Mostra no Sesc lembra 60 anos da Atlântida

Tributo ao estúdio que produziu as chanchadas das décadas de 40 e 50 recupera trajetória de Moacyr Fenelon, diretor de Tudo Azul

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Por Agencia Estado
Atualização:

Já não era sem tempo. O Sesc Pompéia inicia nesta terça-feira uma programação comemorativa dos 60 anos da Atlântida, rendendo tributo à Metro tupiniquim, na qual foram produzidas as chanchadas que marcaram época nos anos 40 e 50. No bojo da festividade, e isso é mais importante, o Sesc Pompéia resgata a figura histórica de Moacyr Fenelon. OK, as maiores glórias da chanchada costumam ser atribuídas aos diretores Watson Macedo e Carlos Manga, mas a Atlântida não seria a mesma sem Fenelon. Além de ter sido um dos fundadores do estúdio, Fenelon realizou um dos filmes mais importantes e menos conhecidos da história do País. A homenagem que recebe não só é válida como necessária, mas ainda não é desta vez que você vai poder (re)ver Tudo Azul. Os filmes do diretor escolhidos para integrar a programação são outros - Dominó Negro e Fantasma por Acaso. Amigos e colaboradores vão comentar as exibições e essa será, com certeza, uma oportunidade rara para se saber mais sobre essa figura hoje um tanto esquecida. Com curadoria de Máximo Barro, 60 Anos da Atlântida é uma realização do Sesc, com apoio da Atlântida Cinematográfica e da Faap. Um coquetel, aberto ao público, inaugura amanhã o evento que prossegue até dia o dia 1.º, com exposição fotográfica, projeção de filmes e até um show (de Emilinha Borba e Adelaide Chiozzo), na Choperia, no dia 28. De quarta-feira e também até o dia 1.º, das 10 às 21 horas, a área de conveniência do Sesc Pompéia vai abrigar um autêntico set, com simulação de filmagens nos fins de semana. E quarta-feira e nos dias 14 e 28, serão exibidos filmes representativos do que era o estilo Atlântida. Você vai descobrir por que os fãs do estúdio carioca gostam de dizer que "este mundo é um pandeiro" - título de uma famosa chanchada (de Watson Macedo, de 1947). O público adorava as chanchadas, mas os críticos torciam o nariz para aqueles filmes espontâneos e de forte apelo popular que consagraram artistas de gênio (isso ninguém discute) como Oscarito e Grande Otelo. Só muito recentemente a chanchada começou a ser repensada e valorizada. Mesmo assim, a tendência não é unânime. Sérgio Augusto escreveu um livro (Este Mundo É um Pandeiro) para provar que a chanchada não tinha nada de alienada e era até um foco de resistência cultural. Hélio Nascimento, no seu livro Cinema Brasileiro, segue o caminho inverso e dedica um capítulo inteiro ao assunto para concluir que a chanchada, com seu gosto das paródias (Emilinha cantando Tomara Que Chova em vez de Gene Kelly, Cantando na Chuva; Nem Sansão nem Dalila e Matar ou Correr, baseados em Sansão e Dalila e Matar ou Morrer), era produto do colonialismo cultural, evidenciando um sentimento de inferioridade, expresso no desejo de imitação. Embora crítico em relação à chanchada, como conceito e como estética, o próprio Nascimento reconhece que há preciosos momentos de antologia nos filmes identificados com esse rótulo. Não poderia ser de outra maneira. Só sendo de pedra para resistir ao riso que jorra, incontrolável, quando Oscarito e Grande Otelo aprontam todas nas chanchadas dirigidas por Macedo ou Manga. O desenvolvimento e o apogeu do gênero estão ligados ao primado do rádio, como veículo de comunicação e integração nacional, nos anos 40 e 50. Por isso mesmo, a chanchada não resistiu à nova era iniciada pela TV, nos 60. Entrou em declínio enquanto a televisão se consolidava no País. Nas ondas do rádio, a chanchada estabeleceu um tipo de estrutura narrativa particular. Era como se o rádio ganhasse imagem. Tramas simples, humor e números musicais, a cargo dos cantores do rádio que eram os ídolos da época. Esse tipo de cinema não assumia a pobreza do neo-realismo, exceto, talvez, em Tudo Azul, que faz a ponte entre Favela dos Meus Amores, dos anos 30, e Rio 40 Graus, de Nelson Pereira dos Santos, um marco dos 50. Não se pode esquecer que Fenelon filma o morro, sem folclorizá-lo, e Marlene canta Lata d´Água na Cabeça em Tudo Azul. Mas a chanchada flertava mesmo, por meio de paródias, com Hollywood. Há cenas de Watson Macedo que mostram que ele queria ser Vincente Minnelli. Sinfonia Carioca é o Sinfonia de Paris dos trópicos. Um dos filmes mais conhecidos de Macedo integra a programação. Aviso aos Navegantes, com todo o elenco de luxo da casa (Oscarito, Grande Otelo, Anselmo Duarte, Eliana, Adelaide Chiozzo, Zezé Macedo, Emilinha cantando Tomara Que Chova), passa dia 28, às 19 horas, precedendo, às 21 horas, a exibição de É com Esse Que Eu Vou, de José Carlos Burle. De novo Burle assina Luz dos Meus Olhos, programado para dia 14 às 19 horas. E há os dois filmes de Fenelon - Fantasma por Acaso, quarta-feira, às 19 horas, e Dominó Negro, dia 14, às 21 horas. Pode não ser, rigorosamente, o melhor da Atlântida e de Fenelon, mas a homenagem justifica-se. O estúdio e seu criador merecem essa revisão necessária que o público poderá fazer no Sesc Pompéia. 60 Anos da Atlântida - De terça a sábado, das 10 às 21 horas; domingo e feriado, das 10 às 20 horas. Exibição de filmes quartas, às 19 e 21 horas. Grátis. Sesc Pompéia. Rua Clélia, 93 tel. 3871-7700. Até 1/4. Abertura, amanhã, às 20 horas.

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