O resultado de uma eleição permite convergências, análises divergentes, mas sempre valem a reflexão e algum destaque.
O primeiro turno das eleições de 2020 consagrou o poder da máquina e confirmou que o atual modelo "democrático" brasileiro é excludente e dá ampla vantagem para quem está no poder ou faz parte de poderosos grupos econômicos.
Em quase um terço dos municípios do país os candidatos à reeleição obtiveram êxito. Mais de 1.600 prefeitos entres nossas 5.570 cidades.
Se descontarmos os locais onde o chefe do Executivo já estava cumprindo o segundo mandato e não poderia mais estar na disputa, a taxa de reeleição se aproxima dos 63% (62,9% para ser mais exato). Na eleição municipal anterior, em 2016, esse índice tinha sido de 46,4%.
Além das próprias máquinas municipais, pesou também a interferência dos atuais governadores na disputa.
Em 13 dos 26 estados, o partido dos respectivos governadores foi o que arrematou o maior número de Prefeituras.
E aqui não levamos em consideração aliados de outras legendas eleitos sob a influência dos comandantes dos executivos estaduais.
No Mato Grosso do Sul, o "prestígio" do governador Reinaldo Azambuja resultou numa taxa de sucesso de 46,8%. Seu partido, o PSDB, conquistou 37 dos 79 municípios.
Em Alagoas, o MDB do governador Renan Filho foi bem sucedido em mais de 36% das empreitadas (37 das 102 prefeituras).
Os paraenses, em sua maioria, também "optaram" por seguir a orientação do governador Helder Barbalho (MDB). O partido logrou êxito em 40% das cidades, com 58 prefeitos vencedores em 144 disputas.
No meu estado, o Paraná, 128 prefeituras - de um total de 399 - estarão a partir de janeiro sob o comando do PSD de Ratinho Júnior.
No maior colégio eleitoral do país (São Paulo), o PSDB de João Dória, apenas no primeiro turno, sacramentou a vitória em 169 das 645 cidades do estado.
Com os números de 2020 é possível dizer que metade dos atuais governadores pavimentaram a reeleição em 2022 ou a eleição de algum representante de seu grupo político. Lógico que é bom aguardar o resultado! E considerar, neste ano, o efeito da pandemia!
Em artigo (Eleições: democracia ou gincana burocrática?) publicado em 22 de outubro - quase um mês antes do primeiro turno - já alertava que "quem não tem mandato ou grande disponibilidade de recursos financeiros para investir na campanha têm menor chance de êxito".
A questão é que a pretexto de combater a corrupção, reduzir o custo das campanhas e a influência do poder, acabamos criando um sistema eleitoral que torna a disputa mais desigual, exclui a participação e põe em xeque o próprio sistema democrático, mesmo com as belas e importantes exceções (eleição de trans, mulheres, negros, causas) desta eleição.
Com altos custos envolvidos e regras que engessam o processo, a eleição se tornou uma gincana burocrática.
O resultado deste ano mostra que o atual sistema está, mais do que nunca, beneficiando candidatos à reeleição e os apoiados por governadores.
Desde a criação da Lei Eleitoral (9504/97), praticamente todas as eleições foram precedidas de alguma "reforma" ou alteração das leis. Essas reformas incluíram aspectos técnicos, regulação da propaganda, do financiamento e das contas partidárias.
Mas, apesar da legislação ter restringido as fontes de financiamento, os custos envolvidos na eleição não caíram!
Mesmo com todo esse modelo legislativo e regulamentador ainda é difícil para os órgãos de controle avaliar, coibir e punir o uso da máquina pública nas disputas.
No meio político é comum dizer que "o resultado da próxima eleição passa pelo resultado dessa".
São eleições distintas, em especial para a Presidência! Em 2018 o debate era sobre o PT. Em 2022, será sobre Bolsonaro. Mas claramente aponta o perfil que será majoritário no Congresso mesmo com o bem-vindo e salutar crescimento de candidaturas em defesa dos direitos humanos.
Exceção que confirma a regra!
*Gustavo Fruet (PDT) é deputado federal e ex-prefeito de Curitiba