O Atlas da Violência 2021, estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, revela que o Brasil ainda é um país muito perigoso no que concerne às mortes violentas. Em 2019, ano-base do estudo publicado na terça-feira passada, houve 45.503 homicídios no País, o que representa uma taxa de 21,7 assassinatos por cada grupo de 100 mil habitantes.
O resultado representa um recuo de 21,4% em relação às 57.956 vítimas de assassinato registradas no ano anterior. No entanto, os pesquisadores responsáveis pelo estudo alertam para a queda da qualidade da base de dados que o consubstancia a partir de 2018, ano em que começou a ser notado um expressivo aumento de registros de mortes violentas “com causa indeterminada”. O Atlas da Violência é baseado em dados extraídos do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde.
A bem da verdade, tanto o número como a taxa de homicídios registrados desde 2009 no País têm apresentado uma tendência de queda, com alguns picos pontuais, como em 2014, 2016 e 2017. A variação do número e da taxa de homicídios entre 2009 e 2019 foi de -12,6% e -20,3%, respectivamente. Porém, um país que ainda hoje perde anualmente tantos milhares de cidadãos para a violência, sobretudo os mais jovens, não pode ser considerado um país pacífico sob nenhuma perspectiva racional. Ainda há enormes esforços a serem empreendidos pelo Estado e pela sociedade para que o Brasil atinja não um patamar “aceitável” de homicídios por 100 mil habitantes, mas ao menos se aproxime dos indicadores de violência das nações mais civilizadas.
O Atlas da Violência 2021 também confirmou que o Brasil é um país particularmente perigoso para os negros. Segundo o estudo, a chance de uma pessoa negra morrer assassinada no País é 2,6 vezes maior do que pessoas não negras serem vítimas de homicídio. Em 2019, houve 29,2 assassinatos de negros para cada grupo de 100 mil habitantes. Entre não negros, a taxa foi de 11,2 assassinatos por 100 mil habitantes.
O Atlas também revelou que a vulnerabilidade das mulheres negras permanece praticamente estável, em patamar muito ruim, desde 2009. Entre aquele ano e 2019, o total de mulheres negras vítimas de homicídio cresceu 2%, passando de 2.419 vítimas em 2009 para 2.468 em 2019. Já o número de mulheres não negras assassinadas no mesmo período despencou quase 27%, saindo de 1.636 mulheres assassinadas em 2009 para 1.196 em 2019. Ou seja, no mesmo período de 11 anos, os avanços das políticas públicas visando à proteção das mulheres contra a violência no País se refletiram apenas sobre a população de mulheres não negras, e de forma substancial. Em 2019, dois terços das mulheres assassinadas no Brasil eram negras. “Como explicar a melhoria dos índices de violência entre mulheres não negras e o agravamento, no mesmo período, dos números de violência letal entre mulheres negras?”, questionam os responsáveis pelo Atlas. É uma pergunta sobre a qual a sociedade deve refletir.
De acordo com o Atlas, São Paulo é o Estado mais seguro do País. Há 7,3 homicídios a cada grupo de 100 mil habitantes no Estado, índice muito abaixo do indicador nacional (21,7). São Paulo também tem os menores indicadores de violência contra as mulheres, os negros e os jovens. Em 2019, houve 1,7 assassinato de mulheres por 100 mil habitantes, metade do indicador nacional (3,5). A taxa de homicídio de negros em território paulista foi de 9,1 mortos por cada 100 mil habitantes, enquanto a média nacional ficou em 29,2 homicídios por 100 mil habitantes. Já entre os jovens de 15 a 29 anos, a taxa paulista foi de 12,5 assassinatos por grupo de 100 mil habitantes, em face da média nacional de 45,8 assassinatos por 100 mil habitantes. Os dados refletem ações que o governo do Estado, não de hoje, tem tomado para coibir a violência e que, pelo que indicam os números, têm sido bem implementadas.
Essa talvez seja a principal informação a ser extraída do Atlas, a enorme desigualdade do País. É imperiosa a coordenação nacional de boas políticas de segurança pública. Nesta seara, como em muitas outras, as promessas de Jair Bolsonaro são o que sempre foram: apenas promessas.