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Os onze do Supremo


Em um livro 320 páginas ('Os onze. O STF, seus bastidores e suas crises'), que será lançado em julho, os jornalistas Felipe Recondo e Luiz Weber mergulham no enigmático dia a dia da Corte e brindam os leitores com um relato instigante que pega desde o Mensalão e vem até o governo Bolsonaro, culminando no polêmico inquérito das fake news aberto por Dias Toffoli

Por Pepita Ortega, Luiz Vassallo e Fausto Macedo
Reprodução Foto: Estadão

Desde o julgamento da Ação Penal 470, o emblemático processo do Mensalão, o Supremo Tribunal Federal viu-se no centro de uma fogueira de debates. Seus ministros tornaram-se amplamente conhecidos e, também por isso, passaram a usar a opinião pública como fundamento para seus votos. Nos turbulentos anos de uma das maiores crises políticas e econômicas que o país já viveu, o protagonismo a que foi alçado o tribunal criou um conjunto novo de desafios.

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Ao longo de 320 páginas, 'Os onze. O STF, seus bastidores e suas crises', os jornalistas Felipe Recondo e Luiz Weber mergulham no dia a dia enigmático da Corte e brindam os leitores com um relato instigante que pega desde o Mensalão e vem até o governo Bolsonaro, culminando no polêmico inquérito das fake news aberto por Dias Toffoli.

A obra será lançada em 31 de julho pela Companhia das Letras.

Onze é o número de ministros do Supremo, que atuam como 'onze ilhas', expressão cunhada pelo ex-ministro Sepúlveda Pertence e que se consolidou como chave de interpretação para o funcionamento da Corte, com a proliferação de decisões monocráticas e a sucessão de embates internos.

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Num momento em que o STF se vê sob ataque de expoentes do governo federal e de militantes nas redes sociais, entender as dinâmicas da última instância do Poder Judiciário é mais importante do que nunca.

Os onze é um estudo diligente tocado a quatro mãos. Seus autores são dois jornalistas tarimbados, perspicazes. Seus currículos têm um traço em comum - eles se destacam, desde sempre, pela cobertura fiel e detalhada dos fatos.

Recondo, especialista na cobertura do STF, acompanha e analisa o cotidiano da Corte máxima há mais de uma década. Conhece como poucos os meandros do tribunal.

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Weber estuda o funcionamento do Supremo e analisa os movimentos e forças políticas que interagem com o sodalício.

Durante anos, os dois realizaram centenas de entrevistas para escrever 'Os onze. O STF, seus bastidores e suas crises' traz histórias que permitem descrever os contornos, causas e consequências dos grandes casos que envolveram o tribunal, incluindo o recente e polêmico inquérito sobre fake news aberto por Dias Toffoli e comandado por Alexandre de Moraes.

LEIA TRECHOS DE 'OS ONZE'

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  • "Bolsonaro assumiu a presidência com uma pauta conservadora, moralizadora, de combate à corrupção, de apoio à Operação Lava Jato. O Supremo, que alguns setores consideravam um entrave ao avanço dessa agenda, passou a ser hostilizado por deputados e senadores, ameaçado por pedidos de CPI e de impeachment pela grita informe das redes sociais."
  • "Já em fevereiro de 2019, vaza a informação de que o ministro Gilmar Mendes e sua mulher Guiomar Feitoza haviam sido incluídos numa lista de mais cem pessoas politicamente expostas que seriam alvo de uma 'análise de interesse fiscal'."
  • "A apuração começou pela faculdade de Mendes -- o Instituto Brasiliense de Direito Público. Ao notar que a investigação tinha objetivos pouco claros, o ministro pediu que seus contadores reavaliassem a sua declaração pessoal de imposto de renda e as contas do IDP. Mendes se viu impelido a apresentar uma retificação de sua declaração. E o IDP teve de fazer o mesmo -- conforme seus sócios, a correção dos tributos resultou num pagamento de cerca de 1 milhão de reais."
  • "Mas a apuração não buscava eventuais erros nas declarações de imposto de renda e se mostrou viciada -- inclusive pelo vazamento de informações sigilosas. O que se buscava era levantar eventuais indícios da prática de outros crimes, como corrupção ou tráfico de influência, avançando sobre funções investigatórias do Ministério Público. Na lista de pessoas a serem investigadas, além de Mendes e Feitoza, constavam outras personalidades, como Roberta Rangel, mulher de Dias Toffoli."
  • "O Supremo reagiu. Toffoli pediu à Procuradoria-Geral da República, à Receita e ao ministro da Economia que investigassem as irregularidades nas apurações."
  • "O Supremo parecia de fato disposto a batalhar. Noutra frente, marcou posição quanto às manifestações de integrantes do governo e de sua base de sustentação parlamentar que indicavam retrocessos na proteção de direitos de minorias."
  • "Celso de Mello era relator de um dos processos que questionavam a demora do Congresso em aprovar uma lei criminalizando a homofobia. E insistiu com Toffoli para que o tema fosse colocado em pauta. No julgamento iniciado em 20 de fevereiro de 2019, Mello liderou o STF e garantiu apoio para a criminalização, por via judicial, da homofobia."
  • "O processo foi interrompido por decisão do presidente do tribunal, sem data para retomada, mas outra cizânia estava criada. O Congresso estava decidido a confrontar o STF -- alguns deputados, sobretudo os novatos, pediam o impeachment dos quatro ministros que já haviam votado favoravelmente."
  • "Em março, outro julgamento acendeu os ânimos. Estava em discussão o destino de processos criminais contra políticos investigados por corrupção e lavagem de dinheiro e, ao mesmo tempo, por crimes eleitorais. Os autos deveriam tramitar na Justiça Federal ou na Justiça Eleitoral?"
  • "Procuradores que integram a força-tarefa da Operação Lava Jato foram à imprensa e às redes sociais em defesa da competência da Justiça Federal para processar tais casos, pois a Eleitoral não teria estrutura nem experiência para investigar crimes de grande complexidade. Aqui e ali ventilou-se o fim da Lava Jato na hipótese de o Supremo determinar a remessa dos autos para a Justiça Eleitoral."
  • "No dia do julgamento, um dos procuradores, Diogo Castor, denunciou que o STF estaria ensaiando um golpe contra a operação. Nas redes sociais, os ataques ao Supremo se avolumavam. Na imprensa, lia-se que a máquina de mídias sociais bolsonaristas havia escolhido o STF como seu alvo preferencial naquele momento."
  • "Às quartas-feiras, antes de iniciada a sessão plenária, Toffoli promove em seu gabinete um almoço com os ministros. É um estratagema simpático para agregar os colegas, amainar os atritos, ampliar a colegialidade, conversar mais abertamente sobre os problemas da Corte e, mais importante, ouvir a fala livre (e, se possível, espontânea...) dos ministros."
  • "O ex-ministro Nelson Jobim lhe havia passado uma dica preciosa: 'Escute-os, deixe-os falar'. Naquele dia, Celso, Marco Aurélio, Cármen Lúcia e Barroso não compareceram. Aos comensais presentes, Fux externou sua indignação com os petardos contra o STF: 'Um absurdo', disse."
  • "A autoridade do STF precisava ser resguardada das investidas que vinha sofrendo. O presidente do tribunal revelou ter encaminhado ofícios à Polícia Federal pedindo que os ataques fossem investigados, mas nenhuma providência fora tomada."
  • "Os ministros ainda reclamaram dos procuradores da Lava Jato que insinuavam um golpe do Supremo contra as investigações. Fux afirmou -- e Fachin confirmou durante o almoço -- que Celso de Mello, então ausente, se revoltara com os termos usados. Para o decano, as críticas haviam exorbitado a liberdade de expressão."
  • "Toffoli pensaria em alguma saída. No dia seguinte, telefonou para Mello e expôs sua ideia, que foi bem recebida pelo interlocutor. Depois ligou para Alexandre de Moraes e disse que o queria no comando da investigação. 'Eu quero designar você, que entende disso', ele disse."
  • "Moraes, que havia sido secretário de Segurança do Estado de São Paulo, usara sua máquina e seu plantel de contatos para solucionar outro caso importante: as ameaças feitas à primeira-dama Marcela Temer. O argumento final de Toffoli não podia ser refutado: 'Duvido que alguém [mais] queira relatar'. Moraes aceitou a tarefa."
  • "No dia 14 de março, minutos antes da sessão plenária do STF, Toffoli conversou com todos os ministros, individualmente, e explicou sua decisão. Não os consultou; apenas lhes comunicou sua resolução. Ninguém objetou."
  • "Enquanto o presidente anunciava sua estratégia em reservado, sua assessoria disparava uma mensagem para os jornalistas: 'Um alerta: o presidente fará um anúncio logo no início da sessão de hoje que promete repercutir MUITO'."
  • "Iniciada a sessão, Toffoli emposta a voz e noticia a abertura de um inquérito 'contra tudo e quase todos', como definiu um de seus assessores de confiança. 'O presidente do Supremo Tribunal Federal, no uso de atribuições que lhe conferem o regimento interno, considerando que velar pela intangibilidade das prerrogativas do Supremo Tribunal Federal e dos seus membros é atribuição regimental do presidente da corte, considerando a existência de notícias fraudulentas, conhecidas como fake news, denunciações caluniosas, ameaças e infrações revestidas de animus caluniandi, diffamandi e injuriandi, que atingem a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de seus membros e familiares, resolve, como resolvido já está, nos termos do artigo 43 [do Regimento Interno do STF], instaurar inquérito criminal para apuração de fatos e infrações correspondentes em toda sua dimensão', anunciou."
  • "Alexandre de Moraes foi designado o relator. As críticas ao Supremo não tardaram. A entidade abre um inquérito a ser julgado por ela mesma? Tal procedimento seria compatível com a Constituição? Não bastasse, a investigação seria tocada por um ministro do Supremo, sem a participação do Ministério Público. Como assim?"
  • "O tribunal ignorava as objeções da imprensa. Toffoli dava mais atenção às críticas daqueles que o circundavam e, sempre que tinha oportunidade, defendia sua decisão. 'Tem que dar porrada. Nós só estamos apanhando', justificou a um amigo na festa de aniversário do ministro Barroso. E acrescentou, irônico: 'E o delegado que eu arranjei?', numa referência ao 'delegado Alexandre de Moraes'."
  • "No inquérito aberto por Toffoli, o sistema de distribuição seguiu um procedimento incomum. Normalmente, os relatores são definidos por sorteio. Quando um ministro está impedido de participar do julgamento daquela causa -- por ser parente de uma das partes, por exemplo --, seu nome é excluído com um clique. E essa informação fica disponível no andamento do processo."
  • "Quando um juiz está prevento, ou seja, quando já está relatando um processo semelhante, os nomes dos demais ministros são ticados no sistema e a ação é encaminhada para o prevento. Mesmo que o tema tramite em segredo de justiça, esta informação fica disponível na página do Supremo."
  • "No caso do inquérito aberto por Toffoli, o relator foi designado a priori, uma solução prevista no regimento -- mas nunca antes utilizada. A assessoria técnica do tribunal excluiu os outros ministros, deixando apenas o nome de Alexandre de Moraes habilitado para receber a ação. Mas a informação sobre a designação do relator não aparece no site."
  • "Com o auxílio de um delegado da Polícia Federal e outro da Polícia Civil de São Paulo, a investigação avançou sobre pessoas físicas, perfis de redes sociais e imprensa, o que provocou fortes reações dentro e fora do tribunal. 'Qualquer tipo de censura, mesmo aquela ordenada pelo Poder Judiciário, mostra-se prática ilegítima, autocrática e essencialmente incompatível com o regime das liberdades fundamentais consagrado pela Constituição da República!', ponderou Celso de Mello em nota à imprensa, contestando a decisão de Alexandre de Moraes de determinar a retirada do ar de matéria da revista eletrônica Crusoé, que trazia trechos de delação premiada que se referiam a Toffoli."
  • "O inquérito era uma tentativa de recompor a redoma que tradicionalmente protegia o STF e que foi fragilizada pelas novas gerações de ministros -- fosse com brigas internas e estratégias artificiais para favorecer suas agendas próprias, fosse contorcendo argumentos, virando casaca e desprezando a jurisprudência do tribunal, fosse usando a imprensa para atacar os adversários. Mas acabou por fragilizar ainda mais a imagem da instituição."

Reprodução Foto: Estadão

Desde o julgamento da Ação Penal 470, o emblemático processo do Mensalão, o Supremo Tribunal Federal viu-se no centro de uma fogueira de debates. Seus ministros tornaram-se amplamente conhecidos e, também por isso, passaram a usar a opinião pública como fundamento para seus votos. Nos turbulentos anos de uma das maiores crises políticas e econômicas que o país já viveu, o protagonismo a que foi alçado o tribunal criou um conjunto novo de desafios.

Ao longo de 320 páginas, 'Os onze. O STF, seus bastidores e suas crises', os jornalistas Felipe Recondo e Luiz Weber mergulham no dia a dia enigmático da Corte e brindam os leitores com um relato instigante que pega desde o Mensalão e vem até o governo Bolsonaro, culminando no polêmico inquérito das fake news aberto por Dias Toffoli.

A obra será lançada em 31 de julho pela Companhia das Letras.

Onze é o número de ministros do Supremo, que atuam como 'onze ilhas', expressão cunhada pelo ex-ministro Sepúlveda Pertence e que se consolidou como chave de interpretação para o funcionamento da Corte, com a proliferação de decisões monocráticas e a sucessão de embates internos.

Num momento em que o STF se vê sob ataque de expoentes do governo federal e de militantes nas redes sociais, entender as dinâmicas da última instância do Poder Judiciário é mais importante do que nunca.

Os onze é um estudo diligente tocado a quatro mãos. Seus autores são dois jornalistas tarimbados, perspicazes. Seus currículos têm um traço em comum - eles se destacam, desde sempre, pela cobertura fiel e detalhada dos fatos.

Recondo, especialista na cobertura do STF, acompanha e analisa o cotidiano da Corte máxima há mais de uma década. Conhece como poucos os meandros do tribunal.

Weber estuda o funcionamento do Supremo e analisa os movimentos e forças políticas que interagem com o sodalício.

Durante anos, os dois realizaram centenas de entrevistas para escrever 'Os onze. O STF, seus bastidores e suas crises' traz histórias que permitem descrever os contornos, causas e consequências dos grandes casos que envolveram o tribunal, incluindo o recente e polêmico inquérito sobre fake news aberto por Dias Toffoli e comandado por Alexandre de Moraes.

LEIA TRECHOS DE 'OS ONZE'

  • "Bolsonaro assumiu a presidência com uma pauta conservadora, moralizadora, de combate à corrupção, de apoio à Operação Lava Jato. O Supremo, que alguns setores consideravam um entrave ao avanço dessa agenda, passou a ser hostilizado por deputados e senadores, ameaçado por pedidos de CPI e de impeachment pela grita informe das redes sociais."
  • "Já em fevereiro de 2019, vaza a informação de que o ministro Gilmar Mendes e sua mulher Guiomar Feitoza haviam sido incluídos numa lista de mais cem pessoas politicamente expostas que seriam alvo de uma 'análise de interesse fiscal'."
  • "A apuração começou pela faculdade de Mendes -- o Instituto Brasiliense de Direito Público. Ao notar que a investigação tinha objetivos pouco claros, o ministro pediu que seus contadores reavaliassem a sua declaração pessoal de imposto de renda e as contas do IDP. Mendes se viu impelido a apresentar uma retificação de sua declaração. E o IDP teve de fazer o mesmo -- conforme seus sócios, a correção dos tributos resultou num pagamento de cerca de 1 milhão de reais."
  • "Mas a apuração não buscava eventuais erros nas declarações de imposto de renda e se mostrou viciada -- inclusive pelo vazamento de informações sigilosas. O que se buscava era levantar eventuais indícios da prática de outros crimes, como corrupção ou tráfico de influência, avançando sobre funções investigatórias do Ministério Público. Na lista de pessoas a serem investigadas, além de Mendes e Feitoza, constavam outras personalidades, como Roberta Rangel, mulher de Dias Toffoli."
  • "O Supremo reagiu. Toffoli pediu à Procuradoria-Geral da República, à Receita e ao ministro da Economia que investigassem as irregularidades nas apurações."
  • "O Supremo parecia de fato disposto a batalhar. Noutra frente, marcou posição quanto às manifestações de integrantes do governo e de sua base de sustentação parlamentar que indicavam retrocessos na proteção de direitos de minorias."
  • "Celso de Mello era relator de um dos processos que questionavam a demora do Congresso em aprovar uma lei criminalizando a homofobia. E insistiu com Toffoli para que o tema fosse colocado em pauta. No julgamento iniciado em 20 de fevereiro de 2019, Mello liderou o STF e garantiu apoio para a criminalização, por via judicial, da homofobia."
  • "O processo foi interrompido por decisão do presidente do tribunal, sem data para retomada, mas outra cizânia estava criada. O Congresso estava decidido a confrontar o STF -- alguns deputados, sobretudo os novatos, pediam o impeachment dos quatro ministros que já haviam votado favoravelmente."
  • "Em março, outro julgamento acendeu os ânimos. Estava em discussão o destino de processos criminais contra políticos investigados por corrupção e lavagem de dinheiro e, ao mesmo tempo, por crimes eleitorais. Os autos deveriam tramitar na Justiça Federal ou na Justiça Eleitoral?"
  • "Procuradores que integram a força-tarefa da Operação Lava Jato foram à imprensa e às redes sociais em defesa da competência da Justiça Federal para processar tais casos, pois a Eleitoral não teria estrutura nem experiência para investigar crimes de grande complexidade. Aqui e ali ventilou-se o fim da Lava Jato na hipótese de o Supremo determinar a remessa dos autos para a Justiça Eleitoral."
  • "No dia do julgamento, um dos procuradores, Diogo Castor, denunciou que o STF estaria ensaiando um golpe contra a operação. Nas redes sociais, os ataques ao Supremo se avolumavam. Na imprensa, lia-se que a máquina de mídias sociais bolsonaristas havia escolhido o STF como seu alvo preferencial naquele momento."
  • "Às quartas-feiras, antes de iniciada a sessão plenária, Toffoli promove em seu gabinete um almoço com os ministros. É um estratagema simpático para agregar os colegas, amainar os atritos, ampliar a colegialidade, conversar mais abertamente sobre os problemas da Corte e, mais importante, ouvir a fala livre (e, se possível, espontânea...) dos ministros."
  • "O ex-ministro Nelson Jobim lhe havia passado uma dica preciosa: 'Escute-os, deixe-os falar'. Naquele dia, Celso, Marco Aurélio, Cármen Lúcia e Barroso não compareceram. Aos comensais presentes, Fux externou sua indignação com os petardos contra o STF: 'Um absurdo', disse."
  • "A autoridade do STF precisava ser resguardada das investidas que vinha sofrendo. O presidente do tribunal revelou ter encaminhado ofícios à Polícia Federal pedindo que os ataques fossem investigados, mas nenhuma providência fora tomada."
  • "Os ministros ainda reclamaram dos procuradores da Lava Jato que insinuavam um golpe do Supremo contra as investigações. Fux afirmou -- e Fachin confirmou durante o almoço -- que Celso de Mello, então ausente, se revoltara com os termos usados. Para o decano, as críticas haviam exorbitado a liberdade de expressão."
  • "Toffoli pensaria em alguma saída. No dia seguinte, telefonou para Mello e expôs sua ideia, que foi bem recebida pelo interlocutor. Depois ligou para Alexandre de Moraes e disse que o queria no comando da investigação. 'Eu quero designar você, que entende disso', ele disse."
  • "Moraes, que havia sido secretário de Segurança do Estado de São Paulo, usara sua máquina e seu plantel de contatos para solucionar outro caso importante: as ameaças feitas à primeira-dama Marcela Temer. O argumento final de Toffoli não podia ser refutado: 'Duvido que alguém [mais] queira relatar'. Moraes aceitou a tarefa."
  • "No dia 14 de março, minutos antes da sessão plenária do STF, Toffoli conversou com todos os ministros, individualmente, e explicou sua decisão. Não os consultou; apenas lhes comunicou sua resolução. Ninguém objetou."
  • "Enquanto o presidente anunciava sua estratégia em reservado, sua assessoria disparava uma mensagem para os jornalistas: 'Um alerta: o presidente fará um anúncio logo no início da sessão de hoje que promete repercutir MUITO'."
  • "Iniciada a sessão, Toffoli emposta a voz e noticia a abertura de um inquérito 'contra tudo e quase todos', como definiu um de seus assessores de confiança. 'O presidente do Supremo Tribunal Federal, no uso de atribuições que lhe conferem o regimento interno, considerando que velar pela intangibilidade das prerrogativas do Supremo Tribunal Federal e dos seus membros é atribuição regimental do presidente da corte, considerando a existência de notícias fraudulentas, conhecidas como fake news, denunciações caluniosas, ameaças e infrações revestidas de animus caluniandi, diffamandi e injuriandi, que atingem a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de seus membros e familiares, resolve, como resolvido já está, nos termos do artigo 43 [do Regimento Interno do STF], instaurar inquérito criminal para apuração de fatos e infrações correspondentes em toda sua dimensão', anunciou."
  • "Alexandre de Moraes foi designado o relator. As críticas ao Supremo não tardaram. A entidade abre um inquérito a ser julgado por ela mesma? Tal procedimento seria compatível com a Constituição? Não bastasse, a investigação seria tocada por um ministro do Supremo, sem a participação do Ministério Público. Como assim?"
  • "O tribunal ignorava as objeções da imprensa. Toffoli dava mais atenção às críticas daqueles que o circundavam e, sempre que tinha oportunidade, defendia sua decisão. 'Tem que dar porrada. Nós só estamos apanhando', justificou a um amigo na festa de aniversário do ministro Barroso. E acrescentou, irônico: 'E o delegado que eu arranjei?', numa referência ao 'delegado Alexandre de Moraes'."
  • "No inquérito aberto por Toffoli, o sistema de distribuição seguiu um procedimento incomum. Normalmente, os relatores são definidos por sorteio. Quando um ministro está impedido de participar do julgamento daquela causa -- por ser parente de uma das partes, por exemplo --, seu nome é excluído com um clique. E essa informação fica disponível no andamento do processo."
  • "Quando um juiz está prevento, ou seja, quando já está relatando um processo semelhante, os nomes dos demais ministros são ticados no sistema e a ação é encaminhada para o prevento. Mesmo que o tema tramite em segredo de justiça, esta informação fica disponível na página do Supremo."
  • "No caso do inquérito aberto por Toffoli, o relator foi designado a priori, uma solução prevista no regimento -- mas nunca antes utilizada. A assessoria técnica do tribunal excluiu os outros ministros, deixando apenas o nome de Alexandre de Moraes habilitado para receber a ação. Mas a informação sobre a designação do relator não aparece no site."
  • "Com o auxílio de um delegado da Polícia Federal e outro da Polícia Civil de São Paulo, a investigação avançou sobre pessoas físicas, perfis de redes sociais e imprensa, o que provocou fortes reações dentro e fora do tribunal. 'Qualquer tipo de censura, mesmo aquela ordenada pelo Poder Judiciário, mostra-se prática ilegítima, autocrática e essencialmente incompatível com o regime das liberdades fundamentais consagrado pela Constituição da República!', ponderou Celso de Mello em nota à imprensa, contestando a decisão de Alexandre de Moraes de determinar a retirada do ar de matéria da revista eletrônica Crusoé, que trazia trechos de delação premiada que se referiam a Toffoli."
  • "O inquérito era uma tentativa de recompor a redoma que tradicionalmente protegia o STF e que foi fragilizada pelas novas gerações de ministros -- fosse com brigas internas e estratégias artificiais para favorecer suas agendas próprias, fosse contorcendo argumentos, virando casaca e desprezando a jurisprudência do tribunal, fosse usando a imprensa para atacar os adversários. Mas acabou por fragilizar ainda mais a imagem da instituição."

Reprodução Foto: Estadão

Desde o julgamento da Ação Penal 470, o emblemático processo do Mensalão, o Supremo Tribunal Federal viu-se no centro de uma fogueira de debates. Seus ministros tornaram-se amplamente conhecidos e, também por isso, passaram a usar a opinião pública como fundamento para seus votos. Nos turbulentos anos de uma das maiores crises políticas e econômicas que o país já viveu, o protagonismo a que foi alçado o tribunal criou um conjunto novo de desafios.

Ao longo de 320 páginas, 'Os onze. O STF, seus bastidores e suas crises', os jornalistas Felipe Recondo e Luiz Weber mergulham no dia a dia enigmático da Corte e brindam os leitores com um relato instigante que pega desde o Mensalão e vem até o governo Bolsonaro, culminando no polêmico inquérito das fake news aberto por Dias Toffoli.

A obra será lançada em 31 de julho pela Companhia das Letras.

Onze é o número de ministros do Supremo, que atuam como 'onze ilhas', expressão cunhada pelo ex-ministro Sepúlveda Pertence e que se consolidou como chave de interpretação para o funcionamento da Corte, com a proliferação de decisões monocráticas e a sucessão de embates internos.

Num momento em que o STF se vê sob ataque de expoentes do governo federal e de militantes nas redes sociais, entender as dinâmicas da última instância do Poder Judiciário é mais importante do que nunca.

Os onze é um estudo diligente tocado a quatro mãos. Seus autores são dois jornalistas tarimbados, perspicazes. Seus currículos têm um traço em comum - eles se destacam, desde sempre, pela cobertura fiel e detalhada dos fatos.

Recondo, especialista na cobertura do STF, acompanha e analisa o cotidiano da Corte máxima há mais de uma década. Conhece como poucos os meandros do tribunal.

Weber estuda o funcionamento do Supremo e analisa os movimentos e forças políticas que interagem com o sodalício.

Durante anos, os dois realizaram centenas de entrevistas para escrever 'Os onze. O STF, seus bastidores e suas crises' traz histórias que permitem descrever os contornos, causas e consequências dos grandes casos que envolveram o tribunal, incluindo o recente e polêmico inquérito sobre fake news aberto por Dias Toffoli e comandado por Alexandre de Moraes.

LEIA TRECHOS DE 'OS ONZE'

  • "Bolsonaro assumiu a presidência com uma pauta conservadora, moralizadora, de combate à corrupção, de apoio à Operação Lava Jato. O Supremo, que alguns setores consideravam um entrave ao avanço dessa agenda, passou a ser hostilizado por deputados e senadores, ameaçado por pedidos de CPI e de impeachment pela grita informe das redes sociais."
  • "Já em fevereiro de 2019, vaza a informação de que o ministro Gilmar Mendes e sua mulher Guiomar Feitoza haviam sido incluídos numa lista de mais cem pessoas politicamente expostas que seriam alvo de uma 'análise de interesse fiscal'."
  • "A apuração começou pela faculdade de Mendes -- o Instituto Brasiliense de Direito Público. Ao notar que a investigação tinha objetivos pouco claros, o ministro pediu que seus contadores reavaliassem a sua declaração pessoal de imposto de renda e as contas do IDP. Mendes se viu impelido a apresentar uma retificação de sua declaração. E o IDP teve de fazer o mesmo -- conforme seus sócios, a correção dos tributos resultou num pagamento de cerca de 1 milhão de reais."
  • "Mas a apuração não buscava eventuais erros nas declarações de imposto de renda e se mostrou viciada -- inclusive pelo vazamento de informações sigilosas. O que se buscava era levantar eventuais indícios da prática de outros crimes, como corrupção ou tráfico de influência, avançando sobre funções investigatórias do Ministério Público. Na lista de pessoas a serem investigadas, além de Mendes e Feitoza, constavam outras personalidades, como Roberta Rangel, mulher de Dias Toffoli."
  • "O Supremo reagiu. Toffoli pediu à Procuradoria-Geral da República, à Receita e ao ministro da Economia que investigassem as irregularidades nas apurações."
  • "O Supremo parecia de fato disposto a batalhar. Noutra frente, marcou posição quanto às manifestações de integrantes do governo e de sua base de sustentação parlamentar que indicavam retrocessos na proteção de direitos de minorias."
  • "Celso de Mello era relator de um dos processos que questionavam a demora do Congresso em aprovar uma lei criminalizando a homofobia. E insistiu com Toffoli para que o tema fosse colocado em pauta. No julgamento iniciado em 20 de fevereiro de 2019, Mello liderou o STF e garantiu apoio para a criminalização, por via judicial, da homofobia."
  • "O processo foi interrompido por decisão do presidente do tribunal, sem data para retomada, mas outra cizânia estava criada. O Congresso estava decidido a confrontar o STF -- alguns deputados, sobretudo os novatos, pediam o impeachment dos quatro ministros que já haviam votado favoravelmente."
  • "Em março, outro julgamento acendeu os ânimos. Estava em discussão o destino de processos criminais contra políticos investigados por corrupção e lavagem de dinheiro e, ao mesmo tempo, por crimes eleitorais. Os autos deveriam tramitar na Justiça Federal ou na Justiça Eleitoral?"
  • "Procuradores que integram a força-tarefa da Operação Lava Jato foram à imprensa e às redes sociais em defesa da competência da Justiça Federal para processar tais casos, pois a Eleitoral não teria estrutura nem experiência para investigar crimes de grande complexidade. Aqui e ali ventilou-se o fim da Lava Jato na hipótese de o Supremo determinar a remessa dos autos para a Justiça Eleitoral."
  • "No dia do julgamento, um dos procuradores, Diogo Castor, denunciou que o STF estaria ensaiando um golpe contra a operação. Nas redes sociais, os ataques ao Supremo se avolumavam. Na imprensa, lia-se que a máquina de mídias sociais bolsonaristas havia escolhido o STF como seu alvo preferencial naquele momento."
  • "Às quartas-feiras, antes de iniciada a sessão plenária, Toffoli promove em seu gabinete um almoço com os ministros. É um estratagema simpático para agregar os colegas, amainar os atritos, ampliar a colegialidade, conversar mais abertamente sobre os problemas da Corte e, mais importante, ouvir a fala livre (e, se possível, espontânea...) dos ministros."
  • "O ex-ministro Nelson Jobim lhe havia passado uma dica preciosa: 'Escute-os, deixe-os falar'. Naquele dia, Celso, Marco Aurélio, Cármen Lúcia e Barroso não compareceram. Aos comensais presentes, Fux externou sua indignação com os petardos contra o STF: 'Um absurdo', disse."
  • "A autoridade do STF precisava ser resguardada das investidas que vinha sofrendo. O presidente do tribunal revelou ter encaminhado ofícios à Polícia Federal pedindo que os ataques fossem investigados, mas nenhuma providência fora tomada."
  • "Os ministros ainda reclamaram dos procuradores da Lava Jato que insinuavam um golpe do Supremo contra as investigações. Fux afirmou -- e Fachin confirmou durante o almoço -- que Celso de Mello, então ausente, se revoltara com os termos usados. Para o decano, as críticas haviam exorbitado a liberdade de expressão."
  • "Toffoli pensaria em alguma saída. No dia seguinte, telefonou para Mello e expôs sua ideia, que foi bem recebida pelo interlocutor. Depois ligou para Alexandre de Moraes e disse que o queria no comando da investigação. 'Eu quero designar você, que entende disso', ele disse."
  • "Moraes, que havia sido secretário de Segurança do Estado de São Paulo, usara sua máquina e seu plantel de contatos para solucionar outro caso importante: as ameaças feitas à primeira-dama Marcela Temer. O argumento final de Toffoli não podia ser refutado: 'Duvido que alguém [mais] queira relatar'. Moraes aceitou a tarefa."
  • "No dia 14 de março, minutos antes da sessão plenária do STF, Toffoli conversou com todos os ministros, individualmente, e explicou sua decisão. Não os consultou; apenas lhes comunicou sua resolução. Ninguém objetou."
  • "Enquanto o presidente anunciava sua estratégia em reservado, sua assessoria disparava uma mensagem para os jornalistas: 'Um alerta: o presidente fará um anúncio logo no início da sessão de hoje que promete repercutir MUITO'."
  • "Iniciada a sessão, Toffoli emposta a voz e noticia a abertura de um inquérito 'contra tudo e quase todos', como definiu um de seus assessores de confiança. 'O presidente do Supremo Tribunal Federal, no uso de atribuições que lhe conferem o regimento interno, considerando que velar pela intangibilidade das prerrogativas do Supremo Tribunal Federal e dos seus membros é atribuição regimental do presidente da corte, considerando a existência de notícias fraudulentas, conhecidas como fake news, denunciações caluniosas, ameaças e infrações revestidas de animus caluniandi, diffamandi e injuriandi, que atingem a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de seus membros e familiares, resolve, como resolvido já está, nos termos do artigo 43 [do Regimento Interno do STF], instaurar inquérito criminal para apuração de fatos e infrações correspondentes em toda sua dimensão', anunciou."
  • "Alexandre de Moraes foi designado o relator. As críticas ao Supremo não tardaram. A entidade abre um inquérito a ser julgado por ela mesma? Tal procedimento seria compatível com a Constituição? Não bastasse, a investigação seria tocada por um ministro do Supremo, sem a participação do Ministério Público. Como assim?"
  • "O tribunal ignorava as objeções da imprensa. Toffoli dava mais atenção às críticas daqueles que o circundavam e, sempre que tinha oportunidade, defendia sua decisão. 'Tem que dar porrada. Nós só estamos apanhando', justificou a um amigo na festa de aniversário do ministro Barroso. E acrescentou, irônico: 'E o delegado que eu arranjei?', numa referência ao 'delegado Alexandre de Moraes'."
  • "No inquérito aberto por Toffoli, o sistema de distribuição seguiu um procedimento incomum. Normalmente, os relatores são definidos por sorteio. Quando um ministro está impedido de participar do julgamento daquela causa -- por ser parente de uma das partes, por exemplo --, seu nome é excluído com um clique. E essa informação fica disponível no andamento do processo."
  • "Quando um juiz está prevento, ou seja, quando já está relatando um processo semelhante, os nomes dos demais ministros são ticados no sistema e a ação é encaminhada para o prevento. Mesmo que o tema tramite em segredo de justiça, esta informação fica disponível na página do Supremo."
  • "No caso do inquérito aberto por Toffoli, o relator foi designado a priori, uma solução prevista no regimento -- mas nunca antes utilizada. A assessoria técnica do tribunal excluiu os outros ministros, deixando apenas o nome de Alexandre de Moraes habilitado para receber a ação. Mas a informação sobre a designação do relator não aparece no site."
  • "Com o auxílio de um delegado da Polícia Federal e outro da Polícia Civil de São Paulo, a investigação avançou sobre pessoas físicas, perfis de redes sociais e imprensa, o que provocou fortes reações dentro e fora do tribunal. 'Qualquer tipo de censura, mesmo aquela ordenada pelo Poder Judiciário, mostra-se prática ilegítima, autocrática e essencialmente incompatível com o regime das liberdades fundamentais consagrado pela Constituição da República!', ponderou Celso de Mello em nota à imprensa, contestando a decisão de Alexandre de Moraes de determinar a retirada do ar de matéria da revista eletrônica Crusoé, que trazia trechos de delação premiada que se referiam a Toffoli."
  • "O inquérito era uma tentativa de recompor a redoma que tradicionalmente protegia o STF e que foi fragilizada pelas novas gerações de ministros -- fosse com brigas internas e estratégias artificiais para favorecer suas agendas próprias, fosse contorcendo argumentos, virando casaca e desprezando a jurisprudência do tribunal, fosse usando a imprensa para atacar os adversários. Mas acabou por fragilizar ainda mais a imagem da instituição."

Reprodução Foto: Estadão

Desde o julgamento da Ação Penal 470, o emblemático processo do Mensalão, o Supremo Tribunal Federal viu-se no centro de uma fogueira de debates. Seus ministros tornaram-se amplamente conhecidos e, também por isso, passaram a usar a opinião pública como fundamento para seus votos. Nos turbulentos anos de uma das maiores crises políticas e econômicas que o país já viveu, o protagonismo a que foi alçado o tribunal criou um conjunto novo de desafios.

Ao longo de 320 páginas, 'Os onze. O STF, seus bastidores e suas crises', os jornalistas Felipe Recondo e Luiz Weber mergulham no dia a dia enigmático da Corte e brindam os leitores com um relato instigante que pega desde o Mensalão e vem até o governo Bolsonaro, culminando no polêmico inquérito das fake news aberto por Dias Toffoli.

A obra será lançada em 31 de julho pela Companhia das Letras.

Onze é o número de ministros do Supremo, que atuam como 'onze ilhas', expressão cunhada pelo ex-ministro Sepúlveda Pertence e que se consolidou como chave de interpretação para o funcionamento da Corte, com a proliferação de decisões monocráticas e a sucessão de embates internos.

Num momento em que o STF se vê sob ataque de expoentes do governo federal e de militantes nas redes sociais, entender as dinâmicas da última instância do Poder Judiciário é mais importante do que nunca.

Os onze é um estudo diligente tocado a quatro mãos. Seus autores são dois jornalistas tarimbados, perspicazes. Seus currículos têm um traço em comum - eles se destacam, desde sempre, pela cobertura fiel e detalhada dos fatos.

Recondo, especialista na cobertura do STF, acompanha e analisa o cotidiano da Corte máxima há mais de uma década. Conhece como poucos os meandros do tribunal.

Weber estuda o funcionamento do Supremo e analisa os movimentos e forças políticas que interagem com o sodalício.

Durante anos, os dois realizaram centenas de entrevistas para escrever 'Os onze. O STF, seus bastidores e suas crises' traz histórias que permitem descrever os contornos, causas e consequências dos grandes casos que envolveram o tribunal, incluindo o recente e polêmico inquérito sobre fake news aberto por Dias Toffoli e comandado por Alexandre de Moraes.

LEIA TRECHOS DE 'OS ONZE'

  • "Bolsonaro assumiu a presidência com uma pauta conservadora, moralizadora, de combate à corrupção, de apoio à Operação Lava Jato. O Supremo, que alguns setores consideravam um entrave ao avanço dessa agenda, passou a ser hostilizado por deputados e senadores, ameaçado por pedidos de CPI e de impeachment pela grita informe das redes sociais."
  • "Já em fevereiro de 2019, vaza a informação de que o ministro Gilmar Mendes e sua mulher Guiomar Feitoza haviam sido incluídos numa lista de mais cem pessoas politicamente expostas que seriam alvo de uma 'análise de interesse fiscal'."
  • "A apuração começou pela faculdade de Mendes -- o Instituto Brasiliense de Direito Público. Ao notar que a investigação tinha objetivos pouco claros, o ministro pediu que seus contadores reavaliassem a sua declaração pessoal de imposto de renda e as contas do IDP. Mendes se viu impelido a apresentar uma retificação de sua declaração. E o IDP teve de fazer o mesmo -- conforme seus sócios, a correção dos tributos resultou num pagamento de cerca de 1 milhão de reais."
  • "Mas a apuração não buscava eventuais erros nas declarações de imposto de renda e se mostrou viciada -- inclusive pelo vazamento de informações sigilosas. O que se buscava era levantar eventuais indícios da prática de outros crimes, como corrupção ou tráfico de influência, avançando sobre funções investigatórias do Ministério Público. Na lista de pessoas a serem investigadas, além de Mendes e Feitoza, constavam outras personalidades, como Roberta Rangel, mulher de Dias Toffoli."
  • "O Supremo reagiu. Toffoli pediu à Procuradoria-Geral da República, à Receita e ao ministro da Economia que investigassem as irregularidades nas apurações."
  • "O Supremo parecia de fato disposto a batalhar. Noutra frente, marcou posição quanto às manifestações de integrantes do governo e de sua base de sustentação parlamentar que indicavam retrocessos na proteção de direitos de minorias."
  • "Celso de Mello era relator de um dos processos que questionavam a demora do Congresso em aprovar uma lei criminalizando a homofobia. E insistiu com Toffoli para que o tema fosse colocado em pauta. No julgamento iniciado em 20 de fevereiro de 2019, Mello liderou o STF e garantiu apoio para a criminalização, por via judicial, da homofobia."
  • "O processo foi interrompido por decisão do presidente do tribunal, sem data para retomada, mas outra cizânia estava criada. O Congresso estava decidido a confrontar o STF -- alguns deputados, sobretudo os novatos, pediam o impeachment dos quatro ministros que já haviam votado favoravelmente."
  • "Em março, outro julgamento acendeu os ânimos. Estava em discussão o destino de processos criminais contra políticos investigados por corrupção e lavagem de dinheiro e, ao mesmo tempo, por crimes eleitorais. Os autos deveriam tramitar na Justiça Federal ou na Justiça Eleitoral?"
  • "Procuradores que integram a força-tarefa da Operação Lava Jato foram à imprensa e às redes sociais em defesa da competência da Justiça Federal para processar tais casos, pois a Eleitoral não teria estrutura nem experiência para investigar crimes de grande complexidade. Aqui e ali ventilou-se o fim da Lava Jato na hipótese de o Supremo determinar a remessa dos autos para a Justiça Eleitoral."
  • "No dia do julgamento, um dos procuradores, Diogo Castor, denunciou que o STF estaria ensaiando um golpe contra a operação. Nas redes sociais, os ataques ao Supremo se avolumavam. Na imprensa, lia-se que a máquina de mídias sociais bolsonaristas havia escolhido o STF como seu alvo preferencial naquele momento."
  • "Às quartas-feiras, antes de iniciada a sessão plenária, Toffoli promove em seu gabinete um almoço com os ministros. É um estratagema simpático para agregar os colegas, amainar os atritos, ampliar a colegialidade, conversar mais abertamente sobre os problemas da Corte e, mais importante, ouvir a fala livre (e, se possível, espontânea...) dos ministros."
  • "O ex-ministro Nelson Jobim lhe havia passado uma dica preciosa: 'Escute-os, deixe-os falar'. Naquele dia, Celso, Marco Aurélio, Cármen Lúcia e Barroso não compareceram. Aos comensais presentes, Fux externou sua indignação com os petardos contra o STF: 'Um absurdo', disse."
  • "A autoridade do STF precisava ser resguardada das investidas que vinha sofrendo. O presidente do tribunal revelou ter encaminhado ofícios à Polícia Federal pedindo que os ataques fossem investigados, mas nenhuma providência fora tomada."
  • "Os ministros ainda reclamaram dos procuradores da Lava Jato que insinuavam um golpe do Supremo contra as investigações. Fux afirmou -- e Fachin confirmou durante o almoço -- que Celso de Mello, então ausente, se revoltara com os termos usados. Para o decano, as críticas haviam exorbitado a liberdade de expressão."
  • "Toffoli pensaria em alguma saída. No dia seguinte, telefonou para Mello e expôs sua ideia, que foi bem recebida pelo interlocutor. Depois ligou para Alexandre de Moraes e disse que o queria no comando da investigação. 'Eu quero designar você, que entende disso', ele disse."
  • "Moraes, que havia sido secretário de Segurança do Estado de São Paulo, usara sua máquina e seu plantel de contatos para solucionar outro caso importante: as ameaças feitas à primeira-dama Marcela Temer. O argumento final de Toffoli não podia ser refutado: 'Duvido que alguém [mais] queira relatar'. Moraes aceitou a tarefa."
  • "No dia 14 de março, minutos antes da sessão plenária do STF, Toffoli conversou com todos os ministros, individualmente, e explicou sua decisão. Não os consultou; apenas lhes comunicou sua resolução. Ninguém objetou."
  • "Enquanto o presidente anunciava sua estratégia em reservado, sua assessoria disparava uma mensagem para os jornalistas: 'Um alerta: o presidente fará um anúncio logo no início da sessão de hoje que promete repercutir MUITO'."
  • "Iniciada a sessão, Toffoli emposta a voz e noticia a abertura de um inquérito 'contra tudo e quase todos', como definiu um de seus assessores de confiança. 'O presidente do Supremo Tribunal Federal, no uso de atribuições que lhe conferem o regimento interno, considerando que velar pela intangibilidade das prerrogativas do Supremo Tribunal Federal e dos seus membros é atribuição regimental do presidente da corte, considerando a existência de notícias fraudulentas, conhecidas como fake news, denunciações caluniosas, ameaças e infrações revestidas de animus caluniandi, diffamandi e injuriandi, que atingem a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de seus membros e familiares, resolve, como resolvido já está, nos termos do artigo 43 [do Regimento Interno do STF], instaurar inquérito criminal para apuração de fatos e infrações correspondentes em toda sua dimensão', anunciou."
  • "Alexandre de Moraes foi designado o relator. As críticas ao Supremo não tardaram. A entidade abre um inquérito a ser julgado por ela mesma? Tal procedimento seria compatível com a Constituição? Não bastasse, a investigação seria tocada por um ministro do Supremo, sem a participação do Ministério Público. Como assim?"
  • "O tribunal ignorava as objeções da imprensa. Toffoli dava mais atenção às críticas daqueles que o circundavam e, sempre que tinha oportunidade, defendia sua decisão. 'Tem que dar porrada. Nós só estamos apanhando', justificou a um amigo na festa de aniversário do ministro Barroso. E acrescentou, irônico: 'E o delegado que eu arranjei?', numa referência ao 'delegado Alexandre de Moraes'."
  • "No inquérito aberto por Toffoli, o sistema de distribuição seguiu um procedimento incomum. Normalmente, os relatores são definidos por sorteio. Quando um ministro está impedido de participar do julgamento daquela causa -- por ser parente de uma das partes, por exemplo --, seu nome é excluído com um clique. E essa informação fica disponível no andamento do processo."
  • "Quando um juiz está prevento, ou seja, quando já está relatando um processo semelhante, os nomes dos demais ministros são ticados no sistema e a ação é encaminhada para o prevento. Mesmo que o tema tramite em segredo de justiça, esta informação fica disponível na página do Supremo."
  • "No caso do inquérito aberto por Toffoli, o relator foi designado a priori, uma solução prevista no regimento -- mas nunca antes utilizada. A assessoria técnica do tribunal excluiu os outros ministros, deixando apenas o nome de Alexandre de Moraes habilitado para receber a ação. Mas a informação sobre a designação do relator não aparece no site."
  • "Com o auxílio de um delegado da Polícia Federal e outro da Polícia Civil de São Paulo, a investigação avançou sobre pessoas físicas, perfis de redes sociais e imprensa, o que provocou fortes reações dentro e fora do tribunal. 'Qualquer tipo de censura, mesmo aquela ordenada pelo Poder Judiciário, mostra-se prática ilegítima, autocrática e essencialmente incompatível com o regime das liberdades fundamentais consagrado pela Constituição da República!', ponderou Celso de Mello em nota à imprensa, contestando a decisão de Alexandre de Moraes de determinar a retirada do ar de matéria da revista eletrônica Crusoé, que trazia trechos de delação premiada que se referiam a Toffoli."
  • "O inquérito era uma tentativa de recompor a redoma que tradicionalmente protegia o STF e que foi fragilizada pelas novas gerações de ministros -- fosse com brigas internas e estratégias artificiais para favorecer suas agendas próprias, fosse contorcendo argumentos, virando casaca e desprezando a jurisprudência do tribunal, fosse usando a imprensa para atacar os adversários. Mas acabou por fragilizar ainda mais a imagem da instituição."

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