Fugitivos de Mossoró: ‘Precisamos celebrar recaptura, mas aprender com erros’, diz pesquisador

Demora na caçada aos foragidos, que se estendeu por 50 dias, e distância percorrida pela dupla de detentos revelaram fragilidades do cerco montado pelas autoridades

PUBLICIDADE

Foto do author Ítalo Lo Re
Foto do author Giovanna Castro
Foto do author Paula Ferreira
Por Ítalo Lo Re , Giovanna Castro e Paula Ferreira
Atualização:

Se por um lado a recaptura dos dois fugitivos da Penitenciária Federal de Mossoró (RN) nesta quinta-feira, 4, motivou alívio, por outro, reforça o entendimento de que houve demora em encontrar os alvos, que percorreram longa distância até serem achados. A dupla, ligada ao Comando Vermelho, foi encontrada 50 dias após a fuga em Marabá (PA), a cerca de 1,6 mil quilômetros de onde fugiram.

Rogério da Silva Mendonça e Deibson Cabral Nascimento haviam escapado do presídio potiguar em 14 de fevereiro e, desde então, eram procurados por forças federais e estaduais na região – foi a primeira fuga do sistema penitenciário federal, que foi criado em 2006 e hoje conta com cinco unidades. A hipótese é de que eles planejavam fugir para o exterior quando foram detidos.

Deibson Cabral Nascimento e Rogério da Silva Mendonça haviam escapado do presídio em 14 de fevereiro e, desde então, eram procurados por forças federais e estaduais na região Foto: DIVULGAÇÃO / POLÍCIA FEDERAL

PUBLICIDADE

Na avaliação do pesquisador Fabio de Sá e Silva, professor da Universidade de Oklahoma (EUA) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a fuga inédita protagonizada pelos dois presos em Mossoró mostrou que o sistema penitenciário federal tem vulnerabilidades em sua gestão.

Como mostrou o Estadão, a dupla de fugitivos chegou a pegar um alicate em uma obra no pátio do presídio e, posteriormente, se beneficiou de câmeras desligadas para não ser descoberta. Como resposta, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, anunciou a construção de muralhas e a instalação de equipamentos mais modernos nas unidades federais.

”A gente sempre fez uma crítica a questões de transparência, já que temos dificuldade em saber o número de presos nos presídios federais, quantos estão em Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), qual o perfil dos presos, entre outros pontos. E em geral afirmam que essas informações não são passadas por questão de segurança”, afirma.

“Mas agora gente viu nesse caso que tem também um problema de gestão, uma vez que os presos se beneficiaram de obras que aconteciam no presídios e de câmeras sem funcionar”, acrescenta o pesquisador. “Precisamos celebrar que fugitivos foram capturados, mas também aprender com erros cometidos para que essa fuga acontecesse.”

Como mostrou o Estadão, a Corregedoria-Geral da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, concluiu nesta semana relatório sobre a responsabilidade de servidores da Penitenciária Federal de Mossoró (RN) na fuga.

Publicidade

O resultado da apuração diz que não há indícios de corrupção no caso, mas aponta falhas nos procedimentos carcerários. Ao todo, 10 servidores responderão a processos administrativos. Outros 17 servidores assinarão Termos de Ajustamento de Conduta (TAC), no qual se comprometem com uma série de medidas – entre as quais, passar por novos cursos.

Segundo Sá e Silva, é importante incrementar não só os protocolos de gestão, mas ter mais transparência nas decisões tomadas na operação de busca. Caso haja um novo caso, é preciso dar resposta mais rápida. “Teríamos que fazer uma discussão mais aberta, em que o governo pudesse demonstrar um pouco como foram tomadas as medidas e especialistas participarem da discussão.”

Demora foi alvo de críticas

No dia 13 de março, Lewandowski havia ressaltado o que chamava de “êxito” da operação de busca por acreditar que a dupla estava perto de Mossoró. “A operação, ao meu juízo, é uma operação que está se desenvolvendo com êxito até o momento. Há fortes indícios que ainda se encontram na região. O fato positivo é que não conseguiram escapar do perímetro original (que foi delimitado).”

Jacqueline Muniz, antropóloga, cientista política e professora de segurança pública da Universidade Federal Fluminense (UFF), disse, também na última semana, ser necessário um relatório de prestação de contas que apresente em detalhes as missões atribuídas, os meios logísticos empregados e os modos táticos adotados a luz dos custos. Dessa forma, segundo ela, seria possível analisar como se deu a falha na operação.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

“O que se pode observar foi um ajuntamento de recursos policiais estaduais e federais sem uma doutrina policial comum clara de busca e captura em cenários adversos”, disse, na ocasião. Ela acredita que pode ter havido falta de protocolo para esse tipo de busca, sem um comando coeso das forças policiais.

Lewandowski considerou a operação “um sucesso”. Segundo ele, a ação foi um exemplo de boa articulação entre as forças de segurança. “Desde o começo da operação, 14 pessoas foram presas, envolvidos nessa fuga. Foi uma operação extremamente bem sucedida porque não foi disparado um tiro, não houve feridos, mortos, foi um trabalho puramente de inteligência.”

O prazo de 50 dias foi considerado “razoável” por ele. “Mudamos de estratégia quando soubemos que eles não estavam mais nas proximidades da penitenciária de Mossoró. A mudança de estratégia consistiu em sairmos da busca física e trabalhar a partir da inteligência, sobretudo do inquérito da PF de Mossoró”, disse o ministro.

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.