Demissões devem aumentar demanda por terra, avalia Incra


Presidente do órgão diz que fechamento de postos nas cidades pode gerar fluxo migratório rumo ao interior

Por Redação

A onda de desemprego, por causa da crise financeira internacional, deve engrossar as fileiras do movimento de reforma agrária e exigir um esforço ainda maior do governo para atender à demanda por terra. A avaliação é do presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart. Ele acredita que o fechamento de postos de trabalho nas cidades pode gerar um fluxo migratório rumo ao interior. "As pessoas vão buscar alternativas. Isso vai engrossar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra ou criar outro. A demanda por terra vai aumentar em 2009 e 2010", avaliou. Hackbart afirmou que o Incra começa 2009 com "um orçamento bom" e adiantou que o número de famílias assentadas em 2008 deve passar de 70 mil, superando as previsões dos movimentos sociais que consideraram o ano passado "o pior para a reforma agrária". Sobre a questão ambiental nos assentamentos, Hackbart reconheceu o desmatamento nessas áreas e afirmou que alguns assentamentos na Amazônia deverão ser fechados por causa das derrubadas e do uso ilegal da terra. "Estamos com diagnóstico feito e equipes em campo para tirar quem é ilegal. Ali tem muita soja e gado. Temos que retirar a ilegalidade e cumprir a legislação ambiental: recuperar a reserva legal, a área de proteção permanente. E, em alguns casos, acabar com os assentamentos, em vários casos, inclusive alguns entre os que foram listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis)", disse ele. Na entrevista, o presidente do Incra também falou sobre a relação entre o órgão e o MST no processo de reforma agrária do país ao longo de 25 anos do movimento. "Eles não reconhecem o que já fizemos", apontou. Leia a seguir os principais trechos da entrevista com Hackbart. Agência Brasil: Diante do cenário de crise, o orçamento do Incra vai ser mantido? Rolf Hackbart: Em 2003, o orçamento total do Incra foi R$ 1,3 bilhão. Vamos arrancar 2009 com orçamento total perto de R$ 3,5 bilhões. O que mudou com a crise é que os recursos do Orçamento Geral da União serão mais disputados, mais focados, mais seletivos. Vamos iniciar 2009 com um orçamento bom. Ao longo do ano sempre buscamos suplementação: R$ 1 bilhão para obtenção [de terras para reforma agrária], R$ 230 milhões para assistência técnica, R$ 70 milhões para proteção do meio ambiente. A disputa pela suplementação este ano vai ser acirrada, o Paulo Bernardo já sinalizou isso. ABr: O MST acredita que 2008 foi o "pior ano da reforma agrária", com a menor quantidade de famílias assentadas em um ano desde o início do governo Lula. Hackbart: Isso é uma avaliação deles. Nós empenhamos, em 2008, 99% do orçamento do Incra. Vamos superar 70 mil famílias assentadas em 2008 (duas mil a mais que em 2007). O problema é que cada movimento social avalia quantas dessas famílias são suas. Aí sim pode-se ter uma avaliação ruim. Nós assentamos, de 2003 para cá, cerca de 530 mil famílias e incorporamos cerca de 40 milhões de hectares à reforma agrária, com destaque para a retomada de terras públicas na Amazônia Legal, o combate à grilagem, a criação de assentamentos sustentáveis na Amazônia. Nosso grande desafio em 2009 é assentar famílias nas áreas tradicionais: Sul, Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste. ABr: Mas os movimentos sociais argumentam que ainda há uma demanda de 4,5 milhões de famílias que precisam ser assentadas. Hackbart: Esse é um dado antigo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). É uma estimativa boa, mas ninguém tem certeza. Se pegar o conceito de sem-terra e com pouca terra pode-se chegar a esse número. Mas é importante entender que são estimativas, senão a gente entra em uma matemática burra: 'são tantos milhões de famílias precisando de terra, vocês assentaram tantas e faltam outras tantas'. Não é assim. Em São Paulo, por exemplo, este ano, 2009/2010, uma parte da demanda por terra é o contingente demitido da indústria automobilística, as pessoas vão buscar alternativas. ABr: O senhor acredita que a onda de desemprego vai engrossar o MST? Hackbart: Vai engrossar o movimento ou criar outros; a demanda por terra vai aumentar em 2010. O aumento de recursos para ações rurais - o Incra, por exemplo, pagou R$ 1 bilhão de crédito aos assentados em 2008 - começa a gerar renda no interior. E atrai as pessoas. Isso já está acontecendo no Espírito Santo e no Rio Grande do Sul, por exemplo. ABr: E como o governo está se preparando para isso? Hackbart: Aumentando o número de assentamentos. Temos várias prioridades para esse período: acelerar o acesso à terra, e isso é uma questão polêmica porque tem gente que acha que não precisa mais, mas precisa sim, é preciso desconcentrar o uso e a propriedade e promover o acesso à terra a quem quer produzir. Segundo: desenvolver os assentamentos, e esse desafio é enorme, são 7 mil assentamentos em todo o país, 70 milhões de hectares onde vivem mais de 1 milhão de famílias. ABr: O que significa desenvolver os assentamentos? Hackbart: Gerar renda, preservar o meio ambiente, dar infra-estrutura básica e, o mais importante, inserir esses assentamentos na cadeia produtiva, senão eles ficam perdidos. E isso depende do Incra, mas também da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento], dos governos estaduais, das prefeituras, dos movimentos sociais, das entidades de pesquisa. O assentamento não é uma indústria, é uma comunidade em formação. Nossa outra prioridade é a regularização fundiária, com grande foco na Amazônia Legal. É dizer o que é terra pública, o que é privada, combater a grilagem e trazer para a legalidade quem for possível trazer. Com o documento, com a regularização, vai ter acesso a crédito, à assistência técnica. Nossa quarta prioridade é o meio ambiente. Existe desmatamento em áreas de assentamento e de agricultura familiar? Sim. Acabamos de fazer um estudo e vimos que está focado bem no Arco do Desmatamento, em 65 grandes assentamentos, no norte de Mato Grosso. ABr: E o que o Incra está fazendo em relação aos desmatamentos em áreas de reforma agrária? Hackbart: Estamos com diagnóstico feito e equipes em campo para tirar quem é ilegal. Ali tem muita soja e gado. Temos que retirar a ilegalidade e cumprir a legislação ambiental: recuperar a reserva legal, a área de proteção permanente. E, em alguns casos, acabar com os assentamentos, em vários casos, inclusive alguns entre os que foram listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). ABr: Em relação à retomada de assentamentos em áreas tradicionais. Qual o ganho dessa opção, já que o custo da terra é maior nessas regiões? Hackbart: O ganho é assentar as famílias acampadas; as famílias acampadas não estão no Norte. E nem sempre é mais caro. Um exemplo: desapropriamos uma propriedade no Rio Grande do Sul por R$ 30 milhões. Desses, R$ 27 milhões eram dívidas do proprietário com a União. O gasto efetivo foi de R$ 3 milhões. ABr: Quantas famílias o governo ainda pretende assentar até 2010? Hackbart: Os números ainda não estão totalmente definidos, mas giram em torno de 80 mil famílias por ano. Tão importante quanto os números é avançar nas regiões tradicionais, os movimentos cobram isso. ABr: O MST está completando 25 anos. Como o senhor avalia as críticas do MST ao desempenho do Incra na reforma agrária? Hackbart: Nós conversamos com todos os movimentos ligados à reforma agrária. Hoje, o centro da reforma agrária está em dois pontos: o acesso à terra e o desenvolvimento dos assentamentos. O grande desafio é mudar o modelo agrícola, fazer assentamento produzir e inseri-lo na cadeia produtiva. Nos 25 anos do MST há muito o que comemorar e há muitos desafios pela frente. O maior dos desafios é desenvolver os assentamentos, além do acesso à terra. O que eu não concordo é que o MST não reconhece o que nós já fizemos: assentamos muitas famílias, o crédito chegou, criamos condições para educação e desenvolvimento. Eu cito o Rio Grande do Sul, onde repassamos 23 mil hectares para assentamentos em 2008 e vamos repassar mais para a reforma agrária. Eles não reconhecem isso publicamente. ABr: Quando o senhor fala em mudança do modelo de desenvolvimento dos assentamentos o que isso significa na prática? Hackbart: A reforma agrária tem que contribuir para mudar o modelo de agricultura do país. E a partir dos biomas proteger o meio ambiente. O grande desafio do Incra é a recuperação de solo das áreas obtidas para a reforma agrária. Sempre precisamos investir muito para recuperar o solo. Temos que priorizar a produção de alimentos, no país ainda há fome. Tem que haver política de compra e mudanças no modelo tecnológico. Meu sonho é dizer não ao veneno e sim ao orgânico. ABr: Há espaço no mercado para esse tipo de produção? Hackbart: Há um espaço econômico. Aí a política pública é fundamental. Se eu conseguir fazer com que a Conab compre diferenciadamente esse produto (orgânico), haverá produtor. Além do acesso à terra, precisamos desenvolver outro tipo de agricultura. O desafio é ter escala para a produção desses alimentos orgânicos e canais de comercialização. ABr: O Incra vai ao Fórum Social Mundial para aprender ou levar experiência brasileira em reforma agrária? Hackbart: Nós vamos lá para nos defender, porque vamos levar muita crítica. ABr: De quem? Hackbart: Um caso concreto que vai chamar a atenção é o lote da Irmã Dorothy Stang. Nós retomamos o lote, estamos lá dentro, mas parte dele está grilado e o juiz local diz que o grileiro tem razão. Parte do mundo vai estar lá e vai a Anapu, no lote da irmã. Menos mal que o próprio Ministério Público do Pará está dizendo que quem está fazendo algum trabalho lá é o Incra. Também haverá um fórum em Parauapebas, onde está o Vale do Rio Doce, onde estará o João Pedro Stedile, a filha do Che Guevara e um grupo de pessoas que vão realizar manifestações.

A onda de desemprego, por causa da crise financeira internacional, deve engrossar as fileiras do movimento de reforma agrária e exigir um esforço ainda maior do governo para atender à demanda por terra. A avaliação é do presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart. Ele acredita que o fechamento de postos de trabalho nas cidades pode gerar um fluxo migratório rumo ao interior. "As pessoas vão buscar alternativas. Isso vai engrossar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra ou criar outro. A demanda por terra vai aumentar em 2009 e 2010", avaliou. Hackbart afirmou que o Incra começa 2009 com "um orçamento bom" e adiantou que o número de famílias assentadas em 2008 deve passar de 70 mil, superando as previsões dos movimentos sociais que consideraram o ano passado "o pior para a reforma agrária". Sobre a questão ambiental nos assentamentos, Hackbart reconheceu o desmatamento nessas áreas e afirmou que alguns assentamentos na Amazônia deverão ser fechados por causa das derrubadas e do uso ilegal da terra. "Estamos com diagnóstico feito e equipes em campo para tirar quem é ilegal. Ali tem muita soja e gado. Temos que retirar a ilegalidade e cumprir a legislação ambiental: recuperar a reserva legal, a área de proteção permanente. E, em alguns casos, acabar com os assentamentos, em vários casos, inclusive alguns entre os que foram listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis)", disse ele. Na entrevista, o presidente do Incra também falou sobre a relação entre o órgão e o MST no processo de reforma agrária do país ao longo de 25 anos do movimento. "Eles não reconhecem o que já fizemos", apontou. Leia a seguir os principais trechos da entrevista com Hackbart. Agência Brasil: Diante do cenário de crise, o orçamento do Incra vai ser mantido? Rolf Hackbart: Em 2003, o orçamento total do Incra foi R$ 1,3 bilhão. Vamos arrancar 2009 com orçamento total perto de R$ 3,5 bilhões. O que mudou com a crise é que os recursos do Orçamento Geral da União serão mais disputados, mais focados, mais seletivos. Vamos iniciar 2009 com um orçamento bom. Ao longo do ano sempre buscamos suplementação: R$ 1 bilhão para obtenção [de terras para reforma agrária], R$ 230 milhões para assistência técnica, R$ 70 milhões para proteção do meio ambiente. A disputa pela suplementação este ano vai ser acirrada, o Paulo Bernardo já sinalizou isso. ABr: O MST acredita que 2008 foi o "pior ano da reforma agrária", com a menor quantidade de famílias assentadas em um ano desde o início do governo Lula. Hackbart: Isso é uma avaliação deles. Nós empenhamos, em 2008, 99% do orçamento do Incra. Vamos superar 70 mil famílias assentadas em 2008 (duas mil a mais que em 2007). O problema é que cada movimento social avalia quantas dessas famílias são suas. Aí sim pode-se ter uma avaliação ruim. Nós assentamos, de 2003 para cá, cerca de 530 mil famílias e incorporamos cerca de 40 milhões de hectares à reforma agrária, com destaque para a retomada de terras públicas na Amazônia Legal, o combate à grilagem, a criação de assentamentos sustentáveis na Amazônia. Nosso grande desafio em 2009 é assentar famílias nas áreas tradicionais: Sul, Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste. ABr: Mas os movimentos sociais argumentam que ainda há uma demanda de 4,5 milhões de famílias que precisam ser assentadas. Hackbart: Esse é um dado antigo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). É uma estimativa boa, mas ninguém tem certeza. Se pegar o conceito de sem-terra e com pouca terra pode-se chegar a esse número. Mas é importante entender que são estimativas, senão a gente entra em uma matemática burra: 'são tantos milhões de famílias precisando de terra, vocês assentaram tantas e faltam outras tantas'. Não é assim. Em São Paulo, por exemplo, este ano, 2009/2010, uma parte da demanda por terra é o contingente demitido da indústria automobilística, as pessoas vão buscar alternativas. ABr: O senhor acredita que a onda de desemprego vai engrossar o MST? Hackbart: Vai engrossar o movimento ou criar outros; a demanda por terra vai aumentar em 2010. O aumento de recursos para ações rurais - o Incra, por exemplo, pagou R$ 1 bilhão de crédito aos assentados em 2008 - começa a gerar renda no interior. E atrai as pessoas. Isso já está acontecendo no Espírito Santo e no Rio Grande do Sul, por exemplo. ABr: E como o governo está se preparando para isso? Hackbart: Aumentando o número de assentamentos. Temos várias prioridades para esse período: acelerar o acesso à terra, e isso é uma questão polêmica porque tem gente que acha que não precisa mais, mas precisa sim, é preciso desconcentrar o uso e a propriedade e promover o acesso à terra a quem quer produzir. Segundo: desenvolver os assentamentos, e esse desafio é enorme, são 7 mil assentamentos em todo o país, 70 milhões de hectares onde vivem mais de 1 milhão de famílias. ABr: O que significa desenvolver os assentamentos? Hackbart: Gerar renda, preservar o meio ambiente, dar infra-estrutura básica e, o mais importante, inserir esses assentamentos na cadeia produtiva, senão eles ficam perdidos. E isso depende do Incra, mas também da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento], dos governos estaduais, das prefeituras, dos movimentos sociais, das entidades de pesquisa. O assentamento não é uma indústria, é uma comunidade em formação. Nossa outra prioridade é a regularização fundiária, com grande foco na Amazônia Legal. É dizer o que é terra pública, o que é privada, combater a grilagem e trazer para a legalidade quem for possível trazer. Com o documento, com a regularização, vai ter acesso a crédito, à assistência técnica. Nossa quarta prioridade é o meio ambiente. Existe desmatamento em áreas de assentamento e de agricultura familiar? Sim. Acabamos de fazer um estudo e vimos que está focado bem no Arco do Desmatamento, em 65 grandes assentamentos, no norte de Mato Grosso. ABr: E o que o Incra está fazendo em relação aos desmatamentos em áreas de reforma agrária? Hackbart: Estamos com diagnóstico feito e equipes em campo para tirar quem é ilegal. Ali tem muita soja e gado. Temos que retirar a ilegalidade e cumprir a legislação ambiental: recuperar a reserva legal, a área de proteção permanente. E, em alguns casos, acabar com os assentamentos, em vários casos, inclusive alguns entre os que foram listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). ABr: Em relação à retomada de assentamentos em áreas tradicionais. Qual o ganho dessa opção, já que o custo da terra é maior nessas regiões? Hackbart: O ganho é assentar as famílias acampadas; as famílias acampadas não estão no Norte. E nem sempre é mais caro. Um exemplo: desapropriamos uma propriedade no Rio Grande do Sul por R$ 30 milhões. Desses, R$ 27 milhões eram dívidas do proprietário com a União. O gasto efetivo foi de R$ 3 milhões. ABr: Quantas famílias o governo ainda pretende assentar até 2010? Hackbart: Os números ainda não estão totalmente definidos, mas giram em torno de 80 mil famílias por ano. Tão importante quanto os números é avançar nas regiões tradicionais, os movimentos cobram isso. ABr: O MST está completando 25 anos. Como o senhor avalia as críticas do MST ao desempenho do Incra na reforma agrária? Hackbart: Nós conversamos com todos os movimentos ligados à reforma agrária. Hoje, o centro da reforma agrária está em dois pontos: o acesso à terra e o desenvolvimento dos assentamentos. O grande desafio é mudar o modelo agrícola, fazer assentamento produzir e inseri-lo na cadeia produtiva. Nos 25 anos do MST há muito o que comemorar e há muitos desafios pela frente. O maior dos desafios é desenvolver os assentamentos, além do acesso à terra. O que eu não concordo é que o MST não reconhece o que nós já fizemos: assentamos muitas famílias, o crédito chegou, criamos condições para educação e desenvolvimento. Eu cito o Rio Grande do Sul, onde repassamos 23 mil hectares para assentamentos em 2008 e vamos repassar mais para a reforma agrária. Eles não reconhecem isso publicamente. ABr: Quando o senhor fala em mudança do modelo de desenvolvimento dos assentamentos o que isso significa na prática? Hackbart: A reforma agrária tem que contribuir para mudar o modelo de agricultura do país. E a partir dos biomas proteger o meio ambiente. O grande desafio do Incra é a recuperação de solo das áreas obtidas para a reforma agrária. Sempre precisamos investir muito para recuperar o solo. Temos que priorizar a produção de alimentos, no país ainda há fome. Tem que haver política de compra e mudanças no modelo tecnológico. Meu sonho é dizer não ao veneno e sim ao orgânico. ABr: Há espaço no mercado para esse tipo de produção? Hackbart: Há um espaço econômico. Aí a política pública é fundamental. Se eu conseguir fazer com que a Conab compre diferenciadamente esse produto (orgânico), haverá produtor. Além do acesso à terra, precisamos desenvolver outro tipo de agricultura. O desafio é ter escala para a produção desses alimentos orgânicos e canais de comercialização. ABr: O Incra vai ao Fórum Social Mundial para aprender ou levar experiência brasileira em reforma agrária? Hackbart: Nós vamos lá para nos defender, porque vamos levar muita crítica. ABr: De quem? Hackbart: Um caso concreto que vai chamar a atenção é o lote da Irmã Dorothy Stang. Nós retomamos o lote, estamos lá dentro, mas parte dele está grilado e o juiz local diz que o grileiro tem razão. Parte do mundo vai estar lá e vai a Anapu, no lote da irmã. Menos mal que o próprio Ministério Público do Pará está dizendo que quem está fazendo algum trabalho lá é o Incra. Também haverá um fórum em Parauapebas, onde está o Vale do Rio Doce, onde estará o João Pedro Stedile, a filha do Che Guevara e um grupo de pessoas que vão realizar manifestações.

A onda de desemprego, por causa da crise financeira internacional, deve engrossar as fileiras do movimento de reforma agrária e exigir um esforço ainda maior do governo para atender à demanda por terra. A avaliação é do presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart. Ele acredita que o fechamento de postos de trabalho nas cidades pode gerar um fluxo migratório rumo ao interior. "As pessoas vão buscar alternativas. Isso vai engrossar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra ou criar outro. A demanda por terra vai aumentar em 2009 e 2010", avaliou. Hackbart afirmou que o Incra começa 2009 com "um orçamento bom" e adiantou que o número de famílias assentadas em 2008 deve passar de 70 mil, superando as previsões dos movimentos sociais que consideraram o ano passado "o pior para a reforma agrária". Sobre a questão ambiental nos assentamentos, Hackbart reconheceu o desmatamento nessas áreas e afirmou que alguns assentamentos na Amazônia deverão ser fechados por causa das derrubadas e do uso ilegal da terra. "Estamos com diagnóstico feito e equipes em campo para tirar quem é ilegal. Ali tem muita soja e gado. Temos que retirar a ilegalidade e cumprir a legislação ambiental: recuperar a reserva legal, a área de proteção permanente. E, em alguns casos, acabar com os assentamentos, em vários casos, inclusive alguns entre os que foram listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis)", disse ele. Na entrevista, o presidente do Incra também falou sobre a relação entre o órgão e o MST no processo de reforma agrária do país ao longo de 25 anos do movimento. "Eles não reconhecem o que já fizemos", apontou. Leia a seguir os principais trechos da entrevista com Hackbart. Agência Brasil: Diante do cenário de crise, o orçamento do Incra vai ser mantido? Rolf Hackbart: Em 2003, o orçamento total do Incra foi R$ 1,3 bilhão. Vamos arrancar 2009 com orçamento total perto de R$ 3,5 bilhões. O que mudou com a crise é que os recursos do Orçamento Geral da União serão mais disputados, mais focados, mais seletivos. Vamos iniciar 2009 com um orçamento bom. Ao longo do ano sempre buscamos suplementação: R$ 1 bilhão para obtenção [de terras para reforma agrária], R$ 230 milhões para assistência técnica, R$ 70 milhões para proteção do meio ambiente. A disputa pela suplementação este ano vai ser acirrada, o Paulo Bernardo já sinalizou isso. ABr: O MST acredita que 2008 foi o "pior ano da reforma agrária", com a menor quantidade de famílias assentadas em um ano desde o início do governo Lula. Hackbart: Isso é uma avaliação deles. Nós empenhamos, em 2008, 99% do orçamento do Incra. Vamos superar 70 mil famílias assentadas em 2008 (duas mil a mais que em 2007). O problema é que cada movimento social avalia quantas dessas famílias são suas. Aí sim pode-se ter uma avaliação ruim. Nós assentamos, de 2003 para cá, cerca de 530 mil famílias e incorporamos cerca de 40 milhões de hectares à reforma agrária, com destaque para a retomada de terras públicas na Amazônia Legal, o combate à grilagem, a criação de assentamentos sustentáveis na Amazônia. Nosso grande desafio em 2009 é assentar famílias nas áreas tradicionais: Sul, Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste. ABr: Mas os movimentos sociais argumentam que ainda há uma demanda de 4,5 milhões de famílias que precisam ser assentadas. Hackbart: Esse é um dado antigo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). É uma estimativa boa, mas ninguém tem certeza. Se pegar o conceito de sem-terra e com pouca terra pode-se chegar a esse número. Mas é importante entender que são estimativas, senão a gente entra em uma matemática burra: 'são tantos milhões de famílias precisando de terra, vocês assentaram tantas e faltam outras tantas'. Não é assim. Em São Paulo, por exemplo, este ano, 2009/2010, uma parte da demanda por terra é o contingente demitido da indústria automobilística, as pessoas vão buscar alternativas. ABr: O senhor acredita que a onda de desemprego vai engrossar o MST? Hackbart: Vai engrossar o movimento ou criar outros; a demanda por terra vai aumentar em 2010. O aumento de recursos para ações rurais - o Incra, por exemplo, pagou R$ 1 bilhão de crédito aos assentados em 2008 - começa a gerar renda no interior. E atrai as pessoas. Isso já está acontecendo no Espírito Santo e no Rio Grande do Sul, por exemplo. ABr: E como o governo está se preparando para isso? Hackbart: Aumentando o número de assentamentos. Temos várias prioridades para esse período: acelerar o acesso à terra, e isso é uma questão polêmica porque tem gente que acha que não precisa mais, mas precisa sim, é preciso desconcentrar o uso e a propriedade e promover o acesso à terra a quem quer produzir. Segundo: desenvolver os assentamentos, e esse desafio é enorme, são 7 mil assentamentos em todo o país, 70 milhões de hectares onde vivem mais de 1 milhão de famílias. ABr: O que significa desenvolver os assentamentos? Hackbart: Gerar renda, preservar o meio ambiente, dar infra-estrutura básica e, o mais importante, inserir esses assentamentos na cadeia produtiva, senão eles ficam perdidos. E isso depende do Incra, mas também da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento], dos governos estaduais, das prefeituras, dos movimentos sociais, das entidades de pesquisa. O assentamento não é uma indústria, é uma comunidade em formação. Nossa outra prioridade é a regularização fundiária, com grande foco na Amazônia Legal. É dizer o que é terra pública, o que é privada, combater a grilagem e trazer para a legalidade quem for possível trazer. Com o documento, com a regularização, vai ter acesso a crédito, à assistência técnica. Nossa quarta prioridade é o meio ambiente. Existe desmatamento em áreas de assentamento e de agricultura familiar? Sim. Acabamos de fazer um estudo e vimos que está focado bem no Arco do Desmatamento, em 65 grandes assentamentos, no norte de Mato Grosso. ABr: E o que o Incra está fazendo em relação aos desmatamentos em áreas de reforma agrária? Hackbart: Estamos com diagnóstico feito e equipes em campo para tirar quem é ilegal. Ali tem muita soja e gado. Temos que retirar a ilegalidade e cumprir a legislação ambiental: recuperar a reserva legal, a área de proteção permanente. E, em alguns casos, acabar com os assentamentos, em vários casos, inclusive alguns entre os que foram listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). ABr: Em relação à retomada de assentamentos em áreas tradicionais. Qual o ganho dessa opção, já que o custo da terra é maior nessas regiões? Hackbart: O ganho é assentar as famílias acampadas; as famílias acampadas não estão no Norte. E nem sempre é mais caro. Um exemplo: desapropriamos uma propriedade no Rio Grande do Sul por R$ 30 milhões. Desses, R$ 27 milhões eram dívidas do proprietário com a União. O gasto efetivo foi de R$ 3 milhões. ABr: Quantas famílias o governo ainda pretende assentar até 2010? Hackbart: Os números ainda não estão totalmente definidos, mas giram em torno de 80 mil famílias por ano. Tão importante quanto os números é avançar nas regiões tradicionais, os movimentos cobram isso. ABr: O MST está completando 25 anos. Como o senhor avalia as críticas do MST ao desempenho do Incra na reforma agrária? Hackbart: Nós conversamos com todos os movimentos ligados à reforma agrária. Hoje, o centro da reforma agrária está em dois pontos: o acesso à terra e o desenvolvimento dos assentamentos. O grande desafio é mudar o modelo agrícola, fazer assentamento produzir e inseri-lo na cadeia produtiva. Nos 25 anos do MST há muito o que comemorar e há muitos desafios pela frente. O maior dos desafios é desenvolver os assentamentos, além do acesso à terra. O que eu não concordo é que o MST não reconhece o que nós já fizemos: assentamos muitas famílias, o crédito chegou, criamos condições para educação e desenvolvimento. Eu cito o Rio Grande do Sul, onde repassamos 23 mil hectares para assentamentos em 2008 e vamos repassar mais para a reforma agrária. Eles não reconhecem isso publicamente. ABr: Quando o senhor fala em mudança do modelo de desenvolvimento dos assentamentos o que isso significa na prática? Hackbart: A reforma agrária tem que contribuir para mudar o modelo de agricultura do país. E a partir dos biomas proteger o meio ambiente. O grande desafio do Incra é a recuperação de solo das áreas obtidas para a reforma agrária. Sempre precisamos investir muito para recuperar o solo. Temos que priorizar a produção de alimentos, no país ainda há fome. Tem que haver política de compra e mudanças no modelo tecnológico. Meu sonho é dizer não ao veneno e sim ao orgânico. ABr: Há espaço no mercado para esse tipo de produção? Hackbart: Há um espaço econômico. Aí a política pública é fundamental. Se eu conseguir fazer com que a Conab compre diferenciadamente esse produto (orgânico), haverá produtor. Além do acesso à terra, precisamos desenvolver outro tipo de agricultura. O desafio é ter escala para a produção desses alimentos orgânicos e canais de comercialização. ABr: O Incra vai ao Fórum Social Mundial para aprender ou levar experiência brasileira em reforma agrária? Hackbart: Nós vamos lá para nos defender, porque vamos levar muita crítica. ABr: De quem? Hackbart: Um caso concreto que vai chamar a atenção é o lote da Irmã Dorothy Stang. Nós retomamos o lote, estamos lá dentro, mas parte dele está grilado e o juiz local diz que o grileiro tem razão. Parte do mundo vai estar lá e vai a Anapu, no lote da irmã. Menos mal que o próprio Ministério Público do Pará está dizendo que quem está fazendo algum trabalho lá é o Incra. Também haverá um fórum em Parauapebas, onde está o Vale do Rio Doce, onde estará o João Pedro Stedile, a filha do Che Guevara e um grupo de pessoas que vão realizar manifestações.

A onda de desemprego, por causa da crise financeira internacional, deve engrossar as fileiras do movimento de reforma agrária e exigir um esforço ainda maior do governo para atender à demanda por terra. A avaliação é do presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart. Ele acredita que o fechamento de postos de trabalho nas cidades pode gerar um fluxo migratório rumo ao interior. "As pessoas vão buscar alternativas. Isso vai engrossar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra ou criar outro. A demanda por terra vai aumentar em 2009 e 2010", avaliou. Hackbart afirmou que o Incra começa 2009 com "um orçamento bom" e adiantou que o número de famílias assentadas em 2008 deve passar de 70 mil, superando as previsões dos movimentos sociais que consideraram o ano passado "o pior para a reforma agrária". Sobre a questão ambiental nos assentamentos, Hackbart reconheceu o desmatamento nessas áreas e afirmou que alguns assentamentos na Amazônia deverão ser fechados por causa das derrubadas e do uso ilegal da terra. "Estamos com diagnóstico feito e equipes em campo para tirar quem é ilegal. Ali tem muita soja e gado. Temos que retirar a ilegalidade e cumprir a legislação ambiental: recuperar a reserva legal, a área de proteção permanente. E, em alguns casos, acabar com os assentamentos, em vários casos, inclusive alguns entre os que foram listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis)", disse ele. Na entrevista, o presidente do Incra também falou sobre a relação entre o órgão e o MST no processo de reforma agrária do país ao longo de 25 anos do movimento. "Eles não reconhecem o que já fizemos", apontou. Leia a seguir os principais trechos da entrevista com Hackbart. Agência Brasil: Diante do cenário de crise, o orçamento do Incra vai ser mantido? Rolf Hackbart: Em 2003, o orçamento total do Incra foi R$ 1,3 bilhão. Vamos arrancar 2009 com orçamento total perto de R$ 3,5 bilhões. O que mudou com a crise é que os recursos do Orçamento Geral da União serão mais disputados, mais focados, mais seletivos. Vamos iniciar 2009 com um orçamento bom. Ao longo do ano sempre buscamos suplementação: R$ 1 bilhão para obtenção [de terras para reforma agrária], R$ 230 milhões para assistência técnica, R$ 70 milhões para proteção do meio ambiente. A disputa pela suplementação este ano vai ser acirrada, o Paulo Bernardo já sinalizou isso. ABr: O MST acredita que 2008 foi o "pior ano da reforma agrária", com a menor quantidade de famílias assentadas em um ano desde o início do governo Lula. Hackbart: Isso é uma avaliação deles. Nós empenhamos, em 2008, 99% do orçamento do Incra. Vamos superar 70 mil famílias assentadas em 2008 (duas mil a mais que em 2007). O problema é que cada movimento social avalia quantas dessas famílias são suas. Aí sim pode-se ter uma avaliação ruim. Nós assentamos, de 2003 para cá, cerca de 530 mil famílias e incorporamos cerca de 40 milhões de hectares à reforma agrária, com destaque para a retomada de terras públicas na Amazônia Legal, o combate à grilagem, a criação de assentamentos sustentáveis na Amazônia. Nosso grande desafio em 2009 é assentar famílias nas áreas tradicionais: Sul, Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste. ABr: Mas os movimentos sociais argumentam que ainda há uma demanda de 4,5 milhões de famílias que precisam ser assentadas. Hackbart: Esse é um dado antigo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). É uma estimativa boa, mas ninguém tem certeza. Se pegar o conceito de sem-terra e com pouca terra pode-se chegar a esse número. Mas é importante entender que são estimativas, senão a gente entra em uma matemática burra: 'são tantos milhões de famílias precisando de terra, vocês assentaram tantas e faltam outras tantas'. Não é assim. Em São Paulo, por exemplo, este ano, 2009/2010, uma parte da demanda por terra é o contingente demitido da indústria automobilística, as pessoas vão buscar alternativas. ABr: O senhor acredita que a onda de desemprego vai engrossar o MST? Hackbart: Vai engrossar o movimento ou criar outros; a demanda por terra vai aumentar em 2010. O aumento de recursos para ações rurais - o Incra, por exemplo, pagou R$ 1 bilhão de crédito aos assentados em 2008 - começa a gerar renda no interior. E atrai as pessoas. Isso já está acontecendo no Espírito Santo e no Rio Grande do Sul, por exemplo. ABr: E como o governo está se preparando para isso? Hackbart: Aumentando o número de assentamentos. Temos várias prioridades para esse período: acelerar o acesso à terra, e isso é uma questão polêmica porque tem gente que acha que não precisa mais, mas precisa sim, é preciso desconcentrar o uso e a propriedade e promover o acesso à terra a quem quer produzir. Segundo: desenvolver os assentamentos, e esse desafio é enorme, são 7 mil assentamentos em todo o país, 70 milhões de hectares onde vivem mais de 1 milhão de famílias. ABr: O que significa desenvolver os assentamentos? Hackbart: Gerar renda, preservar o meio ambiente, dar infra-estrutura básica e, o mais importante, inserir esses assentamentos na cadeia produtiva, senão eles ficam perdidos. E isso depende do Incra, mas também da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento], dos governos estaduais, das prefeituras, dos movimentos sociais, das entidades de pesquisa. O assentamento não é uma indústria, é uma comunidade em formação. Nossa outra prioridade é a regularização fundiária, com grande foco na Amazônia Legal. É dizer o que é terra pública, o que é privada, combater a grilagem e trazer para a legalidade quem for possível trazer. Com o documento, com a regularização, vai ter acesso a crédito, à assistência técnica. Nossa quarta prioridade é o meio ambiente. Existe desmatamento em áreas de assentamento e de agricultura familiar? Sim. Acabamos de fazer um estudo e vimos que está focado bem no Arco do Desmatamento, em 65 grandes assentamentos, no norte de Mato Grosso. ABr: E o que o Incra está fazendo em relação aos desmatamentos em áreas de reforma agrária? Hackbart: Estamos com diagnóstico feito e equipes em campo para tirar quem é ilegal. Ali tem muita soja e gado. Temos que retirar a ilegalidade e cumprir a legislação ambiental: recuperar a reserva legal, a área de proteção permanente. E, em alguns casos, acabar com os assentamentos, em vários casos, inclusive alguns entre os que foram listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). ABr: Em relação à retomada de assentamentos em áreas tradicionais. Qual o ganho dessa opção, já que o custo da terra é maior nessas regiões? Hackbart: O ganho é assentar as famílias acampadas; as famílias acampadas não estão no Norte. E nem sempre é mais caro. Um exemplo: desapropriamos uma propriedade no Rio Grande do Sul por R$ 30 milhões. Desses, R$ 27 milhões eram dívidas do proprietário com a União. O gasto efetivo foi de R$ 3 milhões. ABr: Quantas famílias o governo ainda pretende assentar até 2010? Hackbart: Os números ainda não estão totalmente definidos, mas giram em torno de 80 mil famílias por ano. Tão importante quanto os números é avançar nas regiões tradicionais, os movimentos cobram isso. ABr: O MST está completando 25 anos. Como o senhor avalia as críticas do MST ao desempenho do Incra na reforma agrária? Hackbart: Nós conversamos com todos os movimentos ligados à reforma agrária. Hoje, o centro da reforma agrária está em dois pontos: o acesso à terra e o desenvolvimento dos assentamentos. O grande desafio é mudar o modelo agrícola, fazer assentamento produzir e inseri-lo na cadeia produtiva. Nos 25 anos do MST há muito o que comemorar e há muitos desafios pela frente. O maior dos desafios é desenvolver os assentamentos, além do acesso à terra. O que eu não concordo é que o MST não reconhece o que nós já fizemos: assentamos muitas famílias, o crédito chegou, criamos condições para educação e desenvolvimento. Eu cito o Rio Grande do Sul, onde repassamos 23 mil hectares para assentamentos em 2008 e vamos repassar mais para a reforma agrária. Eles não reconhecem isso publicamente. ABr: Quando o senhor fala em mudança do modelo de desenvolvimento dos assentamentos o que isso significa na prática? Hackbart: A reforma agrária tem que contribuir para mudar o modelo de agricultura do país. E a partir dos biomas proteger o meio ambiente. O grande desafio do Incra é a recuperação de solo das áreas obtidas para a reforma agrária. Sempre precisamos investir muito para recuperar o solo. Temos que priorizar a produção de alimentos, no país ainda há fome. Tem que haver política de compra e mudanças no modelo tecnológico. Meu sonho é dizer não ao veneno e sim ao orgânico. ABr: Há espaço no mercado para esse tipo de produção? Hackbart: Há um espaço econômico. Aí a política pública é fundamental. Se eu conseguir fazer com que a Conab compre diferenciadamente esse produto (orgânico), haverá produtor. Além do acesso à terra, precisamos desenvolver outro tipo de agricultura. O desafio é ter escala para a produção desses alimentos orgânicos e canais de comercialização. ABr: O Incra vai ao Fórum Social Mundial para aprender ou levar experiência brasileira em reforma agrária? Hackbart: Nós vamos lá para nos defender, porque vamos levar muita crítica. ABr: De quem? Hackbart: Um caso concreto que vai chamar a atenção é o lote da Irmã Dorothy Stang. Nós retomamos o lote, estamos lá dentro, mas parte dele está grilado e o juiz local diz que o grileiro tem razão. Parte do mundo vai estar lá e vai a Anapu, no lote da irmã. Menos mal que o próprio Ministério Público do Pará está dizendo que quem está fazendo algum trabalho lá é o Incra. Também haverá um fórum em Parauapebas, onde está o Vale do Rio Doce, onde estará o João Pedro Stedile, a filha do Che Guevara e um grupo de pessoas que vão realizar manifestações.

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