Só 1/3 de novas vagas de graduação vai para áreas prioritárias do Mais Médicos


Além de levar profissionais a regiões mais afastadas, programa previa abrir 11,4 mil postos de graduação com foco em cidades do interior sem escola médica

Por Fabiana Cambricoli e Luiz Fernando Toledo
'Para minha família, seria inviável pagar mensalidade', afirma universitária Foto: Gabriela Bilo/Estadão

Contrariando o objetivo do Mais Médicos de levar faculdades de Medicina a cidades do interior do País que não tivessem nenhum curso do tipo, só 30% das vagas abertas desde 2013, quando o programa começou, ficam nos municípios prioritários, ou seja, que não possuíam escolas médicas anteriormente.

Os dados, obtidos pelo Estado com o Ministério da Educação (MEC), mostram ainda que a concentração dos cursos nas regiões mais ricas do País se manteve: 56% das vagas criadas estão em instituições de ensino do Sul e do Sudeste.

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O aumento das vagas também não facilitou o acesso de estudantes mais pobres à graduação de Medicina: 83% dos postos criados no período estão em universidades privadas, que cobram pelo menos R$ 6 mil de mensalidade.

De acordo com a lei que criou o Mais Médicos, a contratação emergencial de profissionais brasileiros e estrangeiros (como os cubanos) para atuar nas áreas mais pobres do País era uma medida paliativa até que novos médicos, com uma formação mais focada em Medicina da Família, se graduassem e ocupassem essas vagas.

Para isso, o governo federal estipulou a meta de criar 11.400 vagas de graduação em Medicina entre 2013 e 2017, com foco em cidades do interior que ainda não tivessem faculdade médica. A meta quantitativa foi alcançada: desde 2013 até agora, o MEC autorizou 13.624 novas vagas, incluindo as de novos cursos e as adicionadas em escolas já existentes. Apenas 2.747 (20%) delas, no entanto, seguem todos os critérios dos editais abertos dentro do programa Mais Médicos.

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Mesmo cursos criados em cidades que atendiam à regra do Mais Médicos de não possuir faculdade de Medicina ficaram, em parte, concentrados em municípios próximos dos grandes centros. Em São Paulo, por exemplo, foram autorizadas centenas de vagas em cidades da região metropolitana, como Osasco e Guarulhos, o que faz com que estudantes do interior continuem tendo de migrar para cursar a graduação.

Foi o caso da jovem Rafaela Gomes, de 22 anos. Moradora de Guaíra, município paulista a 450 quilômetros da capital, ela teve de se mudar para Osasco para cursar Medicina. “Até tem alguns cursos na região de Barretos, perto da minha cidade, mas são poucos e não passei no vestibular lá”, conta ela. Para Jadete Barbosa Lampert, coordenadora da Comissão de Avaliação das Escolas de Saúde da Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), as vagas acabam concentradas em áreas que já tinham cursos de Medicina por falta de estrutura de outras localidades. “O aumento de vagas extrapolou o planejamento. Não tinha como abrir esse número de vagas em locais sem estrutura de atendimento médico, sem um corpo docente qualificado”, diz ela, que relata ainda preocupação com a qualidade das faculdades abertas. “Com certeza tem muitas falhas”, afirma.

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Já o diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Sólon Caldas, diz que todos os editais abertos pelo MEC para a abertura de vagas pelo Mais Médicos tiveram amplo interesse das universidades. “As instituições de ensino queriam abrir mais vagas, mas quem define os municípios é o MEC”, diz ele.Resposta. Questionado, o MEC afirmou que os dados mostram que “houve ampliação na rede de ensino de Medicina para cidades com instituições de ensino superior aptas a receberem o curso, bem como de residência em Medicina da Família, como havia sido proposto pela Lei do Mais Médicos”.Para chegar ao fim, só com Fies e ajuda familiar Desde que decidiu prestar Medicina, Ana Luisa Resende, de 21 anos, já sabia que só poderia seguir a carreira se passasse em uma universidade pública. “Para minha família, seria inviável pagar a mensalidade de um curso particular, que fica entre R$ 7 mil e R$ 8 mil”, conta ela. Foram dois anos e meio de cursinho, mas a aprovação nas concorridas universidades estaduais e federais não vinha. “Daí eu fiquei sabendo que ia abrir um curso novo, particular, em Osasco (SP). Como minha mãe trabalha aqui, decidi prestar o vestibular”, diz ela, referindo-se a um dos novos cursos autorizados por meio da Lei do Mais Médicos. No meio de 2017, foi aprovada e, com a ajuda da família e do programa de Financiamento Estudantil (Fies), conseguiu iniciar o curso. “No primeiro semestre, meu pai ‘se virou do avesso’ para conseguir pagar e, logo em seguida, consegui o Fies”, conta.  Ela lamenta que as universidades públicas não tenham aberto tantas vagas, possibilitando o ingresso de mais estudantes, mas elogia o fato de seu curso particular já dar prioridade ao atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). “Toda semana temos aula em uma Unidade Básica de Saúde. Também há um grande foco em atenção primária e Medicina da Família”, relata a jovem, que pretende atuar na rede pública quando se formar. Estudante de uma universidade particular de João Pessoa que teve aumento de vagas de Medicina por causa da lei do Mais Médicos, Tainá Rolim, de 23 anos, também depende do Fies para cursar a graduação, cujo valor da mensalidade chega a R$ 8 mil. “Cheguei a fazer duas provas do Enem, em 2013 e 2014, quando já havia passado na particular. Tentei na UPE (Universidade de Pernambuco) e na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), mas não passei”, diz a jovem, que, agora, está a apenas um ano e meio de se formar.Bom exemplo Mas também existem casos de quem conseguiu cumprir de forma exemplar a proposta inicial do Mais Médicos. No Rio Grande do Norte, a Escola Multicampi de Ciências Médicas da Universidade Federal do Estado (UFRN) foi inaugurada em Caicó, a 280 quilômetros de Natal, implementando um modelo inédito: com três câmpus interligados em cidades distintas. O modelo atrai candidatos de diferentes partes do País. “O curso acaba mostrando que você pode ser bem-sucedido em um lugar pequeno”, afirma o estudante Leonardo Almeida, de 23 anos, que migrou de Itapirapuã Paulista (SP).Para Lembrar Uma portaria assinada em abril pelo presidente Michel Temer suspendeu por cinco anos a criação de cursos de Medicina em todo o País. A regra vale para instituições públicas federais, estaduais e municipais e privadas. Também está suspensa a ampliação de programas já existentes. O então ministro Mendonça Filho alegou já ter ocorrido expansão de cursos por todo o País e a necessidade de se avaliar o que foi instituído./COLABOROU RICARDO ARAÚJO e BETO PESSOA, ESPECIAIS PARA O ESTADO

'Para minha família, seria inviável pagar mensalidade', afirma universitária Foto: Gabriela Bilo/Estadão

Contrariando o objetivo do Mais Médicos de levar faculdades de Medicina a cidades do interior do País que não tivessem nenhum curso do tipo, só 30% das vagas abertas desde 2013, quando o programa começou, ficam nos municípios prioritários, ou seja, que não possuíam escolas médicas anteriormente.

Os dados, obtidos pelo Estado com o Ministério da Educação (MEC), mostram ainda que a concentração dos cursos nas regiões mais ricas do País se manteve: 56% das vagas criadas estão em instituições de ensino do Sul e do Sudeste.

O aumento das vagas também não facilitou o acesso de estudantes mais pobres à graduação de Medicina: 83% dos postos criados no período estão em universidades privadas, que cobram pelo menos R$ 6 mil de mensalidade.

De acordo com a lei que criou o Mais Médicos, a contratação emergencial de profissionais brasileiros e estrangeiros (como os cubanos) para atuar nas áreas mais pobres do País era uma medida paliativa até que novos médicos, com uma formação mais focada em Medicina da Família, se graduassem e ocupassem essas vagas.

Para isso, o governo federal estipulou a meta de criar 11.400 vagas de graduação em Medicina entre 2013 e 2017, com foco em cidades do interior que ainda não tivessem faculdade médica. A meta quantitativa foi alcançada: desde 2013 até agora, o MEC autorizou 13.624 novas vagas, incluindo as de novos cursos e as adicionadas em escolas já existentes. Apenas 2.747 (20%) delas, no entanto, seguem todos os critérios dos editais abertos dentro do programa Mais Médicos.

Mesmo cursos criados em cidades que atendiam à regra do Mais Médicos de não possuir faculdade de Medicina ficaram, em parte, concentrados em municípios próximos dos grandes centros. Em São Paulo, por exemplo, foram autorizadas centenas de vagas em cidades da região metropolitana, como Osasco e Guarulhos, o que faz com que estudantes do interior continuem tendo de migrar para cursar a graduação.

Foi o caso da jovem Rafaela Gomes, de 22 anos. Moradora de Guaíra, município paulista a 450 quilômetros da capital, ela teve de se mudar para Osasco para cursar Medicina. “Até tem alguns cursos na região de Barretos, perto da minha cidade, mas são poucos e não passei no vestibular lá”, conta ela. Para Jadete Barbosa Lampert, coordenadora da Comissão de Avaliação das Escolas de Saúde da Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), as vagas acabam concentradas em áreas que já tinham cursos de Medicina por falta de estrutura de outras localidades. “O aumento de vagas extrapolou o planejamento. Não tinha como abrir esse número de vagas em locais sem estrutura de atendimento médico, sem um corpo docente qualificado”, diz ela, que relata ainda preocupação com a qualidade das faculdades abertas. “Com certeza tem muitas falhas”, afirma.

Já o diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Sólon Caldas, diz que todos os editais abertos pelo MEC para a abertura de vagas pelo Mais Médicos tiveram amplo interesse das universidades. “As instituições de ensino queriam abrir mais vagas, mas quem define os municípios é o MEC”, diz ele.Resposta. Questionado, o MEC afirmou que os dados mostram que “houve ampliação na rede de ensino de Medicina para cidades com instituições de ensino superior aptas a receberem o curso, bem como de residência em Medicina da Família, como havia sido proposto pela Lei do Mais Médicos”.Para chegar ao fim, só com Fies e ajuda familiar Desde que decidiu prestar Medicina, Ana Luisa Resende, de 21 anos, já sabia que só poderia seguir a carreira se passasse em uma universidade pública. “Para minha família, seria inviável pagar a mensalidade de um curso particular, que fica entre R$ 7 mil e R$ 8 mil”, conta ela. Foram dois anos e meio de cursinho, mas a aprovação nas concorridas universidades estaduais e federais não vinha. “Daí eu fiquei sabendo que ia abrir um curso novo, particular, em Osasco (SP). Como minha mãe trabalha aqui, decidi prestar o vestibular”, diz ela, referindo-se a um dos novos cursos autorizados por meio da Lei do Mais Médicos. No meio de 2017, foi aprovada e, com a ajuda da família e do programa de Financiamento Estudantil (Fies), conseguiu iniciar o curso. “No primeiro semestre, meu pai ‘se virou do avesso’ para conseguir pagar e, logo em seguida, consegui o Fies”, conta.  Ela lamenta que as universidades públicas não tenham aberto tantas vagas, possibilitando o ingresso de mais estudantes, mas elogia o fato de seu curso particular já dar prioridade ao atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). “Toda semana temos aula em uma Unidade Básica de Saúde. Também há um grande foco em atenção primária e Medicina da Família”, relata a jovem, que pretende atuar na rede pública quando se formar. Estudante de uma universidade particular de João Pessoa que teve aumento de vagas de Medicina por causa da lei do Mais Médicos, Tainá Rolim, de 23 anos, também depende do Fies para cursar a graduação, cujo valor da mensalidade chega a R$ 8 mil. “Cheguei a fazer duas provas do Enem, em 2013 e 2014, quando já havia passado na particular. Tentei na UPE (Universidade de Pernambuco) e na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), mas não passei”, diz a jovem, que, agora, está a apenas um ano e meio de se formar.Bom exemplo Mas também existem casos de quem conseguiu cumprir de forma exemplar a proposta inicial do Mais Médicos. No Rio Grande do Norte, a Escola Multicampi de Ciências Médicas da Universidade Federal do Estado (UFRN) foi inaugurada em Caicó, a 280 quilômetros de Natal, implementando um modelo inédito: com três câmpus interligados em cidades distintas. O modelo atrai candidatos de diferentes partes do País. “O curso acaba mostrando que você pode ser bem-sucedido em um lugar pequeno”, afirma o estudante Leonardo Almeida, de 23 anos, que migrou de Itapirapuã Paulista (SP).Para Lembrar Uma portaria assinada em abril pelo presidente Michel Temer suspendeu por cinco anos a criação de cursos de Medicina em todo o País. A regra vale para instituições públicas federais, estaduais e municipais e privadas. Também está suspensa a ampliação de programas já existentes. O então ministro Mendonça Filho alegou já ter ocorrido expansão de cursos por todo o País e a necessidade de se avaliar o que foi instituído./COLABOROU RICARDO ARAÚJO e BETO PESSOA, ESPECIAIS PARA O ESTADO

'Para minha família, seria inviável pagar mensalidade', afirma universitária Foto: Gabriela Bilo/Estadão

Contrariando o objetivo do Mais Médicos de levar faculdades de Medicina a cidades do interior do País que não tivessem nenhum curso do tipo, só 30% das vagas abertas desde 2013, quando o programa começou, ficam nos municípios prioritários, ou seja, que não possuíam escolas médicas anteriormente.

Os dados, obtidos pelo Estado com o Ministério da Educação (MEC), mostram ainda que a concentração dos cursos nas regiões mais ricas do País se manteve: 56% das vagas criadas estão em instituições de ensino do Sul e do Sudeste.

O aumento das vagas também não facilitou o acesso de estudantes mais pobres à graduação de Medicina: 83% dos postos criados no período estão em universidades privadas, que cobram pelo menos R$ 6 mil de mensalidade.

De acordo com a lei que criou o Mais Médicos, a contratação emergencial de profissionais brasileiros e estrangeiros (como os cubanos) para atuar nas áreas mais pobres do País era uma medida paliativa até que novos médicos, com uma formação mais focada em Medicina da Família, se graduassem e ocupassem essas vagas.

Para isso, o governo federal estipulou a meta de criar 11.400 vagas de graduação em Medicina entre 2013 e 2017, com foco em cidades do interior que ainda não tivessem faculdade médica. A meta quantitativa foi alcançada: desde 2013 até agora, o MEC autorizou 13.624 novas vagas, incluindo as de novos cursos e as adicionadas em escolas já existentes. Apenas 2.747 (20%) delas, no entanto, seguem todos os critérios dos editais abertos dentro do programa Mais Médicos.

Mesmo cursos criados em cidades que atendiam à regra do Mais Médicos de não possuir faculdade de Medicina ficaram, em parte, concentrados em municípios próximos dos grandes centros. Em São Paulo, por exemplo, foram autorizadas centenas de vagas em cidades da região metropolitana, como Osasco e Guarulhos, o que faz com que estudantes do interior continuem tendo de migrar para cursar a graduação.

Foi o caso da jovem Rafaela Gomes, de 22 anos. Moradora de Guaíra, município paulista a 450 quilômetros da capital, ela teve de se mudar para Osasco para cursar Medicina. “Até tem alguns cursos na região de Barretos, perto da minha cidade, mas são poucos e não passei no vestibular lá”, conta ela. Para Jadete Barbosa Lampert, coordenadora da Comissão de Avaliação das Escolas de Saúde da Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), as vagas acabam concentradas em áreas que já tinham cursos de Medicina por falta de estrutura de outras localidades. “O aumento de vagas extrapolou o planejamento. Não tinha como abrir esse número de vagas em locais sem estrutura de atendimento médico, sem um corpo docente qualificado”, diz ela, que relata ainda preocupação com a qualidade das faculdades abertas. “Com certeza tem muitas falhas”, afirma.

Já o diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Sólon Caldas, diz que todos os editais abertos pelo MEC para a abertura de vagas pelo Mais Médicos tiveram amplo interesse das universidades. “As instituições de ensino queriam abrir mais vagas, mas quem define os municípios é o MEC”, diz ele.Resposta. Questionado, o MEC afirmou que os dados mostram que “houve ampliação na rede de ensino de Medicina para cidades com instituições de ensino superior aptas a receberem o curso, bem como de residência em Medicina da Família, como havia sido proposto pela Lei do Mais Médicos”.Para chegar ao fim, só com Fies e ajuda familiar Desde que decidiu prestar Medicina, Ana Luisa Resende, de 21 anos, já sabia que só poderia seguir a carreira se passasse em uma universidade pública. “Para minha família, seria inviável pagar a mensalidade de um curso particular, que fica entre R$ 7 mil e R$ 8 mil”, conta ela. Foram dois anos e meio de cursinho, mas a aprovação nas concorridas universidades estaduais e federais não vinha. “Daí eu fiquei sabendo que ia abrir um curso novo, particular, em Osasco (SP). Como minha mãe trabalha aqui, decidi prestar o vestibular”, diz ela, referindo-se a um dos novos cursos autorizados por meio da Lei do Mais Médicos. No meio de 2017, foi aprovada e, com a ajuda da família e do programa de Financiamento Estudantil (Fies), conseguiu iniciar o curso. “No primeiro semestre, meu pai ‘se virou do avesso’ para conseguir pagar e, logo em seguida, consegui o Fies”, conta.  Ela lamenta que as universidades públicas não tenham aberto tantas vagas, possibilitando o ingresso de mais estudantes, mas elogia o fato de seu curso particular já dar prioridade ao atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). “Toda semana temos aula em uma Unidade Básica de Saúde. Também há um grande foco em atenção primária e Medicina da Família”, relata a jovem, que pretende atuar na rede pública quando se formar. Estudante de uma universidade particular de João Pessoa que teve aumento de vagas de Medicina por causa da lei do Mais Médicos, Tainá Rolim, de 23 anos, também depende do Fies para cursar a graduação, cujo valor da mensalidade chega a R$ 8 mil. “Cheguei a fazer duas provas do Enem, em 2013 e 2014, quando já havia passado na particular. Tentei na UPE (Universidade de Pernambuco) e na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), mas não passei”, diz a jovem, que, agora, está a apenas um ano e meio de se formar.Bom exemplo Mas também existem casos de quem conseguiu cumprir de forma exemplar a proposta inicial do Mais Médicos. No Rio Grande do Norte, a Escola Multicampi de Ciências Médicas da Universidade Federal do Estado (UFRN) foi inaugurada em Caicó, a 280 quilômetros de Natal, implementando um modelo inédito: com três câmpus interligados em cidades distintas. O modelo atrai candidatos de diferentes partes do País. “O curso acaba mostrando que você pode ser bem-sucedido em um lugar pequeno”, afirma o estudante Leonardo Almeida, de 23 anos, que migrou de Itapirapuã Paulista (SP).Para Lembrar Uma portaria assinada em abril pelo presidente Michel Temer suspendeu por cinco anos a criação de cursos de Medicina em todo o País. A regra vale para instituições públicas federais, estaduais e municipais e privadas. Também está suspensa a ampliação de programas já existentes. O então ministro Mendonça Filho alegou já ter ocorrido expansão de cursos por todo o País e a necessidade de se avaliar o que foi instituído./COLABOROU RICARDO ARAÚJO e BETO PESSOA, ESPECIAIS PARA O ESTADO

'Para minha família, seria inviável pagar mensalidade', afirma universitária Foto: Gabriela Bilo/Estadão

Contrariando o objetivo do Mais Médicos de levar faculdades de Medicina a cidades do interior do País que não tivessem nenhum curso do tipo, só 30% das vagas abertas desde 2013, quando o programa começou, ficam nos municípios prioritários, ou seja, que não possuíam escolas médicas anteriormente.

Os dados, obtidos pelo Estado com o Ministério da Educação (MEC), mostram ainda que a concentração dos cursos nas regiões mais ricas do País se manteve: 56% das vagas criadas estão em instituições de ensino do Sul e do Sudeste.

O aumento das vagas também não facilitou o acesso de estudantes mais pobres à graduação de Medicina: 83% dos postos criados no período estão em universidades privadas, que cobram pelo menos R$ 6 mil de mensalidade.

De acordo com a lei que criou o Mais Médicos, a contratação emergencial de profissionais brasileiros e estrangeiros (como os cubanos) para atuar nas áreas mais pobres do País era uma medida paliativa até que novos médicos, com uma formação mais focada em Medicina da Família, se graduassem e ocupassem essas vagas.

Para isso, o governo federal estipulou a meta de criar 11.400 vagas de graduação em Medicina entre 2013 e 2017, com foco em cidades do interior que ainda não tivessem faculdade médica. A meta quantitativa foi alcançada: desde 2013 até agora, o MEC autorizou 13.624 novas vagas, incluindo as de novos cursos e as adicionadas em escolas já existentes. Apenas 2.747 (20%) delas, no entanto, seguem todos os critérios dos editais abertos dentro do programa Mais Médicos.

Mesmo cursos criados em cidades que atendiam à regra do Mais Médicos de não possuir faculdade de Medicina ficaram, em parte, concentrados em municípios próximos dos grandes centros. Em São Paulo, por exemplo, foram autorizadas centenas de vagas em cidades da região metropolitana, como Osasco e Guarulhos, o que faz com que estudantes do interior continuem tendo de migrar para cursar a graduação.

Foi o caso da jovem Rafaela Gomes, de 22 anos. Moradora de Guaíra, município paulista a 450 quilômetros da capital, ela teve de se mudar para Osasco para cursar Medicina. “Até tem alguns cursos na região de Barretos, perto da minha cidade, mas são poucos e não passei no vestibular lá”, conta ela. Para Jadete Barbosa Lampert, coordenadora da Comissão de Avaliação das Escolas de Saúde da Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), as vagas acabam concentradas em áreas que já tinham cursos de Medicina por falta de estrutura de outras localidades. “O aumento de vagas extrapolou o planejamento. Não tinha como abrir esse número de vagas em locais sem estrutura de atendimento médico, sem um corpo docente qualificado”, diz ela, que relata ainda preocupação com a qualidade das faculdades abertas. “Com certeza tem muitas falhas”, afirma.

Já o diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Sólon Caldas, diz que todos os editais abertos pelo MEC para a abertura de vagas pelo Mais Médicos tiveram amplo interesse das universidades. “As instituições de ensino queriam abrir mais vagas, mas quem define os municípios é o MEC”, diz ele.Resposta. Questionado, o MEC afirmou que os dados mostram que “houve ampliação na rede de ensino de Medicina para cidades com instituições de ensino superior aptas a receberem o curso, bem como de residência em Medicina da Família, como havia sido proposto pela Lei do Mais Médicos”.Para chegar ao fim, só com Fies e ajuda familiar Desde que decidiu prestar Medicina, Ana Luisa Resende, de 21 anos, já sabia que só poderia seguir a carreira se passasse em uma universidade pública. “Para minha família, seria inviável pagar a mensalidade de um curso particular, que fica entre R$ 7 mil e R$ 8 mil”, conta ela. Foram dois anos e meio de cursinho, mas a aprovação nas concorridas universidades estaduais e federais não vinha. “Daí eu fiquei sabendo que ia abrir um curso novo, particular, em Osasco (SP). Como minha mãe trabalha aqui, decidi prestar o vestibular”, diz ela, referindo-se a um dos novos cursos autorizados por meio da Lei do Mais Médicos. No meio de 2017, foi aprovada e, com a ajuda da família e do programa de Financiamento Estudantil (Fies), conseguiu iniciar o curso. “No primeiro semestre, meu pai ‘se virou do avesso’ para conseguir pagar e, logo em seguida, consegui o Fies”, conta.  Ela lamenta que as universidades públicas não tenham aberto tantas vagas, possibilitando o ingresso de mais estudantes, mas elogia o fato de seu curso particular já dar prioridade ao atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). “Toda semana temos aula em uma Unidade Básica de Saúde. Também há um grande foco em atenção primária e Medicina da Família”, relata a jovem, que pretende atuar na rede pública quando se formar. Estudante de uma universidade particular de João Pessoa que teve aumento de vagas de Medicina por causa da lei do Mais Médicos, Tainá Rolim, de 23 anos, também depende do Fies para cursar a graduação, cujo valor da mensalidade chega a R$ 8 mil. “Cheguei a fazer duas provas do Enem, em 2013 e 2014, quando já havia passado na particular. Tentei na UPE (Universidade de Pernambuco) e na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), mas não passei”, diz a jovem, que, agora, está a apenas um ano e meio de se formar.Bom exemplo Mas também existem casos de quem conseguiu cumprir de forma exemplar a proposta inicial do Mais Médicos. No Rio Grande do Norte, a Escola Multicampi de Ciências Médicas da Universidade Federal do Estado (UFRN) foi inaugurada em Caicó, a 280 quilômetros de Natal, implementando um modelo inédito: com três câmpus interligados em cidades distintas. O modelo atrai candidatos de diferentes partes do País. “O curso acaba mostrando que você pode ser bem-sucedido em um lugar pequeno”, afirma o estudante Leonardo Almeida, de 23 anos, que migrou de Itapirapuã Paulista (SP).Para Lembrar Uma portaria assinada em abril pelo presidente Michel Temer suspendeu por cinco anos a criação de cursos de Medicina em todo o País. A regra vale para instituições públicas federais, estaduais e municipais e privadas. Também está suspensa a ampliação de programas já existentes. O então ministro Mendonça Filho alegou já ter ocorrido expansão de cursos por todo o País e a necessidade de se avaliar o que foi instituído./COLABOROU RICARDO ARAÚJO e BETO PESSOA, ESPECIAIS PARA O ESTADO

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