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Seis ministros do STF votam para suspender operações policiais no Rio durante pandemia


Ação em julgamento foi movida pelo PSB, que alega que a política de segurança de Witzel estimula o conflito armado e expõe moradores a "profundas violações de seus direitos fundamentais"

Por Rafael Moraes Moura/ BRASÍLIA e Marcio Dolzan/RIO
Ministro Edson Fachin. FOTO: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO  

Seis dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já votaram para manter a suspensão a operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia do novo coronavírus. O relator do caso, ministro Edson Fachin, já havia determinado a medida em junho. Agora, o caso está sendo analisado pelo plenário do STF em um julgamento no plenário virtual, uma ferramenta online que permite que os magistrados analisem ações sem se reunirem presencialmente.

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A ação em julgamento foi movida pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), que alega que a política de segurança pública do governador Wilson Witzel estimula o conflito armado e expõe moradores de áreas conflagradas a "profundas violações de seus direitos fundamentais".

A decisão do ministro foi tomada após dois adolescentes serem mortos em operações na região metropolitana do Rio. João Pedro Mattos, de 14 anos, foi assassinado com um tiro nas costas, dentro de casa no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. João Vitor Gomes da Rocha, de 18 anos, por sua vez, foi morto em uma operação da Polícia Militar na Cidade de Deus, zona oeste da capital, durante a distribuição de cestas básicas e itens de higiene.

Em sua decisão, Fachin observou que operações policiais realizadas em locais de grande aglomeração "ficam ainda mais arriscadas e fragilizam a já baixa accountability (prestação de contas) que deveria pautar a atuação de todos os agentes públicos".

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Até a publicação deste texto, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Cármen Lucia também haviam acompanhado Fachin.

Terraplanismo

Ao concordar com a suspensão das operações policiais, Gilmar Mendes apontou que os "números demonstram um aumento acentuado" do número de mortes por intervenção de agentes do Rio. "A letalidade policial no Brasil tem, portanto, uma cor: negros são aqueles que mais morrem. E, além disso, ela tem também uma classe social", ressaltou Gilmar.

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Gilmar também contestou um "mito propagando por gestores sem embasamento científico" e frisou que o aumento da letalidade policial "não reduz a criminalidade", ao mencionar relatório produzido pelo MP do Rio e dados de letalidade policial.

"Ou seja, cientificamente é infundado sustentar que uma atuação agressiva, com maior letalidade das Polícias, acarreta redução de criminalidade. Não podemos aceitar um terraplanismo contrafático na gestão da Segurança Pública brasileira", observou Gilmar.

Ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo, o ministro Alexandre de Moraes discordou dos colegas. "A ausência de atuação policial durante período indeterminado gerará riscos à segurança pública de toda a Sociedade do Rio de Janeiro, com consequências imprevisíveis", escreveu Moraes.

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Estudo

A proibição de operações policiais em favelas durante a pandemia de coronavírus não aumentou a criminalidade violenta no Rio. Ao contrário. A região metropolitana registrou queda de 70% no número de mortes decorrentes dessas incursões nas comunidades, além de reduções significativas nos registros de crimes contra a vida (48%) e contra o patrimônio (40%). Os dados estão no estudo "Operações policiais e ocorrências criminais: Por um debate público qualificado", do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (GENI) da Universidade Federal Fluminense (UFF), divulgado na última segunda-feira, 3.

Para estimar os efeitos da proibição, o estudo comparou os números do período de um mês com a média das mesmas datas desde 2007. Segundo o relatório produzido pelos pesquisadores, 30 vidas foram salvas nas favelas por causa da decisão de Fachin. Entre as vidas poupadas, estão as de policiais, que também costumam ser vítimas em confrontos nas favelas do Rio.

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Medida reduz riscos, avaliam especialistas

A decisão que manteve a suspensão de operações policiais no Rio foi considerada positiva - pelo menos durante a pandemia - por pesquisadores a área de segurança pública. A avaliação é que a medida reduz riscos, como o de balas perdidas atingirem civis. Mesmo assim, quem acompanha a questão no Estado faz ressalvas.

O coordenador do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Ignacio Cano, avaliou que a decisão do colegiado reforçou a liminar concedida em junho por Edson Fachin. Para ele, a medida "confirma que a prioridade do Estado em meio à pandemia deve ser a preservação da vida, e não a morte de suspeitos ou a realização de operações que coloquem em risco a população."

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Cano lamentou que a decisão de vetar operações policiais não tenha partido diretamente do governo de Wilson Witzel (PSC).

"É lamentável que o Judiciário tenha de invadir a seara do Executivo em função dessas políticas no Rio de Janeiro que privilegiam o extermínio de suspeitos, o disparo na cabecinha", comentou o sociólogo, citando expressão usada pelo governador em entrevista ao Estadão em 2018, logo após ser eleito. "(Mas) o Brasil vive uma fase de limites difusos de cada Poder, e nesse contexto se entende perfeitamente que o Judiciário tome uma decisão como esta."

Ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e especialista em segurança pública, Paulo Storani também considera a acertada a medida do STF. "Mas precisamos entender que é uma decisão transitória, que se encerra a partir do momento que terminar a quarentena", ressalvou.

Na avaliação de Storani, a proibição das operações para além da pandemia seria um problema para o Estado.

"A consequência natural, e que já está ocorrendo, é o fortalecimento das facções criminosas. As operações não estão ocorrendo, mas o criminoso lá se encontra, continua vendendo sua droga, continua dominando seu território, e mais adiante vai tentar expandi-lo enfrentando facções rivais", afirmou.

Reação

Em nota conjunta - o governo do Rio preferiu não se pronunciar - as duas polícias fluminenses afirmaram que cumprirão a decisão do STF. As duas corporações se declararam preocupadas com as consequências da medida. Confira a íntegra:

"As Polícias Civil e Militar respeitam a decisão do STF e informam que cumprirão integralmente o que foi determinado. No entanto, veem com extrema preocupação a restrição à operacionalidade em territórios disputados entre grupos de criminosos, que impõem o terror a milhares de pessoas."

"- Levantamento da Secretaria de Polícia Civil aponta que, em 60 dias de vigência da decisão do STF, pelo menos dez pessoas foram mortas, incluindo dois policiais militares em serviço e crianças, e ao menos 13 foram feridas, em virtude de cerca de 50 guerras territoriais entre facções criminosas. Ainda segundo a Polícia Civil, de 1.413 comunidades em todo o Estado, 81% têm atuação de grupos que exploram o tráfico de drogas e 19% são exploradas por milicianos, com disputas territoriais frequentes entre quatro organizações criminosas."

"- A análise mostrou ainda que existem 56.620 criminosos em liberdade portando armas de fogo de grosso calibre e trabalhando para o tráfico de drogas ou grupos milicianos em todo o Rio de Janeiro. "

"- De acordo com informações da Polícia Militar, após a restrição das ações policiais, houve um aumento significativo do número de confrontos entre grupos rivais por domínio de território. A quantidade de barricadas erguidas por criminosos também aumentou e estão se expandido para as vias urbanizadas."

"- Por fim, vale ressaltar que as polícias já realizam suas operações dentro da excepcionalidade prevista, cumprindo todas as exigências legais e os protocolos técnicos, para preservar vidas de moradores e dos policiais."

Ministro Edson Fachin. FOTO: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO  

Seis dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já votaram para manter a suspensão a operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia do novo coronavírus. O relator do caso, ministro Edson Fachin, já havia determinado a medida em junho. Agora, o caso está sendo analisado pelo plenário do STF em um julgamento no plenário virtual, uma ferramenta online que permite que os magistrados analisem ações sem se reunirem presencialmente.

A ação em julgamento foi movida pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), que alega que a política de segurança pública do governador Wilson Witzel estimula o conflito armado e expõe moradores de áreas conflagradas a "profundas violações de seus direitos fundamentais".

A decisão do ministro foi tomada após dois adolescentes serem mortos em operações na região metropolitana do Rio. João Pedro Mattos, de 14 anos, foi assassinado com um tiro nas costas, dentro de casa no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. João Vitor Gomes da Rocha, de 18 anos, por sua vez, foi morto em uma operação da Polícia Militar na Cidade de Deus, zona oeste da capital, durante a distribuição de cestas básicas e itens de higiene.

Em sua decisão, Fachin observou que operações policiais realizadas em locais de grande aglomeração "ficam ainda mais arriscadas e fragilizam a já baixa accountability (prestação de contas) que deveria pautar a atuação de todos os agentes públicos".

Até a publicação deste texto, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Cármen Lucia também haviam acompanhado Fachin.

Terraplanismo

Ao concordar com a suspensão das operações policiais, Gilmar Mendes apontou que os "números demonstram um aumento acentuado" do número de mortes por intervenção de agentes do Rio. "A letalidade policial no Brasil tem, portanto, uma cor: negros são aqueles que mais morrem. E, além disso, ela tem também uma classe social", ressaltou Gilmar.

Gilmar também contestou um "mito propagando por gestores sem embasamento científico" e frisou que o aumento da letalidade policial "não reduz a criminalidade", ao mencionar relatório produzido pelo MP do Rio e dados de letalidade policial.

"Ou seja, cientificamente é infundado sustentar que uma atuação agressiva, com maior letalidade das Polícias, acarreta redução de criminalidade. Não podemos aceitar um terraplanismo contrafático na gestão da Segurança Pública brasileira", observou Gilmar.

Ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo, o ministro Alexandre de Moraes discordou dos colegas. "A ausência de atuação policial durante período indeterminado gerará riscos à segurança pública de toda a Sociedade do Rio de Janeiro, com consequências imprevisíveis", escreveu Moraes.

Estudo

A proibição de operações policiais em favelas durante a pandemia de coronavírus não aumentou a criminalidade violenta no Rio. Ao contrário. A região metropolitana registrou queda de 70% no número de mortes decorrentes dessas incursões nas comunidades, além de reduções significativas nos registros de crimes contra a vida (48%) e contra o patrimônio (40%). Os dados estão no estudo "Operações policiais e ocorrências criminais: Por um debate público qualificado", do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (GENI) da Universidade Federal Fluminense (UFF), divulgado na última segunda-feira, 3.

Para estimar os efeitos da proibição, o estudo comparou os números do período de um mês com a média das mesmas datas desde 2007. Segundo o relatório produzido pelos pesquisadores, 30 vidas foram salvas nas favelas por causa da decisão de Fachin. Entre as vidas poupadas, estão as de policiais, que também costumam ser vítimas em confrontos nas favelas do Rio.

Medida reduz riscos, avaliam especialistas

A decisão que manteve a suspensão de operações policiais no Rio foi considerada positiva - pelo menos durante a pandemia - por pesquisadores a área de segurança pública. A avaliação é que a medida reduz riscos, como o de balas perdidas atingirem civis. Mesmo assim, quem acompanha a questão no Estado faz ressalvas.

O coordenador do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Ignacio Cano, avaliou que a decisão do colegiado reforçou a liminar concedida em junho por Edson Fachin. Para ele, a medida "confirma que a prioridade do Estado em meio à pandemia deve ser a preservação da vida, e não a morte de suspeitos ou a realização de operações que coloquem em risco a população."

Cano lamentou que a decisão de vetar operações policiais não tenha partido diretamente do governo de Wilson Witzel (PSC).

"É lamentável que o Judiciário tenha de invadir a seara do Executivo em função dessas políticas no Rio de Janeiro que privilegiam o extermínio de suspeitos, o disparo na cabecinha", comentou o sociólogo, citando expressão usada pelo governador em entrevista ao Estadão em 2018, logo após ser eleito. "(Mas) o Brasil vive uma fase de limites difusos de cada Poder, e nesse contexto se entende perfeitamente que o Judiciário tome uma decisão como esta."

Ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e especialista em segurança pública, Paulo Storani também considera a acertada a medida do STF. "Mas precisamos entender que é uma decisão transitória, que se encerra a partir do momento que terminar a quarentena", ressalvou.

Na avaliação de Storani, a proibição das operações para além da pandemia seria um problema para o Estado.

"A consequência natural, e que já está ocorrendo, é o fortalecimento das facções criminosas. As operações não estão ocorrendo, mas o criminoso lá se encontra, continua vendendo sua droga, continua dominando seu território, e mais adiante vai tentar expandi-lo enfrentando facções rivais", afirmou.

Reação

Em nota conjunta - o governo do Rio preferiu não se pronunciar - as duas polícias fluminenses afirmaram que cumprirão a decisão do STF. As duas corporações se declararam preocupadas com as consequências da medida. Confira a íntegra:

"As Polícias Civil e Militar respeitam a decisão do STF e informam que cumprirão integralmente o que foi determinado. No entanto, veem com extrema preocupação a restrição à operacionalidade em territórios disputados entre grupos de criminosos, que impõem o terror a milhares de pessoas."

"- Levantamento da Secretaria de Polícia Civil aponta que, em 60 dias de vigência da decisão do STF, pelo menos dez pessoas foram mortas, incluindo dois policiais militares em serviço e crianças, e ao menos 13 foram feridas, em virtude de cerca de 50 guerras territoriais entre facções criminosas. Ainda segundo a Polícia Civil, de 1.413 comunidades em todo o Estado, 81% têm atuação de grupos que exploram o tráfico de drogas e 19% são exploradas por milicianos, com disputas territoriais frequentes entre quatro organizações criminosas."

"- A análise mostrou ainda que existem 56.620 criminosos em liberdade portando armas de fogo de grosso calibre e trabalhando para o tráfico de drogas ou grupos milicianos em todo o Rio de Janeiro. "

"- De acordo com informações da Polícia Militar, após a restrição das ações policiais, houve um aumento significativo do número de confrontos entre grupos rivais por domínio de território. A quantidade de barricadas erguidas por criminosos também aumentou e estão se expandido para as vias urbanizadas."

"- Por fim, vale ressaltar que as polícias já realizam suas operações dentro da excepcionalidade prevista, cumprindo todas as exigências legais e os protocolos técnicos, para preservar vidas de moradores e dos policiais."

Ministro Edson Fachin. FOTO: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO  

Seis dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já votaram para manter a suspensão a operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia do novo coronavírus. O relator do caso, ministro Edson Fachin, já havia determinado a medida em junho. Agora, o caso está sendo analisado pelo plenário do STF em um julgamento no plenário virtual, uma ferramenta online que permite que os magistrados analisem ações sem se reunirem presencialmente.

A ação em julgamento foi movida pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), que alega que a política de segurança pública do governador Wilson Witzel estimula o conflito armado e expõe moradores de áreas conflagradas a "profundas violações de seus direitos fundamentais".

A decisão do ministro foi tomada após dois adolescentes serem mortos em operações na região metropolitana do Rio. João Pedro Mattos, de 14 anos, foi assassinado com um tiro nas costas, dentro de casa no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. João Vitor Gomes da Rocha, de 18 anos, por sua vez, foi morto em uma operação da Polícia Militar na Cidade de Deus, zona oeste da capital, durante a distribuição de cestas básicas e itens de higiene.

Em sua decisão, Fachin observou que operações policiais realizadas em locais de grande aglomeração "ficam ainda mais arriscadas e fragilizam a já baixa accountability (prestação de contas) que deveria pautar a atuação de todos os agentes públicos".

Até a publicação deste texto, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Cármen Lucia também haviam acompanhado Fachin.

Terraplanismo

Ao concordar com a suspensão das operações policiais, Gilmar Mendes apontou que os "números demonstram um aumento acentuado" do número de mortes por intervenção de agentes do Rio. "A letalidade policial no Brasil tem, portanto, uma cor: negros são aqueles que mais morrem. E, além disso, ela tem também uma classe social", ressaltou Gilmar.

Gilmar também contestou um "mito propagando por gestores sem embasamento científico" e frisou que o aumento da letalidade policial "não reduz a criminalidade", ao mencionar relatório produzido pelo MP do Rio e dados de letalidade policial.

"Ou seja, cientificamente é infundado sustentar que uma atuação agressiva, com maior letalidade das Polícias, acarreta redução de criminalidade. Não podemos aceitar um terraplanismo contrafático na gestão da Segurança Pública brasileira", observou Gilmar.

Ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo, o ministro Alexandre de Moraes discordou dos colegas. "A ausência de atuação policial durante período indeterminado gerará riscos à segurança pública de toda a Sociedade do Rio de Janeiro, com consequências imprevisíveis", escreveu Moraes.

Estudo

A proibição de operações policiais em favelas durante a pandemia de coronavírus não aumentou a criminalidade violenta no Rio. Ao contrário. A região metropolitana registrou queda de 70% no número de mortes decorrentes dessas incursões nas comunidades, além de reduções significativas nos registros de crimes contra a vida (48%) e contra o patrimônio (40%). Os dados estão no estudo "Operações policiais e ocorrências criminais: Por um debate público qualificado", do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (GENI) da Universidade Federal Fluminense (UFF), divulgado na última segunda-feira, 3.

Para estimar os efeitos da proibição, o estudo comparou os números do período de um mês com a média das mesmas datas desde 2007. Segundo o relatório produzido pelos pesquisadores, 30 vidas foram salvas nas favelas por causa da decisão de Fachin. Entre as vidas poupadas, estão as de policiais, que também costumam ser vítimas em confrontos nas favelas do Rio.

Medida reduz riscos, avaliam especialistas

A decisão que manteve a suspensão de operações policiais no Rio foi considerada positiva - pelo menos durante a pandemia - por pesquisadores a área de segurança pública. A avaliação é que a medida reduz riscos, como o de balas perdidas atingirem civis. Mesmo assim, quem acompanha a questão no Estado faz ressalvas.

O coordenador do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Ignacio Cano, avaliou que a decisão do colegiado reforçou a liminar concedida em junho por Edson Fachin. Para ele, a medida "confirma que a prioridade do Estado em meio à pandemia deve ser a preservação da vida, e não a morte de suspeitos ou a realização de operações que coloquem em risco a população."

Cano lamentou que a decisão de vetar operações policiais não tenha partido diretamente do governo de Wilson Witzel (PSC).

"É lamentável que o Judiciário tenha de invadir a seara do Executivo em função dessas políticas no Rio de Janeiro que privilegiam o extermínio de suspeitos, o disparo na cabecinha", comentou o sociólogo, citando expressão usada pelo governador em entrevista ao Estadão em 2018, logo após ser eleito. "(Mas) o Brasil vive uma fase de limites difusos de cada Poder, e nesse contexto se entende perfeitamente que o Judiciário tome uma decisão como esta."

Ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e especialista em segurança pública, Paulo Storani também considera a acertada a medida do STF. "Mas precisamos entender que é uma decisão transitória, que se encerra a partir do momento que terminar a quarentena", ressalvou.

Na avaliação de Storani, a proibição das operações para além da pandemia seria um problema para o Estado.

"A consequência natural, e que já está ocorrendo, é o fortalecimento das facções criminosas. As operações não estão ocorrendo, mas o criminoso lá se encontra, continua vendendo sua droga, continua dominando seu território, e mais adiante vai tentar expandi-lo enfrentando facções rivais", afirmou.

Reação

Em nota conjunta - o governo do Rio preferiu não se pronunciar - as duas polícias fluminenses afirmaram que cumprirão a decisão do STF. As duas corporações se declararam preocupadas com as consequências da medida. Confira a íntegra:

"As Polícias Civil e Militar respeitam a decisão do STF e informam que cumprirão integralmente o que foi determinado. No entanto, veem com extrema preocupação a restrição à operacionalidade em territórios disputados entre grupos de criminosos, que impõem o terror a milhares de pessoas."

"- Levantamento da Secretaria de Polícia Civil aponta que, em 60 dias de vigência da decisão do STF, pelo menos dez pessoas foram mortas, incluindo dois policiais militares em serviço e crianças, e ao menos 13 foram feridas, em virtude de cerca de 50 guerras territoriais entre facções criminosas. Ainda segundo a Polícia Civil, de 1.413 comunidades em todo o Estado, 81% têm atuação de grupos que exploram o tráfico de drogas e 19% são exploradas por milicianos, com disputas territoriais frequentes entre quatro organizações criminosas."

"- A análise mostrou ainda que existem 56.620 criminosos em liberdade portando armas de fogo de grosso calibre e trabalhando para o tráfico de drogas ou grupos milicianos em todo o Rio de Janeiro. "

"- De acordo com informações da Polícia Militar, após a restrição das ações policiais, houve um aumento significativo do número de confrontos entre grupos rivais por domínio de território. A quantidade de barricadas erguidas por criminosos também aumentou e estão se expandido para as vias urbanizadas."

"- Por fim, vale ressaltar que as polícias já realizam suas operações dentro da excepcionalidade prevista, cumprindo todas as exigências legais e os protocolos técnicos, para preservar vidas de moradores e dos policiais."

Ministro Edson Fachin. FOTO: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO  

Seis dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já votaram para manter a suspensão a operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia do novo coronavírus. O relator do caso, ministro Edson Fachin, já havia determinado a medida em junho. Agora, o caso está sendo analisado pelo plenário do STF em um julgamento no plenário virtual, uma ferramenta online que permite que os magistrados analisem ações sem se reunirem presencialmente.

A ação em julgamento foi movida pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), que alega que a política de segurança pública do governador Wilson Witzel estimula o conflito armado e expõe moradores de áreas conflagradas a "profundas violações de seus direitos fundamentais".

A decisão do ministro foi tomada após dois adolescentes serem mortos em operações na região metropolitana do Rio. João Pedro Mattos, de 14 anos, foi assassinado com um tiro nas costas, dentro de casa no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. João Vitor Gomes da Rocha, de 18 anos, por sua vez, foi morto em uma operação da Polícia Militar na Cidade de Deus, zona oeste da capital, durante a distribuição de cestas básicas e itens de higiene.

Em sua decisão, Fachin observou que operações policiais realizadas em locais de grande aglomeração "ficam ainda mais arriscadas e fragilizam a já baixa accountability (prestação de contas) que deveria pautar a atuação de todos os agentes públicos".

Até a publicação deste texto, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Cármen Lucia também haviam acompanhado Fachin.

Terraplanismo

Ao concordar com a suspensão das operações policiais, Gilmar Mendes apontou que os "números demonstram um aumento acentuado" do número de mortes por intervenção de agentes do Rio. "A letalidade policial no Brasil tem, portanto, uma cor: negros são aqueles que mais morrem. E, além disso, ela tem também uma classe social", ressaltou Gilmar.

Gilmar também contestou um "mito propagando por gestores sem embasamento científico" e frisou que o aumento da letalidade policial "não reduz a criminalidade", ao mencionar relatório produzido pelo MP do Rio e dados de letalidade policial.

"Ou seja, cientificamente é infundado sustentar que uma atuação agressiva, com maior letalidade das Polícias, acarreta redução de criminalidade. Não podemos aceitar um terraplanismo contrafático na gestão da Segurança Pública brasileira", observou Gilmar.

Ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo, o ministro Alexandre de Moraes discordou dos colegas. "A ausência de atuação policial durante período indeterminado gerará riscos à segurança pública de toda a Sociedade do Rio de Janeiro, com consequências imprevisíveis", escreveu Moraes.

Estudo

A proibição de operações policiais em favelas durante a pandemia de coronavírus não aumentou a criminalidade violenta no Rio. Ao contrário. A região metropolitana registrou queda de 70% no número de mortes decorrentes dessas incursões nas comunidades, além de reduções significativas nos registros de crimes contra a vida (48%) e contra o patrimônio (40%). Os dados estão no estudo "Operações policiais e ocorrências criminais: Por um debate público qualificado", do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (GENI) da Universidade Federal Fluminense (UFF), divulgado na última segunda-feira, 3.

Para estimar os efeitos da proibição, o estudo comparou os números do período de um mês com a média das mesmas datas desde 2007. Segundo o relatório produzido pelos pesquisadores, 30 vidas foram salvas nas favelas por causa da decisão de Fachin. Entre as vidas poupadas, estão as de policiais, que também costumam ser vítimas em confrontos nas favelas do Rio.

Medida reduz riscos, avaliam especialistas

A decisão que manteve a suspensão de operações policiais no Rio foi considerada positiva - pelo menos durante a pandemia - por pesquisadores a área de segurança pública. A avaliação é que a medida reduz riscos, como o de balas perdidas atingirem civis. Mesmo assim, quem acompanha a questão no Estado faz ressalvas.

O coordenador do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Ignacio Cano, avaliou que a decisão do colegiado reforçou a liminar concedida em junho por Edson Fachin. Para ele, a medida "confirma que a prioridade do Estado em meio à pandemia deve ser a preservação da vida, e não a morte de suspeitos ou a realização de operações que coloquem em risco a população."

Cano lamentou que a decisão de vetar operações policiais não tenha partido diretamente do governo de Wilson Witzel (PSC).

"É lamentável que o Judiciário tenha de invadir a seara do Executivo em função dessas políticas no Rio de Janeiro que privilegiam o extermínio de suspeitos, o disparo na cabecinha", comentou o sociólogo, citando expressão usada pelo governador em entrevista ao Estadão em 2018, logo após ser eleito. "(Mas) o Brasil vive uma fase de limites difusos de cada Poder, e nesse contexto se entende perfeitamente que o Judiciário tome uma decisão como esta."

Ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e especialista em segurança pública, Paulo Storani também considera a acertada a medida do STF. "Mas precisamos entender que é uma decisão transitória, que se encerra a partir do momento que terminar a quarentena", ressalvou.

Na avaliação de Storani, a proibição das operações para além da pandemia seria um problema para o Estado.

"A consequência natural, e que já está ocorrendo, é o fortalecimento das facções criminosas. As operações não estão ocorrendo, mas o criminoso lá se encontra, continua vendendo sua droga, continua dominando seu território, e mais adiante vai tentar expandi-lo enfrentando facções rivais", afirmou.

Reação

Em nota conjunta - o governo do Rio preferiu não se pronunciar - as duas polícias fluminenses afirmaram que cumprirão a decisão do STF. As duas corporações se declararam preocupadas com as consequências da medida. Confira a íntegra:

"As Polícias Civil e Militar respeitam a decisão do STF e informam que cumprirão integralmente o que foi determinado. No entanto, veem com extrema preocupação a restrição à operacionalidade em territórios disputados entre grupos de criminosos, que impõem o terror a milhares de pessoas."

"- Levantamento da Secretaria de Polícia Civil aponta que, em 60 dias de vigência da decisão do STF, pelo menos dez pessoas foram mortas, incluindo dois policiais militares em serviço e crianças, e ao menos 13 foram feridas, em virtude de cerca de 50 guerras territoriais entre facções criminosas. Ainda segundo a Polícia Civil, de 1.413 comunidades em todo o Estado, 81% têm atuação de grupos que exploram o tráfico de drogas e 19% são exploradas por milicianos, com disputas territoriais frequentes entre quatro organizações criminosas."

"- A análise mostrou ainda que existem 56.620 criminosos em liberdade portando armas de fogo de grosso calibre e trabalhando para o tráfico de drogas ou grupos milicianos em todo o Rio de Janeiro. "

"- De acordo com informações da Polícia Militar, após a restrição das ações policiais, houve um aumento significativo do número de confrontos entre grupos rivais por domínio de território. A quantidade de barricadas erguidas por criminosos também aumentou e estão se expandido para as vias urbanizadas."

"- Por fim, vale ressaltar que as polícias já realizam suas operações dentro da excepcionalidade prevista, cumprindo todas as exigências legais e os protocolos técnicos, para preservar vidas de moradores e dos policiais."

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