egito, democrático e sustentável, política e economicamente. A chave para avançarmos é despertar a confiança das pessoas com um projeto imediato de grande envergadura, que capture a imaginação das pessoas e simbolize o que o futuro pode trazer. O que a barragem de Assuã fez para uma geração anterior, a nova Cidade da Ciência e Tecnologia, hoje em construção, também o fará para uma juventude repleta de esperanças. Nos anos 60, vivi pessoalmente o impacto retumbante da ideia do presidente Nasser de construir a barragem de Assuã, como um "projeto nacional" para controlar a irrigação do Nilo e para a produção de eletricidade. Como escreveu o jovem jornalista Emad Ahmed num recente ensaio sobre as "pontes" para o futuro, um projeto nacional pós-revolução do Egito que seja comparável ao de Assuã deve estar focado na educação. Todas as famílias egípcias compreendem isso. Elas vivenciaram pessoalmente a deterioração do sistema de ensino do país nos últimos 30 anos de governo de Mubarak. Especialmente para a juventude do Facebook, que inflamou esta revolução, o foco no avanço da educação talvez leve o Egito de volta ao status de país de primeira categoria e combina com os princípios e o espírito do seu movimento - que eles temem possa ser derrotado por uma política com raízes no passado. Como Emad Ahmed escreveu, duas visões dominantes moldaram a imaginação política egípcia nos últimos 60 anos. A primeira foi a do partido socialista, o "al-Hisb al-Ishtraki", que nasceu com Nasser e a revolução de 1952. Para a juventude atual, essa visão política representa o passado. No momento, a força política mais organizada no país é a Irmandade Muçulmana, "Akhwan al-Muslimin". Para Emad, ela representa o presente em transição. Numa perspectiva histórica, a Irmandade Muçulmana também faz parte do passado, já que foi fundada em 1928, antes mesmo de Nasser. A atração que ela exerce é resultante da mensagem religiosa eficaz que transmite e seu trabalho beneficente organizado; e porque seus adeptos resistiram ao regime por tanto tempo. O movimento juvenil sabe perfeitamente que essas velhas ideias não podem levar o Egito para o futuro. Assim, nos meses que se seguiram desde que Mubarak foi derrubado, com o admirável apoio do Exército, os jovens, junto com um amplo espectro da sociedade egípcia, têm mantido aquele mesmo estado de espírito vivo, continuando a se reunir na Praça Tahrir às sextas-feiras no que é chamado de "millioniah", a reunião de um milhão de pessoas. Eles inventam um nome para cada encontro - sexta-feira da "mudança" ("takhier"), da "ira" ("khadab"), da "correção" ("tas´ hih"). O que demandam é que o caminho para a democracia seja consolidado por meio de constituições adequadas, o fim da influência do antigo regime, e que alcancemos a justiça e a igualdade. Suas expectativas são um remédio rápido para se conseguir uma melhor situação econômica. Depois de tantos anos de inércia e ditadura, contudo, a realidade é que essas mudanças levarão anos. Nesse intervalo, as pessoas precisam de um compasso de esperança que una o país e inspire confiança e orgulho. Em 3 de junho, uma sexta-feira totalmente diferente despontou no país: a sexta-feira da esperança, para os egípcios. Um dia antes, foi lançada uma campanha nacional para a construção da nova Cidade da Ciência e Tecnologia, após uma lei aprovada por unanimidade no gabinete de Ministros e a decisão de apoio do Conselho Supremo das Forças Armadas. Esta "cidade do futuro" como já está sendo chamada, que será erigida num terreno de cerca de 121 hectares nos arredores do Cairo, tem uma estrutura de governança transparente e completamente independente dos regulamentos governamentais. O seu Conselho de Administração, já formado, congrega seis laureados com o Nobel, o atual presidente da Caltech e ex-presidente do Massachusetts Institute of Technology (MIT), e inúmeros egípcios influentes, como Mohamed El-Erian, CEO da PIMCO, que fez uma doação pessoal para a cidade. Sir Magdi Yacoub, renomado cirurgião do Imperial College em Londres também é membro desse conselho. Não é surpresa o fato de o projeto ter sido acatado com o maior entusiasmo pela opinião pública. Ibrahim Issa, conhecido jornalista e um dos líderes dos protestos da praça Tahrir, disse que "é a coisa mais importante anunciada desde a revolução". Ahmed Moslemany, popular comentarista de TV, declarou para milhões de telespectadores que "este é o único caminho para o mundo moderno". Durante 12 anos, desde que fui agraciado com o Prêmio Nobel, venho trabalhando para este projeto sair da gaveta, apenas para ser frustrado por burocratas com falta de visão e a indiferença de Mubarak. O "novo ar" da revolução deu nova vida a ele. Nosso objetivo é desenvolver uma instituição sem fins lucrativos de ensino superior que seja baseada no mérito e o nosso modelo é um híbrido da Caltech, instituição com a qual estou familiarizado há mais de 30 anos, os Institutos Max Planck e o Parque Tecnológico da Turquia. A meta é retomar a produção de novos conhecimentos pelos árabes e levar os avanços da ciência e tecnologia para o mercado e a sociedade nesta era de despertar árabe. Desejamos mostrar que "o Egito pode". O que, por si só, terá um enorme impacto na reconquista do orgulho nacional. Mesmo com as dificuldades econômicas presentes, os egípcios decidiram investir no futuro, com bilhões de dólares em terra e prédios para o projeto. Em questão de semanas de campanha, arrecadamos os primeiros US$ 100 bilhões para uma dotação de US$ 2 bilhões que garantirá o sucesso e a independência a longo prazo desse projeto. Nossa esperança é que a comunidade internacional - os Estados do Golfo, o G-20 e o G-8 (que prometeu US$ 20 bilhões na cúpula de Deauville) - venha a criar uma genuína parceria com o Egito para investir na educação dos nossos jovens, de maneira que os ganhos da revolução possam ser consolidados com benefícios para a região e o mundo. Os benefícios para todos são claros se esta região tão importante para o mundo conseguir progredir e se desenvolver. Quando a população do Egito realizar o seu sonho de democracia e crescimento sustentado, terá avançado uma grande parte do caminho na direção de um grande mercado na região que compreende os países do Oriente Médio e Norte da África de quase quatro milhões de pessoas. O investimento na educação e na prosperidade econômica é a melhor maneira de acabar com os fanatismos e estabelecer uma paz justa no Oriente Médio. Uma instituição como a Cidade da Ciência e Tecnologia certamente será um centro de informação e cooperação global. A revolução egípcia, que não tinha nenhuma ideologia, e só queria mudanças pacíficas, demonstrou claramente que as afirmações de que muçulmanos e árabes são incapazes de participar do mundo moderno, ou estão em violento conflito com a civilização ocidental, são infundadas. Como em todas as partes do mundo, o Oriente Médio aspira à liberdade e à justiça. Deseja ter uma vida melhor e dar uma educação decente para seus filhos. Depois de mais de 50 anos apoiando as autocracias não democráticas na região, nada teria mais êxito na conquista dos corações e mentes dos egípcios do que um apoio real a esta ponte concreta para o futuro, para uma população que se libertou com dignidade e urbanidade. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINOÉ O GANHADOR DO PRÊMIO NOBEL DE QUÍMICA DE 1999

Quase 100 dias após a revolução, o Egito hoje está bem diferente do país que vivenciei quando milhões de pessoas foram às ruas exigindo a queda do regime de Mubarak. Apesar de uma miríade de problemas, hoje existe uma nova energia, ou, como os egípcios afirmam, "hawa gadi" ("um novo ar"). A grande questão é como canalizar esta energia para forjar um novo Egito, democrático e sustentável, política e economicamente. A chave para avançarmos é despertar a confiança das pessoas com um projeto imediato de grande envergadura, que capture a imaginação das pessoas e simbolize o que o futuro pode trazer. O que a barragem de Assuã fez para uma geração anterior, a nova Cidade da Ciência e Tecnologia, hoje em construção, também o fará para uma juventude repleta de esperanças. Nos anos 60, vivi pessoalmente o impacto retumbante da ideia do presidente Nasser de construir a barragem de Assuã, como um "projeto nacional" para controlar a irrigação do Nilo e para a produção de eletricidade. Como escreveu o jovem jornalista Emad Ahmed num recente ensaio sobre as "pontes" para o futuro, um projeto nacional pós-revolução do Egito que seja comparável ao de Assuã deve estar focado na educação. Todas as famílias egípcias compreendem isso. Elas vivenciaram pessoalmente a deterioração do sistema de ensino do país nos últimos 30 anos de governo de Mubarak. Especialmente para a juventude do Facebook, que inflamou esta revolução, o foco no avanço da educação talvez leve o Egito de volta ao status de país de primeira categoria e combina com os princípios e o espírito do seu movimento - que eles temem possa ser derrotado por uma política com raízes no passado. Como Emad Ahmed escreveu, duas visões dominantes moldaram a imaginação política egípcia nos últimos 60 anos. A primeira foi a do partido socialista, o "al-Hisb al-Ishtraki", que nasceu com Nasser e a revolução de 1952. Para a juventude atual, essa visão política representa o passado. No momento, a força política mais organizada no país é a Irmandade Muçulmana, "Akhwan al-Muslimin". Para Emad, ela representa o presente em transição. Numa perspectiva histórica, a Irmandade Muçulmana também faz parte do passado, já que foi fundada em 1928, antes mesmo de Nasser. A atração que ela exerce é resultante da mensagem religiosa eficaz que transmite e seu trabalho beneficente organizado; e porque seus adeptos resistiram ao regime por tanto tempo. O movimento juvenil sabe perfeitamente que essas velhas ideias não podem levar o Egito para o futuro. Assim, nos meses que se seguiram desde que Mubarak foi derrubado, com o admirável apoio do Exército, os jovens, junto com um amplo espectro da sociedade egípcia, têm mantido aquele mesmo estado de espírito vivo, continuando a se reunir na Praça Tahrir às sextas-feiras no que é chamado de "millioniah", a reunião de um milhão de pessoas. Eles inventam um nome para cada encontro - sexta-feira da "mudança" ("takhier"), da "ira" ("khadab"), da "correção" ("tas´ hih"). O que demandam é que o caminho para a democracia seja consolidado por meio de constituições adequadas, o fim da influência do antigo regime, e que alcancemos a justiça e a igualdade. Suas expectativas são um remédio rápido para se conseguir uma melhor situação econômica. Depois de tantos anos de inércia e ditadura, contudo, a realidade é que essas mudanças levarão anos. Nesse intervalo, as pessoas precisam de um compasso de esperança que una o país e inspire confiança e orgulho. Em 3 de junho, uma sexta-feira totalmente diferente despontou no país: a sexta-feira da esperança, para os egípcios. Um dia antes, foi lançada uma campanha nacional para a construção da nova Cidade da Ciência e Tecnologia, após uma lei aprovada por unanimidade no gabinete de Ministros e a decisão de apoio do Conselho Supremo das Forças Armadas. Esta "cidade do futuro" como já está sendo chamada, que será erigida num terreno de cerca de 121 hectares nos arredores do Cairo, tem uma estrutura de governança transparente e completamente independente dos regulamentos governamentais. O seu Conselho de Administração, já formado, congrega seis laureados com o Nobel, o atual presidente da Caltech e ex-presidente do Massachusetts Institute of Technology (MIT), e inúmeros egípcios influentes, como Mohamed El-Erian, CEO da PIMCO, que fez uma doação pessoal para a cidade. Sir Magdi Yacoub, renomado cirurgião do Imperial College em Londres também é membro desse conselho. Não é surpresa o fato de o projeto ter sido acatado com o maior entusiasmo pela opinião pública. Ibrahim Issa, conhecido jornalista e um dos líderes dos protestos da praça Tahrir, disse que "é a coisa mais importante anunciada desde a revolução". Ahmed Moslemany, popular comentarista de TV, declarou para milhões de telespectadores que "este é o único caminho para o mundo moderno". Durante 12 anos, desde que fui agraciado com o Prêmio Nobel, venho trabalhando para este projeto sair da gaveta, apenas para ser frustrado por burocratas com falta de visão e a indiferença de Mubarak. O "novo ar" da revolução deu nova vida a ele. Nosso objetivo é desenvolver uma instituição sem fins lucrativos de ensino superior que seja baseada no mérito e o nosso modelo é um híbrido da Caltech, instituição com a qual estou familiarizado há mais de 30 anos, os Institutos Max Planck e o Parque Tecnológico da Turquia. A meta é retomar a produção de novos conhecimentos pelos árabes e levar os avanços da ciência e tecnologia para o mercado e a sociedade nesta era de despertar árabe. Desejamos mostrar que "o Egito pode". O que, por si só, terá um enorme impacto na reconquista do orgulho nacional. Mesmo com as dificuldades econômicas presentes, os egípcios decidiram investir no futuro, com bilhões de dólares em terra e prédios para o projeto. Em questão de semanas de campanha, arrecadamos os primeiros US$ 100 bilhões para uma dotação de US$ 2 bilhões que garantirá o sucesso e a independência a longo prazo desse projeto. Nossa esperança é que a comunidade internacional - os Estados do Golfo, o G-20 e o G-8 (que prometeu US$ 20 bilhões na cúpula de Deauville) - venha a criar uma genuína parceria com o Egito para investir na educação dos nossos jovens, de maneira que os ganhos da revolução possam ser consolidados com benefícios para a região e o mundo. Os benefícios para todos são claros se esta região tão importante para o mundo conseguir progredir e se desenvolver. Quando a população do Egito realizar o seu sonho de democracia e crescimento sustentado, terá avançado uma grande parte do caminho na direção de um grande mercado na região que compreende os países do Oriente Médio e Norte da África de quase quatro milhões de pessoas. O investimento na educação e na prosperidade econômica é a melhor maneira de acabar com os fanatismos e estabelecer uma paz justa no Oriente Médio. Uma instituição como a Cidade da Ciência e Tecnologia certamente será um centro de informação e cooperação global. A revolução egípcia, que não tinha nenhuma ideologia, e só queria mudanças pacíficas, demonstrou claramente que as afirmações de que muçulmanos e árabes são incapazes de participar do mundo moderno, ou estão em violento conflito com a civilização ocidental, são infundadas. Como em todas as partes do mundo, o Oriente Médio aspira à liberdade e à justiça. Deseja ter uma vida melhor e dar uma educação decente para seus filhos. Depois de mais de 50 anos apoiando as autocracias não democráticas na região, nada teria mais êxito na conquista dos corações e mentes dos egípcios do que um apoio real a esta ponte concreta para o futuro, para uma população que se libertou com dignidade e urbanidade. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINOÉ O GANHADOR DO PRÊMIO NOBEL DE QUÍMICA DE 1999

Quase 100 dias após a revolução, o Egito hoje está bem diferente do país que vivenciei quando milhões de pessoas foram às ruas exigindo a queda do regime de Mubarak. Apesar de uma miríade de problemas, hoje existe uma nova energia, ou, como os egípcios afirmam, "hawa gadi" ("um novo ar"). A grande questão é como canalizar esta energia para forjar um novo Egito, democrático e sustentável, política e economicamente. A chave para avançarmos é despertar a confiança das pessoas com um projeto imediato de grande envergadura, que capture a imaginação das pessoas e simbolize o que o futuro pode trazer. O que a barragem de Assuã fez para uma geração anterior, a nova Cidade da Ciência e Tecnologia, hoje em construção, também o fará para uma juventude repleta de esperanças. Nos anos 60, vivi pessoalmente o impacto retumbante da ideia do presidente Nasser de construir a barragem de Assuã, como um "projeto nacional" para controlar a irrigação do Nilo e para a produção de eletricidade. Como escreveu o jovem jornalista Emad Ahmed num recente ensaio sobre as "pontes" para o futuro, um projeto nacional pós-revolução do Egito que seja comparável ao de Assuã deve estar focado na educação. Todas as famílias egípcias compreendem isso. Elas vivenciaram pessoalmente a deterioração do sistema de ensino do país nos últimos 30 anos de governo de Mubarak. Especialmente para a juventude do Facebook, que inflamou esta revolução, o foco no avanço da educação talvez leve o Egito de volta ao status de país de primeira categoria e combina com os princípios e o espírito do seu movimento - que eles temem possa ser derrotado por uma política com raízes no passado. Como Emad Ahmed escreveu, duas visões dominantes moldaram a imaginação política egípcia nos últimos 60 anos. A primeira foi a do partido socialista, o "al-Hisb al-Ishtraki", que nasceu com Nasser e a revolução de 1952. Para a juventude atual, essa visão política representa o passado. No momento, a força política mais organizada no país é a Irmandade Muçulmana, "Akhwan al-Muslimin". Para Emad, ela representa o presente em transição. Numa perspectiva histórica, a Irmandade Muçulmana também faz parte do passado, já que foi fundada em 1928, antes mesmo de Nasser. A atração que ela exerce é resultante da mensagem religiosa eficaz que transmite e seu trabalho beneficente organizado; e porque seus adeptos resistiram ao regime por tanto tempo. O movimento juvenil sabe perfeitamente que essas velhas ideias não podem levar o Egito para o futuro. Assim, nos meses que se seguiram desde que Mubarak foi derrubado, com o admirável apoio do Exército, os jovens, junto com um amplo espectro da sociedade egípcia, têm mantido aquele mesmo estado de espírito vivo, continuando a se reunir na Praça Tahrir às sextas-feiras no que é chamado de "millioniah", a reunião de um milhão de pessoas. Eles inventam um nome para cada encontro - sexta-feira da "mudança" ("takhier"), da "ira" ("khadab"), da "correção" ("tas´ hih"). O que demandam é que o caminho para a democracia seja consolidado por meio de constituições adequadas, o fim da influência do antigo regime, e que alcancemos a justiça e a igualdade. Suas expectativas são um remédio rápido para se conseguir uma melhor situação econômica. Depois de tantos anos de inércia e ditadura, contudo, a realidade é que essas mudanças levarão anos. Nesse intervalo, as pessoas precisam de um compasso de esperança que una o país e inspire confiança e orgulho. Em 3 de junho, uma sexta-feira totalmente diferente despontou no país: a sexta-feira da esperança, para os egípcios. Um dia antes, foi lançada uma campanha nacional para a construção da nova Cidade da Ciência e Tecnologia, após uma lei aprovada por unanimidade no gabinete de Ministros e a decisão de apoio do Conselho Supremo das Forças Armadas. Esta "cidade do futuro" como já está sendo chamada, que será erigida num terreno de cerca de 121 hectares nos arredores do Cairo, tem uma estrutura de governança transparente e completamente independente dos regulamentos governamentais. O seu Conselho de Administração, já formado, congrega seis laureados com o Nobel, o atual presidente da Caltech e ex-presidente do Massachusetts Institute of Technology (MIT), e inúmeros egípcios influentes, como Mohamed El-Erian, CEO da PIMCO, que fez uma doação pessoal para a cidade. Sir Magdi Yacoub, renomado cirurgião do Imperial College em Londres também é membro desse conselho. Não é surpresa o fato de o projeto ter sido acatado com o maior entusiasmo pela opinião pública. Ibrahim Issa, conhecido jornalista e um dos líderes dos protestos da praça Tahrir, disse que "é a coisa mais importante anunciada desde a revolução". Ahmed Moslemany, popular comentarista de TV, declarou para milhões de telespectadores que "este é o único caminho para o mundo moderno". Durante 12 anos, desde que fui agraciado com o Prêmio Nobel, venho trabalhando para este projeto sair da gaveta, apenas para ser frustrado por burocratas com falta de visão e a indiferença de Mubarak. O "novo ar" da revolução deu nova vida a ele. Nosso objetivo é desenvolver uma instituição sem fins lucrativos de ensino superior que seja baseada no mérito e o nosso modelo é um híbrido da Caltech, instituição com a qual estou familiarizado há mais de 30 anos, os Institutos Max Planck e o Parque Tecnológico da Turquia. A meta é retomar a produção de novos conhecimentos pelos árabes e levar os avanços da ciência e tecnologia para o mercado e a sociedade nesta era de despertar árabe. Desejamos mostrar que "o Egito pode". O que, por si só, terá um enorme impacto na reconquista do orgulho nacional. Mesmo com as dificuldades econômicas presentes, os egípcios decidiram investir no futuro, com bilhões de dólares em terra e prédios para o projeto. Em questão de semanas de campanha, arrecadamos os primeiros US$ 100 bilhões para uma dotação de US$ 2 bilhões que garantirá o sucesso e a independência a longo prazo desse projeto. Nossa esperança é que a comunidade internacional - os Estados do Golfo, o G-20 e o G-8 (que prometeu US$ 20 bilhões na cúpula de Deauville) - venha a criar uma genuína parceria com o Egito para investir na educação dos nossos jovens, de maneira que os ganhos da revolução possam ser consolidados com benefícios para a região e o mundo. Os benefícios para todos são claros se esta região tão importante para o mundo conseguir progredir e se desenvolver. Quando a população do Egito realizar o seu sonho de democracia e crescimento sustentado, terá avançado uma grande parte do caminho na direção de um grande mercado na região que compreende os países do Oriente Médio e Norte da África de quase quatro milhões de pessoas. O investimento na educação e na prosperidade econômica é a melhor maneira de acabar com os fanatismos e estabelecer uma paz justa no Oriente Médio. Uma instituição como a Cidade da Ciência e Tecnologia certamente será um centro de informação e cooperação global. A revolução egípcia, que não tinha nenhuma ideologia, e só queria mudanças pacíficas, demonstrou claramente que as afirmações de que muçulmanos e árabes são incapazes de participar do mundo moderno, ou estão em violento conflito com a civilização ocidental, são infundadas. Como em todas as partes do mundo, o Oriente Médio aspira à liberdade e à justiça. Deseja ter uma vida melhor e dar uma educação decente para seus filhos. Depois de mais de 50 anos apoiando as autocracias não democráticas na região, nada teria mais êxito na conquista dos corações e mentes dos egípcios do que um apoio real a esta ponte concreta para o futuro, para uma população que se libertou com dignidade e urbanidade. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINOÉ O GANHADOR DO PRÊMIO NOBEL DE QUÍMICA DE 1999

Quase 100 dias após a revolução, o Egito hoje está bem diferente do país que vivenciei quando milhões de pessoas foram às ruas exigindo a queda do regime de Mubarak. Apesar de uma miríade de problemas, hoje existe uma nova energia, ou, como os egípcios afirmam, "hawa gadi" ("um novo ar"). A grande questão é como canalizar esta energia para forjar um novo Egito, democrático e sustentável, política e economicamente. A chave para avançarmos é despertar a confiança das pessoas com um projeto imediato de grande envergadura, que capture a imaginação das pessoas e simbolize o que o futuro pode trazer. O que a barragem de Assuã fez para uma geração anterior, a nova Cidade da Ciência e Tecnologia, hoje em construção, também o fará para uma juventude repleta de esperanças. Nos anos 60, vivi pessoalmente o impacto retumbante da ideia do presidente Nasser de construir a barragem de Assuã, como um "projeto nacional" para controlar a irrigação do Nilo e para a produção de eletricidade. Como escreveu o jovem jornalista Emad Ahmed num recente ensaio sobre as "pontes" para o futuro, um projeto nacional pós-revolução do Egito que seja comparável ao de Assuã deve estar focado na educação. Todas as famílias egípcias compreendem isso. Elas vivenciaram pessoalmente a deterioração do sistema de ensino do país nos últimos 30 anos de governo de Mubarak. Especialmente para a juventude do Facebook, que inflamou esta revolução, o foco no avanço da educação talvez leve o Egito de volta ao status de país de primeira categoria e combina com os princípios e o espírito do seu movimento - que eles temem possa ser derrotado por uma política com raízes no passado. Como Emad Ahmed escreveu, duas visões dominantes moldaram a imaginação política egípcia nos últimos 60 anos. A primeira foi a do partido socialista, o "al-Hisb al-Ishtraki", que nasceu com Nasser e a revolução de 1952. Para a juventude atual, essa visão política representa o passado. No momento, a força política mais organizada no país é a Irmandade Muçulmana, "Akhwan al-Muslimin". Para Emad, ela representa o presente em transição. Numa perspectiva histórica, a Irmandade Muçulmana também faz parte do passado, já que foi fundada em 1928, antes mesmo de Nasser. A atração que ela exerce é resultante da mensagem religiosa eficaz que transmite e seu trabalho beneficente organizado; e porque seus adeptos resistiram ao regime por tanto tempo. O movimento juvenil sabe perfeitamente que essas velhas ideias não podem levar o Egito para o futuro. Assim, nos meses que se seguiram desde que Mubarak foi derrubado, com o admirável apoio do Exército, os jovens, junto com um amplo espectro da sociedade egípcia, têm mantido aquele mesmo estado de espírito vivo, continuando a se reunir na Praça Tahrir às sextas-feiras no que é chamado de "millioniah", a reunião de um milhão de pessoas. Eles inventam um nome para cada encontro - sexta-feira da "mudança" ("takhier"), da "ira" ("khadab"), da "correção" ("tas´ hih"). O que demandam é que o caminho para a democracia seja consolidado por meio de constituições adequadas, o fim da influência do antigo regime, e que alcancemos a justiça e a igualdade. Suas expectativas são um remédio rápido para se conseguir uma melhor situação econômica. Depois de tantos anos de inércia e ditadura, contudo, a realidade é que essas mudanças levarão anos. Nesse intervalo, as pessoas precisam de um compasso de esperança que una o país e inspire confiança e orgulho. Em 3 de junho, uma sexta-feira totalmente diferente despontou no país: a sexta-feira da esperança, para os egípcios. Um dia antes, foi lançada uma campanha nacional para a construção da nova Cidade da Ciência e Tecnologia, após uma lei aprovada por unanimidade no gabinete de Ministros e a decisão de apoio do Conselho Supremo das Forças Armadas. Esta "cidade do futuro" como já está sendo chamada, que será erigida num terreno de cerca de 121 hectares nos arredores do Cairo, tem uma estrutura de governança transparente e completamente independente dos regulamentos governamentais. O seu Conselho de Administração, já formado, congrega seis laureados com o Nobel, o atual presidente da Caltech e ex-presidente do Massachusetts Institute of Technology (MIT), e inúmeros egípcios influentes, como Mohamed El-Erian, CEO da PIMCO, que fez uma doação pessoal para a cidade. Sir Magdi Yacoub, renomado cirurgião do Imperial College em Londres também é membro desse conselho. Não é surpresa o fato de o projeto ter sido acatado com o maior entusiasmo pela opinião pública. Ibrahim Issa, conhecido jornalista e um dos líderes dos protestos da praça Tahrir, disse que "é a coisa mais importante anunciada desde a revolução". Ahmed Moslemany, popular comentarista de TV, declarou para milhões de telespectadores que "este é o único caminho para o mundo moderno". Durante 12 anos, desde que fui agraciado com o Prêmio Nobel, venho trabalhando para este projeto sair da gaveta, apenas para ser frustrado por burocratas com falta de visão e a indiferença de Mubarak. O "novo ar" da revolução deu nova vida a ele. Nosso objetivo é desenvolver uma instituição sem fins lucrativos de ensino superior que seja baseada no mérito e o nosso modelo é um híbrido da Caltech, instituição com a qual estou familiarizado há mais de 30 anos, os Institutos Max Planck e o Parque Tecnológico da Turquia. A meta é retomar a produção de novos conhecimentos pelos árabes e levar os avanços da ciência e tecnologia para o mercado e a sociedade nesta era de despertar árabe. Desejamos mostrar que "o Egito pode". O que, por si só, terá um enorme impacto na reconquista do orgulho nacional. Mesmo com as dificuldades econômicas presentes, os egípcios decidiram investir no futuro, com bilhões de dólares em terra e prédios para o projeto. Em questão de semanas de campanha, arrecadamos os primeiros US$ 100 bilhões para uma dotação de US$ 2 bilhões que garantirá o sucesso e a independência a longo prazo desse projeto. Nossa esperança é que a comunidade internacional - os Estados do Golfo, o G-20 e o G-8 (que prometeu US$ 20 bilhões na cúpula de Deauville) - venha a criar uma genuína parceria com o Egito para investir na educação dos nossos jovens, de maneira que os ganhos da revolução possam ser consolidados com benefícios para a região e o mundo. Os benefícios para todos são claros se esta região tão importante para o mundo conseguir progredir e se desenvolver. Quando a população do Egito realizar o seu sonho de democracia e crescimento sustentado, terá avançado uma grande parte do caminho na direção de um grande mercado na região que compreende os países do Oriente Médio e Norte da África de quase quatro milhões de pessoas. O investimento na educação e na prosperidade econômica é a melhor maneira de acabar com os fanatismos e estabelecer uma paz justa no Oriente Médio. Uma instituição como a Cidade da Ciência e Tecnologia certamente será um centro de informação e cooperação global. A revolução egípcia, que não tinha nenhuma ideologia, e só queria mudanças pacíficas, demonstrou claramente que as afirmações de que muçulmanos e árabes são incapazes de participar do mundo moderno, ou estão em violento conflito com a civilização ocidental, são infundadas. Como em todas as partes do mundo, o Oriente Médio aspira à liberdade e à justiça. Deseja ter uma vida melhor e dar uma educação decente para seus filhos. Depois de mais de 50 anos apoiando as autocracias não democráticas na região, nada teria mais êxito na conquista dos corações e mentes dos egípcios do que um apoio real a esta ponte concreta para o futuro, para uma população que se libertou com dignidade e urbanidade. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINOÉ O GANHADOR DO PRÊMIO NOBEL DE QUÍMICA DE 1999

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.