Filmes latinos são destaques de hoje

La Buena Vida, do chileno Andrés Wood, e Perro Come Perro, do colombiano Carlos Moreno, contam histórias do continente

PUBLICIDADE

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Histórias que se cruzam e o brutalismo social do continente são temas de duas atrações latino-americanas de hoje: La Buena Vida, do chileno Andrés Wood, e Perro Come Perro, do colombiano Carlos Moreno. Dois belos filmes, que além das temáticas diferentes seguem caminhos estilísticos opostos. Wood (mesmo diretor de Histórias de Futebol e Machuca) segue a habitual linha amorosa com os personagens e a estética plasticamente afável dos seus outros filmes. Acompanha o cotidiano de 4 personagens e faz com que seus destinos se entrelacem de maneira discreta: um cabeleireiro quer comprar um carro e para isso precisa de empréstimo bancário; uma psicóloga tenta salvar vidas de pessoas desesperadas; um músico quer entrar na filarmônica, mas só consegue emprego no exército; a outra personagem ocupa-se apenas em sobreviver, e isso já lhe parece o bastante. Como em geral acontece com esse tipo de filme, algumas histórias são melhores do que as outras. Com o cruzamento das histórias, pretende-se mostrar como tudo e todas as pessoas estão de certo modo interligadas, etc. O exemplo bem-sucedido dessa tendência é Short Cuts, de Robert Altman que, curiosamente, parte de narrativas independentes, os contos de Raymond Carver. Mas o gênio de Altman soube cruzar esses relatos de forma tão orgânica que, de fato, parecem expressão de uma coisa só. Não é o caso em Wood e, em geral, esse efeito de totalidade não é conseguido pelos cineastas que optam pelo recurso. O que, em absoluto, não faz de La Buena Vida um mau filme. Nada disso. Mesmo se levando em conta certo desequilíbrio entre uma narrativa e outra - que são expostas, como de hábito, de maneira alternada -, o filme se mantém. A melhor das histórias é a do cabeleireiro que, com um tipo engraçado mas ao mesmo tempo patético, consegue ir do humor ao drama com muita naturalidade. Já Perro Come Perro, que competiu no Festival de Gramado em agosto, é muito mais cheio de arestas, mais denso e bastante violento, mas sem apelação. Seus personagens são membros de uma gangue de Cáli e disputam um butim em dinheiro. Há uma parábola aí, com os cães ferozes se entredevorando até que não sobre nenhum. O filme é bem montado, com planos rápidos, intensos. É exemplo de uma estética, que se poderia chamar de brutalismo latino-americano. São filmes nos quais nada se atenua, embora em Perro Come Perro certas cenas de violência sejam mais sugeridas que mostradas de maneira explícita, como se o diretor não quisesse ser acusado de sensacionalismo. No entanto, sugeridas ou não, as cenas testemunham uma violência à flor da pele, que é a condição mesma de existência em países como os nossos. Inútil fugir a essa realidade. De resto, Perro Come Perro pertence a uma antiga dinastia, a das obras que indicam não apenas a inutilidade, mas o poder autodestruidor da cobiça. Em clássicos como Ouro e Maldição, de Erich Von Strohein, ou O Tesouro de Sierra Madre, de John Huston, o que se tem é uma visão pecaminosa da ganância, um viés pré-capitalista, se quisermos. Em Perro Come Perro, que, é claro, não atinge a estatura simbólica dos dois clássicos citados, essa sede pelo dinheiro se ambienta naquele que seria seu hábitat natural - entre celerados. Humanizá-los é também uma tarefa do artista, como a mostrar que não existe tanta distância assim entre as diferentes esferas do esforço humano, como também dizia um personagem de outro clássico de Huston, O Segredo das Jóias. Serviço La Buena Vida - Dir. de Andrés Wood Unibanco Arteplex 1 - Hoje, 20h20 Reserva Cultural 1 - 5.ª, 20h40 Cinesesc - 5.ª (30), 17h50 Perro Come Perro - Dir. de Carlos Moreno Espaço Unibanco 3 - Hoje, 21h30 iG Cine - 5.ª, 16h10 Espaço Unibanco Pompéia 1 - 2.ª, 14 h

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.