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O Bolsonaro ou a vida

Comecei a escrever sobre Gramsci e Maquiavel e acabei no Bolsonaro. Chega. Você eu não sei, mas eu quero ter a liberdade de mudar de assunto

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Por Luis Fernando Verissimo
Atualização:

Num dos textos que escreveu na prisão, Antonio Gramsci refletiu sobre Maquiavel como teorista político, principalmente na sua obra O Príncipe, sempre tida como um livro de conselhos sobre como governar Florença com sabedoria e alguma sacanagem, dirigidos aos Medicis. Os conselhos de Maquiavel eram certamente influentes, mas o que ficou na História sobre sua atuação como “consigliere” foi a sacanagem.

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Até hoje “maquiavélico” quer dizer mau e furtivo no pior sentido. Para Gramsci, longe de ser apenas um oportunista bajulador do poder, Maquiavel foi um realista político que defendia coisas como a unificação da Itália por qualquer meio. Foi quem inventou os “condottiere”, equivalentes às nossas milícias e com a mesma função, proteger as fortunas da burguesia e a burguesia do crime nas ruas, sem se importar com muita legalidade.

Maquiavel não tinha nada contra o sistema político das cidades-Estado italianas, mas admirava as monarquias absolutas da França e da Espanha e os países que elas mantinham fortes e coesos. Os reis da França e da Espanha também faziam e diziam bobagens, mas lá, ao contrário daqui, a imprensa não dava e WhatsApp nem existia. As bobagens eram captadas assim que saíam das bocas reais e levadas para o fundo do palácio, onde eram sacrificadas.

Está aí, comecei a escrever sobre Gramsci e Maquiavel e acabei no Bolsonaro. É inescapável. Há uma expectativa no ar que dá às pessoas o que só pode ser descrito como cara de meu Deus do céu. O que o homem vai aprontar agora? O que ele vai dizer e desdizer depois?

Não sei se foi boa ideia ele tomar café da manhã com jornalistas. Muitas vezes o clima de cordialidade e informalidade não dura até servirem a laranjada. Têm havido desentendimentos lamentáveis. Na outra manhã um jornalista pediu: “Presidente, me dá um pão na chapa?” e o Bolsonaro entendeu mal e chutou a sua canela.

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Chega. Você eu não sei, mas eu quero ter a liberdade de mudar de assunto. Ficar chamando atenção para as barbaridades que ele diz e faz só o encoraja. Quero poder escolher entre o Bolsonaro e a vida, e sua bendita variedade. 

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