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Com a pandemia, prática do bordado passou a conquistar todo tipo de público

Atividade permite extravasar criatividade com um quê de introspecção

Foto do author Gilberto Amendola
Por Gilberto Amendola
Atualização:

A pandemia fez com que a terapeuta corporal Beatriz Farinazzi Vollet, 37 anos, se sentisse exausta, desanimada e identificasse outros claros sinais de depressão em sua rotina. Com a intenção de “desanuviar” do noticiário e “deixar de caraminholas”, ela buscou uma atividade em que pudesse “extravasar sua energia e criatividade”, e que, ao mesmo tempo, tivesse um “quê” de introspecção e meditação.  Beatriz encontrou no bordado tudo o que precisava. Assim como ela, outros descrevem a experiência com as agulhas como uma “terapia”, “um caminho para o autoconhecimento”, “um exercício de respiração” e outras definições que seguem por esse mesmo caminho. O bordado, que hoje atrai um público jovem e interessado em autoconhecimento, tem origens pré-históricas, atravessou todas as civilizações antigas (Egito, China, Pérsia, Índia...) e pode até ser encontrado em passagens bíblicas. A visão romantizada e machista de mulheres submissas que tecem longos bordados enquanto seus maridos lutam em alguma guerra não poderia estar mais desatualizada. O Clube do Bordado, por exemplo, iniciou sua trajetória de sucesso em 2014, com uma coleção de bordados “soft porn” – que representava a sexualidade do ponto de vista feminino. Hoje, o clube tem mais de 230 mil seguidores no Instagram e 7 milhões de visualizações mensais em seus vídeos e aulas no YouTube. “Nos primeiros meses da pandemia, houve um ‘boom’ de procura por cursos de bordado. A gente ganhava, em média, 10 mil seguidores por semana”, falou uma das idealizadoras do Clube do Bordado, Renata Dania, 34 anos. “As pessoas estão buscando ferramentas para ficar bem. O bordado tem um efeito meditativo comprovado”, completou. Viver de bordar. Renata também apontou o bordado como uma ferramenta de empreendedorismo. “É uma consequência natural. A pessoa posta uma foto de um bordado que fez nas redes sociais. Aí, algum conhecido gosta e faz uma encomenda. Temos muitas alunas que começaram assim e hoje criaram perfis em redes sociais e vivem disso”, contou. “O investimento é muito baixo. Com R$ 30, você já pode comprar linha, tecido e agulha”, apontou.  Para Maria Fernanda Narciso, 31 anos, fundadora da Casa Beta, uma plataforma que abriga uma série de cursos online, o público do bordado é “contemporâneo, moderno, jovem, não necessariamente cis (que se identifica com o sexo biológico com o qual nasceu) e feminista. São pessoas que expressam sentimentos e emoções por meio do bordado. E que também usam a técnica como um relaxamento, algo capaz de acalmar a mente e criar foco”, contou.  Homens na agulha. Além de se desvincular da imagem de submissão feminina, o bordado também começou a atrair o público masculino. O psicólogo e confeiteiro Marcos Souza, 32 anos, se reconectou com as artes manuais depois de ganhar um kit de bordado. “Existe uma construção social que faz o homem se distanciar das artes manuais. Mas, veja, o alfaiate, por exemplo, era alguém de alto valor dentro da corte real... Acredito que homens e mulheres podem se beneficiar do autoconhecimento e da delicadeza de trabalhar com as agulhas”, disse.  Para Souza, a necessidade de permanecer em casa e a impossibilidade de frequentar salas de teatro ou o cinema fizeram com que as pessoas descobrissem o prazer do bordado. “É algo que você pode fazer em casa, sozinho e envolve todo um processo de criação”, disse. Formada em História e Geografia, Juliana Padilha, 41 anos, era professora do ensino fundamental quando decidiu mudar de vida. Ela teve um ateliê de decoração, trabalhou com pintura de tecidos e se pegou fazendo delicados bordados para quartos de maternidade (com o nome dos recém-nascidos). “Na ocasião, alguém me perguntou se eu ensinava. Foi então que comecei com as aulas”, disse.

Juliana Padilha, da Confraria da Agulha, que ensina a bordar pela internet Foto: Tiago Queiroz/Estadão

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Hoje, Ju Padilha, como é conhecida, tem um clube de assinatura com aulas de bordado, a Confraria da Agulha. “Muita gente usa o bordado como metáfora para nossas questões do dia a dia. O ponto funciona como algo mecânico, que acaba permitindo que cada pessoa se conecte com ela mesma”, falou. O ponto-atrás é uma das técnicas mais simples do bordado, mas existe uma variedade de pontos, como ponto-cruz, ponto-haste, ponto-corrente e muitos outros. Além disso, o chamado kit bordado para iniciantes é bastante acessível e conta com bastidor (peça em que se prende e estica o tecido que se quer bordar), tecidos, agulha de bordar, linhas, passadores de linha, enroladores de meada (linha), tesoura e dedal. Também com formação em educação, Reginaluz -Vitória, 34 anos, realiza oficinas de bordado. “O trabalho manual é terapêutico. Através das mãos é que o homem construiu o mundo. Nas escolas antroposóficas (que procuram integrar de maneira holística o desenvolvimento físico, espiritual, intelectual e artístico dos alunos), o ensino das habilidades manuais vem antes mesmo da matemática”, disse. “O bordado é algo que parte de uma concentração, um foco, para trabalhar o nosso lado intelectual e emocional”, completou. A psicóloga Ana Lúcia Pizzi, 54 anos, contou que, com o bordado, ela consegue “abandonar essa zona estressante que é o mundo pandêmico”. “Além de olhar mais para o meu interior, eu não compro mais presente de aniversário para ninguém. Meus presentes, agora, são sempre os meus bordados”, brincou. 

Onde aprender

 Clube do Bordado Aulas virtuais, vídeos (YouTube) e clube de assinaturawww.oclubedobordado.com.brCasa Beta Plataforma de cursos para desenvolvimento de criatividade. Aulas de bordado 100% onlinehttps://www.casabeta.com.brConfraria da Agulha Clube de assinatura com aulas pelo Instagram@confrariadagulha ou @jupadilhaReginaluz-Vitória Bordados Aulas particulares de bordado@reginaluzbordadosBordado Academy Video aulashttps://bordadoacademy.comPrimavera de 83

Cursos onlinehttps://www.primaverade83.com/

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