Opinião|A reforma trabalhista do governo Temer


Sugestão encaminhada ao presidente no final do ano peca pelo excesso, não por escassez

Por ALMIR PAZZIANOTTO PINTO

Os consultores do presidente Michel Temer devem compreender que a insegurança nas relações de trabalho não deve ser atribuída à escassez, mas ao excesso de legislação.Desde maio de 1943, quando a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) entrou em vigor, outra coisa não se fez senão aprofundar a intervenção do Estado no convívio entre patrões e empregados.

Com 922 artigos, a CLT nasceu exagerada. Corresponde ao período em que países como México, Bolívia, Venezuela adotaram Código do Trabalho e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) cogitou da aprovação de Código Internacional do Trabalho. Tratava-se de “pura arte de construção no vácuo”, como escreveu Oliveira Vianna, ao tecer críticas a juristas e legisladores habituados a tomar como fatos o que não passava de teses acadêmicas.

Para o Brasil rural, com reduzida população urbana e pequeno número de operários, a CLT trouxe inovações de qualidade. Mas esbanjou defeitos decorrentes da prolixidade, como a data da fotografia colada na carteira profissional, a obrigatória participação da gorjeta na remuneração, a redução da hora de trabalho noturno a 52 minutos e 30 segundos, a fixação do espaço mínimo de 80 centímetros entre ferramentas ou de 1,30 m entre partes móveis de máquinas.

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Em longo período de 70 anos, uma das poucas leis destinadas a atender às necessidades do País foi a que instituiu o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), cuja história é contada no livro O Governo Castelo Branco, de Luís Vianna Filho. Surgiu para permitir a compra, venda e fusões de estatais “condenadas à lenta agonia em virtude do ônus trabalhista”, decorrente da presença de trabalhadores estáveis. Era o que sucedia com a Fábrica Nacional de Motores, “cujos déficits eram intoleráveis, sem trazer contribuição especial para a economia, pois caminhões poderiam ser produzidos pela iniciativa privada”.

Questões essenciais, como validade do recibo de quitação, ou sistemas de controle de jornada, permanecem sem solução e abarrotam Varas e Tribunais do Trabalho com reclamações geradoras de insuportável passivo.

Duas medidas urgem ser promovidas pelo governo do presidente Michel Temer, como pontos de partida de boa reforma: 1) Aprovação do projeto de lei sobre terceirização, inexplicavelmente retido no Senado; e 2) o reconhecimento das convenções e dos acordos coletivos de trabalho, em obediência ao determinado pelo artigo 7.º, XXVI, da Constituição.

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Quanto à terceirização, abstenho-me de argumentar. O assunto já foi objeto de amplas discussões. O projeto aprovado na Câmara dos Deputados é bom. Poderia ser melhor, mas resulta de longas discussões entre as partes interessadas.

No tocante à validade das negociações coletivas, não há como tergiversar. Atendido o disciplinado no Título VI da CLT, onde estão os requisitos para a celebração de convenções e acordos coletivos, ao Ministério do Trabalho resta apenas proceder ao registro e arquivamento (CLT, artigo 614). A negociação será válida, qualquer que tenha sido o objeto e o conteúdo. É o previsto na Convenção n.º 194 da Organização Internacional do Trabalho, promulgada pelo presidente Itamar Franco mediante o Decreto n.º 1.206, de 29/9/1994. Ordena o artigo 1.º: “A Convenção n.º 154, da Organização Internacional do Trabalho, sobre o incentivo à Negociação Coletiva, concluída em Genebra, em 19 de junho de 1981, apensa por cópia a este decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como nela se contém”.

Com as deferências devidas ao ilustre ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, a sugestão de reforma trabalhista encaminhada ao presidente Michel Temer no final do ano peca pelo excesso, e não por escassez. Envereda por terrenos acidentados ao propor, por exemplo, alterações na Lei n.º 6.019/74, que dispõe sobre o trabalho temporário, e ao regulamentar o artigo 8.º da Constituição, que prevê a existência de representantes dos empregados no local de trabalho.

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Sobre contrato de trabalho temporário cabe lembrar que a Lei n.º 6.019 é modelo de diploma legal claro, sucinto, objetivo, embora ocasionalmente prejudicado por portarias do Ministério do Trabalho e Emprego. Trata-se de matéria tranquila e sedimentada, cuja única controvérsia foi recentemente criada pela Justiça do Trabalho ao estender, indevidamente, à prestadora de serviços temporários o benefício da estabilidade da empregada gestante, prevista pelo artigo 10.º, I, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Não houvesse tal excesso de inventividade, continuaria pacificada a esfera da prestação de serviços transitórios.

Quanto à representação dos empregados nas empresas, o artigo 11.º da Constituição dispõe satisfatoriamente acerca da matéria. Reza o dispositivo: “Nas empresas com mais de 200 empregados, é assegurada a eleição de um representante destes com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores”. O artigo omite a necessidade de regulamentação. Trata-se de disposição autoaplicável, que trata de assunto a ser equacionado pelos interessados.

A concessão de estabilidade ao representante interno, oferecendo-lhe garantia não prevista no dispositivo constitucional, atrairá desgastante resistência patronal. Foi o que se deu com o Projeto de Relações Sindicais, do Fórum Nacional do Trabalho, anexo à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 369/05, fulminados ambos no berço por empregadores e empregados.

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O desemprego de mais de 12 milhões recomenda ao governo não se arriscar por terreno acidentado. Apoio a proposta divulgada pelo excelentíssimo ministro Ronaldo Nogueira, a quem louvo pela coragem. Não posso, contudo, fazê-lo incondicionalmente.

* ALMIR PAZZIANOTTO PINTO É ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO

Os consultores do presidente Michel Temer devem compreender que a insegurança nas relações de trabalho não deve ser atribuída à escassez, mas ao excesso de legislação.Desde maio de 1943, quando a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) entrou em vigor, outra coisa não se fez senão aprofundar a intervenção do Estado no convívio entre patrões e empregados.

Com 922 artigos, a CLT nasceu exagerada. Corresponde ao período em que países como México, Bolívia, Venezuela adotaram Código do Trabalho e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) cogitou da aprovação de Código Internacional do Trabalho. Tratava-se de “pura arte de construção no vácuo”, como escreveu Oliveira Vianna, ao tecer críticas a juristas e legisladores habituados a tomar como fatos o que não passava de teses acadêmicas.

Para o Brasil rural, com reduzida população urbana e pequeno número de operários, a CLT trouxe inovações de qualidade. Mas esbanjou defeitos decorrentes da prolixidade, como a data da fotografia colada na carteira profissional, a obrigatória participação da gorjeta na remuneração, a redução da hora de trabalho noturno a 52 minutos e 30 segundos, a fixação do espaço mínimo de 80 centímetros entre ferramentas ou de 1,30 m entre partes móveis de máquinas.

Em longo período de 70 anos, uma das poucas leis destinadas a atender às necessidades do País foi a que instituiu o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), cuja história é contada no livro O Governo Castelo Branco, de Luís Vianna Filho. Surgiu para permitir a compra, venda e fusões de estatais “condenadas à lenta agonia em virtude do ônus trabalhista”, decorrente da presença de trabalhadores estáveis. Era o que sucedia com a Fábrica Nacional de Motores, “cujos déficits eram intoleráveis, sem trazer contribuição especial para a economia, pois caminhões poderiam ser produzidos pela iniciativa privada”.

Questões essenciais, como validade do recibo de quitação, ou sistemas de controle de jornada, permanecem sem solução e abarrotam Varas e Tribunais do Trabalho com reclamações geradoras de insuportável passivo.

Duas medidas urgem ser promovidas pelo governo do presidente Michel Temer, como pontos de partida de boa reforma: 1) Aprovação do projeto de lei sobre terceirização, inexplicavelmente retido no Senado; e 2) o reconhecimento das convenções e dos acordos coletivos de trabalho, em obediência ao determinado pelo artigo 7.º, XXVI, da Constituição.

Quanto à terceirização, abstenho-me de argumentar. O assunto já foi objeto de amplas discussões. O projeto aprovado na Câmara dos Deputados é bom. Poderia ser melhor, mas resulta de longas discussões entre as partes interessadas.

No tocante à validade das negociações coletivas, não há como tergiversar. Atendido o disciplinado no Título VI da CLT, onde estão os requisitos para a celebração de convenções e acordos coletivos, ao Ministério do Trabalho resta apenas proceder ao registro e arquivamento (CLT, artigo 614). A negociação será válida, qualquer que tenha sido o objeto e o conteúdo. É o previsto na Convenção n.º 194 da Organização Internacional do Trabalho, promulgada pelo presidente Itamar Franco mediante o Decreto n.º 1.206, de 29/9/1994. Ordena o artigo 1.º: “A Convenção n.º 154, da Organização Internacional do Trabalho, sobre o incentivo à Negociação Coletiva, concluída em Genebra, em 19 de junho de 1981, apensa por cópia a este decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como nela se contém”.

Com as deferências devidas ao ilustre ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, a sugestão de reforma trabalhista encaminhada ao presidente Michel Temer no final do ano peca pelo excesso, e não por escassez. Envereda por terrenos acidentados ao propor, por exemplo, alterações na Lei n.º 6.019/74, que dispõe sobre o trabalho temporário, e ao regulamentar o artigo 8.º da Constituição, que prevê a existência de representantes dos empregados no local de trabalho.

Sobre contrato de trabalho temporário cabe lembrar que a Lei n.º 6.019 é modelo de diploma legal claro, sucinto, objetivo, embora ocasionalmente prejudicado por portarias do Ministério do Trabalho e Emprego. Trata-se de matéria tranquila e sedimentada, cuja única controvérsia foi recentemente criada pela Justiça do Trabalho ao estender, indevidamente, à prestadora de serviços temporários o benefício da estabilidade da empregada gestante, prevista pelo artigo 10.º, I, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Não houvesse tal excesso de inventividade, continuaria pacificada a esfera da prestação de serviços transitórios.

Quanto à representação dos empregados nas empresas, o artigo 11.º da Constituição dispõe satisfatoriamente acerca da matéria. Reza o dispositivo: “Nas empresas com mais de 200 empregados, é assegurada a eleição de um representante destes com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores”. O artigo omite a necessidade de regulamentação. Trata-se de disposição autoaplicável, que trata de assunto a ser equacionado pelos interessados.

A concessão de estabilidade ao representante interno, oferecendo-lhe garantia não prevista no dispositivo constitucional, atrairá desgastante resistência patronal. Foi o que se deu com o Projeto de Relações Sindicais, do Fórum Nacional do Trabalho, anexo à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 369/05, fulminados ambos no berço por empregadores e empregados.

O desemprego de mais de 12 milhões recomenda ao governo não se arriscar por terreno acidentado. Apoio a proposta divulgada pelo excelentíssimo ministro Ronaldo Nogueira, a quem louvo pela coragem. Não posso, contudo, fazê-lo incondicionalmente.

* ALMIR PAZZIANOTTO PINTO É ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO

Os consultores do presidente Michel Temer devem compreender que a insegurança nas relações de trabalho não deve ser atribuída à escassez, mas ao excesso de legislação.Desde maio de 1943, quando a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) entrou em vigor, outra coisa não se fez senão aprofundar a intervenção do Estado no convívio entre patrões e empregados.

Com 922 artigos, a CLT nasceu exagerada. Corresponde ao período em que países como México, Bolívia, Venezuela adotaram Código do Trabalho e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) cogitou da aprovação de Código Internacional do Trabalho. Tratava-se de “pura arte de construção no vácuo”, como escreveu Oliveira Vianna, ao tecer críticas a juristas e legisladores habituados a tomar como fatos o que não passava de teses acadêmicas.

Para o Brasil rural, com reduzida população urbana e pequeno número de operários, a CLT trouxe inovações de qualidade. Mas esbanjou defeitos decorrentes da prolixidade, como a data da fotografia colada na carteira profissional, a obrigatória participação da gorjeta na remuneração, a redução da hora de trabalho noturno a 52 minutos e 30 segundos, a fixação do espaço mínimo de 80 centímetros entre ferramentas ou de 1,30 m entre partes móveis de máquinas.

Em longo período de 70 anos, uma das poucas leis destinadas a atender às necessidades do País foi a que instituiu o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), cuja história é contada no livro O Governo Castelo Branco, de Luís Vianna Filho. Surgiu para permitir a compra, venda e fusões de estatais “condenadas à lenta agonia em virtude do ônus trabalhista”, decorrente da presença de trabalhadores estáveis. Era o que sucedia com a Fábrica Nacional de Motores, “cujos déficits eram intoleráveis, sem trazer contribuição especial para a economia, pois caminhões poderiam ser produzidos pela iniciativa privada”.

Questões essenciais, como validade do recibo de quitação, ou sistemas de controle de jornada, permanecem sem solução e abarrotam Varas e Tribunais do Trabalho com reclamações geradoras de insuportável passivo.

Duas medidas urgem ser promovidas pelo governo do presidente Michel Temer, como pontos de partida de boa reforma: 1) Aprovação do projeto de lei sobre terceirização, inexplicavelmente retido no Senado; e 2) o reconhecimento das convenções e dos acordos coletivos de trabalho, em obediência ao determinado pelo artigo 7.º, XXVI, da Constituição.

Quanto à terceirização, abstenho-me de argumentar. O assunto já foi objeto de amplas discussões. O projeto aprovado na Câmara dos Deputados é bom. Poderia ser melhor, mas resulta de longas discussões entre as partes interessadas.

No tocante à validade das negociações coletivas, não há como tergiversar. Atendido o disciplinado no Título VI da CLT, onde estão os requisitos para a celebração de convenções e acordos coletivos, ao Ministério do Trabalho resta apenas proceder ao registro e arquivamento (CLT, artigo 614). A negociação será válida, qualquer que tenha sido o objeto e o conteúdo. É o previsto na Convenção n.º 194 da Organização Internacional do Trabalho, promulgada pelo presidente Itamar Franco mediante o Decreto n.º 1.206, de 29/9/1994. Ordena o artigo 1.º: “A Convenção n.º 154, da Organização Internacional do Trabalho, sobre o incentivo à Negociação Coletiva, concluída em Genebra, em 19 de junho de 1981, apensa por cópia a este decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como nela se contém”.

Com as deferências devidas ao ilustre ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, a sugestão de reforma trabalhista encaminhada ao presidente Michel Temer no final do ano peca pelo excesso, e não por escassez. Envereda por terrenos acidentados ao propor, por exemplo, alterações na Lei n.º 6.019/74, que dispõe sobre o trabalho temporário, e ao regulamentar o artigo 8.º da Constituição, que prevê a existência de representantes dos empregados no local de trabalho.

Sobre contrato de trabalho temporário cabe lembrar que a Lei n.º 6.019 é modelo de diploma legal claro, sucinto, objetivo, embora ocasionalmente prejudicado por portarias do Ministério do Trabalho e Emprego. Trata-se de matéria tranquila e sedimentada, cuja única controvérsia foi recentemente criada pela Justiça do Trabalho ao estender, indevidamente, à prestadora de serviços temporários o benefício da estabilidade da empregada gestante, prevista pelo artigo 10.º, I, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Não houvesse tal excesso de inventividade, continuaria pacificada a esfera da prestação de serviços transitórios.

Quanto à representação dos empregados nas empresas, o artigo 11.º da Constituição dispõe satisfatoriamente acerca da matéria. Reza o dispositivo: “Nas empresas com mais de 200 empregados, é assegurada a eleição de um representante destes com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores”. O artigo omite a necessidade de regulamentação. Trata-se de disposição autoaplicável, que trata de assunto a ser equacionado pelos interessados.

A concessão de estabilidade ao representante interno, oferecendo-lhe garantia não prevista no dispositivo constitucional, atrairá desgastante resistência patronal. Foi o que se deu com o Projeto de Relações Sindicais, do Fórum Nacional do Trabalho, anexo à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 369/05, fulminados ambos no berço por empregadores e empregados.

O desemprego de mais de 12 milhões recomenda ao governo não se arriscar por terreno acidentado. Apoio a proposta divulgada pelo excelentíssimo ministro Ronaldo Nogueira, a quem louvo pela coragem. Não posso, contudo, fazê-lo incondicionalmente.

* ALMIR PAZZIANOTTO PINTO É ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO

Os consultores do presidente Michel Temer devem compreender que a insegurança nas relações de trabalho não deve ser atribuída à escassez, mas ao excesso de legislação.Desde maio de 1943, quando a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) entrou em vigor, outra coisa não se fez senão aprofundar a intervenção do Estado no convívio entre patrões e empregados.

Com 922 artigos, a CLT nasceu exagerada. Corresponde ao período em que países como México, Bolívia, Venezuela adotaram Código do Trabalho e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) cogitou da aprovação de Código Internacional do Trabalho. Tratava-se de “pura arte de construção no vácuo”, como escreveu Oliveira Vianna, ao tecer críticas a juristas e legisladores habituados a tomar como fatos o que não passava de teses acadêmicas.

Para o Brasil rural, com reduzida população urbana e pequeno número de operários, a CLT trouxe inovações de qualidade. Mas esbanjou defeitos decorrentes da prolixidade, como a data da fotografia colada na carteira profissional, a obrigatória participação da gorjeta na remuneração, a redução da hora de trabalho noturno a 52 minutos e 30 segundos, a fixação do espaço mínimo de 80 centímetros entre ferramentas ou de 1,30 m entre partes móveis de máquinas.

Em longo período de 70 anos, uma das poucas leis destinadas a atender às necessidades do País foi a que instituiu o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), cuja história é contada no livro O Governo Castelo Branco, de Luís Vianna Filho. Surgiu para permitir a compra, venda e fusões de estatais “condenadas à lenta agonia em virtude do ônus trabalhista”, decorrente da presença de trabalhadores estáveis. Era o que sucedia com a Fábrica Nacional de Motores, “cujos déficits eram intoleráveis, sem trazer contribuição especial para a economia, pois caminhões poderiam ser produzidos pela iniciativa privada”.

Questões essenciais, como validade do recibo de quitação, ou sistemas de controle de jornada, permanecem sem solução e abarrotam Varas e Tribunais do Trabalho com reclamações geradoras de insuportável passivo.

Duas medidas urgem ser promovidas pelo governo do presidente Michel Temer, como pontos de partida de boa reforma: 1) Aprovação do projeto de lei sobre terceirização, inexplicavelmente retido no Senado; e 2) o reconhecimento das convenções e dos acordos coletivos de trabalho, em obediência ao determinado pelo artigo 7.º, XXVI, da Constituição.

Quanto à terceirização, abstenho-me de argumentar. O assunto já foi objeto de amplas discussões. O projeto aprovado na Câmara dos Deputados é bom. Poderia ser melhor, mas resulta de longas discussões entre as partes interessadas.

No tocante à validade das negociações coletivas, não há como tergiversar. Atendido o disciplinado no Título VI da CLT, onde estão os requisitos para a celebração de convenções e acordos coletivos, ao Ministério do Trabalho resta apenas proceder ao registro e arquivamento (CLT, artigo 614). A negociação será válida, qualquer que tenha sido o objeto e o conteúdo. É o previsto na Convenção n.º 194 da Organização Internacional do Trabalho, promulgada pelo presidente Itamar Franco mediante o Decreto n.º 1.206, de 29/9/1994. Ordena o artigo 1.º: “A Convenção n.º 154, da Organização Internacional do Trabalho, sobre o incentivo à Negociação Coletiva, concluída em Genebra, em 19 de junho de 1981, apensa por cópia a este decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como nela se contém”.

Com as deferências devidas ao ilustre ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, a sugestão de reforma trabalhista encaminhada ao presidente Michel Temer no final do ano peca pelo excesso, e não por escassez. Envereda por terrenos acidentados ao propor, por exemplo, alterações na Lei n.º 6.019/74, que dispõe sobre o trabalho temporário, e ao regulamentar o artigo 8.º da Constituição, que prevê a existência de representantes dos empregados no local de trabalho.

Sobre contrato de trabalho temporário cabe lembrar que a Lei n.º 6.019 é modelo de diploma legal claro, sucinto, objetivo, embora ocasionalmente prejudicado por portarias do Ministério do Trabalho e Emprego. Trata-se de matéria tranquila e sedimentada, cuja única controvérsia foi recentemente criada pela Justiça do Trabalho ao estender, indevidamente, à prestadora de serviços temporários o benefício da estabilidade da empregada gestante, prevista pelo artigo 10.º, I, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Não houvesse tal excesso de inventividade, continuaria pacificada a esfera da prestação de serviços transitórios.

Quanto à representação dos empregados nas empresas, o artigo 11.º da Constituição dispõe satisfatoriamente acerca da matéria. Reza o dispositivo: “Nas empresas com mais de 200 empregados, é assegurada a eleição de um representante destes com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores”. O artigo omite a necessidade de regulamentação. Trata-se de disposição autoaplicável, que trata de assunto a ser equacionado pelos interessados.

A concessão de estabilidade ao representante interno, oferecendo-lhe garantia não prevista no dispositivo constitucional, atrairá desgastante resistência patronal. Foi o que se deu com o Projeto de Relações Sindicais, do Fórum Nacional do Trabalho, anexo à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 369/05, fulminados ambos no berço por empregadores e empregados.

O desemprego de mais de 12 milhões recomenda ao governo não se arriscar por terreno acidentado. Apoio a proposta divulgada pelo excelentíssimo ministro Ronaldo Nogueira, a quem louvo pela coragem. Não posso, contudo, fazê-lo incondicionalmente.

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