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Audacioso, Wes Anderson divide Cannes

Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
Wes Anderson volta à Croisette em disputa pela Palma de Ouro - Foto: MUBI

RODRIGO FONSECA Há momentos sublimes em "Asteroid City", o novo Wes Anderson, exibido nesta terça em Cannes, em disputa pela Palma de Ouro de 2023, sobretudo a sequência em que Margot Robbie disseca a história de um casamento, com um cigarro na mão, resumindo ao público o destino de uma personagem limada de uma ficção e resumida a uma foto. Igualmente bela é a história de desejo, cumplicidade silenciosa e peripécias de alcova entre um fotógrafo de guerra (Jason Schwartzman) e uma quase estrela (Scarlett Johansson). Mas, fora isso, tudo no filme é tão trincado, tão acelerado, tão compactado que muito se perde. A gente se perde no mar de gente que Wes enfia na tela, na narrativa mais cartunística de toda a sua obra (essencialmente gráfica), parecida com um desenho do Papa-Léguas. Há até um passarinho exótico, expresso em animação que lembra a ave superveloz dos "Looney Tunes", mas sem um Coiote pra correr atrás dele. Essa cinemática é tão esbaforida que os personagens não têm chance de ir além da condição de entes narrativos. Quem se sai mesmo bem é Byan Cranston, o eterno Walter White de "Breaking Bad", alçado ao posto de narrador. Assim sendo, pode-se afirmar que, no mais corajoso e, ao mesmo tempo, mais irregular de seus longas, Anderson foi mal-recebido na Croisette. O ódio contra ele é polpudo, com parte da crítica tachando seu regresso às telas de tedioso. Tédio ele não causa, mas esgotamento, diante de um ritmo taquicárdico, sim. É uma expressão de pura audácia, um risco sem cálculos. Não há uma sequência que não pareça um croqui, com cores ressaltadas. É excessivo o colorido na fotografia de tintas exageradamente saturadas de seu habitual colaborador, Robert D. Yeoman ("Drugstore Cowboy"). Mesmo atores que são poços de carisma, como Tom Hanks, somem numa multidão de famosos. Seu Jorge só se destaca, nas pontas que faz, por soltar a voz, ao violão, num corifeu.

"Asteroid City" causou tédio em parte da crítica e gerou encanto em outra - Foto: Universal

O pacto de que nada visto em cena é verossímil é travado logo no início quando Cranston entra em cena como o mestre de cerimônias e narrador de um programa de TV em P&B dos anos 1950, no qual o episódio da noite se chama "Asteroid City". Ele avisa que tudo se passa em 1955, em um lugar que não existe, onde fatos além da nossa imaginação ocorrem, a partir do que um dramaturgo e roteirista vivido por Edward Norton escreve. Desse mote em diante vale tudo, até a teoria da conspiração de um ex-militar reformado (Jeffrey Wright"). No excesso, o filme se perde (e a gente se perde com ele), mas que tudo é divertido do início ao fim, é inegável, com direito a uma corajosa participação de Scarlett. Cannes termina neste sábado.

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