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Novo livro de Evandro Affonso Ferreira narra a estória de homem que reflete sobre a vida após o adeus da amada

'O Mendigo Que Sabia de Cor os Adágios de Erasmo de Rotterdam' será lançado hoje em SP

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Por Redação
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E esta é a herança maior de uma cultura em constante desconforto: a eleição como supraliterário de uma linguagem divorciada de qualquer preocupação em se comunicar com um público amplo de leitores. Alçar Rosa e Lispector, donos de estilos herméticos, como os últimos escritores pilares nacionais, é indicativo dessa escolha da dificuldade como termômetro de valor estético: o difícil é o válido, e nenhuma reta pode ser guardiã de sabedoria. Mas para cada Rosa existem dezenas de Borges: literatura que convida o leitor a uma experiência emocional e estética sem humilhá-lo. Evandro Affonso Ferreira é um talento literário nato. Apenas a forma com que talha sua prosa faz com que ninguém saiba realmente disso: complicado, hermético, seu estilo impede que o leitor se aproxime da força emocional de seus personagens. Mais, até: o leitor briga com seu estilo, de facão em punho, buscando a estória dentro do livro. Evandro tem o amor da crítica, algo atestado pelo seu recente prêmio da APCA. Contudo, quem vitaliza a literatura são os leitores, e boa parte dos escritores atuais ignora essa seiva, preferindo o conforto casto dos seus pares.O Mendigo Que Sabia de Cor os Adágios de Erasmo de Rotterdam, que será lançado hoje na Livraria da Vila do Shopping Pátio Higienópolis, alcançará um sucesso estrondoso. A estória de um homem erudito abandonado sem-cerimônia pela paixão de sua vida e que escreve uma narrativa para tentar esclarecer esse ato está tão recheada de citações e neologismos e sintaxes complexas que vai arrebatar todos os prêmios literários de prestígio. No entanto, de amor, de exploração desse sentimento de abandono, o pouco que existe está soterrado. Sentimento que motiva cada palavra do relato, está invisível pela escolha estilística do autor. O livro será um sucesso; foi escrito apenas para 43 pessoas. O livro anterior de Evandro atesta essa escolha. Incensado, elogiado, possui uma das estórias mais intensas de amor e ódio da literatura recente. Minha Mãe se Matou sem Dizer Adeus é a desconstrução dos relatos edificantes de despedida: um homem solitário escreve, sob uma chuva infinita, um acerto de contas com seus afetos familiares embargados. Ele não aprende nada com a morte da mãe, nem com a velhice: apenas rumina seu ressentimento, o vazio em que foi criado e que aceita como seu casulo, quase seu caixão. Evandro construiu um dos mais ricos personagens da literatura brasileira recente. Apenas ninguém, infelizmente, sabe disso.

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