Se existe um problema em Shazam!, talvez seja o mesmo de Capitã Marvel. São filmes de super-heróis que não têm medo de tomar tempo para contar suas histórias. A Capitã começa embaralhado e, de verdade, só fica bom com a inversão de expectativas – olha o spoiler –, quando os heróis viram vilões, e vice-versa. Shazam! começa contando a história do vilão, e só depois vai para a do herói.
Seguimos aquele garoto no carro com o pai e o irmão, compartilhamos o seu isolamento e o encontro com o feiticeiro que busca um salvador para o mundo. E só depois surge o outro garoto, que se perde da mãe e nunca desiste de procurá-la. Shazam! é sobre como esse segundo garoto vira herói – e ganha uma família para chamar de sua.
No texto abaixo você vai saber o essencial sobre a gênese do personagem, e como o Capitão Marvel virou Shazam e foi parar na DC Comics. O filme é sobre Billy Batson, e como o garoto de 14 anos interpretado por Asher Angel vai parar num lar de crianças esquisitas e ainda por cima vira um super-herói adulto, e para essa fase muda o ator. Entra em cena Zachary Levi Pugh, cantor e compositor que cortou o último nome e tornou-se conhecido como o Chuck Bartowski do seriado Chuck.
Assim como o universo estendido Star Wars, a DC também resolveu estender seu universo e é aí que entra um super-herói como Shazam Boa parte do longa de David F. Sandberg narra o processo como Asher Angel vira Zachary, ou Shazam, e como o atrapalhado garoto toma consciência de seus (novos) superpoderes. O cartaz ‘cool’ do filme já faz a síntese desse conceito, com o super-herói mascando chiclete, como o moleque que é. O vilão Thaddeus Sivana/Mark Strong percebe essa dualidade e tenta tirar proveito dela, mas é aí que entra o amigo do herói, Jack Dylan Frazer/Freddy, e as demais crianças do lar de Victor e Rosa Vásquez, no qual, e depois de muitas tentativas frustradas, ele finalmente encontra sua família. Talvez a mais fácil – óbvia? – associação que se possa fazer é a de Shazam! com Deadpool, mas o herói de Ryan Reynolds é muito mais desbocado e ‘pervertido’ (em termos). Shazam é só uma criança, e por isso o roteiro de Henry Gayden e Darren Lemke cria o espaço do clube adulto, de strip-tease, como contraponto ao parque de diversões, onde ocorre toda a ação final.
Justamente o parque. O cinéfilo de carteirinha pode até tentar a aproximação com Nós/We, de Jordan Peele, até porque o diretor sueco David F. Sandberg também veio do terror, de filmes como Lights Out e Annabelle 2 – A Criação do Mal. E, nesse sentido, entende-se melhor sua opção narrativa, de começar Shazam! pela história do vilão. O feiticeiro busca alguém puro de coração para delegar seus poderes, e o amargurado Thaddeus Sivana certamente não é esse personagem. Pela sua construção dramática – é chamado de inútil, o pai e o irmão, o próprio feiticeiro dizem que nunca será ninguém –, ele é muito mais suscetível de assimilar aquele olho para incorporar os (monstruosos) sete pecados capitais. Billy, apesar de seus protestos – e de suas más ações, como a inicial, contra a polícia –, ele sim tem um coração puro e pode ser o herói. Sandberg conta essa (dupla) história com uma pitada de terror e muito humor. Shazam! já nasceu com vocação para ser uma ótima Sessão da Tarde. Quero ser Grande no Lar das Crianças Peculiares. Maneiro.