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Crítica: Norah Jones e o exuberante poder da solidão

Mais densa do que em seus primeiros discos, Norah faz de 'Pick Me Up Off the Floor' um recanto reconfortante para os dias frios

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Foto do author Julio Maria

Quando Norah Jones surgiu, pelo alvorecer dos anos 2000, sua imagem pesou tanto que seu som, tão forte e poderoso, reforçou a ideia equivocada de que ela se tratava de uma cantora de jazz. Um jazz que se via na moça sentada atrás de um piano de cauda, nos arranjos de música etérea, líquida, flutuante e diluída no tempo e no espaço mas que, de fato, nunca existiu. Norah havia encontrado um espaço do qual raramente saiu, dando esse tratamento minimalista, de poucos instrumentos, seco e macio ao mesmo tempo, onde qualquer ideia musical ganhava imediatamente um status elevado de conceito a dois palmos acima do pop, que a falta de compreensão fazia chamar respeitosamente de jazz.

Norah Jones, em sua casa Foto: NJC

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Ela está de novo ali, no mesmo canto de seu quarto, a tocar seu piano. Pick Me Up Off The Floor, seu oitavo disco solo de estúdio, tem uma densidade um pouco maior do que os anteriores, um a névoa uma pouco mais densa e cinza, como se as noites chuvosas dos dois primeiros álbuns, Come Away With Me, de 2002, e Feels Like Home, de 2004, fossem trocadas pelas tardes de inverno em que nada se move. Pick Me Up tem claramente uma influência dos dias pandêmicos e solitários, algo que Nora, uma triste por natureza, cheia de dores e questões familiares aflitivas, sente na pele. Em Heartbroken, Day After, ela canta: “Coração partido, dias depois / Minha mente está girando / Desesperadamente fora de controle / Coração partido, dias depois / Seu lado está ganhando / E eu me encontro no frio / Hey, hey / Vai ficar tudo bem...” E fica, ao menos em outra canção, Hurt to Be Alone: “Tire de mim o que você pode segurar / As coisas que eu preciso, já vendi / Vou tentar ser outra pessoa / Ou encontrar novas maneiras de ser eu mesmo / Nunca é demais estar sozinho.” A solidão, só ou acompanhada.

This Life, Say No More, To Live, uma sequência linda e profunda, tem na última um renascer de esperança gospel que Norah busca em suas paixões sulistas, com sopros e uma letra revigorante: “Quero uma vida colorida / Respirar fora das linhas / Para viver neste momento / Encontrar a paz em minha mente”. E quem a ouve encontra, ao menos nos poucos minutos de duração de sua canção. Ela se reafirma viva também em I’m Alive, com mo máximo de suingue que sua alma pode ter nesse momento, segue com Were You Watching?, tocante em Stumble on My Way e novamente invernal em Heaven Above. Existe um conforto em ouvi-la nesses dias, uma sensação de que há mais do que vida, mas vida criativa, abundante e transformadora em dias de tantos frios e de tantos questionamentos.

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