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Rio Grande do Sul monta hospitais de campanha e tem escassez de insumos

‘Situação é caótica’, diz presidente do conselho de secretarias municipais; parte dos hospitais e postos de saúde foi afetada por enchente recorde

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Por Priscila Mengue
Atualização:

Com ao menos 385 municípios afetados pela maior tragédia ambiental de sua história, o Rio Grande do Sul enfrenta uma crise de saúde, com parte dos hospitais e unidades de saúde afetados pela enchente e dificuldade no abastecimento de insumos essenciais. Hospitais de campanha começaram a operar desde domingo, 5, enquanto diversos locais seguem isolados e com difícil acesso no interior e na região metropolitana de Porto Alegre. Cirurgias, consultas e procedimentos eletivos foram suspensos em grande parte das redes pública e privada.

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“É um momento difícil de descrever: a situação é caótica, dramática no Estado do Rio Grande do Sul”, respondeu, ao Estadão, Cacildo Goulart Delabary, presidente do Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Rio Grande do Sul (Cosems/RS) e secretário de Lavras do Sul.

“Há municípios que estão mais de 90% debaixo de água, que não têm unidade de saúde funcionando”, diz. A situação preocupa ainda mais porque a água deve demorar ao menos 10 dias para baixar da cota de inundação em Porto Alegre.

Terceira maior cidade do Estado e localizada na região metropolitana, Canoas teve a maior parte da rede de saúde afetada. Segundo o prefeito Jairo Jorge (PSD), o Hospital de Pronto-Socorro, três UPAs, três farmácias municipais, 4 Centros de Atenção Psicossocial e 19 dos 27 postos de saúde foram afetados e estão inoperantes.

Casas submersas em Porto Alegre, afetada pela maior enchente da sua história Foto: Carlos Fabal/AFP

Em Brasília desde a sexta-feira, 3, para tratar das necessidades dos municípios, o secretário somente conseguiu voltar ao Estado com a Força Nacional do SUS, junto a cerca de 20 profissionais de saúde que vão atender de forma móvel, com o uso de aeronaves. O principal aeroporto do Estado - o Salgado Filho, de Porto Alegre - está fechado.

Com acessos difíceis e bloqueios, municípios têm enfrentado dificuldade de enviar pacientes para hospitais regionais. A situação é ainda mais preocupante porque a região metropolitana é referência para grande parte do Estado e está com bairros ilhados e até hospitais evacuados após alagarem.

No domingo, aeronaves do Estado levaram insumos a Caxias do Sul, Lajeado, Santa Cruz do Sul e São Jerônimo. Na remessa, estavam itens prioritários, como soluções para hemodiálise e cilindros de oxigênio, mas há falta de itens diversos. A indicação é que cidades isoladas devem avisar aos fornecedores para entregar insumos na Base Aérea de Canoas, na Grande Porto Alegre, de onde são remanejados por via aérea.

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Mesmo em cidades menos afetadas, como Lavras do Sul, um dos acessos ao Município de referência ficou inviabilizado, de modo que resta apenas um opção com mais do que o triplo de distância (de 70 km para 210 km), em Bagé. “A outra estrada está intransitável, porque era de chão”, diz o secretário e presidente do Cosems-RS.

Em ofício ao Governo do Estado, o Cosems-RS listou algumas das demandas mais urgentes. No documento, pede medidas emergenciais e chama a situação de “devastadora” após dias seguidos de chuva extrema, vendavais, enchentes e deslizamentos.

O documento aponta que a falta de energia, internet e telefonia inviabiliza que algumas Prefeituras acessem recursos e insumos governamentais urgentes, porque é cobrada a publicação de um decreto de calamidade. Outro gargalo é garantir o atendimento de pacientes que necessitam de hemodiálise, quimioterapia e radioterapia.

Devastação após enchente, vendaval e chuva extrema em Roca Sales, no interior gaúcho Foto: Gustavo Ghisleni/AFP

O conselho também solicita o envio de geradores às unidades de saúde, a destinação de mais kits de medicamentos e insumos e a realização de um levantamento de dados à estrutura de unidades de saúde, dentre outras medidas. Além disso, tem pleiteado incremento do teleatendimento, incluindo profissionais de saúde mental.

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O Estado assinou o repasse de R$ 9,45 milhões a hospitais atingidos nesta segunda. A medida envolve municípios onde a água baixou, mas há grande destruição, como Estrela, Encantado e Roca Sales.

Hospitais de campanha no interior e Grande Porto Alegre

Com estradas bloqueadas, locais ilhados e unidades de saúde afetadas, aeronaves se tornaram uma das poucas alternativas para levar insumos e equipes de assistência a municípios, assim como o resgate de feridios e dos que necessitam de atendimento. Um hospital de campanha começou a operar no domingo em Estrela, no Vale do Taquari, enquanto outros dois estão sendo montados em São Leopoldo e Canoas, região metropolitana da capital, nesta segunda.

Para os próximos dias, estão previstos mais dois hospitais de campanha em Canoas — que precisou evacuar seu pronto-socorro no sábado, 4, após ser tomada pela água —, Guaíba, Eldorado do Sul e Lajeado. Essas unidades estão sob responsabilidade do Exército, da Força Aérea e da Marinha, parte delas com capacidade para 60 leitos.

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Em Porto Alegre, a Secretaria Municipal de Saúde chegou a sinalizar estoque insuficiente de oxigênio, mas novas remessas de cilindro foram entregues. Também apontou a necessidade do repasse de insumos e equipamentos essenciais para a continuidade dos atendimentos.

Encantando está entre municípios que tiveram estradas e vias de acesso afetadas pela chuva extrema e enchente no Rio Grande do Sul Foto: Gustavo Ghisleni/AFP

Segundo a pasta, ao menos 15 hospitais e prontos-socorros indicaram baixo estoque ou desabastecimento de itens nos últimos dias, como respiradores mecânicos, fraldas, sondas, seringas, agulhas, esparadrapos, cateteres e outros, além de produtos para limpeza e alimentos para dietas especiais.

Entre as instituições identificadas, estão os maiores espaços públicos e filantrópicos da cidade e unidades em bairros centrais e periféricos, como o Hospital de Pronto Socorro, o Hospital Materno Infantil Presidente Vargas, o Complexo Santa Casa, o Hospital São Lucas da PUCRS e o Grupo Hospitalar Conceição. A situação afeta também hospitais privados, como o Mãe de Deus, que precisou ser esvaziado após alagamento.

Além disso, na rede municipal, cirurgias, procedimentos e consultas eletivos estão suspensos devido à “situação de calamidade pública em decorrência das enchentes e o risco de desabastecimento de insumos, materiais e medicamentos devido ao impacto e dificuldades logísticas de transporte”, conforme comunicado.

Cerca de 70% da cidade está com desabastecimento de água. Até a manhã, 7,5 mil pessoas estavam em abrigos, cujo balanço não contempla o número ainda maior de moradores que estão em casas de amigos e familiares.

No Estado, também há temor de um aumento nos casos de leptospirose, com a exposição de tantas pessoas à água potencialmente contaminada. Segundo a Defesa Civil, ao menos 873,2 mil pessoas foram afetadas em 364 municípios.

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