O PMDB poderia perfeitamente ter esperado a virada do ano para deflagrar o processo de sucessão na presidência da Câmara, que normalmente ocorre nas últimas semanas de janeiro, pouco antes da escolha no início de fevereiro.Mas, a exemplo do que fez Lula com a candidatura de Dilma Rousseff à reeleição, o partido resolveu antecipar o lançamento o líder da bancada, Eduardo Cunha, a fim de demarcar terreno, ocupar espaço e mandar à presidente o seguinte recado: seja qual for o perfil predominante no colegiado dos deputados eleitos, o PMDB não pretende que o comando da Câmara seja submisso às orientações do Palácio do Planalto. Isso não deve se confundir com a pretensão do Poder Legislativo de se impor ou viver em confronto permanente com o Executivo. A ideia é justamente recuperar o conceito de equilíbrio entre os Poderes da República, aproveitando o momento em que essa paridade se refletiu no resultado das urnas e que o PT não sai da eleição com a mesma força avassaladora de antes.A figura do deputado Eduardo Cunha talvez não seja a ideal do ponto de vista da opinião pública, mas sob a ótica dos deputados pemedebistas é quem melhor representa uma posição ao mesmo tempo de enfrentamento latente e negociação quando conveniente. O poder dele emana do apoio da bancada, não de sustentação do governo. Ao contrário. No ano passado a presidente entrou em embate direto com ele, tentou isolá-lo na Câmara e perdeu a parada.Dilma mostrou inexperiência, pois um presidente não se confronta com um deputado, muito menos para ficar em desvantagem. Cunha também é do PMDB fluminense, a seção regional que se posicionou na convenção mais claramente contrária à renovação da aliança com o PT pela reeleição.Já na noite de domingo assim que saiu o resultado da eleição Eduardo Cunha sem assumir a candidatura - como convém ao nome do jogo nessa altura - ressaltava o impacto do escândalo da Petrobrás no próximo ano, recebia com descrédito a proposta da presidente ao "diálogo" e apontava o PT é quem dá o "tom" do clima entre os aliados.Referia-se, na ocasião, às derrotas de líderes do PMDB muito próximos do Planalto em disputas para governos de Estados: Eunício Oliveira (CE), Eduardo Braga (AM) e Henrique Eduardo Alves (RN). Os adversários de todos eles ajudados pelo PT ou aliados. Lembrava que os candidatos mais distantes do governo haviam se saído melhor.O campo não estaria tão minado se o PMDB estivesse sozinho nessa atitude mais ofensiva. No momento é o PT quem se encontra mais perto das cordas. Por isso mesmo o Planalto reconhece a urgência de reorganizar toda sua articulação política. O próprio líder na Câmara, Arlindo Chinaglia, admite a necessidade. Para ele o erro central foi a quase inexistência de interlocução entre o Palácio e sua base, principalmente as lideranças do PT, no Congresso.Mas as medidas de ajuste vão além. Se quiser recuperar terreno o governo vai precisar adaptar seu modo de agir ao tempo de estio nos quesitos popularidade e força política. Desde que assumiu o poder o PT estava acostumado a falar sozinho. Primeiro por meio dos monólogos de Lula e depois pelos modos ariscos de Dilma.Isso sem contar a arrogância de um partido que se pretendia hegemônico, proprietário do monopólio do bem estar social e imbuído da certeza de que as opiniões contrárias na sociedade seriam eternamente residuais. Já há algum tempo o vento sopra de outra forma, mas o governo vem se enganando, arrumando desculpas, evitando olhar as coisas como elas são.Gastou tanto capital que perdeu o crédito de confiança. Prova é o ceticismo com que foi recebida a mão estendida da presidente. Agora vai precisar reaprender a jogar, construir convergências, lidar com as divergências, enfim, reconhecer que não inventou nem é dono do Brasil.
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