PUBLICIDADE

Irmãos de taxista que fixou cruzes em Copacabana repetem o gesto em sua homenagem

Márcio Antônio do Nascimento, de 58 anos, morreu na segunda-feira, 3, de problemas cardíacos; depois do protesto que o tornou conhecido nacionalmente, taxista pediu mais compaixão pelas vítimas da covid-19, que matou seu filho Hugo aos 25 anos

Por Fabio Grellet
Atualização:

RIO - Irmãos do taxista Márcio Antônio do Nascimento Silva repetiram simbolicamente o gesto de mais de dois anos atrás do familiar e fixaram cruzes nas areias da praia de Copacabana, em frente ao Copacabana Palace, nesta quarta, 5. Além dos mortos pela covid-19, que já são mais de 680 mil, homenagearam o próprio Márcio, que morreu na segunda-feira, 3, de problemas cardíacos.

Na manifestação de junho de 2020, ele protestou contra o descaso em relação às vítimas. Uma delas foi seu filho Hugo, que a doença levou aos 25 anos. Inconformado e conhecido nacionalmente por causa do protesto, ele prestou depoimento na CPI da Covid, onde criticou o presidente Jair Bolsonaro.

PUBLICIDADE

“Em memória de Márcio Antônio do Nascimento Silva, pai de vítima da covid, que defendeu bravamente o direito à vida e à liberdade de expressão”, dizia uma faixa, no ato desta quarta-feira. “Exigiu e não teve do poder público o combate eficaz da pandemia”.

Luiz Martins Pinto, irmão de Márcio foi um dos participantes do ato e descreveu o sofrimento do taxista. “Um cidadão que foi voz de quase setecentas mil pessoas e tantas centenas de famílias que foram dilaceradas por uma doença maldita”, disse.

“Doença que dilacerou o coração do meu irmão a ponto dele enfraquecer e não resistir. Ser tratado como ele foi tratado é muito duro. Ele sempre foi sereno, pacato, e teve a indignação necessária (quando fincou novamente as cruzes na areia)”.

Parentes repetem o protesto de Márcio Antônio na praia de Copacabana Foto: Pedro Kirilos/Estadão

A irmã, Márcia Pinto, também falou de Márcio. “Espero que, de onde estiver, Márcio nos dê luz pra que a gente continue na luta pela igualdade e justiça”.

Fundador da ONG Rio de Paz, que organizou os atos de 2020 e desta quarta, 5, Antônio Carlos Costa disse que Márcio morreu após ter “vivido uma experiência profundamente decepcionante com o Brasil.”

Publicidade

“Ele reclamava muito comigo do tratamento que o presidente da República deu aos brasileiros contaminados pela pandemia, aos brasileiros que morreram e seus parentes”, relatou Costa. Durante a pandemia, Bolsonaro, contrário ao fechamento do comércio, criticou quem temia a doença. O presidente destaca supostos benefícios econômicos da sua postura e mantém até hoje a defesa sobre as medidas tomadas na oportunidade.

Taxista reagiu à perda do filho

No ato de junho de 2020, as cruzes tinham sido arrancadas da areia pelo aposentado Hequel da Cunha Osório, então com 78 anos, que discordava das críticas que muitos faziam a Bolsonaro por sua política para a pandemia. O filho de Márcio, Hugo Dutra do Nascimento, de 25 anos, embora saudável e não integrante de grupos de risco, morreu de covid-19 em abril de 2020. Antes, passou dezesseis dias internado.

Depois de fincar novamente as cruzes, durante aquele ato de junho de 2020, Silva pediu mais empatia e compaixão pelas vítimas da covid-19. Àquela altura, a covid-19 já tinha matado mais de 40 mil pessoas. Suas imagens e palavras viralizaram nas redes sociais.

“Meu nome é Márcio. Pai do Hugo, que faleceu aos 25 anos de covid-19. Só queria dizer que a dor do pai é muito grande. É ter que conviver todo o dia com essa dor, com os pensamentos. Tentar lidar com estes pensamentos. Gostaria, por favor, que as pessoas tivessem mais empatia e compaixão pelas pessoas, pelas vítimas, por todos nós”, afirmou.

Apõs a homenagem a Márcio seus parentes choram Foto: Pedro Kirilos/Estadão Conteúdo

O corpo de Márcio foi enterrado na tarde de terça-feira, 4, no cemitério de São João Baptista, em Botafogo (zona sul).

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.