Pandemia invade brasileiro ‘Três Tigres Tristes’

Longa de Gustavo Vinagre é exibido na mostra Fórum do Festival de Berlim

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Por Mariane Morisawa
Atualização:

Em fevereiro de 2020, Gustavo Vinagre tinha acabado de voltar de Berlim, onde apresentou Vil, Má. No mês seguinte, começaria a rodar seu novo longa, Três Tigres Tristes. Mas aí a pandemia atrapalhou os planos. Só depois de alguns meses, ele retomou o projeto, que estreia nesta segunda-feira na seção Fórum, no mesmo Festival de Berlim. “Estar em Berlim em 2022 é um privilégio muito grande porque são só seis filmes brasileiros. Em 2020, eram 19 produções”, disse Vinagre em entrevista ao Estadão, por telefone, de Berlim.

“O filme foi feito durante a pandemia. Foi o último suspiro do Fundo Setorial do Audiovisual, a gente ganhou o edital de 2019. É um privilégio estar fazendo cinema no Brasil em 2022, quando a Ancine não existe mais, basicamente.” 

Cena do filme Três Tigres Tristes, de Gustavo Vinagre. Foto: Cris Lyra

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A ideia do filme, girando em torno de três personagens jovens andando pelo centro de São Paulo, surgiu em 2016. No processo, ele virou um musical. E aí a pandemia contribuiu para dar a Três Tigres Tristes os contornos que ele ganhou. “Estou no meio da pandemia, não quero fazer um filme de época. Quero fazer um filme sobre agora”, disse Vinagre. Por segurança, ele preferiu que, na maior parte das cenas, os atores usassem máscaras. 

Assim, Isabella (Isabella Pereira), Pedro (Pedro Ribeiro) e Jonata (Jonata Vieira) enfrentam uma nova cepa em que as pessoas perdem a memória. “Para mim, tinha tudo a ver com o jargão de que o Brasil não tem memória”, disse o cineasta. Esse esquecimento ou apagamento aparece quando os personagens visitam o Beco dos Aflitos, no bairro da Liberdade, onde fica a Capela de Nossa Senhora dos Aflitos. Lá eram enterradas pessoas escravizadas, indigentes e condenados à morte – ali perto, a hoje Praça da Liberdade era chamada de Largo da Forca. O filme também aborda o apagamento da natureza na cidade, simbolizado pelo rio Tietê. 

Filme foi rodado durante a pandemia de covid-19. Foto: Cris Lyra

Cada um dos jovens enfrenta seu próprio drama: Pedro perdeu o namorado de maneira trágica, Isabella se prepara para o Enem e não sabe muito bem o que quer do futuro, Jonata vem do interior de Minas Gerais para pegar sua medicação, pois vive com o HIV. Em suas perambulações, eles encontram outros personagens, como o cliente de Pedro (Everaldo Pontes) e a dona de um antiquário (Cida Moreira). “Sempre fui apaixonado por ela e queria tê-la no filme”, explicou Vinagre.

Em dado momento, o filme volta às suas origens musicais, com composição dos também cineastas Marco Dutra e Caetano Gotardo. “Esse momento é quando esses conflitos começam a ser tratados de outra forma. Parece que o que eles desejam vira realidade de uma maneira retorcida, e eles repensam o que desejam de fato. É um momento despirocado”, explicou Gustavo Vinagre. “Sempre quis que esse filme tivesse uma aura infantil, por mais que toque em questões pesadas como HIV, câncer, vírus.” 

Mas é, também, um filme sobre o poder do encontro, ainda mais forte nesses tempos de pandemia. 

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